• Nenhum resultado encontrado

François Cheng é um chinês naturalizado francês que veio a se tornar uma das vozes mais brilhantes desse encontro das culturas francesa e chinesa, tendo o mérito de conjugar a força da tradição da China Clássica com o espírito francês. Fez da poesia o caminho principal desse encontro. Sua poesia é hoje considerada tanto chinesa quanto francea.

É importante destacar que o Mandato do Céu, mesmo sendo uma instância normativa não se restringe a uma lei, uma legislação. Ele implica além da normatividade, uma ética. Há o mandato celeste, mas se o soberano não agir conforme o que lhe compete, ele pode ser destituído. Para Confúcio, deve haver uma correspondência entre as relações de família e de Estado. Um filho deve obediência ao pai do mesmo modo que o súdito para com o soberano. Porém, se cabe ao súdito ser leal, cabe também ao soberano ser benevolente e um exemplo, caso contrário pode até perder o Mandato do Céu. Portanto a dimensão ética é indissociável. “Se há uma ética da psicanálise - a questão se coloca -, é na medida em que, de alguma maneira, por menor que seja, a análise fornece algo que se coloca como medida de nossa ação” (Lacan, 1960/1988, p.374).

A psicanálise procede por um retorno ao sentido da ação. Eis o que justifica, por si só, que estejamos na dimensão moral. A hipótese freudiana do inconsciente supõe que a ação do homem... tem um sentido escondido para o qual se pode dirigir. (Lacan, 1960/1988, p.374).

É na sequência dessa questão que Lacan introduz Mêncio no seminário A ética da psicanálise: “Isso nos põe diante da mais velha questão. Um denominado Mêncio... nos diz que ela se julga da seguinte maneira – a benevolência está na origem natural do homem” (Lacan, 1960/1988, p.375). O que está em questão é a “relação da ação com o desejo que a habita” (Lacan, 1960/1988, p.375). E ainda:

84

Talvez uma leitura mais detalhada demonstre um posicionamento político de Lacan quanto ao movimento maoísta nas décadas de 1960 e 1970, mas não é o alvo da minha investigação.

150

Falei-lhes a pouco de Mêncio. Após ter sustentado essas palavras que vocês estariam errados em acreditar otimistas, sobre a bondade do homem, ele explica muito bem como é possível que aquilo de que se é mais ignorante, seja as leis na medida em que vêm do céu, as mesmas leis de Antígona. Sua demonstração é absolutamente rigorosa, mas é tarde demais para que eu diga aqui para vocês. As leis do céu em questão são justamente as leis do desejo. (Lacan, 1960/1988, p.389).

O que Lacan chama aqui de leis do céu é o Mandato do Céu. Considero mais apropriado manter a terminologia de “Mandato” no lugar de “lei” em função da dimensão ética que lhe é inseparável. Como o próprio Lacan observa, a noção de benevolência não tem nada a ver com ser bom ou mau. Ela se articula com a relação do sujeito com suas ações. É isso que está em jogo em Confúcio e retomado por Mêncio, a dimensão da relação do ser com relação ao seu ato. A respeito da ignorância do sujeito devido ao Mandato do Céu – mencionada acima na citação –, decorre do fato de que para o confucionismo, esse mandato está além das nossas possibilidades de intervir. É entre o mandato celeste e a sua natureza que o ser terá que encontrar seu lugar.

Sollers também criticava a preservação dos ritos. Há uma aproximação possível dos ritos com a questão que acabamos de comentar. O livro canônico Liji 禮記 (Livro dos Ritos)85 é um dos livros fundamentais do confucionismo. O ensinamento de Confúcio se apoia em três eixos fundamentais: a aprendizagem, a qualidade humana (o discurso confucionista é basicamente uma palavra sobre o homem), e o espírito ritual.

Este’’’ ensino se inicia com uma disposição para aprender, o que quer dizer que ele acredita que o caminho do homem visa o aperfeiçoamento. Portanto, sua posição não é a de doutrinamento, mas de uma orientação para a tomada de uma posição que é a de alguém sempre pronto a ouvir, o outro, a natureza, a si mesmo. Isso estabelece em que termos se ergue a noção de saber para o chinês. A figura do sábio, tradicionalmente atribuída a Confúcio, se difere daquela do filósofo grego, com exceção parcialmente feita a Sócrates. Os diálogos de Confúcio, reunidos num livro chamado Analectos, demonstram que suas respostas aos seus interlocutores são, via de regra, breves e lacunares. Ele não era um doutrinador, e tais respostas destes diálogos assumem um formato quase aforismático. Nesse sentido o Sábio não é aquele que é portador de um saber que transmite aos discípulos. Ele veicula um saber suposto. Como aponta Jullien

85

Mencionado por Lacan na lição na lição de 22 de abril de 1959 (O desejo e sua interpretação). Volta a abordá-lo em 6 de janeiro de 1972, em O saber do psicanalista.

151 (1998/2000), sábio não tem ideia: “Na China, onde não se erigiu o edifício da ontologia, a sabedoria é o ‘caminho’: o sábio, diz-se de Confúcio, por não ter parti pris, ‘não tem ideia’” (Jullien, 1998/2000, p.9). E “Não ter ideia significa que ele evita por uma ideia à frente das outras... não há ideia que ele ponha em primeiro lugar, posta em princípio, servindo de fundamento ou simplesmente de início, a partir do qual seu pensamento poderia se deduzir, ou pelo menos se desenvolver” (Jullien, 1998/2000, p.13).

A sabedoria para o pensamento chinês não está em relação a um conteúdo doutrinário ou catedrático, por isso nunca se preocuparam com a argumentação e com o debate filosófico tal como o conhecemos a partir dos gregos. A sabedoria, completamente desinteressada pela argumentação lógica se coloca numa disposição para o real. O sábio não ter ideia significa que, não se orientando por um significante mestre qualquer de uma doutrina, ele pode estar em condições de lidar com as transformações da realidade, com a contingência, com as desordens do real. Confúcio nasceu e viveu num período muito conturbado da história da China, período de declínio da dinastia Zhou86 no qual as guerras eram frequentes. A tensão social, as dificuldades provenientes dela, assim como a instabilidade da sua própria vida, podem ter sido uma inspiração para tomar essa postura frente ao real. Portanto, a sabedoria chinesa não dialoga com o conhecimento, mas sim com a dimensão do ato e do real.

A filosofia ocidental tem um problema com a sabedoria. Inicialmente, bastava haver uma hierarquia bem definida em que a sabedoria funcionasse como um ideal, de modo que a filosofia poderia, por pudor, manter-se diante dela. Platonicamente, a filosofia só poderia amar a sabedoria (Jullien, 1998/2000). Bastou algum tempo para que o ideal se transfigurasse e mudasse de posto, se tornando uma espécie de subfilosofia (Jullien, 1998/2000). O princípio matemático da proporção ou mesmo o ensinamento socrático da moderação não foram suficientes para definir a virtude. Coube a Aristóteles dar um estatuto teórico a um justo meio entre o excesso e a falta: mas, posteriormente, “com a vulgarização do aristotelismo, a noção perde seu rigor e se estiola, ela se rebaixa (s’aplait) a conselho de prudência, coincidindo com o ‘nada de exageros’ da opinião

86 Período conhecido como Primaveras e Outonos (772-481 a.C). Este período antecedeu aquele chamado de Reinos Combatentes (403-256 a.C.) que por sua vez precedeu à unificação da China que inaugura a Dinastia Qin. Lacan mencionou o período dos Reinos Combatentes na lição de 12 de março de 1958, As formações do inconsciente.

152 comum. O justo meio torna-se meio-termo” (Jullien, 1998/2000, p.31). A sabedoria do meio em Confúcio é justamente o oposto disto.

Ainda estamos na questão de que um sábio não tem ideia, e que precisa se posicionar de tal modo que aprenda com os encontros com o real, seja diante de um ponto em que o real se imponha ao simbólico, fazendo furo, seja diante da mentira do realmente simbólico que sempre repete, voltando ao mesmo lugar. Uma demonstração de François Jullien me parece ilustrativa, em que ele exemplifica com o Clássico das Mutações Yi jing (易经, I Ching). Neste, a figura básica é o hexagrama, que decorre de uma outra ainda mais elementar, que é o trigrama. Um hexagrama é composto por seis linhas horizontais, continuas ou não, que é composto por dois trigramas, um sobre o outro. Porém, entre o trigrama superior e o inferior não há espaço para um outro traço, que funcione como um traço mediano, um meio termo entre os dois trigramas. Disso decorre que, não há um meio, não há um centro. O hexagrama, a exemplo do sujeito da psicanálise, não tem um centro. O descentramento do hexagrama corresponde ao descentramento do sujeito. Essa figura, sendo composta por dois trigramas, estes sim, cada um tendo um traço médio, acaba fazendo com que o hexagrama tenha virtualmente, dois centros. Se o caminho a ser seguido for um hipotético meio termo, o hexagrama mostra que não há meio termos, há meios termos. Estamos diante de diversos caminhos possíveis, não há uma medida de orientação prévia, não há qualquer possibilidade de uma medida regulatória.

O justo meio para o pensamento chinês é o oposto do meio-termo, sendo, em verdade,a resposta para a impossibilidade prática do segundo. Não há uma posição que fixe o sábio. Ele pode ocupar tanto um extremo quanto o outro, conforme o que a situação exija. O justo meio do confucionismo se equivale ao vazio do taoísmo e do zen budismo. Consequentemente, a nobreza na visão de Confúcio, não está na condição de nascimento e na categoria social, esta no aprendizado para se tornar o que ele chama de homem de bem.

Porém, não podemos nos assegurar do ponto que cada um está nesse caminho do aprendizado, e nem por isso deixamos de viver em sociedade. Então entra em questão o convívio com o outro, na sociedade. Comportar-se como homem, como um homem de bem, é comportar-se ritualmente.

153 O caractere Li 禮, que significa rito, é composto pelo radical (que fica à esquerda) que se refere às coisas sacras, seguido ao lado e acima pelo caractere que indica um caldo de cereais, um alimento de cereais, e logo abaixo dele uma taça, que designa um vaso sacrificial:

Por extensão o significado deste caractere é um ritual sagrado de sacrifício. Mas o que interessa a Confúcio não é exatamente isso:

não é o aspecto propriamente religioso do sacrifício à divindade, mas a atitude ritual de quem nele participa. Atitude primeiramente e, sobretudo, interior, compenetrada da importância e da solenidade do ato em curso, que nada mais faz do que traduzir-se externamente por um comportamento formal controlado.

A dimensão ritual do humanismo confuciano confere-lhe uma qualidade estética, não apenas na beleza formal do gesto e no requinte sutil do comportamento, mas pelo fato de haver nisto uma ética que encontra sua justificação nela mesma, em sua própria harmonia. Daí a associação natural entre os ritos e a música, expressão por excelência da harmonia. (A. Cheng, 2008, 78).

Há todo um acento posto sobre a dimensão do ato. O ritual visa à atitude em diversas esferas, mas exige para que tenha seu lugar, que não seja uma encenação. A estética do ato não responde aos fins a que ele visa. Há uma exigência de uma conformidade entre o enunciado refletido no gestual ritualístico, com a enunciação, que, se não pode ser averiguada por um juiz externo, é ainda assim o ponto que é visado. O ritual deve ser indissociável da enunciação que ele porta, pois é este seu principal ponto de mira.

O Mandato do Céu coloca em questão a ética do desejo como apontado por Lacan. O rito coloca em questão a dimensão do ato e da enunciação. Não é à toa que encontramos um trecho dos Diálogos de Confúcio que se assemelha com uma passagem do Seminário 24: “O Mestre disse: ‘Erguer-se com os Poemas, firmar-se com os Ritos,

154 completar-se com a Música’.”87 (VIII, 8) (Confúcio, 2012, p. 262). Os poemas aqui mencionados são aqueles que compõem o Clássico da Poesia, Shi Jing. Não tem um autor, são poemas reunidos em todo o império sendo agrupados num conjunto de 305 poemas de temas variados, para servirem de uma orientação moral e ética para o convívio social. Lacan aborda o Shi Jing no Seminário sobre A identificação:

na rima das antigas poesias, principalmente aquelas do Chi King que é um dos exemplos mais fabulosos das desventuras literárias, uma vez que ele teve o destino de se tornar o suporte de todas as espécies de elucubrações moralizantes, de ser a base de todo um ensino muito enrolado dos mandarins sobre os deveres do soberano, do povo e do tutti quanti, ainda que se trate principalmente de canções de amor e origem camponesa. (Lacan, 1962/2003, p.138).

Aqui fica clara a junção da poesia com os ritos, a aprendizagem para tornar-se o homem de bem e consequentemente com a dimensão moral e ética no confucionismo. Antes de prosseguir neste comentário, é importante ressaltar que a referência à poesia chinesa no Seminário 9 nada tem a ver com a escrita poética chinesa da qual fala Cheng e que Lacan a aproxima da interpretação analítica. Esta última se refere à poesia da Dinastia Tang (618-907 d.C.), enquanto que o Shi Jing foi uma compilação feita pelo próprio Confúcio (551-479 a.C.). O critério de seleção destes poemas foi menos pelo seu valor estético e literário do que por servirem de exemplos diversos sobre a vida comum daquele tempo, daí Lacan dizer que tenha servido para elucubrações moralizantes. Como um dos livros Clássicos a sua leitura e estudo passou a ser obrigatório, e falar de ensino para um chinês equivale a decorar um texto. Cada Clássico deveria ser decorado, um chinês médio deveria sabê-los de cor, para só então começar a tentar entendê-los. Na base das relações sociais que são reguladas pelos ritos, estão os poemas clássicos. A poesia para o chinês não é sinônimo de erudição, ela faz parte da sua educação mínima, o suporte dos ritos, da relação em sociedade se encontra na leitura e recitação das poesias.

87

Essa é a tradução direta do chinês para o português feita por Giorgio Sinedino, publicado pela editora UNESP. Sua forma é bem sintética tentando reproduzir ao máximo o estilo do chinês tradicional. Há uma outra tradução utilizada por Anne Cheng que perde um pouco na concisão da língua mas está mais acessível ao e te di e to de ó ocide tais: U ho e desperta pela leitura das Odes, afirma-se pela pr tica do ritual e chega perfeição a har o ia da úsica A. Che g, 200 , p. . As Odes se refere ao Clássico das Poesias, compilado por Confúcio, reunindo em 305 poemas a síntese do que ele considerou ser o principal da poesia e canto chineses até então. Este juntamente com outros cinco, compõem os maiores clássicos do pensamento chinês.

155 Isso sem dúvida é um aspecto importante de ser levado em conta. Afinal, já vimos que o Mandato do Céu é uma instância normativa e ética, que Lacan relacionou com a lei do desejo; o aprendizado do justo meio ou do vazio, coloca o sujeito em relação a uma modalidade de saber que se depara com o real e não com o conhecimento; bem como os ritos se referem a uma posição quanto ao ato e à enunciação. Pensar a poesia na base desse percurso nos dá uma ligeira ideia do que significa poesia a partir de um ponto orientado, pelo oriente.

Assim como Mêncio, Zhu Xi88 foi um grande comentador de Confúcio, cito o resumo do seu comentário sobre as palavras do Diálogo acima:

os Poemas tratam da natureza humana (性, xing) e das emoções (情, qing) no que elas têm de bom e ruim. O Estudo começa por ele porque é fácil de memorizar, sua linguagem é simples e sua musicalidade faz as emoções entrarem nos corações. Além disso, como os jovens se iniciam no Estado ainda não são capazes de distinguir entre o bem e o mal, por isso os Poemas têm o poder de provocar nele as primeiras sensações

de que preferem o bem ao mal, por isso o Mestre usa o termo ‘erguer-se’ (que, em chinês, tem também o sentido de ‘fazer surgir’ ou ‘suscitar’). Em seguida, Zhu Xi

ensina que os Ritos são baseados na cordialidade, no respeito e na humildade. A vantagem de usá-los para incutir essas virtudes nos discípulos é que eles dão mandamentos concretos, é uma verdadeira disciplina do corpo e pode até definir expressões físicas. Nessa etapa intermediária do estudo, os discípulos já são capazes de se estabelecer como sujeito moral; como lembra Zhu Xi, ‘pôr-se de pé’ ou ‘firmar-se’ é não ser influenciado pelas tentações que vêm de fora. Por último, os discípulos devem se dedicar à música, que na China antiga era não só a produção de sons por meio de instrumentos, mas também o canto e a dança. No currículo confuciano, a música era uma disciplina de categorização do mundo psicológico dos homens: especificava emoções e virtudes e lhes atribuía sons ou cadências com o intuito terapêutico. Ela também era capaz de delimitar abstratamente o espaço de convivência e o relacionamento entre as pessoas, determinando uma hierarquia social. [grifos meus] (Confúcio, 2012, p. 263).

Cheng Baoyi89 程抱 nasceu em Nanchang, ao sul da China, no ano de 1929, quando Lacan já contava com 28 anos – estando os dois separados por uma geração e por dois continentes distintos. Cheng era de uma família de universitários, cujo pai era especialista em ciências da educação. Entrou para a universidade de Nankin, mudando-

88 Zhu Xi (1130-1200) é um dos grandes comentadores de Confúcio, considerado como a palavra final sobre o Mestre. Nas palavras do tradutor da edição brasileira de Os Analectos: “A transmissão do Caminho começa com Confúcio, continua com seu discípulo Zeng Shen, e passa pelo neto de Confúcio Zisi para chegar a Mêncio. Por esse motivo adotamos o comentário de Zhu Xi como o referencial para entendimento do texto principal” (Confúcio, 2012, p. 28).

89

Lacan dá um outro nome para Cheng, Tai Tchen e não Baoyi. Seria, pela referência de Lacan, Cheng Tai Tchen e não Cheng Baoyi...

156 se para a França para estudar graças ao pai, e logo se interessa pela literatura francesa, área que se dedicará a ponto de se tornar membro da Academia Francesa em 2002. Ele e Lacan iniciarão uma parceria exatamente vinte anos depois do nascimento de Cheng, parceria esta que trará frutos para ambos.

Frequentador do curso de Paul Demiéville no Collège de France, Cheng inicia em função deste contato um trabalho no Centre de Linguistiques Chinoise90. Paralelamente, publica na China algumas traduções, em chinês, da poesia moderna francesa. Em 1968, diante de uma banca composta por Roland Barthes e Julia Kristeva defende uma tese a respeito de um texto de Zang Ruoxu, um poeta da dinastia Tang. Esse trabalho teria chamado a atenção tanto de Barthes quanto de Kristeva. A partir do ano seguinte, sua carreira universitária tem um impulso. É o período que conhece e passa a frequentar os cursos de Gilles Deleuze e de Henri Maldiney na Universidade de Paris – VII, se tornando mestre de conferencias em 1974, e depois professor do Institut National des Langues et Civilisations Orientales (INALCO) (Porret, 2008). Ainda em 1969, com sua carreira universitária iniciando de forma brilhante, aguardava o pedido de naturalização e iniciava o trabalho com Lacan.

Lacan havia encontrado um interlocutor que já havia despertado o interesse e a admiração tanto do seu antigo mestre na língua chinesa, Demiéville, quanto de Barthes e de Kristeva, antes mesmo desta se tornar psicanalista. Além de ser alguém que mesmo que num momento inicial, já circulava entre a elite intelectual francesa. O encontro se deu durante o período do seminário De um Outro ao outro. A proposta feita por Lacan a Cheng era de realizarem encontros informais sem um programa predefinido. Mais do que retomar suas aulas de chinês, o interesse de Lacan era o de que estudassem juntos alguns termos e sentenças em chinês, que pudessem vir de textos clássicos, da literatura ou das artes chinesas em geral, além dos estudos sobre a língua. Lacan tinha Cheng como um repetidor privado, alguém de que pudesse ouvir em chinês algumas passagens que lhe interessasse, e ao mesmo tempo um auditório ou comentador privilegiado. Por inúmeros encontros, Lacan pôde ser ouvido e frequentemente interpelado para eventuais correções e redirecionamentos a respeito de suas construções que envolviam os temas debatidos.

90Posteriormente se tornará o Centre de Recherches Linguistiques sur l’Asie Orientale na École des