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1 A CULTURA ORGANIZACIONAL ALGUMAS CONTRIBUIÇÕES SOBRE O TEMA

1.4 Mitos e Ritos Organizacionais

1.4.1 Ritos e Rituais

O estudo dos ritos é parte fundamental das construções antropológicas, principalmente naquilo que se refere às sociedades primitivas. O seu estudo na vida moderna é justificado pelo fato de que os rituais e as cerimônias estruturam e apresentam interpretações da realidade social.

O primeiro autor a se interessar pelo estudo dos rituais foi Van Gennep (1978), quando em 1909 lança um livro sobre o assunto. Assim, a partir dos estudos do autor os rituais passam a ser considerados em sua constituição básica: ritos de separação, de margem e de agregação. Segundo o autor, essas três categorias secundárias referem-se a uma categoria especial, os ritos de passagem, que se decompõem quando submetidos à análise. O autor afirma ainda que os ritos de separação ocorrem com maior frequência em cerimônias fúnebres, enquanto os ritos de agregação nas cerimônias de casamento. Por sua vez, os ritos de margem são desenvolvidos na gravidez e no noivado, por exemplo.

Outro autor que se interessou pelo estudo dos rituais foi Turner (1974), antropólogo que estudou os rituais de iniciação entre meninas de um grupo étnico do Zimbabwe. Segundo esse autor, os conflitos são concebidos como “drama social”, e neste caso os rituais servem, basicamente, para resolvê-los, diminuindo rivalidades.

No âmbito organizacional, destacam-se, dentre outros, os estudos de Deal e Kennedy (1982) e Trice e Beyer (1993). Estes últimos definem “rito” como um conjunto de atividades planejadas que consolidam determinado número de formas culturais em uma única ocasião. Essas atividades são executadas por meio de interações sociais. Esses autores propõem uma

tipologia para os ritos organizacionais, assim composta: ritos de passagem; ritos de reforçamento; ritos de degradação, ritos de redução de conflitos, ritos de renovação e ritos de integração. Os ritos de passagem, de degradação e de reforçamento têm o foco no indivíduo, ao passo que os demais têm seu foco no grupo.

Para os autores, as consequências manifestas dessa tipologia são:

 Ritos de passagem: facilitam a transição de pessoas dentro de papéis e status sociais, que são novos para eles.

 Ritos de degradação: dissolvem identidades sociais e seu poder.  Ritos de reforçamento: reforçam a identidade social e seu poder.

 Ritos de renovação: reformam a estrutura social e aperfeiçoar seu funcionamento.  Ritos de redução de conflitos: reduzem conflitos e agressões.

 Ritos de integração: incentivam e reanimam sentimentos comuns que amarram as pessoas a um sistema social.

Paz e Tamayo (2004) afirmam que os ritos são atividades de natureza social, planejadas e executadas por membros da organização, que estas atividades se constituem em um evento extraordinário e marcante para o indivíduo no contexto de trabalho. Os ritos, ainda de acordo com esses autores, “são a dramatização dos valores e regras da organização e a incorporação dos mitos”.

Para Trice e Beyer, (1993) os ritos, tal qual os mitos, têm sua qualidade ligada ao sagrado, e muitos ritos estão intimamente ligados aos mitos. Para os autores, os ritos são indicadores importantes da cultura, porque são elaborados e incorporam várias formas, cada uma das quais carrega significados; isto é, veicula mensagens relativas aos seus valores.

Lenhard (1980) afirma que os ritos contribuem para o reavivamento e manutenção dos valores dos grupos sociais.

Para Galinkin e Paz (2006), os ritos ou rituais - utilizados pelas autoras como sinônimos - são atividades simbólicas (organizadas e codificadas) que permitem não só a identificação como também a comunicação social que são indispensáveis à vida em sociedade. Ainda de acordo com as autoras, os ritos correspondem a uma prática formalizada e regulamentada que representam uma ruptura na rotina diária da vida pública e da vida privada. São de natureza simbólica, sendo representados pelas celebrações, regras de etiqueta, promoções, entrega de prêmios e transmissão de cargos, dentre outros.

Os ritos e rituais são também importantes no processo de socialização de novos integrantes da organização, pois mediante a repetição, na sua realização, transmitem aspectos da cultura considerados relevantes. Essa repetição pode ser considerada importante não apenas para os novatos, como também para os demais integrantes da organização, pois a sua realização traz à memória dos mais antigos a importância do ato.

Silva e Zanelli (2004) explicam que os ritos e os rituais são importantes elementos a serem considerados na análise da cultura. Essa importância se dá porque esses elementos constituem uma série de atividades planejadas, que têm alguma elaboração e interagem muitas formas de expressão cultural, as quais irão resultar em manifestações concretas e expressivas.

DaMatta (1997) destaca que os rituais promovem, principalmente nas sociedades complexas, a identidade social e a construção do seu caráter. É o ritual, segundo o autor, que permite tomar consciência de determinadas cristalizações sociais mais profundas que ocorrem na sociedade e que passam a se constituir como algo “eterno”. Segundo o autor, é por meio do ritual que o indivíduo pode, enquanto pertencente a determinado grupo, mostrar como se resolve um problema que se coloca, como se apropriar dele e como o apresentar sob determinado estilo. O autor afirma que é por meio do rito que se transforma algo natural em algo social e que essa transformação se dá, necessariamente, por meio de dramatização, para que a pessoa tome consciência das coisas, as quais passam a ter sentido, como sendo sociais.

Rodolpho (2004, p.139) sustenta que “os rituais emprestam formas convencionais e estilizadas para organizar certos aspectos da vida social [...]”. Esclarece que essas formas estabelecidas têm em comum uma marca, a repetição, que dá à pessoa que o executa certa segurança, a partir da familiarização com a sequência do ritual, pois aí é que vai acontecer o que leva a pessoa a uma sensação de coesão social.

Gastaldo (2008, p. 152), reportando-se a Goffman, afirma que a ideia de ritual para o autor está relacionada a um “comportamento expressivo, a gestos ou ações significativos”. As condutas denominadas como “ritualizadas” trazem em seu bojo um sentido que não está ligado na conduta em si, mas, nos “códigos culturais” que lhes dão significado.

Peirano (2003) declara que o mais importante em um ritual não é seu “conteúdo explícito”, mas suas características, tais como: forma, convencionalidade e repetição. Nas organizações policiais, em geral, e as organizações policiais militares, em especial, o universo simbólico é repleto de riquezas, expressas por meio de gestos, linguagem e comportamentos ritualizados, dentre outros. Vale destacar o processo de socialização dos novos membros nas organizações policiais, as formas de tratamento praticadas entre as diferentes patentes na Polícia Militar, em que o superior é sempre o “comandante”, e dos diferentes cargos na

Polícia Civil, em que o delegado é sempre tratado por “doutor”. Um ritual comum às duas instituições diz respeito à formação de alunos no pátio das academias antes do início das aulas, quando se cantam o hino brasileiro e o da instituição, com o objetivo de introjetar regras, normas e valores das instituições. As organizações policiais militares se destacam pela realização de alguns rituais, como ordem unida, que acabam por oferecer aos policiais militares um sentido de corpo único. Outro ritual presente nesta organização é a continência, que é considerada um cumprimento do subordinado ao seu superior, de caráter obrigatório. Muitos policiais a consideram como ato mecânico, desprovido de afeto, enquanto outros a reconhecem como uma forma de saudação e respeito.

DaMatta (1997) afirma que o rito e o mito devem ser analisados em conjunto, como dramatizações, de temas e questões básicas do cotidiano de uma sociedade. Afirma ainda que tanto o mito quanto o ritual são formas de chamar a atenção para determinados pontos da realidade social que estão mergulhados nas rotinas, interesses e complicações da vida cotidiana.

Crema (2007) explica que o rito é a expressão do mito. Segundo ele, o mito e o rito são os dois lados de uma mesma realidade, sendo que o mito inclui princípios básicos, considerados orientadores e que se apresentam na forma de estórias ou crenças.