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II. SEGURANÇA E A NOVA ORDEM MUNDIAL: MUDANÇA DE PARADIGMAS?

2.1 O debate teórico da Estratégia americana

2.1.3 Segurança Cooperativa

Para os defensores da estratégia de segurança cooperativa o interesse dos EUA em garantir a paz mundial só será alcançado através da ação conjunta e multilateral. Ao contrário da tendência do engajamento seletivo que visualiza nas grandes potências um possível foco de conflito, para os teóricos da segurança coletiva as grandes potências são centrais na participação da manutenção da ordem internacional.

Por serem formadas na sua maioria por democracias e Estados que compartilham de diversos valores, dificilmente estes entrariam em guerra entre si, e estariam, na verdade, mais propensos a promoverem a segurança de maneira coletiva38.

Segundo Posen e Ross (1996/1997) a segurança cooperativa representa um esforço para superar as lacunas produzidas pela teoria tradicional da segurança coletiva. Para ambas uma agressão provindo de qualquer lugar contra qualquer um não pode ser permitida, ambas concordam que a cooperação internacional deve ser utilizada para deter e prevenir possíveis agressões, porém, a segurança coletiva tradicional refere-se a aspectos restritos à determinado grupo ou aliança formada por Estados soberanos, enquanto que a segurança cooperativa funcionaria em nível mais amplo, global, incluindo atores não estatais, e por isso compreende a resolução de conflitos transnacionais tais como o terrorismo.

38 A teoria da paz democrática defende que as democracias liberais dificilmente entram em guerras umas contra as outras, ou seja, vincula diretamente a idéia de paz ao regime democrático. Assim, duas democracias estariam menos propensas a entrar em guerra do que duas ditaduras, ou uma democracia e uma ditadura. Esta teoria teve suas bases fundamentas da tese de Immanuel Kant desenvolvida em À paz perpétua (1795).

A estratégia da segurança cooperativa depende de instituições internacionais legítimas, capazes de coordenar ações coletivas. Estas instituições são indispensáveis num processo mais longo que visa à construção de confiança e o convencimento de que todos os possíveis agressores à ordem internacional serão combatidos. Uma estratégia de segurança cooperativa requer novas formas de inteligência, leis que reforcem a cooperação, um sistema diplomático intenso, reorganização da burocracia da segurança nacional dos países e novas formas de ajuda internacional.

Janne Nolan (1991) reconhece que este tipo de estratégia dificilmente será possível num cenário onde os Estados desenvolvidos não adaptem suas políticas exteriores e domésticas aos princípios da segurança cooperativa. Para a autora os princípios que norteiam a segurança internacional dos EUA são produtos de um sistema internacional cujas características não mais existem, e eram baseadas no conflito latente entre duas superpotências onde a proeminência dos EUA dificilmente era questionada.

No cenário atual as ações dos EUA passarão a ser cada vez mais questionadas e o país será invariavelmente compelido a agir de acordo com certa forma de aprovação internacional, evitando posturas unilaterais. Neste sentido, Nolan afirma que “However reluctant some may be to come to the conclusion, there nonetheless is a growing awareness that U.S. military power cannot be used without an internationally supported framework that accords it legitimacy” (NOLAN, 1991, p.179).

Para que haja uma adesão à segurança cooperativa de maneira efetiva é necessário que exista uma interdependência estratégica de maneira a instaurar uma lógica que conecte a segurança dos EUA e de seus aliados à totalidade dos problemas de segurança internacional. Tendo isto em vista, os conflitos intra-estatais não devem ser desconsiderados ou marginalizados, como pontuam os autores do isolacionismo e do engajamento seletivo. Estes conflitos são compreendidos como ameaça ao sistema internacional como um todo, na medida em que podem se expandir e se tornarem conflitos inter-estatais e, mesmo que não envolvam grandes potências, guerras civis podem atrair intervenções externas, e desta maneira, precipitar conflitos internacionais. Além disso, a ferocidade neste tipo de conflito é muito alta, e seu precedente deve ser evitado em escala mundial, para isto ações militares de cunho humanitário são essenciais.

Para Nye Júnior (1990), os EUA não procuram se tornar um império ou uma potência hegemônica que subordine as outras nações em posições servis. Ao contrário, o país tem

preferido estimular o reavivamento econômico e as alianças estratégicas, como fez durante a Guerra Fria para contrabalancear com o poder soviético na Europa e Ásia. Para o autor, no pós- Guerra Fria uma nova estratégia é necessária, mas não deve ser muito diferente daquela que já tem sido desenvolvida. Nye Jr. (1990) também discorda que os EUA devam se desengajar internacionalmente, uma vez que isso produziria uma maior instabilidade internacional, ainda que favoreça a percepção de aumento da multipolaridade e afirma, ainda, que o afastamento dos EUA de compromissos internacionais não vai fazer com que as animosidades internacionais se arrefeçam, ou seja, o terrorismo, tráfico de drogas, epidemias tais como a AIDS vão continuar fazendo parte da rotina dos EUA, queiram os americanos ou não.

De acorodo com Nye Júnior (1990) a estabilidade do sistema internacional irá depender da capacidade dos Estados em promover ações coletivas para solucionar os problemas contemporâneos, considerando-se não apenas as ameaças tradicionais e as possíveis guerras entre Estados, mas também os problemas transnacionais. Para isso, a ação conjunta internacional será imprescindível e os EUA não podem se abster de liderar este processo, sendo assim:

Absence of leadership by the largest country would reduce the ability of all states to deal with such problems of interdependence. Managing interdependence is a major reason for investing American resources for international leadership and must be central to a new strategy (NYE JÚNIOR, 1990, p.518).

Nye Júnior (1990) considera que as novas ameaças internacionais, a crescente interdependência e a difusão de poder entre Estados pequenos e atores privados, exigirão dos Estados Unidos um poder para organizar os Estados em atitudes cooperativas, porquanto nem os EUA, nem qualquer outra grande potência poderão encarar estes desafios de maneira isolada.

Outro fator relevante e que pede por ação conjunta é a questão do controle de armas de destruição em massa através de acordos de não proliferação, transparência e medidas de construção de confiança. O uso da força também é considerado contra Estados que agridam os acordos pré-estabelecidos, o que criaria ainda um caráter dissuasório destas medidas. Isto tornaria menos provável a ocorrência de ataques e conflitos, mesmo de Estados fracos ou falidos que se sentiriam intimidados em utilizar estas armas, sendo coagidos pela estrutura preventiva e punitiva organizada. Proliferação é um ponto-chave da estratégia de segurança cooperativa, uma vez que, quanto mais países detentores de armas de destruição em massa (ADM) existirem, maiores serão os riscos para as Organizações Internacionais atuarem livremente e terem o poder de intimidar

aqueles que as possuírem. Caso as organizações percam esta capacidade, rapidamente este sistema entrará em colapso, tendo isto em vista, uma guerra para prevenir o surgimento de novas potências nucleares seria razoável em algumas circunstâncias (POSEN; ROSS, 1996/1997, p.28).

A estrutura militar para dar suporte a este tipo de estratégia é majoritariamente defensiva, contudo, alguns Estados, incluindo os EUA devem ter forças militares superiores às necessárias para sua defesa nacional, as quais seriam disponibilizadas para formarem forças multinacionais, quando necessário. A contribuição dos EUA nestas forças multinacionais envolveria o país em diversas ações militares simultâneas, sendo que a cooperação dos EUA é fundamental para que ações deste tipo se desenvolvam.

Autores como Janne Nolan (1991) afirmam que o cenário da segurança cooperativa já está em construção, o que pode ser percebido pela ascensão de instituições tais como a ONU e o crescente nível de envolvimento e colaboração entre países para resolver crises tais como a da Somália, Bósnia, Haiti, etc.

Em última instância, o ápice deste cenário se daria na constituição de algo como uma espécie de federalismo mundial onde a capacidade dos EUA em agir sozinho seria eliminada e todos os países estariam submetidos a uma autoridade internacional.

Pragmaticamente o multilateralismo tem sido empregado para alcançar diversos objetivos, tanto pela administração Bush, quando Clinton, principalmente em decorrência dos recursos limitados e necessidade de apoio internacional.