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A recarga subterrânea na ilha de Santiago varia significativamente com a precipitação, altitude e/ou distância à costa e tipo de formação geológica. A utilização conjunta de métodos físicos e químicos para aproximar o valor da recarga de água subterrânea na ilha de Santiago, permitiu superar algumas dificuldades resultantes da ocorrência de um clima predominantemente árido ou

semi-árido até aos 400 m de altitude da ilha, nomeadamente no que diz respeito à estimativa da evapotranspiração real.

Aplicando o método de balanço de cloretos obtém-se um volume total de recursos subterrâneos renováveis em média de 39 hm3/ano. No entanto, se o cálculo da recarga for feito com base no método de Penman-Grindley, obtêm-se valores de recarga anual inferiores e que podem variar entre 22 e 30 hm3/ano, dependendo do método de estimativa da evapotranspiração (Penman ou tina evaporimétrica, respectivamente). A utilização do método de Thornwaite na estimativa da evapotranspiração potencial não se mostrou adequada a este tipo de climas áridos e foi por isso eliminado.

Tendo em conta que o método de Penman-Grindley não permite calcular qualquer recarga nas zonas mais áridas da ilha (menores altitudes e valores de precipitação) considera-se que as estimativas de recarga por este método serão sempre por defeito, já que se sabe que nos períodos de maior precipitação a recarga subterrânea pode ocorrer mesmo a baixas altitudes. Sendo assim, considera-se que os valores estimados pelo método de balanço de cloretos se aproximarão mais do que se passa na natureza.

Do ponto de vista da recarga subterrânea, deve-se salientar a importância da criação de um maior número de estruturas de retenção de água (diques) nas zonas mais a montante dos leitos das ribeiras, de forma a potenciar o aumento da recarga subterrânea e a diminuir a quantidade de água doce que se perde ao mar. Assim, como a necessidade de criação de uma rede de monitorização da composição química (e, isotópica) da água da chuva (factor essencialmente na aplicação do método de balanço de cloretos).

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HIDROGEOQUÍMICA E QUALIDADE DA ÁGUA

A alteração química das rochas é um dos processos principais no controlo do ciclo geoquímico global dos elementos na crusta terrestre. Estes processos de alteração química têm como agente principal a água, implicando normalmente o consumo de dióxido de carbono (atmosférico ou endógeno) e a libertação em solução, de metais e outros elementos químicos, existentes nas estruturas das rochas, dando origem a novas rochas e/ou minerais. Para além de factores biológicos, a alteração química é também auxiliada por processos físicos que contribuem para fracturar as rochas e aumentar a superfície mineral sujeita à alteração.

Na ilha de Santiago existem rochas vulcânicas de composição e génese variadas, com predomínio das rochas de composição basáltica, constituídas maioritariamente por minerais de natureza silicatada. E, embora estes minerais apresentem normalmente uma cinética química bastante lenta, os basaltos são no grupo das rochas de origem vulcânica, aquele que é mais sensível a processos de alteração química, como a dissolução, a hidrólise e a oxidação. Por exemplo, estima-se que a contribuição de cálcio resultante da alteração de minerais silicatados em rochas basálticas por acção da água do mar, seja da mesma ordem de grandeza, que a contribuição de cálcio proveniente dos processos de alteração de silicatos de cálcio em zonas continentais (Berner & Berner, 1996).

Diversos factores controlam o grau de alteração química de uma rocha em ambientes vulcânicos, nomeadamente o clima, o tipo de rocha, o tempo de interacção água-rocha, a existência ou não de camada de solo e a composição química da água de infiltração (pH, temperatura). O clima determina a quantidade de água de precipitação, um dos factores fundamentais na alteração química. Em climas áridos e semi-áridos como o de Santiago, os processos de alteração química são mais lentos, devido à escassez de água.

O tipo de rocha influencia essencialmente através de três propriedades – a estrutura, a textura e a composição mineralógica. Quer a estrutura quer a textura influenciam a forma como a água circula numa rocha, determinando a extensão da relação água - rocha. A composição mineralógica da rocha determina em grande parte a composição catiónica da água subterrânea. Iões como o sódio, cálcio, magnésio e potássio estão debilmente retidos na estrutura silicatada do mineral, deixando a estrutura cristalina que se supõe oferecer uma certa resistência aos processos

de dissolução e passando, com uma certa facilidade, para a água (Custodio & Llamas, 2001). Estes processos de dissolução são, em geral, função do pH e da temperatura da água.

Nas áreas de vulcanismo recente, que não é o caso da ilha de Santiago, a dissolução de quantidades significativas de dióxido de carbono no terreno confere grande agressividade à água, e associada à existência de gradientes geotérmicos elevados, facilita a libertação de quantidade significativa de iões em solução.

No âmbito do presente trabalho de investigação foi realizado um estudo hidrogeoquímico detalhado das águas subterrâneas da ilha de Santiago com o objectivo de estudar, por um lado, as relações existentes entre o quimismo da água subterrânea e as características hidrogeológicas e mineralogia das principais formações aquíferas e, por outro lado, avaliar a qualidade da água para diferentes usos identificando potenciais focos de contaminação. Saliente-se ainda que os dados geoquímicos recolhidos constituíram uma importante ferramenta para validar os estudos hidrodinâmicos já realizados (capítulo 3), esclarecendo aspectos referentes à origem, processos de recarga (capítulo 4) e movimento da água no meio geológico.

A metodologia seguida incluiu (1) a caracterização da distribuição espacial das principais características físico-químicas das águas subterrâneas; (2) a identificação dos principais processos geoquímicos de interacção água - rocha; (3) o estudo de outros processos responsáveis pela variação do quimismo da água subterrânea, com especial ênfase nos processos de mistura (com águas salgadas, águas contaminadas, etc.); e, (4) a identificação de indicadores de contaminação.

As composições químicas e isotópicas da água subterrânea foram estudadas determinando-se razões iónicas, molares e isotópicas e a sua evolução com o aumento do tempo de residência (em função nomeadamente, da altitude e distância à costa). A selecção de alguns pontos de água que foram monitorizados durante um ano permitiu avaliar o efeito das precipitações no quimismo das águas subterrâneas. O cálculo dos índices de saturação dos minerais mais comuns tornou possível a identificação de algumas associações mineralógicas em equilíbrio com as águas subterrâneas.

Importa referir que existiam alguns estudos hidrogeoquímicos anteriores realizados na ilha de Santiago, a maioria com base na análise dos constituintes principais das águas subterrâneas, mas alguns já incluíram a determinação de isótopos estáveis (δ2H, δ18O, δ13C) e datações (3H e 14C), mas nenhum realizou um estudo com um número tão elevado de pontos de água, nem incluiu a determinação de elementos menores e traço. Barmen et al. (1984) estudou os constituintes principais e fez determinações de trítio nas águas subterrâneas na zona Norte, Centro e Este da ilha. Akiti (1985), num relatório realizado para a IAEA a pedido do PNUD, apresentou os resultados de um estudo hidroquímico e isotópico que incluiu determinações de isótopos estáveis (δ2H, δ18O, δ13C), trítio (3H) e carbono-14 (14C) contribuindo para um melhor conhecimento dos

recursos de água subterrânea nas bacias do Tarrafal e da Achada Baleia, nomeadamente sobre a sua origem e tempo de residência. O INGRH & Cooperação Espanhola (1994) realizaram também um estudo sobre a qualidade da água da subterrânea no arquipélago de Cabo Verde, que incluiu também a determinação dos constituintes principais, isótopos estáveis, trítio e carbono-14 na água subterrânea. Estes autores foram os primeiros a analisar a composição química e isotópica da água da chuva. Heitor & Pina (2003) fizeram um estudo sobre a qualidade da água subterrânea da ilha a partir de análises de constituintes principais. Mota Gomes et al. (2004) e Lobo de Pina et al. (2004, 2005) apresentaram os primeiros resultados físico-químicos obtidos nas campanhas de campo que serviram de base aos estudos hidrogeoquímicos das suas teses de Doutoramento (Mota Gomes, 2007; Lobo de Pina nesta monografia). Monteiro Santos et al. (2006) correlaciona os resultados dos estudos geofísicos sobre intrusão salina na zona de Santa Cruz, Santa Catarina e Tarrafal, com os resultados já obtidos àquela data por Mota Gomes et al. (2004) e Lobo de Pina et al. (2004, 2005). Mota Gomes (2007) caracteriza o quimismo das três unidades hidrogeológicas com base na análise da distribuição dos constituintes principais. Carreira et al. (2007a,b,c,d) no âmbito do projecto Hidroarid realiza duas campanhas de amostragem na ilha de Santiago, em que foram recolhidas cerca de trinta amostras de água subterrânea pertencentes aos diferentes sistemas aquíferos da ilha para análises isotópicas (δ2H, δ18O, δ13C, 3H). De referir que estes autores utilizaram como base de dados os pontos de água previamente seleccionados por Lobo de Pina et al. (2004, 2005) e Mota Gomes (2007). Condesso de Melo et al. (2008) apresenta os resultados de um estudo hidroquímico e isotópico (isótopos estáveis) com o objectivo de avaliar potenciais zonas de recarga e mecanismo de salinização das águas subterrâneas.

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