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CAPÍTULO II FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA:

2.3. Saberes docentes

O sujeito, ao se constituir professor, deverá ser conhecedor de que na sua profissão existe uma série de saberes docentes, que são um conjunto de conhecimentos, competências e habilidades que dão sustentação à prática docente, ou seja, “um repertório de conhecimentos pedagógicos que possibilitam ao professor ensinar melhor” (GAUTHIER, 1998, p.15). Se me proponho investigar o Estágio Supervisionado como uma atividade curricular, que colabora com a formação de professores de matemática como pesquisador de sua própria prática e, portanto, um professor reflexivo, então tenho que investigar alguns saberes desenvolvidos pelos

professores nas suas ações, no intuito de melhorar, não só suas práticas mas, também, constituir uma identidade que contribua com seu ideário de professor.

Ao conduzir o licenciando para o “aprender a ensinar” posso contribuir para que ele perceba que, além dos saberes que ele já tinha ao adentrar na formação, são necessários outros saberes na sua constituição de professor que serão construídos no decorrer da formação, que perpassa por saberes pedagógicos e específicos que são frutos do contato dele com as ciências da educação e de sua imersão no contexto escolar por meio da observação, de experienciação e da prática. Conjuntos de saberes que constitui o saber docente que Fiorentini et al (1999, p. 57) conceitua como:

Um saber reflexivo, plural, e complexo porque histórico, provisório, contextual, afetivo, cultural, formando em teia, mais ou menos coerente e imbricada de saberes científicos – oriundos das ciências da educação, dos saberes das disciplinas, dos currículos – e de saberes da experiência e da tradição pedagógica.

São vários os estudiosos e pesquisadores que escreveram sobre saberes docentes. Aqui, atentarei para as concepções de saber explicitadas nos trabalhos de Tardif, Shulman e Gauthier. Tardif (2002) define o saber docente como um saber múltiplo, proveniente de diferentes meios como da formação profissional. Para esse autor,

O saber é sempre o saber de alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo qualquer. Além disso, o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o saber dos professores é o saber deles e está relacionado com a pessoa, com a identidade deles, com a experiência de vida, com a história profissional, com suas relações com os alunos em sala de aula e com outros atores escolares na escola, etc. (TARDIF, 2002, p.71).

Ou seja, são adquiridos no contexto de uma socialização, interação profissional por grupos de professores que atuam no mesmo, ou em diferentes contextos, mas que tem objetivos comuns nas suas práticas educacionais e sociais. Diante desse pensar coletivo e social, como o mundo em constante transformação, os saberes constantemente são renovados, reavaliados e ressignificados no intuito de atender as necessidades desses grupos.

Gauthier et al (1998), em suas investigações, buscam identificar e/ou definir um repertório de conhecimentos docentes subjacentes ao ato de ensinar. Para esses autores, as pesquisas sobre ensino perpassam por três paradigmas, explicitados por Soares (2006, p. 49) como: O enfoque processo-produto, o cognitivo e o interacionista-subjetivista. O enfoque produto correlaciona o desempenho dos docentes com as capacidades subsequentes adquiridas pelos alunos; o cognitivo investiga o processo da informação e os processos de construção do conhecimento dentro do complexo processo ensino-aprendizagem e o interacionista-subjetivista reúne o interacionismo simbólico, a etnometodologia, a etnografia, a sociolinguística e o enfoque ecológico.

Gonçalves (2000), com base em Gauthier et al (1998), diz que o trabalho docente apresenta três dimensões básicas que se relacionam e se influenciam mutuamente. São elas: a ético-politica, a emocional-afetiva e a cognitiva relativa aos saberes profissionais, sendo que este último nos conduz aos saberes públicos, produzidos pela ciência da educação, dos conhecimentos disciplinares e das diversas teorias, e ao saber privado que é o saber da experiência, construído na prática pelos docentes.

Gauthier et al (1998) categorizam o saber público em saber disciplinar, saber curricular, saberes da ciência da educação, saber da tradição pedagógica e o da ação pedagógica. O saber da experiência é categorizado como uma jurisprudência particular, portanto um saber privado.

Saber disciplinar – São os saberes produzidos pelos pesquisadores e cientistas nos diversos campos do conhecimento e que se incorporam às disciplinas científicas.

Saberes disciplinares são saberes que correspondem aos diversos campos do conhecimento, aos saberes de que dispõe nossa sociedade, tais como se encontram hoje integrados nas universidades, sob a forma de disciplinas, no interior de faculdades e de cursos distintos. Esses saberes emergem da tradição cultural e de grupos sociais produtores de saberes (TARDIF, 2002, p. 38).

O professor, para ensinar, extrai o saber produzido por outros (pesquisadores, cientistas) pelo fato de que ensinar exige conhecimento do conteúdo a ser transmitido, não se ensina o que não se conhece, para ensinar o professor tem que

desempacotar todo um arsenal de conhecimentos, entre eles o conhecimento do conteúdo.

Saberes curriculares - Os professores, no ato de ensinar uma disciplina, fazem transformações para adequá-la ao programa, as suas convicções, aos seus conhecimentos. Na realidade, essas transformações, muitas vezes, já estão nos programas escolares em forma de grade curricular, montado e discutido por um grupo de professores no seu contexto escolar ou pelas secretarias de educação e que de alguma forma são aprovados por órgãos competentes para serem utilizados pelos professores. Esses saberes denominados de curriculares são:

Saberes que correspondem aos discursos, objetivos, conteúdos e métodos a partir dos quais a instituição escolar categoriza e apresenta os saberes sociais por ela definidas e selecionados como modelos da cultura erudita e de formação para a cultura erudita. Apresenta-se concretamente sob a forma de programas escolares (objetivos, conteúdos, métodos) (TARDIF, 2002, p.38). Saber das ciências da educação - É o saber relacionado às questões como funcionamento e organização da escola, do desenvolvimento das crianças, desenvolvimento profissional do professor. Ou seja, são conhecimentos profissionais que, “embora não ajudem diretamente o professor a ensinar, informa a este a respeito de várias facetas de seu oficio ou da educação de modo geral” (GAUTHIER, 1998, p. 31).

Saber da tradição pedagógica - É a representação que se faz da profissão mesmo antes de atuar, é o uso da profissão. Essa tradição pedagógica é o saber dar aulas que transparece numa espécie de intervalo da consciência. Nessa perspectiva, cada um tem uma representação da escola que o determina antes mesmo de ter feito um curso de formação de professores, na Universidade. Apresenta muitas fraquezas, pois pode comportar muitos erros. Esse saber poderá ser adaptado e modificado pelo saber da experiência, sendo validado ou não pelo saber da ação pedagógica.

Saberes experiências - São os saberes que os professores desenvolvem no exercício de suas funções e na prática de sua profissão, baseados em seu trabalho cotidiano e no conhecimento do seu meio. Esses saberes brotam da experiência e são por ela validados. Eles se incorporam à experiência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades de saber-fazer e saber-ser. É pessoal, próprio de

cada professor. Embora o professor viva muitas experiências das quais tira grande proveito, tais experiências, no entanto, permanecem confinadas ao segredo. Seu julgamento e as razões nas quais ele se baseia nunca são conhecidos nem verificados por métodos científicos, fato que limita esse saber.

Saber da ação pedagógica - É o saber da experiência dos professores quando se torna público e verificado por pesquisas realizadas em sala de aula. Os julgamentos dos professores e os motivos que lhes servem de apoio podem ser comparados, avaliados, pesados, a fim de estabelecer regras de ação que serão conhecidas e aprendidas por outros professores. Os autores colocam que esse saber é o mais necessário para a profissionalização do ensino e deve ser divulgado e legitimado por pesquisas, pela própria ação docente, e incorporado na formação de outros professores.

Precisamos saber explorar melhor esses saberes, em especial na formação inicial do professor de Matemática, tanto para que os licenciandos saibam usá-los como ferramentas nas suas práticas professorais e também no seu desenvolvimento profissional.