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4.1 Dimensões trabalhadas na formação como fundamentos que devem alicerçar a prática

4.1.2 A rotina didática na sala de aula: do espontaneísmo a uma prática de previsões

Anterior à implementação das iniciativas do Programa, como já citado em outros momentos desse texto, os nossos professores não tinham a prática de organizar o tempo e o espaço didático da sala de aula, muitos nem planejavam as atividades. A ação era desenvolvida de forma espontaneísta e/ou de improvisação, fato diagnosticado pelo Comitê de Erradicação do Analfabetismo no Ceará.

Desse modo, a rotina didática vem sendo utiliza como passos necessários a serem seguidos pelos professores, onde o professor sabe o que fazer e como fazer, tendo como referencial a criança. A rotina é entendida dentro do fazer pedagógico como um caminho a seguir, um percurso a ser trilhado pelo professor. Quando perguntamos a formadora sobre o porquê da palavra “rotina”, esta disse que estava relacionada ao que não pode faltar no dia a dia da sala de aula, algo que o professor utilizasse sabendo o que iria ocorrer em sala e uma organização do tempo escolar para que o professor pudesse “prevê” o que estava por vim.

Nos momentos de observação da formação, vimos que os professores tiveram a oportunidade de vivenciar a organização do tempo, do espaço e das interações na sala de aula. Participaram de atividades que envolviam o ato de planejar, organizar e administrar o tempo, a rotina e as atividades.

Ao serem perguntados sobre o aspecto que mais lhe ajudou na prática diária de sala e no processo de alfabetização de seus alunos alguns professores afirmaram que havia sido “a administração do tempo e as atividades do próprio programa que foram essenciais para o seu trabalho”.

A professora D destacou que “um dos aspectos que me ajudou na prática em sala foi à organização do tempo na aplicação de novas formas de metodologia, proposta pelo programa”.

Uma reflexão sobre as palavras da professora nos remete a incompreensão e a indignação com a realização de uma prática pedagógica “sem planejamento algum”, além disso, temos clareza de que nenhum docente consegue êxito na sala de aula se não tiver uma organização metodológica e um planejamento prévio de sua ação:

de aula e, portanto, ponto de partida para todas as elaborações pertinentes à prática pedagógica. (LUSTOSA, 2010, p.151).

Lembrando-se de contextos de incertezas e imprevisões ressaltamos a importância de planejarmos “... estratégias criativas para moldar, desviar, acelerar ou desacelerar seletivamente as mudanças.” (TOFFLER, 2001:301).

A despeito disso, convém assinalar que Lustosa (2010) defende o planejamento como foco privilegiado de intervenção quando se tem a intenção de colaborar com professores para a mudança e inovação de suas práticas pedagógicas.

Para contextualizar o cenário das práticas pedagógicas das professoras nas escolas de Fortaleza, anterior à implantação do Programa PAIC, trazemos à baila o estudo da pesquisadora Lustosa (2010), já reportada nesse texto, com a intenção de retratarmos a situação vivenciada na época:

Os planejamentos das escolas pesquisadas se limitavam à reunião das educadoras, em seus turnos, para apenas listarem um rol de conteúdos programáticos gerais e datas comemorativas do período para serem realizadas. Ademais, as professoras investigadas foram unânimes nos relatos sobre a falta de tempo destinado pela instituição para planejar as ações necessárias à sala de aula, para estudo, reuniões e outros encaminhamentos necessários para se orquestrar um trabalho de qualidade ao longo do ano escolar. As dificuldades se localizavam muito intensamente em realizar um planejamento que contivesse situações didáticas que contemplassem dimensões importantes de composição da prática pedagógica de qualidade, tais como: garantia da variedade de “métodos” de ensino, consideração aos estilos e ritmos de aprendizagem e aos centros de interesse dos alunos, promoção de maiores e melhores interações dos alunos e com os alunos, bem como a avaliação das aprendizagens do grupo. Outra dimensão das fragilidades no ato de planejar das professoras estava implicada na inexistência de uma organização do trabalho pedagógico no sentido de atender aos diferentes níveis, ritmos ou característica outra dos alunos, incluindo aqueles com deficiência. Percebíamos que questões como a diversidade existente na sala de aula, entre os alunos, sequer era mencionada ou tomada como realidade. A rotina pedagógica não era expressa em um plano de atividades consistente e organizado, e, igualmente, não eram destinadas considerações sobre como registrar e avaliar as conquistas dos alunos. A ausência dessas preocupações pedagógicas fazia com que o conhecimento prévio dos alunos e suas aprendizagens iniciais ou mesmo as já consolidadas não fossem tomadas como mobilizadoras de novas intervenções. (pp. 148-149).

O cenário retratado expõe uma mazela existente na organização do trabalho docente, realidade sobre a qual se justifica o trabalho realizado pelo Programa foco dessa investigação e de todas as iniciativas envolvidas. Ante o constatado, a realidade das escolas públicas de

improvisação das ações desenvolvidas em sala de aula e pela repercussão que ele tem na organização e dinamização das situações de aprendizagem e da prática pedagógica em geral”. (LUSTOSA, 2010).

Observamos que, constantemente durante as entrevistas, as professoras se referiam a importância da rotina didática proposta pelo Programa Paic. Para elas esse aspecto se constituía como “algo novo” e que assumia um lugar de importância privilegiada.

Para a professora A, essa rotina didática foi importante para a sua prática na sala, a mesma afirmou que “a rotina dos alunos mudou, facilitando dessa forma a sua prática de alfabetização” [...]; “resultando em mais organização e disciplina na sala de aula”. Conforme essa professora esses fatos são atribuídos às práticas vivenciadas na formação do PAIC.

Quando a mesma professora foi indagada a apresentar detalhes sobre a rotina e o que esta facilitou a dinâmica de sua sala de aula ela argumentou que a mesma “realmente funciona” e acrescentou que

No início eu não acreditava, fiquei desesperada achando que os alunos não iam aprender. Só que agora vejo que [a proposta] dá certo. É só segui a rotina que os alunos aprendem.

Como vimos os professores apontaram a rotina didática com tempos didáticos que proporcionaram aos mesmos momentos de organização das atividades em sala de aula e que serviram como forma de orientar as práticas pedagógicas do professor alfabetizador. Nesse ponto indagamos sobre a relevância desses tempos para a prática dos professores. Assim, segundo os professores pesquisados os tempos didáticos facilitaram a sua prática.

A professora C afirmou que sua prática em sala mudou:

A minha prática mudou devido os diversos momentos [tempos didáticos], principalmente, o tempo para gostar de ler onde os alunos devem entrar em contato com os vários gêneros textuais.

Nas formações pudemos observar vivências, ao longo dos encontros de formação, com gêneros textuais, pois o programa recomenda e se alicerça no uso de diversos gêneros textuais na prática alfabetizadora. Os formadores estudavam e demonstravam na prática como realizar o trabalho metodologicamente com esses gêneros, além de discutirem situações didáticas que poderiam contribuir com o seu trabalho na sala de aula.

melhor. Segundo Vanderlúcia “até então pensava que era só mostrar os gêneros aos alunos, mas não. Na formação aprendi como explorá-los e como trabalhar com alunos”.

Outro ponto observado na prática foi o tempo didático “Escrevendo do seu jeito”, momento específico para a escrita espontânea da criança. Nesse momento o professor apresentou maior dificuldade em conduzir essa atividade. Em entrevista com a professora A, esta afirma que “os alunos resistem e em alguns casos o próprio professor não sabe como orientar seus alunos nesse momento”. Esse fato foi recorrente durante todo o momento em que estivemos em contato com as professoras A, B e C na sala de aula.

Durante uma semana procuramos observar a realização das atividades direcionadas à escrita espontânea. Constatamos que os alunos percebiam a insegurança da professora A na condução da atividade, o que, consequentemente, causava neles uma grande insegurança na realização dessa atividade. Muitos se negavam a fazer a atividade, dizendo que não sabiam fazer.

Realmente a escrita de textos, para crianças que estão se apropriando do sistema de escrita alfabética, é um problema, porém a professora deve estimular a produção de alunos ainda não escritores. Como afirma Melo (2009)

defendemos a posição de que essa circunstância (produção de textos) deve ser garantida na escola mesmo antes de a criança se apropriar do sistema de escrita alfabética, a partir de atividades de leitura, produção e exploração de variados