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CAPÍTULO 2 FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES

2.3 S IGNIFICADO E S ENTIDO

Paralelamente ao que fora tratado no item anterior, sobre as condições necessárias à mudança no trabalho pedagógico, faz-se necessário abordar o constructo teórico sobre significado e sentido, para que seja possível articularmos nossa discussão sobre o trabalho docente e a formação contínua de professores.

Existem várias vertentes que visam ao estudo e à compreensão dos sistemas sígnicos e/ou sistemas de representação e comunicação. Ocupam posição de destaque a Semiologia, cujo precursor foi Saussure, que tem a Linguística (estudo científico da linguagem verbal humana) como uma das partes mais representativas e a Semiótica de Peirce.

No entanto, trabalharemos com a concepção de significado e de sentido sob a perspectiva histórico-social, pois esta perspectiva trabalha com a concepção de dialética e de conjunto – articulação das partes que compõem um todo. Portanto, pensamos ser esta a visão que vem ao encontro dos pressupostos que foram discutidos até o momento para o processo de formação contínua, os quais defendem o desenvolvimento de uma visão ampla, consciente e crítica acerca do todo, ou seja, dos vários contextos sócio-históricos que envolvem o trabalho pedagógico e não uma visão dicotômica, cujos elementos da prática são separados e analisados isoladamente para uma posterior associação mecânica.

Segundo Corsino (2001), o significado é dicionarizável, ele corresponde a uma significação mais estável e precisa, podendo ser considerado apenas uma das zonas do sentido.

Para Basso (1998, p. 24), o significado é “a generalização e a fixação da prática social humana”, ou seja, o significado corresponde àquilo que a sociedade estabeleceu/convencionou/padronizou das práticas humanas. Sendo assim,

A significação é o reflexo da realidade independentemente da relação individual ou pessoal do homem com esta. O homem encontra um sistema de significação pronto, elaborado historicamente, e apropria-se dele, tal como se apropria de um instrumento (LEONITEV apud BASSO, 1998, p. 24).

A significação, portanto, é construída/padronizada histórico-socialmente, independe da interpretação pessoal, o indivíduo simplesmente depara-se com o significado que já fora previamente fixado. Para exemplificar, a referida autora menciona que o significado da atividade pedagógica é definido em função de seu objetivo – mediar o processo de apropriação de conhecimento. Portanto, a prática docente é definida, histórico-socialmente, como sendo um conjunto de ações intencionais e conscientes dirigidas a um fim específico: a apropriação dos bens culturais/conhecimentos pelos alunos (BASSO, 1998).

Em contrapartida, o sentido corresponde à elaboração pessoal acerca das coisas, ou seja, o sentido é singular, depende da elaboração de cada indivíduo. “O sentido é a soma de todos os eventos psicológicos que a palavra desperta em nossa consciência” (CORSINO, 2001, p.1).

Sendo assim, o sentido do trabalho docente, por exemplo, dependerá da interpretação pessoal que cada profissional da educação dará à sua atividade. Em outras palavras, quando o professor descobre os motivos que o levam a lecionar, os objetivos que busca alcançar ao realizar a prática docente e reflete sobre eles, descobre o sentido desta atividade para si.

Neste momento, cabe retomarmos a questão da identidade profissional, pois a identidade profissional docente se constrói nessa articulação entre significado e sentido, portanto o professor se constitui a partir da integração da significação social de seu trabalho e de sua própria compreensão dos objetivos de sua ação de ensinar.

Em um sentido mais amplo, a identidade não pode ser pensada sem a relação que estabelece com significado e sentido, pois a construção do sentido é constituidor da nossa existência enquanto sujeitos sociais. Em outras palavras, um sujeito não se constrói apenas do conhecimento que adquiri, o que o

possibilita a construir-se enquanto sujeito são as relações que estabelece entre significado e sentido.

Sendo assim, o que nos faz constituirmos enquanto sujeitos, são as relações que estabelecemos entre significado e sentido ao longo de nossa existência. Nós construímos nossa identidade a partir do confronto do significado socialmente construído e do sentido que atribuímos a nossas atividades, o que implica questões subjetivas e objetivas.

Desta forma, a idéia articuladora que defendemos é de que o construir de uma identidade profissional docente está relacionada ao sentido que o professor atribui a sua formação e atuação.

Espera-se, entretanto, que significado e sentido se integrem, ou seja, que caminhem na mesma direção. No entanto, pode haver um distanciamento entre essas duas dimensões. E, conforme alerta Basso (1998), quando há a ruptura entre o significado e o sentido de uma ação, há o trabalho alienado.

Trabalho alienado, então, ocorre quando o sentido não corresponde ao significado, ou seja, quando o sentido pessoal da ação não corresponder ao que é previsto socialmente (à sua significação), haverá um trabalho alienado. A autora supracitada ainda comenta que, na sociedade capitalista em que vivemos, a alienação está presente em maior ou em menor grau, pois, devido às relações de dominação e de divisão de classes, o trabalho, frequentemente, acaba tendo como único sentido a garantia de sobrevivência. O trabalho é realizado como forma de garantia de salário, de estabilidade ou de status social, sem a preocupação e a consciência de sua verdadeira função na sociedade.

Porém, a alienação do trabalho docente, por exemplo, pode ser superada, em algum grau, quando houver melhores condições efetivas de trabalho, pois o que motiva o professor a realizar seu trabalho não são apenas questões subjetivas, como interesse, vocação, gosto e amor, mas também questões objetivas, como recursos físicos, materiais didáticos, gestão escolar, organização da escola, oportunidades de trocas de experiência, tipo de contrato de trabalho, salários, jornada de trabalho, entre outras (BASSO,1998).

Da mesma forma, gostaríamos de finalizar este capítulo, dizendo que a formação contínua também possui um significado e um sentido. Seu significado corresponde ao entendimento fixado socialmente: processo permanente de aprendizagem e de desenvolvimento profissional, no intuito de contribuir para a

criação de novas propostas, transformando, aperfeiçoando e/ou complementando o trabalho pedagógico para o alcance da melhoria da qualidade do ensino.

E seu sentido? Nosso desafio nessa pesquisa é, justamente, desvelar o sentido da formação contínua para os professores em questão (professores de língua inglesa pertencentes ao quadro próprio do magistério da rede pública estadual de ensino – fundamental e médio – da cidade de Ibiporã). Para alcançarmos esse objetivo, detalharemos, no próximo capítulo, questões objetivas da formação contínua, como: a legislação que a regulamenta, os tipos de programas ofertados pelo Estado do Paraná aos professores de sua rede para promover a formação contínua, os objetivos e finalidades estabelecidos pelo sistema para essa formação, as gratificações, os locais de realização, a carga horária, etc., para, posteriormente, analisarmos as questões subjetivas a cada professor, em relação ao processo de formação contínua por meio das entrevistas, como: o que o motiva a participar desse processo, o que ele espera dessa formação, qual sua opinião em relação aos programas ofertados, qual a função da formação contínua para ele, entre outras.

Feitas as análises das questões objetivas e subjetivas inerentes à formação contínua, chegaremos à compreensão do sentido que ela tem para os professores participantes do estudo.