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4. ANÁLISE DOS RESULTADOS

4.11. Segurança no trabalho

As questões que dizem respeito à segurança do trabalho são sempre problemáticas quando voltadas aos trabalhadores terceirizados, pois aparecem para estes sempre em condições inferiores relativamente às condições de trabalho da empresa mãe, mesmo com a Súmula 331 do TST prevendo a igualdade de condições para ambos os enquadramentos, terceirizados ou efetivos. Ao serem questionados sobre segurança no trabalho, os entrevistados levantam questões importantes como o autoritarismo hierárquico e os interesses da empresa sendo priorizados em detrimento das questões de segurança.

Ao serem indagados sobre acidentes de trabalho, têm-se as seguintes respostas:

“De vez em quando, ali, é porque é muita coisa ali é incumbrido. Acontece muita coisa que a gente não sabe. [...] eu já presenciei acidentes ali dentro.

Não, não. Caso, acidente fatal num chega ao Ministério do Trabalho não. Até porque, aconteceu lá na empresa não, aconteceu eu em outra empresa, eles pegam a pessoa, coloca no carro e diz que morreu no caminho.” E1

“Tem muita coisa errada, muita. É por isso que a fiscalização é tão rígida pra não deixar ninguém entrar. Porque se entrar e for mexer ali dentro, minha filha, é muita coisa que vai feder, viu? Infelizmente, assim, tem coisas que você vê que a pessoa vai fazer, que vai dar errado e se você for tomar frente pra reclamar ou tomar as dores, você vai pra rua. Você tem que fingir que não viu.

[...]

É muita coisa, muito acidente. Muitos pai de família já morreu lá dentro e foi encoberto. As vezes eles paga pra família ficar calada, ameaça pra família num falar. É muita máfia, muita! Não é pouca não.”E2

As falas deixam clara a ideia de que existem acidentes e outras irregularidades que não são devidamente comunicados aos órgãos responsáveis. A fala de E2 apresenta uma visão não só da empresa trabalhada, mas da região como um todo, ao afirmar que existem omissões em relação a acidentes e outras questões. O autoritarismo, mais uma vez, aparece como mediador das relações entre trabalhadores e chefias, pois aqueles são intimidados pelos segundos, pela via da ameaça de demissão, não podendo, assim, requerer direitos, explicações, etc. sobre os acontecidos. A esfera de poder das chefias, segundo a trabalhadora E2, estende-se para fora do âmbito organizacional através de ameaças. Este é um ponto bastante delicado e a partir dele pode-se questionar se a cultura local, marcada por hábitos que fazem referência ao coronelismo, não tem influência sobre a mentalidade gerencial e as práticas organizacionais.

No discurso de E1 há referência ao Ministério do Trabalho, afirmando que este não tem conhecimento do que realmente acontece dentro de Suape. Ao questionarmos o auditor do trabalho sobre acidentes de trabalho em Suape, obtemos a seguinte resposta:

“Há muitos acidentes de trabalho?

Veja... hoje, eu acho que o estaleiro está bem organizado, mas na última ação que nós estivemos lá que deu problema, é... foi a questão da NR12, que trata da proteção de máquinas e equipamentos. Nós temos uma NR12 que é bem rígida, né? Na segurança do maquinário. E nós temos uma pessoa que até hoje não tá alocada aqui, mas que entendia muito dessa parte de proteção de máquinas e equipamentos, e aí gerou uma interdição de vários equipamentos do Estaleiro Atlântico Sul, e aí eles fizeram um termo de compromisso e ajustamento de conduta junto ao Ministério Público do Trabalho pra instalar esse... proteção. Esse foi o último, digamos assim, problema de repercussão que nós tivemos no Estaleiro.” Igor Guimarães, Auditor do Trabalho

A referência que o auditor faz a um estaleiro bem organizado, possivelmente dar- se em decorrência da fiscalização do trabalho, em especial dos terceirizados, no ano de 2011.

Segundo o auditor, o maior problema do EAS dizia respeito ao uso de maquinário, a segurança alocada para os trabalhadores quando da utilização de máquinas e equipamentos. No entanto, ainda nas palavras do mesmo, procedimentos para ajuste da conduta da empresa já teriam sido tomados em fiscalização realizada.

A ótica da trabalhadora E1, que afirma que o Ministério do Trabalho não tem conhecimento de muitos casos envolvendo questões de risco ou acidente nos faz pensar que a segurança, para estes trabalhadores, é posta em segunda ordem. No entanto, outro terceirizado entrevistado, nos apresenta uma visão diferente do problema:

“Muitos acidentes?

Com a gente não. Nunca vi acidente não. Nessa profissão é muito perigosa. Um exemplo: antes da gente começar uma atividade de trabalho, a gente passa por uma DDS. DDS é Diálogo Diário de Segurança. Então, se o meu psicológico não tiver legal pra fazer uma manobra, eu sou obrigado a chegar a meu encarregado, falar pra ele que eu não estou preparado para executar a manobra. Então ele passa o rádio para alguém que tá preparado psicologicamente, fisicamente.

Ele compreende?

Ele vai ter que compreender, porque são manobras perigosas, um sinal errado pode matar pessoas, entendeu? Então se eu chegar pra R., eu vou falar assim ‘R., eu não tô em condições, meu psicológico tá preocupado com outras coisas, meu filho, não tô legal.’ Automaticamente ele vai entender e vai passar um rádio pra uma pessoa.” E3

É importante destacar que a fala de E3 traz também um novo elemento, a discussão sobre segurança: o DDS.

“É obrigatório a gente ter o DDS antes de começar o dia de trabalho, por que o DDS é de 15 a 20minutos. [...] É importante ter todo dia e é exigido pela Petrobras ter todo dia o DDS.

[...]

É porque a gente tinha, quando ia acontecer alguma manobra [...] a gente tinha que ter um DDS, dizer o que vai fazer, pra que no decorrer desse período aí da manobra, não acontecer nada. Nesse DDS rolava também, como o pessoal tava sentindo, aí como ele falou, mal e tal, com o psicológico abalado, com relação com família, isso, aquilo outro, também já dizia, aí a gente separava o pessoal de outra equipe pra fazer manobra pra gente, entendeu? O pessoal que ia fazer manobra com a gente era o pessoal que tinha entrado naquilo ali sabendo desde o começo o que ia fazer pra concluir a manobra.” E4

O Diálogo Diário de Segurança (DDS) constitui-se como uma medida, uma política de prevenção de acidentes, exigido por norma do MTE, visto que a maioria das áreas de trabalho contidas na organização são de risco. O DDS consiste numa reunião diária antes

do início das atividades operacionais com o fim de se discutir e planejar tais atividades, as condições de risco, as medidas de proteção. Nos discursos de E3 e E4, o DDS aparece como uma forma de repassar as atividades a serem realizadas no dia e a importância de segurança na realização das mesmas. E3, por exemplo, afirma que se não estiver psicologicamente bem para a execução da tarefa, deve repassar ao seu superior no momento do DDS, sendo, então, dispensado da mesma. Esta ideia é confirmada por E4.

Embora não tenhamos tido acesso a dados referentes a acidentes de trabalho em Suape, esse tema aparece como relevantes na luta do sindicato da categoria. Os representantes sindicais são precisos quanto ao tema segurança e advertem sobre a existência de empresas que não fornecem os EPI’s necessários:

“Você vem de sandália... tem empresa aqui que não dá o fardamento a você, você não pode usar a camisa de um clube, de um... sei lá... mas ela (a empresa) não dá... essa não dá a bota para você trabalhar... a mulher vem de sandália e não tem onde sentar, senta na frente da fábrica, põe a bota lá mesmo por que não pode entrar no piso da fábrica e ela não fornece o EPI.” Enoque, Representante do Sindimetal - PE

Desse modo, temos três visões distintas: uma mais ríspida, dos trabalhadores E1 e E2, que denunciam acidentes e afirmam que estes são encobertos pelas chefias, constituindo- se relações de autoritarismo a partir de tais e confirmada pelos representantes sindicais; uma visão mais branda, mas não pouco consciente, do Ministério do Trabalho, em que não deixam de falar da existência de acidentes (trazem o exemplo da aplicação da NR12), porém de forma mais amena que os primeiros trabalhadores; e uma terceira visão, dos trabalhadores E3 e E4, quase que totalmente aprazível e em consonância com o discurso empresarial, onde é apresentada a ideia do DDS, como uma interessante medida na prevenção de acidentes.