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5 O JORNAL RECOPILADOR SERGIPANO

5.4 Seções do jornal

Analisar as seções acrescenta elementos no que diz respeito à parcialidade demonstrada nos textos que eram produzidos e disseminados. Nas matérias é possível constatar, mesmo que de forma implícita, escritos que enfatizavam as ideias que os editores atacavam ou defendiam. As seleções dos escritos indicam as intenções que seus editores tinham em colocar ou não determinada informação em circulação, para conhecimento de seus leitores. A escrita desses textos justifica, inclusive, a iniciativa de pôr o impresso em circulação, e automaticamente, tornando quem os escreve porta-voz de determinadas ideologias, pois para Nísio Teixeira “o jornalista é um ser humano, com uma história e formação própria, que se posiciona diante de um fato ou, pelo menos, que escolhe palavras para sua descrição”. (TEIXEIRA, 2008, p.67)

As seções do Recopilador Sergipano sofriam constantes variações, algumas se faziam presentes de forma frequente praticamente em todas as edições analisadas, outras foram encontradas esporadicamente. Dois números não possuíam seções (122 e 123), trazendo apenas relatórios sobre a segurança pública e outras questões relacionadas à Assembleia Geral Legislativa. Os assuntos abordados seguiam tendências parecidas em todos os números: leituras longas, grande quantidade de publicações de caráter oficial, a exemplo de leis e decretos que tomavam grande quantidade de páginas.

Outro ponto bem perceptível eram as reproduções de outros jornais, importantes periódicos da corte tinham textos transcritos no Recopilador Sergipano. Esses textos eram inseridos ao corpo do jornal em forma de editorial ou com a finalidade de respaldar algum tema discutido. O Quadro 2 apresenta dados sobre a regularidade em quais outros jornais eram citados:

Quadro 2: Periódicos da corte reproduzidos pelo Recopilador Sergipano

TÍTULO QUANTIDADE DE

REPRODUÇÕES

Aurora Fluminense 5

O Carapuceiro 5

Jornal do Commércio 4 Verdade 4 Recopilador Liberal 3 Gazeta da Bahia 3 Federalista de Pernambuco 3 Patriota Brasileiro 3 Sete d’Abril 3 Valenciano 2 O Nacional 2 Inflexível 1 Messager 1 Diário do Governo 1 O súbdito da lei 1 Diário da Bahia 1 Publícola Brasileiro 1 Correio do Amazonas 1 Noticiador 1 Continentino 1 Propagador da indústria 1 Federalista Alagoense 1

Fonte: Dados da pesquisa (2018)

Nas edições analisadas observaram-se 9 (nove) seções diferentes, estas foram examinadas e comentadas, explicitando a maneira como se apresentavam. Em algumas seções julgou-se conveniente apresentar exemplos por meio de imagens ou fragmentos textuais com intuito de exemplificar o que é dito.

5.4.1 Correspondências

As cartas dos leitores estavam presentes na maioria das edições que foram estudadas, tendo sido vistas 17 vezes, e faziam o canal de ligação entre a redação do jornal e o público que o acompanhava. Esse tipo de relação inclui demonstrações de aceitação por parte do público que fazia leitura do impresso,

atuava como instrumento de retorno acerca das considerações feitas por quem acompanhava as temáticas discutidas. Santo e Dumont consideram, ainda, que essas correspondências dizem muito sobre o cenário social e histórico, pois:

As cartas foram consideradas, então, como instrumentos de transmissão de informação sobre a vida em sociedade. Fazem parte de um processo discursivo e estão inseridas em condições sócio históricas. Páginas e colunas específicas para sua publicação servem como espaços de denúncia, de confronto do político/social, de reivindicação, de desabafo, enfim, de exercício da cidadania. Há que se considerar, ainda, que aqueles que escrevem representam uma população muito mais ampla que se possa dimensionar, porque, no fundo, são uma espécie de porta-voz das queixas e observações de tantos/as outros/as que, por algum motivo, não enviam suas opiniões aos jornais. (SANTO; DUMONT, 2014, p. 4)

A análise deixa transparecer que esse era o principal canal de interação e seu conteúdo permite entender que as correspondências publicadas tinham como remetentes leitores assíduos do impresso, uma vez que estes comentavam edições anteriores, discutiam sobre temas anteriormente publicados e inclusive foram vistas edições onde o espaço fora utilizado como direito de resposta. Entre os fatos que comprovam o valor dado a essa seção por parte da redação, estão jornais que possuíam apenas essas cartas ocupando colunas ou até mesmo páginas inteiras, a exemplo dos números 124, 129, 143 e 145. Geralmente as assinaturas eram feitas através de pseudônimos como: “O inimigo dos empolgadores”, “O ouvinte”, “O amigo de todos os homens de bem”, “Berimbau”, “Amigo dos bons pagadores”, “O curioso”, “Amigo da lei”, “Observador”.

5.4.2 Interior

Pode ser considerado o que hoje chamamos de editorial. Textos opinativos, predominantemente escritos na primeira página e podendo se estender por muitas outras. Assim como em outros tópicos apresentava textos copiados de outros periódicos, e foi constatado que alguns eram divididos em duas edições. Seguia sempre a mesma linha do restante do conteúdo e, por isso, fica claro que os textos eram selecionados baseados no ponto de vista do redator.

Os anúncios estão entre os principais elementos que dão forma ao jornal. Uma observação minuciosa revela ideais não só do projeto jornalístico em si, mas também do público que se deseja alcançar. Considerando que todos os discursos são voltados a um determinado leitor, quem anuncia busca atingir seus objetivos e dentro desse contexto é possível destacar que esses mudam conforme o espaço e o momento histórico. (GOUVEA; PAIXÃO,2004)

Historicamente a publicidade é incorporada aos jornais como uma maneira de gerar recursos necessários ao sustento do periódico, visando a diminuição de preços e, assim, atrair mais leitores. Em contrapartida, os anunciantes passam a ver a propaganda como oportunidade de chegar até o mercado consumidor. Nem sempre houve uma boa aceitação por parte dos leitores com relação à veiculação de publicidades, para ser inserida como parte do jornal, teve que superar a sombra de representar o rótulo de desconfiança e suspeita sobre a ética jornalística. (DEPEXE, 2011).

Visando atrair lucros para se manter, procedimentos de persuasão foram constantemente adotados nos impressos fazendo dos anúncios um dos cadernos mais importantes. Porém, tratando-se do jornal estudado, fica nítido que essa inserção voltada à lucratividade não se aplica efetivamente, revelando, assim, características específicas daquela época. Observa-se que o interesse financeiro não era o foco inicial, pois o Monsenhor Fernandes, na condição de diretor da tipografia, aproveitava-se das publicações para se promover, mas, posteriormente, viu circunstâncias favoráveis para obtenção de ganhos. Oliveira (2018) declara que ele teria utilizado da máquina pública para fazer crescer seu patrimônio, fez com que seu jornal fosse contratado para prestar serviços ao governo e como era presidente do conselho conseguiu obter vantagens pessoais.

No mais, tratando-se da leitura um privilégio de poucos, o acesso a informação por meio de impressos era praticamente inviabilizado aos mais desfavorecidos, então entende-se que quem anunciava tinha convicção de atingir um público-alvo em particular e que tinha provável interesse naquelas informações.

Desde os primeiros números analisados o jornal Recopilador Sergipano possui anúncios. A seção “ANNUNCIOS” estava localizada sempre na última página do jornal, no canto inferior direito e trazia em seus conteúdos os mais diferentes itens. O gráfico a seguir ilustra a variedade de assuntos divulgados:

Gráfico 1: Distribuição da seção anúncios do jornal Recopilador Sergipano (1833-1834)

Fonte: Dados da pesquisa (2018)

Nem todas as edições possuíam anúncios, das 31 edições estudadas 10 não contavam com esse recurso. Nos números analisados foi possível observar poucas comunicações de vendas, sendo estas de bois, carnes ou imóveis. Em muitos momentos foram vistos comunicados de autoridades, como de juízes e procuradores da Vila, que se dedicavam a divulgar audiências ou convocar devedores. A própria equipe do jornal utilizava o espaço para fins próprios seja para cobrar assinantes ou informar que desejava comprar algo, inclusive divulgação de compras eram feitas com certa frequência, assim como anúncio de objetos perdidos. As ações de compra e venda de escravos, além de recompensas por suas fugas eram tratadas com naturalidade demonstrando que não havia envolvimento com tópicos abolicionistas isso se torna visível quando se publicam anúncios como o de 24/07/1833:

“Fugio ao Padre Francisco Antônio Ferreira Castro, hum escravo de nome Luiz, crioulo bem retinto, gago, alto, grosso do corpo, nariz afilado e pés mal feitos: He official de capateiro,mestre d’assucar, e tocado de viola: quem o conduzir a Sr. no Engenho Serraria, será generosamente gratificado”

5% 26% 11% 42% 8% 8%

Anúncios

Comunicados da tipografia Sem anúncios Vendas de produtos Prestação de serviços Compra/venda/fuga de escravos Venda de imóveis

Avisos peculiares também eram feitos a exemplo da edição 126 (17/07/1833) onde um indivíduo utiliza do jornal para despedir-se dos familiares e amigos antes de viajar: “Manoel Rodrigues do Cotias, havendo de retirar-se para Sergipe no dia 18 do corrente, e não podendo despedir-se de todos os seus amigos, e conhecidos pela brevidade de tempo, o faz por este” ou no número 134 onde o dono de determinada propriedade ameaça pessoas que estão furtando madeira:

João Dias da Silva, proprietário do Engenho Piripiri, faz público que d’ora em diante procederá contra aquelles, que tirarem madeiras nos mattos do mesmo Engenho sem o seu consentimento, extranhando todavia áquelles, que já tem assim praticado occultamente. (agosto de 1833)

Outra observação é que, em nenhum documento analisado constatou-se repetição de anúncios. Como era característico dos jornais desse período, as propagandas não tinham o perfil de convencimento e nem de argumentação, buscavam apenas trazer informações sobre determinado produto ou serviço como demonstram os exemplos de Pinho (1990, p. 17):

[...] diziam respeito à venda de imóveis (“Quem quiser comprar uma morada de casas de sobrado com frente para a Santa Rita, fale com Ana Joaquina da Silva...”), à de escravos (“uma Paula que tem ‘sapiranga’ nos olhos e o ar triste”), aos leilões de tecidos (“constando de 64 peças de fustões acolchoados e 50 caixas com vestidos de senhoras”), a escravos foragidos (“um Benedito de Pirassununga com marca de golpe de faca, dois sinais entre as maminhas, que entende alguma coisa de ofício de pedreiro e é um tanto pilantra”), e à solicitação de serviçais para trabalhos nas casas senhoriais (“de uma mulher para senhora inglesa, que saiba bem lavar, engomar e coser, pagando-se um tanto por mês”).

Rüdiger (1995) apud Depexe (2011) esclarece ainda que esses reclames seriam o que hoje conhecemos por classificados. Isso se dá devido ao caráter meramente informativo, e não objetivando atingir o mercado consumidor propriamente dito.

5.4.4 Máximas e pensamentos

Em relação a adoção de pequenos textos ou frases com perfil reflexivo ou de auto ajuda no jornal Recopilador Sergipano, foram encontrados textos com citações a alguns autores ou simplesmente extraídos de outros impressos sem as

devidas referências. Em algumas edições esse conteúdo apresentava-se apenas como “pensamentos”.

5.4.5 Notícias estrangeiras

Nas três ocasiões em que esteve presente essa seção narrou acontecimentos importantes para a época, sendo duas das notícias vindas de Portugal. Trazia informações acerca da Guerra Civil Portuguesa (ou Guerra Miguelista) e sobre o chamado Cerco do Porto, e tinha o objetivo de informar sobre o andamento das batalhas e dava parciais sobre a situação das tropas envolvidas.

Outra informação, vinda da Itália, reproduz uma nota da Duquesa de Berry, onde assume publicamente ter contraído matrimônio em segredo e explica seus motivos.

5.4.6 Ofício

Essa seção era dedicada às transcrições de ofícios enviados às autoridades, inclusive ao próprio monsenhor na condição de Deputado da Província. Nessa sessão ele, como redator, faz breves considerações numa espécie de resposta aos comunicados.

5.4.7 Edital

Os editais eram escritos em formato de comunicado e se referiam a questões relativas ao interesse público, bem como decisões da administração municipal de certo modo viessem a interferir na sociedade.

5.4.8 Anedota

Publicada apenas na edição de número 114, essa seção trazia um discurso discretamente moralista, não necessariamente voltado para a sátira:

Hum pregador, estando no púlpito, dizia que tudo que Deos tinha feito era perfeito. Hum Carcunda, que se achava no auditório, esperou que o padre sahisse da Igreja, e lhe dice- muito bem, Sr. Padre Pregador: Vm. Dice que

tudo Deos fez era perfeito: agora olhe para mim, e diga-me se eu sou perfeito; ao que o Padre immediatamente respondeo- certamente, pois para hum carcunda he perfeito, e o que não he obra de Deos he o carcunda moral (que he filho do Diabo). (n.114, p.4, 01/06/1833)

5.4.9 Variedades

Vista em metade dos números analisados, essa seção continha, como o próprio nome sugere, as mais diversas temáticas. Comumente trazia textos retirados de outros periódicos que circulavam no Brasil durante o período. Falavam sobre o país, emitiam opiniões acerca do cenário político instável, e com discurso patriota comentavam os rumos do país. Eventualmente se pôde constatar interação por parte do redator que escrevia comentários relacionados ao assunto. Foi observado também, em menor frequência, textos com caráter reflexivo.

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