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Saberes docentes necessários para a prática pedagógica dos professores.

No documento Etnografia da educação (páginas 86-89)

A palavra saber possui diversos significados conforme o contexto em que é empregada. Para os filósofos clássicos tais como Platão o conhecimento torna-se vivo devido a sensibilidade do sujeito diante do universo e assim por meio do conhecimento o humano se liberta do corpo para chegar à contemplação inteligível.

Nesse sentido o conhecimento é empírico e sensível e nessa direção desenvolve o conhecimento intelectual, conceitual. É portanto pelo conhecimento conceitual em que se apresentam ou explica-se os elementos não sensíveis.

Para Sócrates o saber intelectual ultrapassa em valor o saber sensível, nesse sentido tanto Platão quanto Sócrates convergem, porém diferem quando para Platão o conhecimento conceitual é imutável e o conhecimento sensível mutável, vulgar. Para Sócrates os conhecimentos ou conceitos pre-existem ao homem, são inatos no espírito deles e são esses conhecimentos que dão sustentação às sensações correspondentes por meio de leis de associação. Afirma que “existe apenas um bem, o saber, e apenas um mal, a ignorância”.

Platão ressalta para alem da discussão entre o saber sensível e o saber conceitual aponta para o “SABER” como um conjunto de informações que são acompanhadas de explicações e ainda de uma estrutura compreendida como episteme.

Diversos autores apresentam o saber como ligados à crença ou à episteme (Bombassaro 1997), ou seja, há uma intenção proposital para crer no conteúdo apresentado, existe assim uma pré-disposição do sujeito para aderir a esse conhecimento. Esse mesmo autor apresenta outra forma de interpretar “saber” ou seja relacioná-lo com poder. Quem sabe pode assim enquanto a primeira definição está ligada à questão prática o saber enquanto poder está relacionado com as habilidades.

É interessante salientar que para outros teóricos a exemplo de Tardif (2006), o saber profissional é constituído por elementos psicológicos e psicossociológicos,

ou seja, elementos constitutivos intrínseco ao docente (conhecimento sobre si mesmo, compreensão dos seus limites e potenciais, entendimento dos fatores que alteram seu comportamento e personalidade etc.) e elementos extrínseco ao docente (reconhecimento da presença de fatores intersociais, relacionamento humano e interpessoal, clima organizacional, fatores sociais e políticos, fatores econômicos etc.). Assim para ele o saber do professor deve ser considerado um saber ao mesmo tempo prático e complexo.

Dessa forma podemos entender que o saber e o saber docente possuem uma epistemologia que ancora o fazer pedagógico e ajuda no processo de tomada de decisão no contexto escolar.

É natural, portanto, que as instituições escolares transmitam aos docentes um saber pedagógico composto por diversas práticas que tem “dado” e é natural também que esse saber que denominamos aqui de institucional seja incorporado pelos professores. Por outro lado o saber institucional se fundamenta em uma epistemologia (teoria do conhecimento é o ramo da filosofia interessado na investigação da natureza, fontes e validade do conhecimento). Assim se esse conhecimento institucionalizado se fundamenta em uma epistemologia é razoável afirmar que esse conhecimento se constitui em uma crença verdadeira e justificada conforme apresentado por Plantão e Aristóteles.

Assim o conjunto de justificativas da prática pedagógica ou do saber institucional sobre a prática pedagógica transmitida para o docente forma um conhecimento importante para o desempenho da atividade na escola.

De acordo com Therrien, 2002

“A observação da prática docente e dos saberes que lhe dão sustentação foi permeada, em todos estes estudos, por três dimensões epistemológicas que considero fundantes do trabalho docente:

• A ‘prática produtiva’, expressa como produção material ou ainda como produção do humano com o humano, que aborda o trabalho como

princípio educativo, ou seja, na sua referência inicial com a produção do

saber;

• A ‘prática política’ que situa a educação no seio da comunidade ou no eixo da formação para a cidadania, numa concepção da educação

como ato político;

• As 'práticas pedagógicas’ vistas na sua diversidade de formas e através da multiplicidade de saberes que as permeiam, o que leva a considerar seus autores como autênticos profissionais de educação, produtores de saber com identidade própria” (pág. 67).

Assim nos parece que Therrien, 2002 engloba o conhecimento ou saber institucional tanto na prática produtiva como na política. Porém em outro sentido o conhecimento ou saber pode também ser adquirido á partir da formação do

indivíduo, ou seja, saberes adquiridos formalmente no mundo acadêmico no sentido lato da expressão.

O saber adquirido formalmente tende a ocupar um espaço maior nas discussões dos teóricos cuja preocupação é o entendimento entre a teoria e a prática, o conhecimento científico e o conhecimento comum/vulgar entre a racionalidade do saber pedagógico e a abordagem experiencial da prática pedagógica.

O saber formal, acadêmico enquanto teoria é fundamental para dar ao profissional (ver definição no módulo II) docente legitimidade científica no exercício do seu trabalho e esses saberes são, portanto múltiplos e bastante diferenciados.

As diversas interfaces com áreas próximas da pedagogia dentre elas citamos a sociologia, psicologia, história antropologia, filosofia, biologia etc. Essas interfaces estão presentes na atuação profissional do docente e constituem parte dos conhecimentos necessários ao exercício desse profissional.

Assim esse saber teórico, constituinte das competências na formação profissional docente configura-se como o saber acadêmico/formal que necessita ser experienciado, posto em prática, testado.

Tardif (2006), apresenta o saber docente à partir de categorias ou dimensões tais como: “saber disciplinar e curricular, saber pedagógico, saber da experiência profissional e saber da cultura e do mundo vivido na prática social” (página 118). Essa multiplicidade de saberes e interrelações concebem ao docente um conhecimento especial que vai alem do entendimento meramente técnico ou de compreensão limitado do seu objeto de trabalho.

Assim é fundamental compreender a racionalidade do fazer pedagógico à partir da origem do conhecimento, da sua epistemologia pois essa compreensão é a estrutura do trabalho do professor.

Em um último aspecto é necessário considerar o saber adquirido com os pares, com os colegas de trabalho, saber oriundo da prática efetiva, da experiência. Portanto na linha de Tardif, 2006 o saber oriundo da experiência constitui-se em um espaço fundamental para o profissional docente tendo em vista que, "formando um conjunto de representações a partir das quais os docentes interpretam, compreendem e orientam (212)” e podem ajudar significativamente os menos experientes a construírem sua prática.

Não se quer aqui destituir o papel da formação acadêmica para a prática pedagógica, porém evidenciar a necessidade da formação acadêmica por meio da prática ou da práxis. Estabelecer o movimento dialético necessário para a

constituição de o verdadeiro saber pedagógico em movimento de ação e reflexão. De acordo com Silva,

“agora pergunto: quantos são os professores brasileiros que ao iniciarem no magistério, efetivamente sabem o que e como ensinar? Quantos são corretamente preparados para analisar as conseqüências de suas opções e do seu trabalho em uma escola? Quantos têm uma vivência com crianças reais, historicamente situadas? Eu diria que poucos muito poucos... devido ao caráter excessivamente teórico e livresco dos nossos cursos de preparação e formação de professores” (1997:54).

O saber adquirido na experiência com os demais profissionais da docência podem constituir-se também como uma forma de educação continuada permanente nesse contexto, assim são de natureza dinâmica e multirelacional, estabelecem- se na ação reflexão e ação, na troca de experiências, extrapolam o saber teórico e a ele retorna é, portanto interativa e ainda possui a função de construção de um trabalho coletivo intencional ou como ocorre geralmente não intencional além de ser profundamente dialético (Therrien, 2002). Pimenta, 1999 procede a uma análise da pratica pedagógica e afirma que

[...] da significação social da profissão; da revisão constante dos significados sociais da profissão; da revisão das tradições. Mas também da reafirmação das praticas consagradas culturalmente e que permanecem significativas. Praticas que resistem a inovações porque prenhes de saberes validos as necessidades da realidade. Do confronto entre as teorias e as praticas, da analise sistemática das praticas a luz das teorias existentes, da construção de novas teorias. (PIMENTA, 1999, p. 19).

Ela resume a necessidade do profissional docente buscar sua auto-formação e confrontar na prática os saberes acadêmico-teóricos com os institucionais e esses com a prática experiênciada. Esse é o movimento ação reflexão necessário á construção do saber docente.

No documento Etnografia da educação (páginas 86-89)