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Segundo Bakhtin, (1968:40) a máscara é o tema mais complexo da cultura folk Ela está ligada à alegria da mudança e reincarnação com "uma relatividade festiva e com a negação da uniformidade Está relacionada à

transição, metamorfose, violação de fronteiras naturais, descárneo e apelidos familiares." O autor chama a atenção para a figura do "diabo", na Idade Média, como ambivalente, festiva, expressando o ponto de vista "não oficial". (Op. Cit., 38). Corroborando as mesmas idéias, Yamaguchi (1977:56) aponta para o significado da maquiagem e da máscara no teatro japonês tradicional, e argumenta:"A maquiagem, como a máscara, assinala um estado de possessão por um espírito divino ... "

"É difícil a gente lembrar tudo. Quando é o som da bateria, influe muito. Dá uma vibração louca. O couro come lá, aquilo vem tudo na idéia, parece que chama, provoca."

Visitar, com a Folia, terreiros de Umbanda, e até sair com a Folia, na noite de Natal, de um gongá, conforme já citamos em capítulo anterior, faz parte já da gramática do ritual, que, segundo as informações dos foliões, já pressupõe comportamentos específicos em tais situações, não deixando de ser, no entanto, sempre motivo de tensões, conflitos e acusações mútuas.

Sobre esta questão, Fernandes (1982: 126) aponta para uma citação de Brandão ao pesquisar o que chamou de " violência ritual no catolicismo popular", que parece exemplar . Segundo o autor, Brandão analisou a

maneira como grupos de Congada e Moçambique e mesmo as Folias de Reis

passam a incorporar secretamente certas práticas da tradição africana, como forma ilegítima de fazer face aos conflitos em que se envolvem. O depoimento prestado a Brandão pelo embaixador de uma Congada de ltapira parece significativo:

"Outros falam: macumba? Não tem macumba!. Tem macumba. Todo mundo tem, é questão de querer usar. Essa parte da congada eu não uso. Eu tenho minha fé em deus, na Virgem Maria nossa mãe, nas Três Pessoas da Santíssima Trindade, no meu glorioso São Benedito. Eu não uso isso, não vou atrás disso. Mas na parte da congada existe essas coisas. O senhor sabe, essas congadas que existe lá em Minas, essas parte de quatro, cinco congada, às vezes a pessoa tá dançando, dançando assim, quando vê um morre lá, um cai morto lá. É demanda, é demanda!"

Velho (1991) chama atenção para o que seria uma característica da cultura brasileira: a existência de uma linguagem básica, atravessando toda a

o

possessão. "Transe, possessão

e

mediunidade são fenômenos religiosos recorrentes na sociedade brasileira. No candomblé, na umbanda, no espiritismo, no pentecostalismo e em outros grupos religiosos, entidades, espíritos, guias, o Espírito Santo, orixás, descem ou sobem, se incorporam, se comunicam etc através de cavalos, aparelhos, ou do que costumamos denominar de indivíduo agente empírico ... "(Op.Cit. p.124) Fernandes (1982: 135) vai discutir o universo das religiões populares na sociedade brasileira enquanto "visões de um mesmo mundo". Segundo o autor,"igrejas dos padres são visitadas por pessoas religiosamente vestidas de branco; pastores pentecostais são capazes de nomear as muitas faces de Exu; personagens do candomblé declaram-se católicos no censo, com conhecimento de causa. Cada um deles é capaz de traduzir as palavras e imagens dos demais com seus próprios termos ... Os principais elementos são do conhecimento geral: natureza, seres humanos, almas dos mortos, divindades positivas e negativas, um deus soberano. Com estes elementos básicos, um mundo comum é composto; mas o relacionamento entre as partes varia segundo as diferentes visões ... "

Em matéria de destaque, veiculada pela imprensa, no ano de 198613 D. Neuma, "primeira dama de Mangueira", à época, falava que "60% da população do morro está entrando para alguma seita, igreja ou Assembléia de Deus,(ela não sabe definir bem o quê) " refletindo-se imediatamente esta adesão no abandono do "samba".

Movimento semelhante se notava com relação à participação nos grupos de Folias de Reis: não pelas razões ideológicas, que parecem estar implícitas no discurso de D.Neuma, num antagonismo entre o "samba" e os movimentos neo protestantes, especialmente as denominações pentecostais; mas por razões práticas. Dificuldades de horários e datas tornava a participação de

e

foliões em terreiros de Umbanda e Centros Espíritas inconciliável com a "saída" dos grupos de Folia, especialmente nas noites de sábado. Ouví inúmeros relatos que se referiam à ausência de um folião justificada pela sua adesão a tais cultos. Se por um lado, a gramática da relação Folia/Umbanda, Folia/Cultos Afro parece ser uma só: foliões participando de ambos os rituais, folias visitando terreiros, palhaços "fechando o corpo", por outro parece existir a idéia básica de que a Folia seja autônoma, sem se vincular a um ou outro culto a uma ou outra liturgia, em termos de subordinação:14

"Folia não anda em macumba. Chega, canta três versos e sai. Os três Reis nunca andaram em macumba. São livres! " (Teixeira, dono Mangedoura).

A Folia de Reis e o poder público:

a. A relação com as instituições culturais, Os orgãos de repressão e a política No Rio de Janeiro, no âmbito do governo estadual, a partir de 1974, com a fusão dos Estados da Guanabara e Rio de Janeiro, houve uma ativação do Departamento de Cultura da então Secretaria de Educação e Cultura, e o incremento de projetos e experiências no tocante ' a "cultura"e ao "povo", na busca de seu perfil e de sua identidade. Os "Pacotes Culturais" - experiência de levar a cultura às comunidades de todo o Estado, os "Encontros Municipais de Folclore", com o incentivo de apresentação das tradições locais em praças públicas e ginásios esportivos, os "cursos de folclore" disseminados entre os professores, alunos, a comunidade, o Estado, foram experiências da década de 70, e posso citar os nomes de Paulo Affonso Grisolli - em nível de direção estadual - e de Cáscia Frade, que vai então

14 Fernandes (1982: 111) aponta para os diferentes modos de se conceber as diferenças, tratando da igreja