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Rota de peregrinação 61 

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2.1 CONVERGÊNCIA GEOGRÁFICA 50 

2.1.1.7 Rota de peregrinação 61 

O quinto espaço é a rota de peregrinação. Observamos que existe a prática interna de peregrinação para o Monte do Cruzeiro, localizado no píncaro24 da montanha, uma das antigas entradas para o território do Santuário. O caminho começa no veleiro, localizado na praça do Santuário. O veleiro é o local em que os romeiros acendem velas e fazem pedidos de ajuda a Deus, a Nossa Senhora e às Almas. O pedido de auxílio às almas é uma das características do catolicismo popular. O itinerário é a saída do veleiro, passagem pelos córregos de Muquém e das Lágrimas, segue a estrada de pedra dos escravos e a finalização dá-se no topo da montanha, local que se encontra a imagem do Cristo com braços abertos. Ali, vimos o espaço sacralizado pelos romeiros e que depositam terços, medalhinhas, camisas, fotografias, chaves de veículos, moedas, velas e imagens de santos. Na figura 06, apresentamos um campo simbólico no topo da montanha. A montanha torna-se é um espaço polissêmico do sagrado e pulverizador de sentidos.

24 Expressão utilizada por Dom Eduardo Duarte Silva quando chegou ao Muquém: “No píncaro da serra de onde avista-se a planície em que está a Capela de São Tomé, onde se venera a imagem da Senhora da Abadia” (DUARTE SILVA, 2007, p. 98).

Figura 6 – Monte da Cruz.

Fonte: Arquivo do Santuário. Fotógrafo Daniel Siqueira, 2017.

A prática de depositar os objetos de ex-votos25na montanha expressa sentido de sagrado, de confiança, de agradecimento e de pedido de ajuda. O que chamou nossa atenção é de o romeiro colocar um par de botinas na haste do cruzeiro. Outra rota de peregrinação é um caminho de difícil acesso e de subida para chegar ao topo do Monte da Cruz. A peregrinação fora iniciada pelo policial Rubens Correia de Medeiro, residente em Planaltina de Goiás, no ano 1983. Segundo Rubens, ele e mais cinco companheiros levaram a cruz de madeira fixando-a na montanha mais alta como forma de pagamento de promessa feita na intenção da sobrinha.

Identificamos também, a existência de rotas de peregrinação fora do perímetro do Santuário. Algumas dessas rotas foram construídas pelos antigos cavaleiros e tropeiros comerciantes vindos das Províncias da Bahia, Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais e Maranhão. Ambas as rotas convergem para o Santuário de Muquém. Citamos três rotas de peregrinação: a rota com saída da Catedral de Brasília-Distrito Federal (275Kms), a rota com saída da cidade de Brazlândia-Distrito Federal (225Kms) e a rota da cidade de Padre Bernardo-Goiás (146kms).

25Ex-votos é um termo usado para referir os variados objetos doados ao santo ou a santa como

A peregrinação é uma caminhada longa, que envolve determinação, persistência e fé. O sacrifício é percebido ao lado do esforço físico e das bolhas dos pés e do rosto empoeirado. É uma experiência inesquecível. O peregrino faz a descoberta de si, admira a paisagem do caminho e mistifica símbolos que vai acessando ao longo do percurso. As rotas de peregrinação agregam valores substanciais aos peregrinos, pois ao entrarem no Santuário, alegram, emocionam e choram. O momento culminante é visitar a imagem de Nossa Senhora d´Abadia. Diante da Santa, todo sofrimento é esquecido e os problemas são afastados, pois o romeiro encontra um sentido novo para a vida que começa.

2.1.1.8 Veleiro

O sexto espaço é o veleiro O veleiro está localizado na praça do Santuário, onde está fixado o cruzeiro. Ali, os romeiros acendem velas, sendo que uns fazem pedidos a Deus e à Santa e outros às Almas. O romeiro Joaquim Ferreira Neto, segue a tradição familiar de acender vela e depositar moeda branca para o pagamento das almas. Em depoimento disse:

Eu vim aprender já com dez anos. O meu povo todo devia para as almas. Pagava lá no cruzeiro da romaria. Eu pedia as almas que guardasse a minha pessoa pra nunca o inimigo me enxergasse. Colocava qualquer moeda, sendo moeda branca e não moeda de cores. Tenho devoção as almas em geral. Foi catorze dias, eles na beira da roça minha, caçando prá me matar. Dois pais e dois filhos, via eu na roça e quando levava as armas prá atirar, viam um lote de gente, mas não me viam. Pago as almas até agora (Joaquim Ferreira Neto, entrevista gravada por Aldemir Franzin no dia 22 de julho de 2018).

Curiosamente perguntamos ao seu Joaquim Ferreira Neto o motivo de depositar moeda branca. Segundo ele, esse tipo de moeda agrada as Almas por que elas vestem de branco, são puras e não tem manchas. Enquanto as moedas de cores (cobre, bronze) são para Almas que estão do outro lado, o lado escuro e não são de Deus. A intenção pelas almas é feita da seguinte forma: o romeiro escreve os nomes dos falecidos no impresso e deposita na Caixa de Intenções das Missas. Os pedidos aparecem assim: “Pelas almas do purgatório”, “Pelas almas de...”, “Por todas as almas abandonadas, as almas aflitas, para as almas dos meus parentes, amigos, inimigos, todos os padres, todos os conhecidos e desconhecidos que dessa vida partiram”; o romeiro acende uma ou várias velas no veleiro e reza pelas almas dos falecidos e dos

desconhecidos no veleiro. Ao rezar na intenção das Almas ou das almas dos falecidos, o romeiro encontra o sentido de proteção, de consolo e de comunhão com os mortos.

Clifford Geertz (1989) interpretou a religião como um sistema cultural, um sistema de símbolos capaz de tornar as coisas significativas. Os símbolos e os ritos ajustam “as ações humanas a uma ordem cósmica imaginada e projetam imagens da ordem cósmica no plano da experiência humana” (GEERTZ, 1989, p. 104). Vejamos abaixo como a romaria se torna um lugar de convergência cultural.

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