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3 O SER-PARA-SI: CONSCIÊNCIA E INDETERMINAÇÃO

3.4 O Ser dos Possíveis

Segundo Sartre, é cabível considerar que assim como o ser do valor, também o possível vem ao mundo por meio da realidade humana. O possível se caracteriza pela falta do para-si, mas uma falta que ao mesmo tempo o constitui, ou seja, o para-si na ânsia de se fundar, busca suas possibilidades em um ser que seja colocado na sua própria possibilidade e que esteja intrinsecamente ligado a esta possibilidade para poder dar-lhe fuga em direção à algo. Por isso, podemos considerar que o possível é o para-si deficiente, ou melhor, é o que falta ao para-si para ele ser si.

Para Sartre (1997, p. 149), "O possível nos surge como uma propriedade dos seres. Só depois de olhar o céu decretarei 'é possível que chova\ e não entendo aqui o 'possível' como sem contradição com o presente estado do céu."

Decerto essa possibilidade de vir a chover ou não chover, vem de fora do céu, do estado em que as nuvens se revelam transcendentes para que eu perceba se isto poderá ou não se realizar. Esta percepção de chuva é apenas uma possibilidade, que se encontra no aspecto da nuvem que ao ser captada de forma transcendente faz que o futuro, ou seja, a chuva, já possa fazer parte de um possível presente.

Prosseguimos dando continuidade ao raciocínio de Sartre (1997, p. 155) sobre o ser dos possíveis em seu arremate final a respeito do qual escreve que "O possível não é, o possível se possibiliza."

Na verdade, Sartre quer demonstrar que o possível existe para além do mundo. Na proporção em que eu capto o mundo, sua presença vai surgindo como uma possibilidade. Na opinião de Bornheim (1984, p. 61),

A noção do possível se insere em um contexto que aponta a duas direções. De um lado o possível indica que a realidade é opção em relação a seu ser, embora, sendo nada, permaneça separada daquilo pelo qual ele opta.. E, dfe outro lado, para que haja o possível faz-se necessário que a realidade humana seja outra coisa que não ela mesma, isto é, abertura a um mundo do qual o homem se conserva separado.

Enaltecidos com o texto anteriormente exposto, que nos possibilitou uma melhor compreensão acerca do ser dos possíveis, nos direcionamos a explorar na filosofia sartreana como é mantida a relação intersubjetiva.

Dadas as premissas ontológicas do conceito sartreano sobre as vertentes do para-si, buscamos agora as considerações de Sartre sobre o ser-para-o-outro, ou seja, um outro modo de existência tão fundamental quanto o ser-para-si. Essa explanação abre uma perspectiva sobre a liberdade, que doravante deve ser assumida em situação. Entretanto, não é nosso intento tomar expressamente como tema a afirmação do ser-para-o-outro somente no nível abstrato, mas dimensioná-lo nas relações concretas do homem entre os homens.

Ressaltaremos o homem como um ser engajado, isso é, como ser-em-situação, onde exaltaremos um indivíduo situado com suas vivências e que se descobre entre outros homens buscando vivenciar todas os tipos de sentimentos. Assim, formularemos uma síntese dentro da concepção sartreana sobre o ser-para-o-outro discorrendo como se estabelecem as relações concretas com o outro. Versaremos, então, sobre o olhar, o amor, o desejo sexual, o masoquismo e o sadismo. Enfim, retrataremos o pensamento de Sartre, segundo o qual ele coloca o homem na existência.

Para tanto, efetivaremos um estudo na obra ‘O Ser e o Nada’, texto no qual, primordialmente, o filósofo francês se empenhou em caracterizar com vasta perquirição as questões relativas ao ser-para-o-outro, em uma densa e inquietante leitura, mas que expressa com exatidão os detalhes e a importância do caráter de sua doutrina na origem da questão da existência do outro.

Convém observar que o indivíduo sartreano por mais livre que seja em si mesmo, é visado por aquilo que se passa no mundo, por isso ele é livre só em uma determinada situação e

com relação a essa situação. Consideramos, portanto, que o homem só pode ser realmente livre quando ele reconhece essa situação e é em relação a esta situação que terá liberdade para transformar ou não, de aceitá-la ou negá-la. Essa liberdade, segundo Sartre, não é um poder metafísico da 'natureza' humana. O homem não faz o que quer, mas sim aquilo que ele escolhe para fazer de acordo com seu projeto original, por isso, ele é responsável por aquilo que é.

Acerca disso poder-se-ia dizer que a liberdade só vale pelo uso que o indivíduo dela faz. É dessa forma que o homem responde ao desafio de encontrar um mundo aí posto, sem definição. Contudo, é o homem que vai dar sentido a tudo isso que existe Através de seu projeto original, é possível fazer o que ele decide nessa situação, pois o mundo não se decide jamais a não ser pela transcendência do para-si em direção ao futuro. Ou seja, na ânsia de estabelecer seu projeto, o homem se lança ao futuro, procurando desvelar um mundo ou situações que correspondam àquilo que ele escolheu para ele mesmo.

Entende-se que o homem sartreano é aquele que está sempre se descobrindo, porque ele não é uma realidade acabada em si e, como já frisamos anteriormente, o homem é um projeto, um indivíduo que tem o poder de dar sentido ao mundo. Suas escolhas serão simultâneas, sempre serão feitas no mundo, sobre o mundo e contra o mundo. Por isso, ele é responsável por essa escolha, o que implica, também, uma inegável responsabilidade por suas ações. Com efeito, o homem é obrigado a ser um sujeito engajado, comprometido com a situação em que vive para que sua escolha não venha a ser em vão. Como diz Sartre, até mesmo o ato de não escolher, já é uma escolha, é a sua liberdade expressa, portanto, ele deve se responsabilizar pela sua ausência de escolha.

Notadamente, Sartre prega um existencialismo em que o homem é integralmente livre para escolher, mas também é totalmente responsável por tudo que faz. Uma vez que o homem é livre para escolher, nada, nem ninguém pode justificar suas ações. De acordo com Sartre, é nesse sentido que a liberdade é absoluta, pois ela obriga o homem a fazer-se ao invés de ser, pois nossas abjeções, fracassos, enfim todas as nossas atitudes, só encontram justificativas na autonomia de nossas escolhas que se concretizam em nossas ações.

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