• Nenhum resultado encontrado

Segurança do doente e cultura de segurança em Portugal

PARTE I. Enquadramento teórico

CAPÍTULO 2. Segurança do doente

2.2. Segurança do doente e cultura de segurança em Portugal

De acordo com o DQS (2014a) no desenvolvimento de estratégias de segurança do doente, as atitudes devem ser pró-ativas, preventivas e sistemáticas: para admitir que os incidentes para a segurança do doente acontecem, para identificar e gerir os pontos de risco nos processos, para aprender e minimizar os seus efeitos, para prevenir futuras ocorrências e encorajar simultaneamente, doentes e profissionais de saúde a comunicar estes incidentes. A Estratégia Nacional para a Qualidade na Saúde definida em 2009 pelo DQS, integrou a segurança do doente como prioridade estratégica a implementar a nível nacional (Despacho n.º 14223/2009, 2009, junho 24). Até aí, os esforços desenvolvidos em Portugal em matéria de segurança do doente eram, na sua maioria, baseados em iniciativas isoladas e nem sempre a avaliação era feita tendo em conta critérios de efetividade e de eficiência levando

à obtenção de resultados parcelares e de visibilidade reduzida (Sousa, et al., 2009). Após a criação do DQS em 2009, observou-se um salto qualitativo em matéria de segurança do doente. Sob a influência deste departamento foram desenvolvidas um pouco por todo o país as vias verdes sépsis, vias verdes trauma e as equipas de emergência médica intra- hospitalar. Foram definidos critérios para a criação de centros de elevada diferenciação, de centros de referência e de centros de tratamento para varias especialidades médicas e cirúrgicas, concentrando competências, experiência e recursos. Foi elaborado um manual de procedimentos em situações de catástrofe orientador dos planos de emergência interna a elaborar por cada instituição. O projeto da OMS “cirurgia segura salva vidas” foi lanado em todo o país (Dinis, 2012). No âmbito das medidas da melhoria da qualidade, foi iniciado um processo conjunto do DQS com a ordem dos médicos, no sentido de formar e constituir um grupo de auditores clínicos. Simultaneamente, Iniciou-se um processo conjunto com os conselhos clínicos dos agrupamentos de centros de saúde e as direções clínicas dos hospitais, com o objetivo de criar uma rede nacional para a governação clínica. Esta rede tem como objetivo incentivar e avaliar a implementação das normas de boa prática organizacional e clínica elaboradas pelo DQS e emanadas pela DGS (Dinis, 2012). Além dos projetos já enumerados e de outros também implementados ou em fase de implementação não mencionados, relembramos a implementação de um Observatório Nacional da Segurança do Doente, com o objetivo de gerir toda a informação relativa à segurança do doente e a criação e implementação do SNNIEA, anónimo e não punitivo, com caráter educativo e preventivo do erro (Dinis, 2012).

O conhecimento e compreensão das causas, frequência e impacto dos EA constituem uma parte fundamental do processo de avaliação e melhoria contínua da segurança do doente e da qualidade em saúde. Com o objetivo de caracterizar a frequência, natureza, impacto e grau de evitação dos EA em contexto hospitalar, a Escola Nacional de Saúde Pública com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian desenvolveram um estudo piloto em três hospitais públicos da região de Lisboa, com base na informação contida nos processos clínicos, metodologia utilizada a nível internacional (Sousa, Uva, Serranheira, Leite, & Nunes, 2011). A amostra foi constituída por 1 669 processos clínicos de doentes internados, de um total de 47 783 admissões referentes ao período de 01 de janeiro a 31 de dezembro de 2009. A taxa de incidência de EA foi de 11,1%, dos quais, cerca de 53,2% foram considerados evitáveis. A maioria dos EA (60,3%) não causaram dano ou resultaram em dano mínimo, mas 58,2% dos casos resultaram em prolongamento do período de internamento, cujo valor médio se situou nos 10,7 dias. Os resultados obtidos identificaram uma realidade, não muito diferente da que foi descrita em estudos similares, realizados em vários países da Europa (Inglaterra,

Franca, Espanha, Dinamarca, Suécia e Países Baixos), nos EUA, na Austrália, no Canadá, na Nova Zelândia e no Brasil.

Em 2011, o DQS em parceria com a Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Hospitalar, realizou, entre junho e setembro, um projeto piloto com 7 hospitais de norte a sul do país, envolvendo 21985 questionários. Pretendia-se com esse projeto, disponibilizar às instituições de saúde, uma ferramenta para avaliar a cultura de segurança do doente, de forma a fortalecer o empenho contínuo de melhoria da qualidade. Para o efeito, foi utilizado o questionário Hospital Survey on Patient Safety Culture da Agency for Healthcare Research and Quality, dos EUA, traduzido e adaptado ao contexto português por Margarida Eiras em 2008 (Portugal, MS, DGS, DQS, 2011b). Esta é uma das ferramentas recomendada aos Estados-Membros pelo projeto europeu European Network for Patient Safety e com este projeto pretende-se igualmente ir ao encontro da recomendação do Conselho, de 9 de Junho de 2009, sobre a segurança dos doentes, incluindo a prevenção e o controlo de IACS, designadamente na recomendação cinco (5.), que insta os Estados-Membros a classificar e a medir a segurança dos doentes (Conselho Europeu, 2009). O objetivo principal do projeto europeu foi desenvolver uma rede europeia de colaboração na segurança do doente e projetos em cinco áreas de trabalho coordenadas em rede; o nosso país participa apenas em 4 delas: 1) cultura em segurança clínica; 2) sistemas de notificação e aprendizagem; 3) estudos-piloto (erros medicamentosos e educação): ferramentas e soluções e 4) promoção e disseminação de conhecimentos. A quinta é a educação e formação (Portugal, MS, DGS, 2013b). Outro estudo realizado em 2011 com uma amostra de 2449 participantes de sete hospitais públicos de norte a sul do país revelou uma resposta ao erro não punitiva de 41,0%, foi a dimensão com valor mais baixo, ao invés do trabalho em equipa com 73,0% de respostas positivas. Da avaliação das dimensões concluiu-se que a frequência da notificação com 44,0% de respostas positivas, a dotação de profissionais com 47,0% e o apoio à segurança do doente pela gestão com 48,0% de respostas positivas, são as que, de forma prioritária, carecem de ações de melhoria. Avaliaram ainda o número de notificações efetuadas por cada profissional nos últimos 12 meses e a avaliação geral que cada um fazia sobre a segurança do doente, concluindo que 73,0% referiu não ter efetuado qualquer notificação, 17,0% notificou 1 a 2 eventos; 7,0% notificou 3 a 5, 2,0% notificou 6 a 10 e apenas 1,0% notificaram 11 a 20 eventos/ocorrências. Quanto à avaliação geral da segurança do doente, 45% classificou-a como ‘muito boa’, 42,0% como ‘aceitvel’, 6,0% de ‘excelente’, 5,0% ‘fraca’ e 1,0% de ‘muito fraca’. Resultados que demostram uma perceção positiva dos profissionais sobre a segurança do doente (Eiras, et al., 2011).

É desejável que a avaliação da cultura de segurança seja efetuada regularmente para que se possa analisar a evolução. Neste sentido a DGS emitiu a norma nº 25/2013 que no número um (1) refere que o questionário "Avaliação da Cultura de Segurança do Doente nos Hospitais Portugueses” deve ser aplicado em 2014 em todos os hospitais do Sistema de Saúde (Portugal, MS, DGS, 2014a), não existindo à data quaisquer dados desta avaliação.