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SAÚDE E VULNERABILIDADES AO ADOECIMENTO

CAPÍTULO II FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 O QUADRO DA VULNERABILIDADE

2.1.2 SAÚDE E VULNERABILIDADES AO ADOECIMENTO

De forma geral, Bellenzani (2012) explica que, o desenvolvimento das ciências biomédicas, da epidemiologia e o ingresso das ciências humanas e sociais no campo da saúde têm evoluído na compreensão do corpo e dos processos de saúde-doença, superando as explicações mais reducionistas e universalistas, para abordagens mais complexas, situadas no tempo e nos aspectos socioeconômicos e psicossociais, considerando o adoecer como um fenômeno também construído social e culturalmente, e multideterminado, sendo assim, é um fenômeno social, além de biológico.

Muito avanços foram conquistados desde a teoria unicausal da doença no século XIX; da história natural da doença (HND - em que se estudava os conjuntos de aspectos que determinavam o comportamento epidêmico das doenças); passando, pela epidemiologia, os determinantes sociais do processo saúde-doença, pela promoção da saúde (com seus princípios orientadores que se tornou um poderoso movimento de ideias e expansão de ações para a renovação das práticas de saúde já apresentados no primeiro capítulo) até a proposta da vulnerabilidade no final do século XX (Ayres, França Jr., Calazans & Saletti Filho, 2003; Ayres, Paiva & França Jr, 2012).

Nesse processo de evolução e, ao se acompanhar as demandas reais das populações, as propostas de redução de vulnerabilidade têm procurado ampliar do plano individual para o

plano das suscetibilidades socialmente configuradas o alvo de suas intervenções. Nesse sentido, percebe-se que há uma responsabilidade que se estende para além da simples tarefa de alertar ou de dar informações as pessoas sobre um problema. É necessário concorrer para que os sujeitos sociais sejam alertados sim, mas que possam também responder de forma que superem os obstáculos materiais, culturais e políticos que os mantêm vulneráveis. Assim, mais do que serem avisadas, é fundamental que as pessoas saibam como se proteger e se mobilizem para que as situações estruturais que as tornam suscetíveis ao adoecimento sejam de fato transformadas (Ayres, Calazans et al., 2006).

O pensamento do senso comum de que as doenças ou problemas sociais e sanitários não vêem sexo, cor, classe social ou nacionalidade contribui para a crença de que todas as pessoas têm as mesmas chances de adoecerem, de permanecerem saudáveis, de se recuperarem ou de terem alguma qualidade de vida, independentemente dos países, regiões em que vivem e de suas condições de vida. Ao contrário disto, é notório que populações que não têm seus direitos respeitados e garantidos, têm piores perfis de saúde, sofrimento, doença e morte e que a atenção em saúde, quando acessível e de boa qualidade, pode promover a realização do direito à saúde e à vida (França Jr. & Ayres, 2003; Bellenzani, 2012), assim como foi discutido no primeiro capítulo.

De fato, conforme afirma Costa-Couto (2007), a vulnerabilidade individual e coletiva é influenciada e determinada, ao menos parcialmente, pela vulnerabilidade social, estando condicionada aos riscos decorrentes de fatores estruturais. Portanto, estar vulnerável - em maior ou menor grau - vincula-se à efetivação dos direitos de cidadania. Nesse quadro se identifica que o menor acesso às oportunidades terá como resultado a desproteção, a desvantagem e a exclusão, trazendo prejuízos a saúde em razão de menores recursos econômicos, sociais e legais. Por isso, a redução dos níveis de vulnerabilidade social não

prescinde das ações em saúde, mas necessariamente extrapola o âmbito setorial e exige uma resposta intersetorial (Cáceres, 2000).

[...] a satisfação das necessidades em saúde se relaciona diretamente ao conjunto de condições de reprodução social e material disponíveis que permite, ou não, o desenvolvimento individual e coletivo de capacidades e potencialidades. Grupos sociais de menor renda e poder podem se beneficiar de medidas de proteção coletivas que reduzam a vulnerabilidade social. Dito de outra forma, segmentos que vivem com menor poder, em desigualdade, maior vulnerabilidade ou excluídos necessitam de políticas asseguradoras do exercício pleno de sua cidadania (Laurell, 1997 citado por Costa-Couto, 2007, p. 52).

Sobreviver em condição de desigualdade e exclusão favorece o risco de desenvolver ou contrair doenças e, em alguns casos, a ausência de medidas de enfrentamento das vulnerabilidades contribui para outros tipos de adoecimentos e problemas sociais que acrescem dificuldades à vida (Costa-Couto, 2007). A vulnerabilidade ao adoecimento de pessoas que pertencem a segmentos socialmente mais vulneráveis e marginalizados, como por exemplo os mais pobres, diminui ou aumenta através da presença ou ausência de programas de saúde, na existência ou na falta de saneamento básico, no acesso aos serviços, na qualidade dos cuidados, entre outros (Ayres, Paiva & França Jr., 2012; Ayres, Paiva & Buchalla, 2012; Paiva, 2013).

Portanto, desemprego, emprego precário, desintegrações sociais, baixo poder aquisitivo, iniquidade, opressão, discriminação, estigma, ausência ou ineficiência de redes de apoio ou suporte social (formais e informais), violência e exclusão por gênero, raça ou etnia são fatores que combinados atuam sinergicamente para aumentar a suscetibilidade e vulnerabilidade (Costa-Couto, 2007).

Diante dessa conjuntura, a proposta da vulnerabilidade, aliado as especificidades do contexto brasileiro, conferiram transformações e peculiaridades ao modo como esse modelo foi sendo desenvolvido ao longo dos anos. Foi a partir da construção de novas práticas conceituais, técnicas e políticas sistematizadas, que levou a teoria da vulnerabilidade a abranger novos conceitos e especificidade, até a emergência, um pouco mais recente, do quadro de vulnerabilidade relacionada aos direitos humanos, que denuncia a não garantia dos direitos fundamentais das pessoas (Ayres, Paiva & Buchalla, 2012).

O ambiente politizado do processo de redemocratização do país, a reforma sanitária em curso com a construção do sistema único de saúde (SUS); as propostas de modelos de atenção integral à saúde; a mobilização de grupos da sociedade civil organizada frente à epidemia da Aids, em movimentos de construção de solidariedade e de defesas de direitos; todos estes aspectos ajudam a compreender o porquê no Brasil, como talvez em nenhuma parte do globo, o quadro de vulnerabilidade e sua incorporação à formulação de políticas públicas e ações de saúde tenham alcançado trabalhos expressivos (Ayres, Paiva & Buchalla, 2012, p. 12).

O modelo teórico de vulnerabilidade no campo das abordagens em saúde com base nos direitos humanos que podem estar sendo ou não garantidos e efetivados, contribui para delinear um conjunto de princípios, normas, padrões e instrumentos que moldam as políticas públicas e favorecem a atribuição de responsabilidades, ou seja, além de fortalecer a compressão sobre os determinantes sociais no processo de saúde e doença, como, propõe o modelo da Promoção da Saúde, designa critérios para estabelecer prioridades com base nos princípios de justiça, equidade e dignidade e, para definir a quem responsabilizar pelo processo decisório sobre essas prioridades. Sendo assim, esse modelo alinha-se com a Promoção da Saúde na medida em que ambos buscam compreender e transformar desde uma

perspectiva sociopolítica os processos e determinantes descritos nos modelos de História Natural da Doença (HND) e os Níveis de Prevenção (NP) (Ayres, Paiva & França Jr, 2012).

Devido aos fatores apresentados e uma necessidade do ambiente acadêmico e dos movimentos sociais, identifica-se uma progressão da própria teoria da vulnerabilidade que, conforme afirma Ribeiro (2013), nos últimos anos vem adotando um caráter mais radical, no sentido de buscar novas bases epidemiológicas e técnicas rumo a propostas de reconstrução das práticas de saúde. Nesse aspecto, a teoria vem procurando superar a fatoração dos determinantes contextuais na explicação de vulnerabilidades, trabalhando-se com totalidades compreensivas, nas quais os significados dos diversos aspectos individuais, sociais e programáticos implicados na exposição à infecção e adoecimento sejam sempre mutuamente referidos (Ayres, Paiva & Buchalla, 2012).

No sentido definido pelos autores do que seja as totalidades compreensivas, Ribeiro (2013) afirma ser necessário abordar e compreender a progressão que ocorreu desde o modelo de história natural da doença (HDN) e níveis de prevenção (NP), pois os mesmos permitem distinguir dois períodos envolvidos na gênese e desenvolvimento dos adoecimentos: o pré- patogênico, diz respeito aos determinantes que potencializam o aparecimento das doenças, sobre ele se desenvolve a prevenção primária, no qual se procura intervir sobre os agentes patogênicos e seus vetores, sobre os hospedeiros e sobre o meio que os expõe a esses patógenos (Ayres, Paiva & França Jr., 2012).

Essa prevenção se divide em dois níveis: a promoção de saúde - ações que incidem sobre melhorias gerais nas condições de vida de indivíduos, famílias e comunidades, beneficiando a saúde e a qualidade de vida, criando obstáculos para os processos patogênicos, como educação, saneamento, moradia, trabalho, cultura, entre outros; e a proteção especifica no qual se voltam ações apenas para determinadas doenças ou agravos, como por exemplo, na vacinação (Ayres, Paiva & França Jr., 2012).

O período patogênico se refere ás evoluções possíveis da doença em curso, sobre este artifício atua a prevenção secundária, pois ela visa propiciar a melhor evolução clínica para os indivíduos já afetados, buscando conduzir o processo para desfechos favoráveis e interromper ou reduzir a disseminação da patologia. A fim de atingir esses objetivos são definidos mais dois níveis de prevenção: o diagnóstico precoce e o tratamento imediato/a limitação de incapacidades. A prevenção terciaria, por fim, refere-se ao desfecho do quadro patológico: se atingiu a cura, se houve sequelas ou a cronificação da patologia. Nesse nível o objetivo é conseguir que as limitações impostas pela condição provocada pelo adoecimento ou agravo, quando existirem, prejudiquem o mínimo possível o cotidiano e a qualidade de vida das pessoas, famílias e comunidades afetadas (Ayres, Paiva & França Jr., 2012; Ribeiro; 2013).

Com o enfoque da vulnerabilidade é possível um significativo rearranjo dos momentos analíticos desse modelo, pois, a vulnerabilidade assume que as mútuas interações entre agente, hospedeiro e meio não se limitam às condições de origem do agravo, mas o determinam ao longo do curso do processo patogênico. Esta concepção procura superar a externalidade das ações preventivas na análise do processo saúde-doença, pois considera que as características desses processos são diretamente condicionadas pelo conjunto de saberes, tecnologias e serviços que estão atuando na realidade estudada (Ayres, Paiva & França Jr., 2012).

A intervenção, e não somente a prevenção, mas também o tratamento e a reabilitação, já estão implicados na determinação do processo saúde-doença, em razão da forma como está organizada e como está sendo aplicada. Ela não é apenas solução, mas parte do problema em estudo, considerando-se no processo a tríade saúde-doença-cuidado (Ayres, Paiva & França Jr., 2012; Ribeiro, 2013). Para o modelo teórico da vulnerabilidade não existe um agente que seja em si mesmo agressor, pois, ele só é percebido como tal frente às especificidades das

características físicas, cognitivas, afetivas e comportamentais de seus hospedeiros que estão entrelaçadas ao ambiente cultural e sociopolítico e do contexto intersubjetivo nos quais as pessoas vivem e interagem (Ayres, Paiva & França Jr., 2012).

Assim, não existe um único e necessário modo de descrever os determinantes, distribuição e desdobramento de um processo saúde-doença-cuidado, logo, o modelo da vulnerabilidade demonstra que não há uma história natural da doença, senão uma história social das mesmas, não só porque são sociais e históricos os conteúdos desta história, mas porque social e histórica é também a forma de contá-la, pois dependerá da perspectiva teórica, ético-política de quem a descreve assim como dos conhecimentos e recursos tecnológicos disponíveis (Ayres, Paiva & França Jr., 2012; Ribeiro, 2013).

Entende-se assim que o modelo teórico da vulnerabilidade tem um enfoque também nos direitos humanos, pois, visa compreender a história social do sujeito, priorizando a responsabilidade e a ação de governos e dos programas públicos de saúde como parte integral dos determinantes contextuais e sociais no processo saúde e doença. Alerta-se para o fato de que essa responsabilidade está implicada desde a dimensão individual na medida em que esta é concebida como pertencente a esfera da pessoa que é um sujeito de direito - direito à saúde integral, à não discriminação, à consideração de sua condição na promoção da equidade, entre outros. Nesta perspectiva o Governo e os programas, por exemplo, devem garantir a todos o acesso aos serviços de atenção à saúde e as práticas de qualidade (Ayres, Paiva & França Jr., 2012).

Conforme as formulações de França Jr e Ayres (2003) a relação entre Saúde Pública e direitos humanos pode ser sistematizada em três conjuntos: o primeiro se refere à reciprocidade entre saúde e direitos humanos, ou seja, o impacto das violações e da promoção dos direitos humanos sobre a saúde de indivíduos e populações e, inversamente, o impacto das ações de saúde sobre a violação e/ou a promoção de seus direitos; o segundo expressa a

responsabilidade do Estado perante o respeito e o cumprimento aos direitos, pois sua ausência ou indiferença não protege o cidadão, isso ocorre quando não implementa condições legais, administrativas, orçamentárias e assistenciais e não as fiscaliza para garantir, proteger ou promover os direitos humanos; e o terceiro conjunto que está associado à avaliação das condições a serem satisfeitas no caso de uma necessidade de saúde pública implicar a suspensão ou modificação temporária (derrogabilidade) de um determinado direito humano. Lembrando que são direitos inderrogáveis (irrevogáveis), o direito à vida, a não ser discriminado, a não ser torturado, entre outros (Bellenzani, 2012).

Assim, os direitos humanos indicam referências para se analisar os agravos à saúde e as situações potenciais a vulnerabilidade ao adoecimento, identificando os direitos que estão sendo negados e infringidos. Podem oferecer ainda, direções e orientações para se planejar ações e realizar intervenções, identificando grupos, pessoas, comunidades e populações que tendem a ser discriminados, que sofrem com as iniquidades e com a ausência de proteções devidas e necessárias.

A fim de se superar a vulnerabilidade ao adoecimento nos planos individual, social e programático, como afirmam Ayres, Paiva e França Jr. (2012), é importante considerar a pessoa como sujeito de direito e compreender o quanto e como os governos regulamentam, respeitam, protegem e efetivam os direitos aprovados nas definições de cidadania de cada local, de cada contexto legal e político. Nessa perspectiva, as dimensões da vulnerabilidade, de qualquer processo saúde-doença-cuidado serão identificadas e inter-relacionadas pelos sujeitos que estão implicados nesse processo.

A qualidade é sempre fundamental na busca pela redução das vulnerabilidades, assim os intercâmbios e as vivências, expressões vivas de cada processo, merecem particular atenção nas suas três dimensões. Além do conhecimento dos padrões normativos de um país, da compreensão de seus valores culturais, das suas instituições e das estruturas, será

importante abranger a dinâmica da vida cotidiana e de suas organizações sociais. Por exemplo, melhor do que abordar os traços gerais de desigualdade será compreender a concretude das relações de gênero e raciais, de classe, de geração, em cada cena da vida diária, no modo como cada local e território, a desigualdade está sendo experenciada pelas pessoas também nas práticas em saúde (Ayres, Paiva & França Jr., 2012; Paiva, 2013).

Portanto, é na vida real, nas situações concretas que se encontram as verdadeiras identidades sociais, históricas e subjetivas dos sujeitos em cena. Em seus contextos de vida, em suas localidades é que se torna possível identificar e compreender as desigualdades e suas consequências, a fim de planejar ações efetivas para a redução das vulnerabilidades ao adoecimento para aqueles sujeitos sociais, em suas reais necessidades e condições de vida. Por esta razão, Ayres, Calazans, et al. (2006) enfatizam que o enfoque nos processos de promoção da saúde, não pode ficar aprisionado às tendências modeladoras, fortemente difundidas a partir de paradigmas comportamentalistas. A atitude construtivista, que parte dos saberes e experiências das pessoas em cena, no seu dia-a-dia, é a que melhor concorre para que essas possam de fato procurarem e se apropriarem de informações para que se mobilizem, autenticamente, para o encontro das alternativas práticas que consintam em suplantar as situações que as vulnerabilizam.

Estimula-se, assim a participação e a autonomia dos diversos sujeitos sociais no diagnóstico da situação e no encontro dos caminhos para sua superação. Ayres et al. (2006) alertam que os diagnósticos de vulnerabilidade e, consequentemente, a elaboração de propostas de intervenção, precisam sempre considerar a mediação exercida (e a ser exercida) entre os sujeitos e seus contextos sociais e pelos programas e serviços disponíveis.

Com a compreensão desse enfoque e a partir do compromisso estabelecido com essa atitude construtivista, se depara com a necessidade de superar, nos processos de promoção e de prevenção à saúde, a utilização de informação estritamente técnica, transmitida de forma

unilateral do educador para o educando, em favor de uma troca bilateral de saberes, fundamental para identificar finalidades e meios convenientes à construção de respostas por aqueles específicos sujeitos em seus contextos reais e concretos de vida (Ayres, Calazans et al., 2006).

Considera-se que as ações de redução de suscetibilidades e agravos à saúde, assim como de proteção, não serão efetivas, operacionais e promissoras se permanecerem ancoradas apenas na esfera institucional da saúde. A atuação intersetorial é essencial: saúde e educação devem ser articuladas as áreas do trabalho, bem-estar social, jurídica e cultural potencializando e expandindo as chances de melhores resultados. A busca de resposta social coloca no cerne das práticas de promoção da saúde não mais o sujeito técnico, munido especificamente com saber e recursos especializados, mas sim, os capazes de melhor apreender e lidar com as barreiras e os obstáculos à sua saúde, ou seja, os próprios sujeitos sociais afetados (Ayres, Calazans et al., 2006; Costa-Couto, 2007).

Vale salientar, assim como declararam Ayres, Calazans et al. (2006), que ao se assumir essa concepção de cuidado não há um desmerecimento ou esvaziamento do profissional e de sua importância, mas um reposicionamento que complexifica suas tarefas na compreensão, desenvolvimento e monitoramento das estratégias, tornando-se um mediador do encontro que deve dar-se entre os sujeitos visados nas ações e o conjunto de recursos de que devem dispor para construir sua saúde. Não se espera dos usuários dos serviços e da comunidade, uma adesão ao que lhes é prescrito e recomendado, e sim uma autonomia para edificar as estratégias que de fato possam lhes servir e ser úteis (Cáceres, 2000; Sánchez & Bertolozzi, 2007).

O modelo teórico da vulnerabilidade pressupõe e demonstra, concomitantemente, que as mudanças de comportamento de pessoas envolvidas em seus contextos específicos, não parte do indivíduo em relação ao outro, não muda simplesmente pela informação e pela

educação fornecida pelo profissional e por seu entorno. As modificações mais profundas e interessantes ocorrem quando de fato se enxerga e constrói possibilidades de os indivíduos estarem uns de frente aos outros em seu entorno, de modo que torne a saúde de todos mais satisfatória (Ayres, Calazans et al., 2006).

A concepção de saúde-doença-cuidado, além de se apoiar nos processos de produção e de reprodução social, não deve se separar da dimensão subjetiva, que se refere às representações/significados que os indivíduos atribuem a fatos e à vida em si, o que acaba por refletir nos comportamentos e atitudes das pessoas. A abordagem da vulnerabilidade enfatiza a dimensão relativa ao indivíduo e o local social por ele ocupado que juntamente com os eixos programático e social, permite a integralização da análise da situação de saúde e de diferentes possibilidades de intervenção, sempre contemplando a participação ativa da população na procura solidária de estratégias passíveis de execução e de encaminhamento/equacionamento de problemas e de necessidades de saúde (Sánchez & Bertolozzi, 2007).

Dessa forma, é como sujeito de direitos que o usuário do serviço deve ser concebido nas abordagens práticas e técnicas de saúde: como sujeitos de encontros de cuidado, sujeitos de aprendizagens em solidariedade com outros, como agentes de sua emancipação da opressão psicossocial e da vulnerabilidade ao adoecer (Paiva, 2013). Nesse sentido, é preciso esclarecer, como afirma Ribeiro (2013), que esse modelo tem buscado superar a dicotomização entre o individual e o coletivo no manejo das três dimensões constitutivas das análises de vulnerabilidade havendo uma progressão e reformulação de alguns conceitos e inclusão de uma dinâmica mais viva e integrada.

Há uma inseparabilidade dessas dimensões analíticas e na forma como em cada situação concreta existe diferentes maneiras e intensidades em que aspectos intersubjetivos, contextuais e programáticos podem se combinar. Dessa forma, “a sinergia das três inextricáveis dimensões da vulnerabilidade é a dinâmica que precisa ser considerada para

tornar os conceitos da prevenção e da promoção da saúde mais realista, programáticos e eticamente orientados” (Ayres, Paiva & França Jr., 2012, p.84).

Assim, na dimensão individual no modelo teórico da vulnerabilidade, o indivíduo é