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Saberes a ensinar, comportamentos a inculcar: o que se observa na

No documento UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ (páginas 130-134)

4.3 A PRÁTICA PEDAGÓGICA DA PRIMEIRA INFÂNCIA NO CMEI “ALFA” 102

4.3.2 Saberes a ensinar, comportamentos a inculcar: o que se observa na

A instituição ―não é somente um lugar de aprendizagem de saberes, mas é, ao mesmo tempo, um lugar de inculcação de comportamentos e de habitus que exige uma ciência de governo transcendendo e dirigindo, segundo sua própria finalidade‖ (JULIA, 2001, p.22).

Dessa forma, as crianças desde que entram na escola começam a ter ensinamentos não só cognitivos, mas de hábitos e comportamentos: cumprimentar as pessoas, pedir licença, pedir desculpas, agradecer, cuidar da sua higiene e alimentação, como usar determinados espaços e o tempo, dentre outros. Os saberes são transmitidos também por rituais diários: fazer fila para entrar na sala de aula, dirigir-se ao pátio ou parque infantil ou banheiro para a escovação dos dentes, seguir as diferentes orientações nas atividades diárias. Ou são difundidos através de eventos ou festas tradicionais: marcha no dia sete de setembro, festejos em datas comemorativas, que no CMEI, traduzem-se na festa junina, que ainda é uma tradição e é comemorada todos os anos, transmitindo saberes e valorizando a simplicidade das pessoas do campo; no dia da família (que substitui o dia do pai e da mãe), visto que atualmente as famílias se reconfiguraram e são compostas por diferentes pessoas que diferem do modelo tradicional; a festa de encerramento (substitui a comemoração do Papai Noel e formatura do Pré II). Visto que alguns comportamentos se extinguiram, influenciados por normas externas.

Por meio da observação na turma do pré I e no maternal I identificaram-se alguns saberes transmitidos às crianças como os saberes sobre a família, por exemplo, o projeto Receitas da Vovó, cada criança realiza uma receita com sua avó e registra a mesma com fotos em um caderno coletivo. Desenvolve-se assim, conceitos espontâneos da criança provenientes das interações familiares, sendo um ponto de partida a vida da criança, pois a aprendizagem inicia bem antes da aprendizagem escolar. A aprendizagem escolar não parte do zero, ela sempre possui uma pré-história, como concebeu Vigotski, citado por Ivic (2010).

Além desses, os saberes matemáticos são transmitidos na sala:

Pelo calendário do mês de agosto as crianças contam os dias que faltam para acabar o mês, dias da semana e ano e as crianças presentes; Cantam a música sete dias da semana e utilizam os dedos para contagem. Com os crachás expostos, três crianças são chamadas ao meio para contar quantos estão faltando, e também com os números de 1 a 99 expostos na parede da sala (DIÁRIO DE CAMPO PRÉ I, 2018).

Não sendo o objetivo para esta etapa da Educação Básica, segundo os documentos norteadores, saberes sobre princípios de alfabetização são empreendidos perante um alfabeto na parede da sala e no momento da chamada:

Durante a chamada com os crachás, conversa-se sobre quem está faltando, os cinco faltantes têm seu crachá colocado no meio da roda e cinco crianças são chamadas para reconhecer o nome do faltante e colocar virado no painel da chamada. Outro recurso pedagógico é a caça ao nome, com crachás distribuídos pela sala vão primeiro as meninas e depois os meninos, quem reconheceu seu nome coloca na parede (DIÁRIO DE CAMPO PRÉ I, 2018, grifo da pesquisadora).

Saberes sobre disciplina são exigidos também quando, por exemplo, uma das professoras, ―com um diário de chamada, pede para que respondam presente, e quando não o fazem é chamada a atenção da criança, o que lembra o Ensino Fundamental‖ (DIÁRIO DE CAMPO, 2018).

Como pode ser observado na Figura (19) que segue, igualmente encontrou-se o saber científico, quando ―a professora leva fotos da evolução das lagartas para virar borboleta, e assim falar da metamorfose‖ (DIÁRIO DE CAMPO, 2018). Para Vigotski, citado por Ivic (2010), adquirir conceitos científicos é a aprendizagem mais importante ao longo do período escolar. A criança traz consigo os conceitos espontâneos, ou do cotidiano e na escola adquire os conceitos científicos. Ambos os conceitos se constroem de maneiras diferentes durante o desenvolvimento da criança, porém no ambiente escolar acontece a interlocução dos dois. Na concepção do autor, o sistema de conceitos científicos é um instrumento cultural portador, e também, de mensagens profundas e, com sua assimilação a criança muda profundamente seu modo de pensar.

A educação italiana que embasa os campos de experiências da BNCC visualiza a consciência científica como uma pesquisa que se fundamenta em fatos e interpretações, com formulações condicionados de reformulações. Observar os fatos e o espírito de pesquisa deveriam ocorrer com um envolvimento direto da criança,

com coragem, mas sem forçar as fases para construir experiências e investigações por meio de hipóteses de trabalho para formular modelos de interpretação (INDICAÇÕES NACIONAIS ITALIANAS, 2012).

Figura 19 - Trabalhando a Metamorfose

Fonte: Foto registrada pela pesquisadora (2018).

Conjuntamente, saberes da psicomotricidade são compartilhados com as crianças ao incentivar a coordenação motora nos ―recortes em revistas, agrupando no máximo três crianças na mesa dentro da sala, enquanto outro grupo brincava com brinquedos diversos, além da atividade de circuito na parte da tarde‖ (DIÁRIO DE CAMPO, 2018). Um exemplo citado, o recorte em revistas pode ser observo na Figura (20) a seguir.

Figura 20 - Atividade de Coordenação Motora

Fonte: Foto registrada pela pesquisadora (2018).

Comportamentos como: cruzar a perna como índio, na roda de conversa, sentar em roda, sentar em semicírculo como se visualiza na Figura (21) a seguir, fazer fila para o refeitório, não mexer nas coisas da sala, deixar a sala organizada e saber dividir com as demais crianças, são reforçados todos os dias em coletivo ou individualmente. Presente nos documentos normativos e na prática das docentes, incentiva-se a autonomia reiterando diversas vezes durante o dia a realização de atividades sem ajuda do adulto, como ―café com cantos‖, onde a criança é estimulada a se servir sozinha com o bule, assim como, no restante do dia, a colocar os sapatos, escovar os dentes, vestir a roupa, comer sozinha, etc. desenvolvendo assim gradativamente sua autonomia pessoal. No entanto, a professora não possui autonomia para repensar a realização do café da manhã em outro espaço/ambiente, pois é exigido que seja realizado todos os dias na sala, para facilitar a organização institucional.

Figura 21 - Posicionamento em Semicírculo no Maternal I

Fonte: Foto registrada pela pesquisadora (2018).

Para a compreensão do momento histórico em que se vive, a escola precisa repensar sua associação ―[...] entre a sua virada universalista e o pluralismo do público que ela recebe, entre a esfera pública e a vida privada, protegendo a infância das agressões do mundo adulto, sem, contudo, deixá-la ignorar os conflitos que o atravessam‖ (JULIA, 2001, p.37).

4.4 EDUCAÇÃO INTEGRAL E TEMPO INTEGRAL: A TEORIA E A VOZ DOCENTE

No documento UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ (páginas 130-134)