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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Segurança do paciente: um breve histórico

O conhecimento de que o paciente é colocado em risco ao receber cuidados relacionados à sua saúde não é tema novo. Estudos relacionados a essa temática iniciaram há, aproximadamente, trinta anos. Em 1974, nos Estados Unidos, foi realizado um estudo pioneiro, pelo California Medical Association e a California Hospital Association, intitulado “The Medical Insurance Feasibility Study” (MIFS). Esse estudo foi solicitado por seguradoras de saúde ao se depararem com um grande número de benefícios requeridos pelos segurados. No estudo foram revisados 21mil prontuários em 23 hospitais da Califórnia, identificando-se eventos adversos em 4,6% dos pacientes hospitalizados (ZAMBON, 2008).

Em 1991, no estudo "The Harvard Medical Practive Study”, foram revisados 30 mil prontuários de pacientes que receberam alta de hospitais em Nova York. Evidenciaram-se eventos adversos em 3,7% dos casos, sendo que 13,6% levaram o paciente ao óbito (ZAMBON, 2009). Um dos integrantes dessa pesquisa, Lucian Leape, médico e professor da Harvard School of Public Health, publicou em 1994, no Journal American Medical Association (JAMA), o artigo “Error in Medicine”, considerado o primeiro clássico na literatura da saúde, sugerindo a necessidade de uma abordagem sistêmica da segurança.

Em 1999 a divulgação do relatório “To Err is Human: Building a Safer Health System”, do Institute of Medicine (IOM), desencadeou o movimento da segurança do paciente, após divulgar dados alarmantes sobre erros médicos e lesões causadas nos pacientes. Esse relatório alertou para a estimativa anual de mortes (44 a 98 mil em um ano) nos (EUA) decorrentes de eventos adversos relacionados à assistência ao paciente. Este tipo de incidente foi a oitava causa de mortalidade nos EUA, superando as ocasionadas por acidentes automobilísticos (43.458 mortes em um ano) e câncer de mama (42.297 mortes em um ano) com custos calculáveis em bilhões de dólares (KOHN, 1999).

Em outubro de 2004, a Organização Mundial de Saúde (OMS) lançou formalmente a Aliança Mundial para a Segurança do Paciente, na 57ª Assembleia Mundial da Saúde. Sua criação foi um importante passo na busca para melhorar a segurança dos cuidados de saúde em todos os Estados-Membros. Ela objetivou despertar a consciência e o comprometimento

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político para melhorar a segurança na assistência, além de apoiar os países no desenvolvimento de políticas públicas e práticas para a segurança do paciente em todo o mundo.

Nessa Aliança, foram priorizadas ações divididas em seis áreas de atuação, de previsão bianual e o compromisso de disponibilizar as informações e experiências adquiridas relacionadas à aprendizagem e ações preventivas. As áreas definidas foram: desafio global para a segurança do paciente 2005-2006; participação dos pacientes e consumidores; desenvolvimento de uma taxonomia de segurança do paciente; pesquisa no campo de segurança do paciente; soluções para reduzir o risco no cuidado à saúde e melhorar a segurança; notificação e conhecimento para melhorar a segurança do paciente além de governança e apoio ao programa (WHO, 2004).

Em 2005, The Joint Commission e seu braço internacional, uma organização independente de acreditação, foi designada como membro participante do Centro Colaborador (WHO Collaborating Centre). Este órgão foi criado com a função de coordenar, programar e difundir ações de abrangência internacional voltadas à segurança do paciente. Uma das ações implantadas em 2006 foi o "High 5s Project", que se constitui em um mecanismo para implementar iniciativas e protocolos operacionais padronizados para cinco soluções de segurança do paciente em cinco anos (JC, 2008).

O "Desafio Global para a Segurança do Paciente" é uma das ações previstas pela OMS para minimização de riscos em todos os países. A cada dois anos é lançado um tema prioritário. O primeiro desafio foi lançado em 2005, focado na prevenção e redução de infecções relacionados à assistência (IRAS), com o tema "Uma Assistência Limpa é uma Assistência mais Segura". O segundo desafio focou a segurança cirúrgica, com o tema "Cirurgia Segura Salva Vidas" (BRASIL, 2011). O primeiro desafio priorizou a higienização de mãos e o segundo propiciou a criação do Protocolo de Cirurgia Segura, em 2008. O terceiro desafio, iniciado em 2009, com o tema "Enfrentando a Resistência Bacteriana", desencadeou a implantação de um conjunto de intervenções, os bundles, que têm por finalidade reduzir a mortalidade e evitar danos decorrentes da assistência.

As Seis Metas Internacionais para a Segurança do Paciente foram adaptadas das metas americanas propostas pela Joint Commission, em 2006, e passaram a ser difundidas a todos os países membros da OMS, pelo então Centro Colaborador para Soluções de Segurança de Paciente, que assim passou a ser denominado. São elas: identificar corretamente os pacientes; melhorar a comunicação efetiva; melhorar a segurança para os medicamentos de alto risco; garantir cirurgia em local, procedimento e paciente correto; reduzir o risco de infecções

associados à assistência e reduzir o risco de dano resultante de queda (JC, 2007). Essas metas orientam a promoção de melhorias específicas relacionadas à assistência à saúde e fazem parte das estratégias dos hospitais em processo de acreditação e nos já acreditados.

No Brasil, no ano de 1999, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, vinculada ao Ministério da Saúde, substituiu a Secretaria de Vigilância Sanitária, como um órgão regulador do governo. A ANVISA formou a Rede de Hospitais Sentinela, em 2001, com o propósito de controlar a qualidade dos medicamentos, equipamentos, insumos, hemoderivados entre outros serviços (BRASIL, 2001). Em 2007, o Brasil formalizou o compromisso com a Aliança Mundial para a Segurança do Paciente, pelo Ministro da Saúde, na Declaração de Compromisso na Luta contra as Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (BRASIL, 2010).

No ano de 2005 foi criada a Rede Internacional de Enfermagem e Segurança do Paciente (RIENSP), em encontro realizado no Chile. No ano de 2008, em São Paulo, foi criada a Rede Brasileira de Enfermagem e de Segurança do Paciente (REBRAENSP), com a participação de 12 estados, dentre eles o Rio grande do Sul. Essa rede tem por objetivo ser um elo de articulação e de cooperação técnica entre instituições direta e indiretamente ligadas à saúde e à educação de profissionais de saúde para fortalecer a assistência de enfermagem segura e com qualidade, desenvolvendo programas conforme as necessidades dos Estados e municípios no território nacional (REBRAENSP, 2009). Em 11 de setembro desse mesmo ano, foi criada a REBRAENSP Pólo RS em reunião com representantes de diversas instituições de saúde e de ensino do Rio Grande do Sul. Em agosto de 2010, foi oficializada a criação da REBRAENSP – Núcleo Santa Maria.

Em 2011, a ANVISA, na resolução RDC nº 63, dispôs sobre os Requisitos de Boas Práticas para Funcionamento de Serviços de Saúde. A mesma apontou, no capítulo II, seção II, sobre a obrigatoriedade do serviço de saúde estabelecer estratégias e ações voltadas para a segurança do paciente (BRASIL, 2011a). Essa normativa foi uma medida importante para regulamentação de ações desenvolvidas nas instituições de saúde, em âmbito nacional, o que propiciou a publicação da Portaria nº 529, de 1º de abril de 2013, pelo Ministério da Saúde, do Programa Nacional de Segurança do Paciente com o objetivo de contribuir para a qualificação do cuidado em saúde em todos os estabelecimentos de saúde do território nacional. Este determina a criação de núcleos de segurança pelas instituições de saúde, no período de 120 dias, com consequentes multas, sansões e suspensão da licença sanitária no descumprimento das determinações. Fica também instituído o Comitê de Implementação do Programa Nacional de Segurança do Paciente (CIPNSP), de caráter consultivo, com a função de propor

e validar protocolos, guias e manuais voltados à segurança do paciente nas diferentes áreas (BRASIL, 2013). Todas essas ações, promovidas por órgão governamentais ou não, visam minimizar os incidentes durante a assistência à saúde, com propostas voltadas à segurança do paciente e à qualidade da assistência prestada pelos profissionais envolvidos.