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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO

4.5 Seleção dos casos

A seleção dos casos e a posterior coleta dos dados é um momento crucial na condução da pesquisa. Considerando que um dos principais desafios que o estudo de caso proporciona é a interação entre as questões teóricas e os dados coletados e devido à contextualização e o aprofundamento exigido nesta metodologia, os casos não devem ser aleatoriamente escolhidos. Esse processo pode ser favorecido da experiência do pesquisador. Porém, um fator muito importante é a capacidade de o pesquisador se proteger de procedimentos potencialmente tendenciosos, estando sempre atento a provas contraditórias (Yin, 2001).

Sabe-se que a ‘eficiência’ de um estudo de caso não é medida pelo número de casos estudados, e o objetivo na seleção dos casos não é o da amostragem ou avaliação da incidência dos fenômenos (Yin, 2001). O estudo em questão procura tratar tanto do fenômeno, quanto o contexto, indicando a complexidade que está envolta num estudo desse tipo. O que inviabilizaria, por exemplo, uma avaliação estatística das variáveis relevantes. Nesse sentido, a determinação do número de casos é uma tarefa delicada, pois além de exigir um esforço teórico no sentido de avaliar a necessidade de replicações, também está condicionada por fatores de ordem prática, como disponibilidade das organizações em colaborar na pesquisa, recursos financeiros e tempo necessário.

Dado que o varejo brasileiro de alimentos possui cerca de 66% de médios e pequenos estabelecimentos35, esta pesquisa utilizou três organizações varejistas regionais que apresentam um porte médio. A relevância dos varejos regionais para este estudo também se dá pelo motivo de que na maior parte dos municípios do interior do estado são o tipo de varejo mais frequente, representando um volume muito significativo em termos de vendas e aquisição de FLV e, por consequência,

um canal mais próximo das unidades produtivas locais. A definição de cada rede em particular se deu considerando a relevância da rede no recorte geográfico utilizado (buscou-se eleger as maiores empresas regionais) e com base nos contatos pessoais que a autora possuía.

Como forma de compreender a dinâmica que existe nas regiões localizadas fora do eixo produtor (Mesorregião Nordeste/Serra Gaúcha – Região Metropolitana), as distintas formas que as empresas utilizam para manter seu suprimento regular a longas distâncias e seus desafios de organização, o contexto das mesorregiões Centro Ocidental Rio-grandense, Centro Oriental Rio-grandense, Noroeste Rio- grandense, Sudoeste Rio-grandense e Sudeste Rio-grandense foram privilegiados neste estudo através da escolha de três empresas regionais presentes em diferentes municípios destas regiões36. A Figura 6 demonstra graficamente a distribuição geográfica das regiões abrangidas pelo estudo.

36Mesorregiões geográficas definidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística/2009. Fonte:

Fundação Economia e Estatística. Disponível em: <http://mapas.fee.tche.br>. Acesso em: setembro de 2011.

Figura 6 – Mesorregiões do Estado do Rio Grande do Sul.

Fonte: Fundação Economia e Estatística. Disponível em: < http://mapas.fee.tche.br>.

Conforme ilustra o mapa apresentado na Figura 6 das sete mesorregiões sugeridas pelo IBGE, cinco mesorregiões foram incluídas por este estudo, abrangendo grande parte do território estadual. Após a seleção das regiões e a escolha das redes que foram analisadas e os respectivos fornecedores se deu com base na experiência da pesquisadora e através dos informantes das próprias redes. Desta maneira, como forma de compreender melhor os relacionamentos e as implicações para o setor produtivo, buscou-se que para cada rede se obtivesse pelo menos dois fornecedores, incluindo agricultores e atravessadores. Foram selecionados quatro casos referentes a produtores de olerículas que transacionam diretamente com as organizações varejistas escolhidas e dois casos de fornecedores estabelecidos na CEASA/POA. De forma complementar realizou-se uma entrevista com a representante da ASSPHCERRGS – Associação de

produtores de Hortigranjeiros da CEASA do Rio Grande do Sul. A Figura 7 demonstra esquematicamente os casos estudados.

Figura 7 – Casos varejistas pesquisados e respectivos fornecedores

Os casos denominados ‘Produtor’ referem-se aos casos em que os agricultores transacionam diretamente com as organizações varejistas, estabelecendo canais de suprimento indireto curto. O caso denominado Produtor – Fornecedor 5 caracteriza-se por ser um grande produtor e ao mesmo tempo possuir um Box na CEASA no qual revende também produtos de terceiros. O Fornecedor 6 é um elo que transaciona com as organizações varejistas estabelecido na CEASA.

4.6 Procedimentos de campo e coleta de dados

Uma particularidade importante que deve ser considerada em um estudo de caso refere-se às limitações proporcionadas por esta escolha metodológica. Ou seja, por se tratar de acontecimentos relacionados ao mundo real, o pesquisador deve atentar para as especificidades, elaborando um plano que seja condizente e

Caso Varejista 1 Caso Varejista 2 Caso Varejista 3 Caso produtor 1 Caso produtor 2 Caso fornecedor 6 Caso produtor 4 Caso produtor–fornecedor 5 Caso produtor 3 Caso fornecedor 6

exeqüível, já que não se trata meramente de situações controláveis dentro de um laboratório, por exemplo. Para tanto, alguns fatores foram considerados decisivos na escolha do caso37, tais como: conveniência, acesso aos dados, limitações geográficas, contingências temporais e financeiras.

Outra característica relevante a ser destacada é que o estudo de caso geralmente se baseia em várias fontes de evidências, nas quais o pesquisador poderá deparar-se com uma situação tecnicamente única, e precisará considerar muitas variáveis e o aprofundamento teórico será responsável pelo auxílio à compreensão das mesmas. Mesmo que em alguns estudos de caso, a obtenção de evidências possa ter uma única base para estudos inteiros, Yin (2001) recomenda a triangulação como fundamento lógico, através da utilização de várias fontes de evidências. Essa possibilidade de usar várias fontes para obtenção de evidências é considerada, pelo autor, como um dos pontos fortes a serem delegados ao estudo de caso. Nesse contexto, são sugeridas para esse estudo, pelo menos, quatro fontes de evidências: documentação; registros em arquivos; entrevistas; e, observação direta.

4.6.1 Documentação

Para Yin (2001), o uso da documentação tem como principal objetivo a busca de indícios que auxiliem na corroboração, valorização ou até mesmo contradição das evidências oriundas de outras fontes (como, por exemplo, das entrevistas). Nesta pesquisa, foram analisados, sempre que disponibilizados pelas empresas focais, os documentos relativos à organização como um todo e, especificamente, sobre o setor de FLV (padrões, normas de recebimentos, exigências em termos de embalagens, horários de entrega, negociação de trocas, etc.), assim como, materiais disponíveis publicamente como, por exemplo, balanço social da organização, conteúdo de páginas da internet, folders.

37Para a coleta de evidências, Yin (2001) cita, por exemplo, que se formos fazer uma entrevista, o

pesquisador é que deve se adequar aos horários e disponibilidade do entrevistado. Afirma que a natureza da pesquisa precisará ser muito mais aberta, e o entrevistado pode ainda não cooperar integralmente ao responder as questões. Ou ainda, se forem utilizadas observações, o pesquisador deverá estar preparado para saber ouvir, ver e perceber as atividades da vida real, entrando no mundo do que está sendo pesquisado.

De acordo com Gil (2006), o uso de fontes de ‘papel’, muitas vezes, é capaz de proporcionar ao pesquisador dados suficientemente ricos, que poderiam até evitar perda de tempo com levantamentos de campo. O autor salienta que este tipo de fonte possibilita o conhecimento do passado e a investigação dos processos de mudança social e cultural38.

4.6.2 Registros em arquivos

De forma genérica, o uso desta forma de coleta de evidências permitiu que fossem analisados dados de levantamentos com características socioeconômicas das regiões estudadas, mapas e tabelas com características geográficas de um território, etc. Nesse caso, como registros estatísticos, foram utilizados, principalmente, os dados referentes às características socioeconômicas das populações, fornecendo elementos importantes a serem consideradas no contexto onde está inserido o estudo de caso.

Num enfoque intraorganizacional e, considerando a tecnologia disponível, os registros em arquivos, principalmente aqueles disponíveis de forma eletrônica, são elementos importantes a uma pesquisa desse tipo. Quando foi conferido o acesso a este tipo de informação, os mesmos auxiliaram no panorama montado em torno de cada um dos casos, informando dados relativos aos serviços prestados pelo varejo, como número de clientes, faturamento, desperdícios, etc. Todavia, mesmo considerando a relevância dessa fonte, destaca-se que no que se refere aos registros institucionais escritos, apenas o faturamento, a porcentagem de desperdício e os contratos foram disponibilizados. Todavia, as duas primeiras informações serviram apenas para contextualização, não sendo objeto de divulgação.

38Contudo, é pertinente lembrar que esse autor considera que as fontes mais importantes seriam os

4.6.3 Entrevistas

O terceiro procedimento refere-se à entrevista. Para Yin (2001) a entrevista pode ser considerada como uma das mais cruciais fontes de dados para um estudo de caso, principalmente, por apresentar ‘atalhos’ para se chegar à história anterior da situação examinada, por tratar de questões humanas e, normalmente, por se tratar de informantes qualificados, os quais podem trazer elementos confiáveis e com riqueza de detalhes. Gil (2006) salienta que a entrevista é, antes de tudo, uma forma de interação social, da qual podemos buscar coletar dados através de uma fonte de informação. Ressalta, ainda, a entrevista, nas ciências sociais, como a técnica por excelência, mas que, por sua flexibilidade, acaba sendo adotada nos mais diversos campos. Dentre as principais vantagens citadas por Gil (2006), destaca-se a possibilidade de obtermos elementos em profundidade sobre o fenômeno estudado.

Yin (2001) ressalva, porém, que podem decorrer equívocos nessa forma de coleta de evidência. Como a entrevista é um ‘relatório verbal’, podem ser oriundos problemas como preconceito, memória fraca, articulação pobre ou imprecisa. Para amenizar possíveis problemas dessa ordem, é que se torna tão importante a utilização de outras fontes de coleta de dados.

De acordo com o nível de estruturação das entrevistas, os autores realizam um esforço no sentido de classificá-las. Gil (2006) define as entrevistas como informais, por pautas e formalizadas. Yin (2001) classifica-as como espontânea, focal e levantamento formal. Richardson (1999) define as técnicas utilizadas nas entrevistas como dirigidas (perguntas precisas, pré-formuladas e com uma ordem pré-estabelecida, evitando qualquer desvio com relação ao tema de estudo por parte do entrevistado), guiadas (na qual o entrevistador usa um guia de temas a serem explorados durante o período da entrevista) e não diretiva (permite ao entrevistado desenvolver suas opiniões e informações da maneira que ele estimar conveniente).

Utilizando a classificação de Gil (2006), este estudo recorreu a um tipo de pesquisa: por pautas. A entrevista por pautas apresenta certo grau de estruturação, já que é guiada por uma relação de pontos de interesse, que o entrevistador vai explorando ao decorrer da mesma. Assim, o objetivo foi o de realizar poucas perguntas diretas e deixar que o entrevistado falasse livremente, disponibilizando,

pouco a pouco, o enredo de interesse. Esse tipo de entrevista foi realizado com seis fornecedores, com três representantes das empresas focais e com a representante da Associação dos Produtores de Hortigranjeiro da CEASA do Rio Grande do Sul, totalizando dez entrevistas. Para Yin (2001) o tipo de entrevista utilizado nessa pesquisa teria a denominação de entrevista focal, sendo uma entrevista baseada na espontaneidade do entrevistado, possuindo ainda um caráter informal. Contudo, o pesquisador segue um conjunto de perguntas previamente elaboradas.

4.6.4 Observação

Através da observação direta, pode-se encontrar ou verificar comportamentos e condições ambientais que também foram uma importante fonte de evidências para o estudo de caso em questão, pois, conforme corrobora Yin (2001), a observação direta traz uma nova dimensão na hora de compreender tanto o contexto, quanto o fenômeno que está sendo estudado.

Gil (2006) assevera que a observação simples, embora possa ser considerada espontânea, informal, não planificada, está em um plano científico, pois vai além da simples constatação dos fatos, ou seja, após a coleta dos dados via observação, o pesquisador realiza um processo de análise e interpretação, o que confere um caráter de sistematização e controle. Contudo, ressalta Gil (2006) que o primeiro obstáculo a ser superado refere-se ao ‘o que observar’. Para tanto, não existem regras fixas, embora alguns itens possam ser salientados, conforme demonstra a Tabela 2.

Tabela 2 – Itens observados

Os sujeitos Quais as suas idades? Que movimentos seus corpos expressam? Quem são? Quantos são? A que sexo pertencem? O cenário Onde as pessoas se situam?

Quais as características desse local?

O comportamento social Como as pessoas se relacionam? De que modo realizam seus atos? Que linguagem utilizam? Fonte: GIL (2006, p. 112) Elaborado pela autora.

O registro dos itens observados foram feitos através de fotos, anotações, gravações, e, principalmente, pelo registro na memória, considerando que, em muitas situações, poderia ser comprometida a naturalidade da observação através da utilização destes instrumentos. Assim como, foi vedado o seu uso (Rede 1 e Rede 2).

A observação foi realizada informalmente durante o acompanhamento de todos os elos pertencentes à cadeia, desde produtores, passando pelos elos atacadistas, áreas de venda do varejo e ambientes onde foram realizadas entrevistas, auxiliando, assim, na análise do contexto onde está inserida a organização responsável pela coordenação da cadeia. Serviu, também, para a construção do ‘cenário’ relativo ao setor de FLV dentro dos supermercados (viés intra-organizacional), através da observação do espaço utilizado dentro da loja, do fluxo de consumidores finais, das características dos produtos, das formas de exposição, das embalagens utilizadas, do uso de selos, de placas de identificação, etc.