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CAPÍTULO 1 SANTA RITA DE CÁSSIA: A CONSTRUÇÃO TEXTUAL DE

1.2 SANTA RITA DE CÁSSIA: ENTRE A HISTÓRIA E A HAGIOGRAFIA

1.2.3 Santa Rita depois da morte

As leituras após a sua morte não foram bem detalhadas por alguns autores, mas Cuomo (2009) e Álvarez Maestro (2012) explicitam que de acordo com a tradição oral, os sinos de todas as igrejas tocaram automaticamente. A população de Cássia pensou que era um aviso de missa e todos correram para as igrejas para verificar o que tinha realmente acontecido. Ao perceber que nada havia, a multidão se dirigiu até o mosteiro de Santa Maria Madalena e lá Rita já estava pronta para receber homenagens. A ferida em sua testa estava curada, mudando sua fisionomia para uma aparência agradável, e o odor fétido já não era perceptível.

O que podemos notar é que a tradição oral dos devotos da monja agostiniana trouxe até os dias atuais uma interpretação romântica de sua morte. Sua morte foi interpretada, tanto pela população de Cássia como pelas freiras do convento, como um evento sobrenatural, visto que Rita mudou seu semblante, perdeu seu odor e os sinos das igrejas tocaram.

Não se sabe ao certo se o corpo de Rita foi enterrado ou já se foi logo embalsamado. Podemos conjecturar que ele foi primeiramente enterrado como os corpos de outras freiras, com fama de santidade, e dez anos depois ele foi exumado e foi construído um féretro solene14 (ÁLVAREZ MAESTRO, 2012).

Outros autores, entre eles Cuomo (2009), afirmam que o corpo de Rita não foi enterrado, e sim logo embalsamado após sua morte, sendo construído um féretro por um carpinteiro. Adeverte que as freiras do convento afirmavam que a pessoa a que Rita concedeu o milagre após sua morte não foi Cicco Barbaro, e sim, uma parenta sua que sofria de paralisia no braço. Cuomo (2009) não descarta a possibilidade de o féretro ter sido construído por Cicco Barbaro para homenageá-la, pois, conforme a tradição oral, quem o curou foi de fato a beata falecida. Cicco Barbaro prometera que, a partir do momento em que se curasse da paralisia que tinha nas mãos, ele construiria um féretro como forma de pagamento pela graça concedida.

Em 1628, 171 anos após sua morte, Rita de Cássia foi beatificada pelo papa Urbano VIII15. A beatificação passou por um processo de análise, com o objetivo de fundamentar a existência de uma vita beata, pois somente havia duas obras publicadas a seu respeito. No processo foram também analisados os milagres, as virtudes, as suas ações e sua vida. Foram entrevistadas cinquenta pessoas, sendo freiras uma boa parte delas. Diante dos testemunhos, que em sua maioria eram curas de doenças, o papa procedeu à beatificação da monja agostiniana. (CUOMO, 2009; ÁLVAREZ MAESTRO, 2012; BERGADANO, 2003).

Cuomo (2009) relata os principais testemunhos que fizeram a freira agostiniana tornar-se beata; o primeiro momento, durante o processo de beatificação, foram colhidas as provas de como seu culto se espalhara, sendo examinados os votos depositados diante do féretro solene. Desses ex-votos havia pinturas ilustrativas e objetos preciosos, somando um total de 446 objetos. Em seguida foi aberto o féretro para verificar a veracidade do perfume que exalava dela, e o que se encontrou foi um corpo incorrupto, ou seja, em perfeito estado de conservação. De acordo com o processo de beatificação, as virtudes que Rita possuía eram fé, esperança e caridade.

No processo de beatificação se examinou como o culto se instaurou na região de Cássia, como esse culto estava crescendo e a forma como os devotos a cultuavam

14O Féretro solene seria uma caixa na qual ficaria o corpo exumado de Santa Rita de Cássia. Foi construído por Cicco Barbaro, para homenageá-la pela graça concedida. No féretro também havia pinturas demonstrando um pouco da vida da santa (CUOMO, 2009; BERGADANO, 2003)

naquele momento: embora se houvessem passado dois séculos, o culto era celebrado por meio de missas, de votos e de quadros em igrejas em Cássia, e a sua biografia era relatada pela tradição oral. Se sua beatificação foi adiada, o processo de canonização foi concluído em 1900, ou seja, quase dois séculos após a beatificação.

A presença da beata Rita de Cássia já era evidente na Itália, na Espanha e em Portugal. O seu culto se expandiu para essas regiões graças aos agostinianos, que celebravam missas em sua homenagem (MEGALE, 2002; BEZERRIL, 1957). Em 24 de maio de 1900 Rita de Cássia foi declarada santa pelo papa Leão XIII16. A Igreja reconhece três curas inexplicáveis pela ciência: a de um senhor de idade que se recuperou de uma doença fatal depois de sonhar com Rita; a cura de uma menina de sete anos que voltou a enxergar de forma inesperada e; a cura de uma freira que, após estar paralítica durante quatro anos, voltou a andar depois de ter sido chamada por uma voz, identificada com a santa (CUOMO, 2009; ÁLVAREZ MAESTRO, 2012).

No século XX a devoção a Santa Rita de Cássia já estava popularizada no Brasil. Seu culto se instalou no século XVIII, no Rio de Janeiro, trazido por uma família de colonos portugueses. (BEZERRIL, 1957). As orações, os pedidos, as promessas e as novenas confirmavam sua santidade, embora a Igreja não lhe houvesse dado este título. O processo de canonização, o qual demorou mais dois séculos, não fez os devotos deixarem de cultuá-la.

16O Papa Leão XIII sucedeu o Papa Pio IX. Teve uma trajetória grande, passando por transformações políticas de forma universalizada, como o capitalismo e o comunismo. Ficou como Pontífice de 1878 a 1903.

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