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A SAÚDE PÚBLICA NO REGIME MILITAR

No documento catarinamenezesschneider (páginas 80-84)

4. A DITADURA NO BRASIL

4.4. A SAÚDE PÚBLICA NO REGIME MILITAR

A saúde pública no Brasil durante o regime militar começou com um processo de mudança que criou as primeiras bases para o surgimento do Sistema Único de Saúde (SUS). Os documentos da 3ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1963, um ano antes do golpe, identificam-se que o setor apontava para um projeto de país. Nesta conferência, estavam pautadas a análise da situação sanitária nacional e a municipalização, com o objetivo de descentralizar a execução das ações básicas de saúde.

A partir de 1964, quando se deu o golpe militar no Brasil, o país viveu um período de grande abertura econômica, conhecido como “milagre econômico”. Nessa época, o governo estava preocupado em tornar o país uma potência, focando, portanto, principalmente na economia, esquecendo-se um pouco das questões políticas e sociais, entre elas a saúde pública do país (PAIM, 2008).

No momento, segundo o autor, um dos primeiros efeitos do golpe militar sobre o Ministério da Saúde foi a redução das verbas destinadas à saúde pública, havendo assim um processo investimento à iniciativa privada, “com expansão de coberturas à criação de empresas na área da saúde a partir de contratos e convênios com médicos, dentistas, hospitais, clinicas e laboratórios privados mediante o estímulo da contratação e planos de saúde” (PAIM, 2008, p. 78). Assim, o acesso à saúde pública nesta época era restrito,

caro e prioritário para aqueles que eram trabalhadores regulamentados com carteira assinada.

Dessa forma, “a saúde deveria deixar de ser um direito do cidadão e uma responsabilidade do Estado para que fosse considerada como uma mercadoria, como fonte de lucro para os empresários” (PAIM, 2008, p. 80). Por isso houve a implantação de uma política de poucos recursos para saúde pública, e muito incentiva para as empresas de saúde. Era necessário, então, que a mídia divulgasse as vantagens de participar de algum plano de saúde particular, de mostrar o quanto esse novo modelo era vantajoso em relação ao “decadente” sistema público. Apesar de ter sido neste momento ditatorial que o Brasil deu início a um processo de mudanças, criando as primeiras bases para o surgimento do Sistema Único de Saúde (SUS), a proposta para uma saúde mais democrática foi interrompida.

Além disso, o autor afirma que a articulação das atividades sanitárias nas esferas federal, estadual e municipal, dando o primeiro passo, para a implantação de um sistema nacional de saúde unificado, também se fez presente. Entre os pontos de destaque encontravam-se ainda o incentivo à formação dos trabalhadores da saúde, a reforma agrária aliada ao combate à desnutrição e o incentivo para que as áreas rurais melhorassem suas condições de vida.

No entanto, aquele projeto embrionário de proposta para uma saúde mais de- mocrática foi interrompido, assim como o início das reformas de base que marcaram esse período.Esse projeto somente foi recuperado em 1985, com a 8ª Conferência Nacional de Saúde, colocando em pauta discussões do acesso à saúde.

A 3ª Conferência foi um marco, principalmente em relação ao caráter dado ao sistema público de municipalização, mas a 8ª Conferência foi mais progressista, pois incentivou o debate a partir dos conceitos ampliado de saúde que permitiram a formulação das diretrizes da Reforma Sanitária e do SUS. O elo entre a 3ª e a 8ª é a mobilização da capacidade técnica de pessoas que trabalhavam em instituições nacionais e internacionais do setor saúde.

O Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde (Prev-Saúde) na sua versão apresentava três objetivos: a) estender a cobertura por serviços básicos de saúde a toda a população; b) reorganizar o setor público de saúde, pela articulação das diversas instituições existentes e pela reordenação da oferta de serviços, implicando a redução dos custos unitários e no aumento da produtividade dos recursos disponíveis; c) promover a melhoria das condições gerais do ambiente com ênfase em sistemas

simplificados de abastecimento d’água e em medidas necessárias ao controle de esquistossomose e de doença de Chagas (PAIM, 2008, p. 85).

Suas diretrizes, segundo Paim, referiam-se à responsabilidade pública pelos serviços básicos e pela condução e controle de todo o sistema; articulação entre as instituições públicas; descentralização decisória e operacional; integração entre ações de promoção, recuperação e reabilitação; regionalizaçao; simplificação de técnicas e de meios; eficiência administrativa sem prejuízos da eficácia social; e participação comunitária.

Neste contexto, diversas iniciativas simbólicas para caracterizar o que pretendia o regime militar foram implantadas nas décadas de 1970 e 1980, como a criação do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps) e do Conselho Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária (Conasp).

Surgiu em meados da década de 70, um movimento postulando a democratização da saúde, justamente num período no qual novos sujeitos sociais emergiram nas lutas contra a ditadura. Estudantes, professores universitários, setores populares e entidades de profissionais de saúde passaram a defender mudanças na saúde,, culminando com a criação do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES) em 1976. A conquista da democracia em 1985 possibilitou a realização da 8ª Conferência Nacional de Saúde no ano seguinte. Nesse evento, reafirmou-se o reconhecimento da saúde como um direito de todos e um dever do Estado, recomendando-se a organização de um Sistema Único de Saúde (SUS) descentralizado e democrático (PAIM, 2008, p. 27).

Segundo o autor Jairnilson Paim (2008), a Reforma Sanitária enquanto fenômeno histórico e social pode ser analisado como ideia, projeto, proposta, movimento e processo. Essa ideia, segundo ele, se expressa em vários pontos como político, social, cultural e econômico. Assim, foi dado início o processo de democratização da saúde, intitulado Reforma Sanitária.

Imunização: um programa nacional

A segunda metade do século XX pode ser caracterizada como marcadamente importante para a história da saúde e da utilização de imunobiológicos no país e no mundo. Impulsionadas pelos progressivos sucessos da Campanha Mundial de Erradicação da Varíola (1959-1977) e pelos avanços no campo de desenvolvimento e produção de imunizantes, essas décadas assistem a uma proliferação do uso de vacinas

jamais vista até então. São desse período, entre outras realizações de impacto, as vacinas contra a poliomielite; a intensificação das campanhas de vacinação; a constituição do Programa Ampliado de Imunizações (PAI), proposto pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1974; o surgimento de programas nacionais de vacinação e a erradicação da poliomielite nas Américas, na década de 1990. É também nesse período que a vacina se torna, paulatinamente, um negócio interessante para empresas multinacionais.

No Brasil, apesar dos esforços empreendidos, em fins do século XIX e início do XX, por sanitaristas como Oswaldo Cruz, Emilio Ribas e Vital Brazil na defesa da utilização da vacina como meio de promoção da saúde, seu emprego no país só se tornou alvo de uma política de abrangência nacional, a exemplo do que se verificava no cenário internacional, a partir da instituição, em 1966, da Campanha de Erradicação da Varíola. Para tanto, foram instituídos novos órgãos públicos e programas de ação. Datam das décadas de 1970-1990 a criação da Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (Sucam), em 1970; o início das atividades da Central de Medicamentos (Ceme), em 1971, cujos propósitos iniciais incluíam o apoio tanto à produção de vacinas quanto de medicamentos, e a institucionalização do Programa Nacional de Imunizações, em 1973.

No entanto, a época ditatorial no Brasil também foi responsável por implementar mudanças positivas no país, como a revitalização da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a partir da segunda metade da década de 1970, o surgimento do Instituto de Tecnologia em ImunobiológicosBio-Manguinhos, em 1976, e do Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), em 1981; e o lançamento do Programa de Auto- Suficiência Nacional de Imunobiológicos (Pasni), em 1985 (Ponte, 2003).Mesmo antes do início da década de 1970, os progressos obtidos na campanha contra a varíola e a crescente aceitação das vacinas como instrumentos positivos de promoção da saúde das populações já vinham animando técnicos e autoridades governamentais a buscar a expansão do uso de imunizantes.

De acordo com Nara Azevedo (2007), a estruturação de Bio-Manguinhos na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em 1975 pode ser associada ao surto de epidemia de meningite que se intensificou a partir de 1974, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro. Segundo ela, foi na presidência de Vinicius da Fonseca (1975-1979) que o país buscou a autossuficiência em imunobiológicos, pois ele acreditava que isso contribuiria para superação do subdesenvolvimento do país. “Fonseca movimentou-se intensamente

no cenário político nacional e internacional, com o firme propósito de obter do Instituto Mérieux a transferência de tecnologia da vacina contra a meningite” (AZEVEDO, 2007, p. 55).

Portanto, com a redemocratização do país em 1985, a saúde pública passa a ser um dos principais focos da política brasileira. Em 1986, na 8ª Conferência Nacional da Saúde, junto com os movimentos de saúde da população, foi aprovada a Reforma Sanitária Brasileira. Em 1988, com a nova Constituição, há pela primeira vez uma sessão sobre saúde no artigo 196, com a afirmação “A saúde é direito de todos e dever do Estado”, sendo isto colocado em prática com a aprovação do Sistema Único de Saúde (SUS) pela Constituição Federal. Com isso, crescem as estratégias de campanhas de saúde, como a vacinação, e a política da prevenção.

No documento catarinamenezesschneider (páginas 80-84)

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