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SENTIDOS DO TRABALHO NO PROCESSO DE PRODUÇÃO CAPITALISTA A compreensão do trabalhar e da atividade em geral como manifestação da

CAPÍTULO 3: TRABALHO E EDUCAÇÃO: APORTES PARA COMPREENSÃO DE SABERES E PROCESSOS PEDAGÓGICOS NA PRODUÇÃO

3.1 SENTIDOS DO TRABALHO NO PROCESSO DE PRODUÇÃO CAPITALISTA A compreensão do trabalhar e da atividade em geral como manifestação da

vida é uma perspectiva proposta por Schwartz (2000a, 2000b) em que a atividade de trabalho torna-se o lugar de uma dialética de produção e de matriz de histórias e de normas antecedentes que são renormatizadas no recomeço indefinido de atividades no horizonte histórico-social. O trabalho é, portanto, um lugar de escolhas, um destino a viver; é risco vislumbrando, assim, um campo de variabilidades, do meio e dos trabalhadores/as. Se essa primeira imagem pode parecer romântica, logo o sentido do trabalho, que parece fundamental considerar neste estudo, é o de transformação das matérias naturais em produtos da atividade humana como sendo essencialmente criador e como mediação em que homens e mulheres se fazem sujeitos na transformação prática do mundo, sob determinadas condições. É necessário entendê-lo como independente de todas as formas de sociedade, em seu significado histórico-ontológico, como intercâmbio orgânico entre o homem e a natureza, e também como forma histórica societal que assume na sociedade nas relações de produção, que podem estar sob maior ou menor controle do capital.

A perspectiva da economia clássica assinalou a característica formativa, a constituição de agentes históricos vinculada ao trabalho social nas sociedades industriais, a partir da ideia fundamental formulada por Hegel (1982). O autor chama de trabalho à atividade espiritual pela qual o Espírito se opõe a um dado exterior para se conhecer a si mesmo e se coloca diversos obstáculos exteriores para se obrigar a descobrir suas potencialidades. Dessa forma, o trabalho é o mediador entre a natureza e o Espírito. Pelo trabalho, o homem destrói o natural e se faz sempre mais humano. O Espírito trabalha, pois, sem cessar até o fim da História.

Em sua elaboração, Hegel (1982) explicita uma polissemia, pois emprega o mesmo termo para o conjunto do processo, isto é, para a vida do Espírito, que é perpétuo aprofundamento de si e que toma formas cada vez mais espirituais (instituições políticas, obras artísticas, religiões, sistemas filosóficos) e para o trabalho industrial, que é, apenas, uma das formas que a história da humanidade assume. Portanto, esse conceito de trabalho designa a essência comum da totalidade das atividades pelas quais o sujeito se inscreve e se objetiva na materialidade do mundo, configura o mundo e, ao fazer isso, também produz a si

mesmo. Trabalho no sentido hegeliano, designa a essência comum do conceber, do fazer, do fabricar e do agir, que, até então, eram categorias incomensuravelmente distintas.

O trabalho é, para Hegel (1982), antes de tudo, uma determinação filosófica, pois é categoria indispensável para a realização da autoconsciência dos indivíduos na esfera da sociedade civil. O trabalho propicia a transformação do objeto na natureza, visto que é um momento de criação; o homem modifica o objeto bruto, tornando-o meio concreto para o seu consumo e dos demais. Isso se depreende do texto de Hegel (1982, p.223):

[...] o trabalho é uma atividade mediadora que consiste em produzir e adquirir meios particularizados apropriados a carecimentos igualmente particularizados. Pelo seu trabalho, o homem diferencia, por meio de procedimentos variados, o material que a natureza lhe oferece imediatamente para adaptá-lo a fins múltiplos. Esta transformação efetuada pelo trabalho dá ao meio o seu valor e sua utilidade, de modo que o homem utiliza essencialmente para seu consumo os produtos do trabalho humano e dos esforços humanos (investidos nesses produtos).

Ou seja, o que a natureza oferece transforma-se para diferentes fins e valores pelo trabalho humano e nós – consumidores dos produtos produzidos - estamos nos utilizando dos esforços humanos. Trata-se de um processo em que ser humano também transforma a si mesmo, uma vez que alcança determinações éticas por meio do ato laborativo.

No trabalho, como intercâmbio orgânico entre o homem e a natureza, existe um significado histórico-ontológico segundo o qual o homo sapiens se distinguiu diante dos demais animais superiores e conseguiu evoluir e desenvolver cultura e linguagem fazendo com que o trabalho deixasse de ser meramente atividade instrumental e se tornasse meio de socialização e de desenvolvimento das forças produtivas sociais. Assim, o intercâmbio orgânico com a natureza corresponde a um complexo de trabalho que impulsionou o desenvolvimento da potência morfológica da espécie homo sapiens fazendo ocorrer um salto ontológico em face do mundo natural e instaurando-se o ser social. Por um lado, a consciência é a determinação reflexiva da categoria do trabalho que marca a racionalidade com respeito aos fins e aos meios, a utilização de linguagem e de comunicação complexa e o intercâmbio mediado por objetos de trabalho, meios de produção da vida social, formas de objetivação, ou seja, pela técnica, ciência e tecnologia. Por outro lado, consciência e

técnica pressupõem, como complexo reflexivo de determinações, a sociabilidade, a interação social, a relação do homem com outros homens e a cooperação social, que, no decorrer da história do homem, adquiriu várias formas sócio-históricas, determinadas pelas relações de propriedade social e pelo grau de desenvolvimento das forças produtivas. São esses elementos que retroalimentam uma nova forma de ser: o ser social (ALVES, 2005).

Consciência, técnica e sociabilidade medeiam o trabalho humano como intercâmbio orgânico com a natureza, sendo que essa mediação constitui a própria forma de ser social diferenciada do mundo natural propriamente dito. O ser social surge como pressuposto da atividade do trabalho humano e, também, como produto da própria atividade do trabalho humano (LUKÁCS, 1978).

A dimensão de intercâmbio orgânico com a natureza tornou-se mais complexa e diferenciada ao longo da evolução social.

Tal determinação mais geral da categoria trabalho como intercâmbio orgânico do homem com a Natureza em sua forma primordial está pressuposta, como base histórico-ontológica, nas demais formas de trabalho humano historicamente determinadas. O trabalho assalariado e o trabalho por conta própria, por exemplo, contém em si, tal determinação ontológica do trabalho como intercâmbio orgânico do homem com a Natureza. Nesse caso, lidamos com o homem como trabalhador coletivo e um trabalho socializado em sua forma plena (ALVES, 2005, p.114).

Derivada da primeira ideia de que o trabalho forma desenvolveu-se, sobretudo com a contribuição de Marx (2006), a ideia do trabalho como a essência do homem. Segundo o autor, Hegel assinala apenas o lado positivo do trabalho, não o seu aspecto negativo, ao considerar o trabalho como a essência confirmativa do

homem70. E Marx (2006, p.179) esclarece que “o trabalho é o tornar-se para si do homem no interior da alienação ou como homem alienado. O único trabalho que

Hegel entende e reconhece é o trabalho intelectual abstrato”.

Mediante o trabalho, os seres humanos são, pela sua labuta cotidiana, pela sua inventividade e utensílios, os construtores da história. Isso significa que o ser humano só pode existir trabalhando e que não é plenamente homem se não imprimir em todas as coisas a marca de sua humanidade. Portanto, o trabalho é, sobretudo,

70 Vale assinalar que Marx (2006, p.178) reconhece que o grande mérito de Hegel reside no fato de

“conceber a autocriação do homem como processo, a objetivação como perda do objeto, como alienação e como abolição da alienação” bem como no outro fato de “apreender a natureza do trabalho e de conceber o homem objetivo como resultado do seu próprio trabalho”.

expressão; é toda atividade humana que permite exprimir a individualidade daquele que a exerce, mas se exprimir para o outro, portanto, de mostrar ao outro ao mesmo tempo sua singularidade e seu pertencimento ao gênero humano.

Para Marx (2006), o trabalho possui uma tríplice qualidade: de revelar o homem a si mesmo, de revelar sua sociabilidade e de transformar o mundo. Como assinala Lukács (1978), a essência do trabalho humano reside no fato de que, em primeiro lugar, ele se origina em meio à luta pela existência e, em segundo lugar, todos os seus estágios resultam da autoatividade do homem.

Considerando o sentido ontológico independentemente de qualquer modo de produção, o trabalho é ação criativa do homem que visa garantir sua existência material e não material. Nesse caso, é compreendido na sua forma concreta, e em seu sentido preciso de modalidade de práxis humana através da qual a natureza é transformada nos bens necessários à vida, processo no qual aqueles que trabalham também se transformam. Portanto, o trabalho, enquanto atividade útil que visa de uma forma ou de outra à apropriação das matérias naturais, é uma “condição [natural] de existência do homem, independente de todas as formas de sociedade, eterna necessidade natural de mediação do metabolismo entre homem e natureza e, portanto, da vida humana” (MARX, 1983, p.5). Esse é trabalho útil, em geral, trabalho que produz algo a partir da natureza sobre a qual o homem atua com suas forças corporais e intelectuais para dela se apropriar e modificá-la, e, ao fazê-lo, modifica a si próprio, numa forma que pertence exclusivamente aos humanos. São esses aspectos que Marx (1983, p.151) salienta em sua definição de trabalho em geral.

Antes de tudo, o trabalho é um processo entre o homem e a natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mãos, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. Ele desenvolve as potências nela adormecidas e sujeita o jogo de suas forças a seu próprio domínio. Não se trata aqui das primeiras formas instintivas, animais, de trabalho. O estado em que o trabalhador se apresenta no mercado como vendedor de sua própria força de trabalho deixou para o fundo dos tempos primitivos o estado em que o trabalho humano não se desfez ainda de sua primeira forma instintiva. Pressupomos o trabalho numa forma em que pertence exclusivamente ao homem.

Com base nas categorias analíticas específicas para a apreensão do capital e do seu modo de produção, Marx (1983) desenvolve as categorias analíticas de caráter genérico que tratam de uma forma social genérica e, por conseguinte, de um ser social também genérico, explicitando, assim, o conceito de trabalho em geral.

Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de suas colméias. Mas o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera. No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador e, portanto idealmente. Ele não apenas efetua uma transformação da forma da matéria natural; realiza, ao mesmo tempo, na matéria natural seu objetivo, que ele sabe que determina, como lei, a espécie e o modo de sua atividade e ao qual tem de subordinar sua vontade. E essa subordinação não é um ato isolado. Além do esforço dos órgãos que trabalham, é exigida a vontade orientada a um fim, que se manifesta como atenção durante todo o tempo de trabalho, e isso tanto mais quanto menos esse trabalho, pelo próprio conteúdo e pela espécie e modo de sua execução, atrai o trabalhador, portanto, quanto menos ele o aproveita, como jogo de suas próprias forças físicas e espirituais. Os elementos simples do processo de trabalho são a atividade orientada a um fim ou o trabalho mesmo, seu objeto e seus meios. (MARX, 1983, p. 149- 150).

Nessa análise, o processo de trabalho tem um elemento claro de intencionalidade e de finalidade uma vez que o resultado obtido é uma transformação da forma da matéria natural pretendida desde o princípio e que orienta a espécie ou o modo da atividade laboral como objetivo. O trabalho culmina no produto, ou seja, num valor de uso, num objeto trabalhado, numa matéria natural transformada para atender às necessidades humanas, sendo, portanto trabalho objetivado. No entanto, para Marx (1983, p.151), “esses elementos constitutivos do

processo simples de trabalho, embora sejam necessários, são insuficientes para se

entender o processo de produção capitalista”.

Uma vez apresentados os meios de produção no interior do processo

simples de trabalho, Marx (1983) empreende a análise da força de trabalho71 como

mercadoria e, por conseguinte, dos atores sociais que estabelecem a relação de troca dessa mercadoria, com vistas à compreensão do processo de produção

capitalista72. A explanação de Marx (1983) explicita, distingue e, ao mesmo tempo,

71 Por força de trabalho ou capacidade de trabalho compreendemos o conjunto das faculdades físicas

e mentais existentes no corpo e na personalidade viva de um ser humano, as quais ele põe em ação toda vez que produz valores-de-uso de qualquer espécie (MARX, 1983).

72 Trata-se da exposição no segundo segmento do capítulo 5 de O Capital, denominado de processo de valorização (MARX, 1983).

estabelece a conexão entre processo de trabalho, processo de formação de valor e

processo de valorização. Se o processo simples de trabalho refere-se à atividade

orientada visando transformar matéria natural em produto, ou seja, produzir valor de

uso; o processo de produção do capital pressupõe a produção da mais-valia, que

demanda, por sua vez, a produção do valor, que só pode ocorrer por intermédio da produção do valor de uso.

Marx (1983) revelaria no trabalho como forma nuclear da práxis social a base do dinamismo possível nas sociedades industrializadas, desvendando o nexo contraditório da ideia de formação mediante um trabalho que está na sua forma estranhada, ou seja, trabalho abstrato, trabalho-mercadoria, mensurável, quantificável, indiferente ao seu conteúdo, destacável dos indivíduos intercambiáveis que o executam.

A dimensão histórico-ontológica da categoria do trabalho (trabalho como intercâmbio orgânico com a Natureza, e, portanto, como elemento do processo civilizatório humano-genérico), está pressuposta na segunda determinação do trabalho: o trabalho como forma histórico-concreta de modo de produção social. Mesmo em sua forma estranhada, o trabalho social tende a possuir, como pressuposto negado, o signo de humanização/ hominização (ela é a contradição lancinante do sistema do capital). (ALVES, 2005, p.115).

O modo de produção capitalista tem sua base numa dupla dominação do capital sobre o trabalho, que, não sendo estática ou definitiva vai se reestruturando em face das próprias crises de acumulação; de um lado, na forma de propriedade dos meios de produção e, de outro lado, na forma de controle real sobre o processo de produção. Para entendermos a relação entre trabalho, capital e saberes, retomamos os conceitos propostos por Marx (1983), de valor de uso, de valor de troca da mercadoria, inclusive da mercadoria força-de-trabalho, e de trabalho concreto e trabalho abstrato.

Qualquer mercadoria precisa ter alguma utilidade para se lhe atribuir valor de troca. E qualquer mercadoria, apenas, conterá valor de troca se puder ser útil a alguém. Em termos econômicos, situa-se um problema central que é a impossibilidade de se equalizar trocas com base na utilidade de um bem, uma vez que esta é subjetiva em relação aos agentes em intercâmbio. A medida para comparar o valor de mercadorias independente de sua utilidade, conforme Marx (1983) e também de acordo com uma tradição teórica que remontava a Smith

(1983)73, seria o tempo de trabalho médio socialmente necessário para a produção de uma mercadoria qualquer. Também a força de trabalho, como mercadoria, consiste nessa unidade entre valor de uso e valor de troca. O seu valor de uso expressaria o trabalho concreto que alguém pode realizar desde que reúna os conhecimentos, competências, habilidades para atender a uma determinada finalidade. Já o valor de troca expressaria o trabalho abstrato, isto é, “dispêndio de força de trabalho simples que, em média, toda pessoa comum, sem desenvolvimento especial, possui em seu ‘organismo físico’” ou “dispêndio de força de trabalho do homem no sentido ‘fisiológico’” (MARX, 1983, p. 51). A mercadoria força-de-trabalho também teria seu valor de troca aferido, que, segundo Marx (1983, p.158) é o “quantum de trabalho para produzir a soma média dos meios diários de subsistência do trabalhador”.

O modo de produção capitalista envolve, a um só tempo, o trabalho concreto e o trabalho abstrato. É definido como trabalho concreto o processo de trabalho, a ação humana que se orienta numa perspectiva de produção de valor de uso. O processo de trabalho abstrato74 é o de produção de valor de troca, e assim de valor excedente, constituindo a base principal da acumulação de capital. Embora distintos,

o trabalho concreto e o trabalho abstrato – valor de uso e valor de troca – constituem uma unidade, ponto de partida no processo de valorização75 (MARX, 1983).

No processo de trabalho, ao se desgastar fisiologicamente, o trabalhador transfere seu conhecimento e habilidades para o que está produzindo, marca, com isso, a forma que dá ao produto; mesmo intuitivamente mobiliza imagens, memórias, saberes e habilidades para fazer com que alguma matéria seja transformada em algum produto. Esse conhecimento, mesmo sem formalização, será transferido pelo trabalhador para a matéria em transformação por meio de movimentos apropriados e gasto de energia física e, assim, será acrescentado valor à mercadoria76. A subjetividade em ação reproduz seu próprio valor, agrega valor novo ao produto e

73 Adam Smith lançou, em sua investigação do regime econômico, os fundamentos da teoria do valor- trabalho na sua obra A riqueza das nações: investigação sobre sua natureza e suas causas,

publicada em 1776.

74 A obra de Lessa (2007) é bastante clara na distinção entre trabalho concreto e trabalho abstrato em

Marx.

75 Marx (1983) desvenda o segredo da produção do capital, ou do processo de valorização, ao lançar

mão da categoria de mais-valia e explicar sua origem, conforme segundo segmento do capítulo 5 de

O capital, denominado de processo de valorização.

76 A questão dos saberes no trabalho do bordado será considerada nos próximos capítulos quatro e

experimenta uma modificação de valor no processo de valorização, conforme Dantas (2007, p.13-14) esclarece ao se referir ao estágio atual do capitalismo.

A mente, através do corpo, apodera-se das formas que encontra disponíveis, opera nelas as transformações desejadas e obtém alguma nova forma, conforme projetara. A mente em-forma o seu objeto, isto é, dá- lhe forma, naquele sentido etimológico do latim informatio, - onis: formação, plano, ação de formar. O valor que o trabalho útil acrescenta aos materiais e meios de trabalho submetidos à sua ação é a informação que neles

introduz. É esta a essência real do trabalho útil, este “dom natural” (Marx)

do trabalhador (e de qualquer ser humano) que, entre outras coisas, permite ao capital obter mais-valor de materiais quaisquer, ao dar-lhes alguma utilidade. A utilidade da força de trabalho consiste não na sua eventual capacidade de transformar e empregar energia no processo de trabalho, mas na sua capacidade de nele introduzir informação. Mesmo se não considerássemos o processo capitalista de valorização, o processo de trabalho acrescentaria valor aos materiais nele introduzidos, pelo simples ato de acrescentar informação a estes materiais. (DANTAS, 2007, p.13-14).

Uma quantidade de trabalho abstrato socialmente necessário tem a propriedade de ativar e socializar mais tempo de trabalho, criando, portanto, valor extra, excedente77. O objetivo de maximizar a produção de mais valia determina uma forma pela qual o capital reúne os meios de produção e a força de trabalho, além de controlar todo o trabalho, no âmbito da própria produção e fora dela, criando a subordinação não apenas formal, mas real do trabalho ao capital. Ao desenvolvimento de técnicas para controle do trabalhador, acopla-se a intensificação do trabalho por meio de máquinas modernas que favorecem a extração da mais-

valia relativa fazendo avançar a tecnologia e a ciência com efeitos destruidores78.

Portanto, o trabalho abstrato é uma das mais importantes categorias forjadas por Marx (1983) na teoria do valor e, por se constituir em elemento de produção de mais

valia, diferencia-se do trabalho concreto. Nesse sentido,

77 Para que ocorra lucro através do trabalho, a partir do seu capital, o processo de produção deve

resultar em bens que, além do valor de uso (utilidade), possuam um valor de troca e, sobretudo, um

sobre valor, ou seja, um valor excedente em relação ao valor gasto na produção dos bens de uso,

também chamado de mais valia. Logo, o processo de produção no modo de produção capitalista é também um processo de valorização ou de produção de mais valia, pela exploração do trabalhador. Segundo Marx (1983), a mais valia absoluta é produzida pelo prolongamento da jornada de trabalho com pagamento de salários aviltantes. Já na mais valia relativa, o capitalista deixa de prolongar a jornada e introduz inovações nas condições técnicas e sociais do processo de trabalho que vão intensificar a produção e o próprio trabalho, uma vez que a facilitação do processo é utilizada para