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3 ALFABETIZAÇÃO, LETRAMENTO E SABERES DOS PROFESSORES ALFABETIZADORES

3.2 Saberes docentes e os saberes necessários à alfabetização e ao letramento

O trabalho docente do professor alfabetizador requer saberes específicos para que ele tenha êxito no ensino da língua escrita. “Alfabetizar letrando” exige muito conhecimento e muita dedicação em um trabalho pedagógico que deve ser sistematizado. De acordo com Soares (2008), exige muitas facetas e uma diversidade de métodos e procedimentos para o ensino da língua escrita.

[...] exige uma preparação do professor que o leve a compreender todas as facetas (psicológica, psicolingüística, sociolingüística e lingüística) e todos os condicionantes (sociais, culturais, políticos) do processo de alfabetização,

que o leve a saber operacionalizar essas diversas facetas (sem desprezar seus condicionantes) em métodos e procedimentos de preparação para a alfabetização, em elaboração e uso adequados de materiais didáticos, e, sobretudo, que o leve a assumir uma postura política diante das implicações ideológicas do significado e do papel atribuído à alfabetização. (SOARES, 2008, p. 24-25).

Diante da complexidade que é o ensino da língua escrita "operacionalizar essas diversas facetas" não é um trabalho fácil e simples ao professor, é necessário fazer uso de todos seus saberes. Estes saberes que o professor possui, Tardif (2011) afirma que estão relacionados com a sua identidade, suas experiências de vida e experiências profissionais, com as relações estabelecidas com outros profissionais da mesma escola e com os estudantes. Dessa maneira, o saber docente é social e também individual, estabelecendo entre eles uma articulação. Social porque provém de relações estabelecidas com o outro e individual porque é dele, da forma como ele abstrai todas estas experiências e relações em sua história de vida e história profissional.

Esses saberes são provenientes de diversas fontes, espaços, tempos e experiências, são construídos ao longo de toda a trajetória de vida do professor, pessoal ou profissional, dando início em suas primeiras experiências escolares, passando pela formação inicial, continuando com a formação continuada, englobando teorias e crenças oriundas da vivência de cada um, sofrendo diversas influências e se consolidando na prática docente. (MONTALVÃO; MIZUKAMI, 2010)

De acordo com Tardif (2011, p. 18), o professor traz para seu trabalho um saber plural, heterogêneo, “porque envolve, no próprio exercício do trabalho, conhecimentos e um saber-fazer bastante diversos, provenientes de fontes variadas e, provavelmente, de natureza diferente.”

O quadro a seguir foi elaborado por Tardif (2011) para identificar e explicar o pluralismo do saber do professor, relacionando-o com as fontes de aquisição desse saber e os modos de integração do trabalho do professor.

Quadro 05 - Os saberes dos professores.

Saberes dos professores Fontes sociais de aquisição Modos de integração no trabalho docente

Saberes pessoais dos professores A família, o ambiente de vida, a

educação no sentido lato, etc. Pela história de vida e pela socialização primária Saberes provenientes da

formação escolar anterior A escola primária e secundária, os estudos pós-secundários não especializados, etc.

Pela formação e pela socialização pré-profissionais Saberes provenientes da

formação profissional para o magistério

Os estabelecimentos da formação de professores, os

estágios, os cursos de

Pela formação e pela socialização profissional nas

reciclagem, etc. professores Saberes provenientes dos

programas e livros didáticos usados no trabalho

A utilização das “ferramentas” dos professores: programas, livros didáticos, cadernos de

exercícios, fichas, etc.

Pela utilização das “ferramentas” de trabalho, sua adaptação às

tarefas Saberes provenientes de sua

própria experiência na profissão, na sala de aula e na escola

A prática do ofício na escola e na sala de aula, a experiência dos

pares, etc.

Pela prática do trabalho e pela socialização profissional

Fonte: Tardif (2011, p. 63).

Os saberes pessoais do professor alfabetizador e os saberes provenientes da formação escolar anterior trazem enraizados em si todas as crenças, valores e vivências relacionadas com a história de vida do docente. O ambiente em que cresceram, as pessoas com que conviviam, se tinham ou não hábitos de leitura e escrita, como iniciaram sua vida escolar, como eram os primeiros professores, as lembranças dos anos iniciais do ensino fundamental, os tipos de texto que eram lidos, a maneira pela qual foram alfabetizados, métodos de ensino da leitura e escrita que foram utilizados.

Todas estas crenças e valores produzidos pela história de vida do professor são interiorizados por ele e acabam se constituindo, muitas vezes, em concepções de alfabetização e letramento, trazidas para a sala de aula por meio de práticas pedagógicas.

Os saberes provenientes da formação profissional para o magistério trazem ao professor alfabetizador todas as aprendizagens e conhecimentos adquiridos na formação inicial e que são ampliados com a formação continuada, após a inserção deste profissional no mercado de trabalho. Esses saberes vão se modificando a medida que as crenças em relação à alfabetização presentes no professor vão sendo dissolvidas por meio de formações.

Os saberes provenientes dos programas e livros didáticos usados no trabalho do professor alfabetizador provenientes da utilização de ferramentas usadas para ensinar, como o livro didático, apostila, materiais de programas como o Ler e Escrever, por exemplo, vão direcionando o trabalho do professor e construindo estes saberes. Alguns destes materiais necessitam de estudo e muita dedicação para serem utilizados, contribuindo para a formação docente. No entanto, mesmo sem o planejamento necessário para a execução das aulas relacionadas ao ensino da língua escrita, conforme são inseridos na prática do professor vão sendo materiais de análise sobre práticas bem- sucedidas ou fracassadas de alfabetização e letramento, auxiliando, assim, o repertório de atividades voltadas à aquisição da linguagem escrita.

Os saberes provenientes de sua própria experiência na profissão, na sala de aula e na escola estão relacionados com a trajetória de vida profissional do professor alfabetizador. Estes saberes trazem as experiências vividas e presenciadas do trabalho com a alfabetização e letramento e as relações interpessoais estabelecidas no contexto escolar.

Tardif (2011, p. 103) elucida que os saberes, tanto os adquiridos na história de vida do professor como na trajetória profissional, são também “existenciais, sociais e

pragmáticos”.

Existenciais porque tudo aquilo que foi vivido pelo professor, que foi acumulado

durante sua história de vida o influenciou em sua forma de ser, pensar e agir. “Em suma, ele pensa a partir de sua história de vida não somente intelectual, no sentido rigoroso do termo, mas também emocional, afetiva, pessoal e interpessoal” (TARDIF, 2011, p. 103). Sociais por serem adquiridos das relações e experiências vivenciadas em variados grupos sociais, no período da infância, escolar, de formação e de trajetória profissional.

Pragmáticos, pois ao mesmo tempo em que os saberes estão ligados ao trabalho do

professor estão à pessoa do trabalhador.

Trata-se de saberes ligados ao labor, de saberes sobre o trabalho, ligado às funções dos professores. E é através do cumprimento dessas funções que eles são mobilizados, modelados, adquiridos, como tão bem o demonstram as rotinas e a importância que os professores dão à experiência. (TARDIF, 2011, p. 105)

De acordo com os estudos de Tardif (2011), esses saberes que possuem uma tripla caracterização, existenciais, sociais e pragmáticos, são adquiridos com e no tempo, são abertos e ao longo da trajetória profissional do professor, vão se modelando e se reconstituindo a medida em que ele vai vivenciando novas experiências, adquirindo novos conhecimentos e estabelecendo novas relações.

Dessa forma, o professor alfabetizador traz consigo muitos saberes oriundos de sua história de vida e de sua trajetória profissional que vão se modificando ao longo de sua carreira. Por isso, dada a complexidade do trabalho com a língua escrita, é imprescindível que o professor dos anos iniciais do ensino fundamental deva participar de formações contínuas para ampliação de seus saberes em relação ao trabalho com a alfabetização e letramento.

3.3 A formação de professores alfabetizadores e as políticas educacionais: alguns