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3. Materiais e métodos

3.1. Definição e identificação dos locais de amostragem

3.1.1. Serra do Caraça e sua vizinhança

Uma região peculiar no desenvolvimento desse trabalho foi a Serra do Caraça, que faz parte do complexo do Quadrilátero Ferrífero e pode ser definida como um conjunto serrano de grandes dimensões, cuja maior parte de sua área é representada por exposições rochosas de quartzitos, com a presença de solos muito rasos (Carvalho Filho, Curi et al., 2010).

A rede de drenagem do Caraça tem como seu curso hídrico mais volumoso o córrego Caraça, que possui águas escuras devido à matéria orgânica captada ao longo do seu percurso e minerais dissolvidos pela água de suas rochas quartzíticas (Barbosa, 2005). A importância dessa área para o presente trabalho vem dessas águas com alta concentração de material húmico, que chegam a possuir até 5,03 mg/L de COD segundo Craveiro (2011). A Figura 3-1 mostra a Serra do Caraça, onde é possível ver claramente os afloramentos de rochas ricas em quartzo ao longo da montanha.

Figura 3-1 – Vista do maciço do Caraça. Afloramentos de rochas quartzíticas

ao longo da Serra do Caraça

Áreas de mineração de Fe no sopé da montanha

A região da serra abrange os municípios de Barão de Cocais, Catas Altas e Mariana, que sobrevivem basicamente de atividades mineradoras. A área ainda abriga uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), onde é encontrado o antigo colégio do Caraça (Barbosa, 2005).

O parque do Caraça é uma área bastante deformada geologicamente, sendo situada em uma das porções do maciço do Espinhaço, que é uma cordilheira de montanhas que atravessa o estado de Minas Gerais e vai até o interior da Bahia. Os quartzitos presentes na região “evidenciam uma deposição marinha que data os primórdios da evolução” (Barbosa, 2005, p. 5). É um ambiente que possui uma grande riqueza, abrigando dobras e falhas das mais diversas variedades e amplitudes (Barbosa, 2005).

As montanhas da região do Caraça atingem altitudes superiores a 2000 m como é o caso do Pico do Sol com 2070 m e o Pico do Inficionado com 2063 m. A serra é um ambiente rico em biodiversidade com vegetação de transição entre Mata Atlântica e Cerrado. Em altitudes maiores que 1400 m ainda é possível encontrar campos rupestres (Barbosa, 2005).

A presença de um alto teor de quartzo proveniente das rochas quartzíticas abundantes na região faz com que os solos da área da serra sejam, em geral, de textura arenosa e estrutura fraca (Souza, 2006). O baixo teor de argilas nesse tipo de cobertura inibe o acumulo de húmus, já que se sabe que solos de textura mais grosseira concentram menor quantidade de matéria orgânica (Lepsch, Silva et al., 1982). A Tabela 3-2 exibe os limites de teores médios de matéria orgânica para solos com diferentes texturas em um mesmo tipo climático da região do QF.

Tabela 3-2 – Teores médios de matéria orgânica para solos de São Paulo cultivados, bem drenados, profundos e argila de atividade baixa, em locais de clima Cwa.

Textura Matéria orgânica

(%)

Arenosa (areia e areia franca) 0,6-1,2

Média (franco-arenosa e franco-argilo-arenosa) 1,0-1,8

Argilosa (argilosa e argilo-arenosa) 1,5-2,8

Muito argilosa 2,4-3,8

Fonte: Lepsch, Silva et al. (1982).

As grandes variações de altitude fazem com que o Caraça tenha um microclima particular, onde a umidade é elevada e predominam temperaturas amenas durante o ano

todo (18 ºC a 19 ºC), cuja máxima raramente ultrapassa os 30 ºC e a mínima facilmente alcança valores negativos (Dutra et al., 2002).

A Serra do Caraça possui uma imensa riqueza e uma enorme diversidade biológica, abrigando inúmeras espécies de animais e plantas, como resultado da transição entre biomas e da “presença de habitat únicos formados pelo relevo acidentado e pela rica rede de drenagem” (Coimbra, 2006 p.152). Nela são encontradas desde espécies típicas de cerrado, como os tamanduás, tatus e cotias, até animais típicos de florestas secundárias como anfíbios anuros e alguns primatas como o sagui e o mico-estrela. Particularmente os campos rupestres abrigam uma fauna com alto grau de endemismo, especialmente por aves, anfíbios e invertebrados (Coimbra, 2006).

Apesar de possuir uma área bem preservada dentro dos limites da RPPN, a região no entorno do Caraça destaca-se pela intensa degradação ambiental, principalmente na porção leste, “gerando uma paisagem muito fragmentada, com poucos remanescentes de vegetação nativa e com grandes manchas de monocultura de eucaliptos” (Coimbra, 2006, p.124), como é mostrado na Figura 3-2. Outro aspecto negativo vem da presença de minerações, que são encontradas nos limites das serra, como já foi destacado na Figura 3-1.

Figura 3-2 - Monocultura de eucaliptos no sopé da Serra do Caraça. Serra do Caraça

A atividade mineradora nos limites da serra provoca grandes impactos ao meio ambiente e à sociedade local. Às vezes, por localizarem-se próximas a núcleos urbanos, as minerações geram poluição atmosférica e sonora, sem contar os registros de casas e janelas trincadas devido a repetidas detonações em minas locais (Coimbra, 2006).

Outros grandes problemas na região são a clandestinidade de garimpos (que ocorrem principalmente nos pequenos cursos d’água, que tem suas direções alteradas e seus leitos revolvidos), a remoção da mata ciliar e a realização de empréstimo de solo para construção de diques. Segundo Coimbra (2006, p. 165), esses impactos são facilmente perceptíveis devido ao aumento da lixiviação e erosão dos solos, sendo possível “ver a olho nu a turbidez nos córregos, oriunda da garimpagem”.

Dentre outros impactos gerados pela mineração estão o assoreamento de corpos d’água e a emissão de pó em suspensão, oriundos do desprendimento da matéria no momento da explosão. Do meio atmosférico, esse material vai depositar-se na área de entorno das minas, prejudicando o crescimento de espécies rasteiras e impedindo o sistema de aeração do solo e absorção de nutriente pelas plantas. A fauna também é prejudicada pelo barulho das explosões (Costa, 2004 apud Coimbra, 2006).

Em relação à monocultura de eucaliptos no sopé da Serra do Caraça, cabe salientar que as plantações ocupam grandes extensões e atendem a demandas para fabricação de celulose e a produção de carvão vegetal para as siderúrgicas de ferro-gusa. O mais impressionante é que as áreas ocupadas por esse tipo de cultura chegam a atingir 30% do território do município de Catas Altas (Coimbra, 2006). Esses reflorestamentos provocam grandes impactos ambientais na região devido ao uso de adubos químicos e herbicidas. Outro grande problema é que o solo ainda fica exposto, potencializando o processo de lixiviação de partículas do solo e produtos agroquímicos para os cursos d´água. Coimbra (2006) ainda completa que o plantio de eucalipto é responsável pela destruição de remanescentes florestais da região, provocando uma redução na biodiversidade destes ambientes.

A bacia do ribeirão Caraça, que se localiza dentro da RPPN Santuário do Caraça, foi uma opção para amostragem por possuir cursos hídricos com alto teor de SH, o que é evidenciado pelas suas águas de coloração amarronzada (Figura 3-3). Além disso, nesse local, podem ser excluídas interferências antropogênicas, o que pode ser utilizado como parâmetro de comparação com as bacias do entorno da Serra do Caraça (bacias do rio Conceição, Gualaxo do Norte e Piracicaba) que sofrem com a degradação ambiental advinda da mineração e da monocultura de eucaliptos, conforme já exposto anteriormente.

A Figura 3-4 mostra a área onde foram coletadas as amostras. O mapa foi elaborado com auxílio do software ArcGis (versão 10) e de cartas topográficas na escala 1:50000, obtidas pela biblioteca digital do IBGE (2011). Destaca-se que os pontos de coleta 9 e 10 abrangeram a região dentro da RPPN do Caraça.

Figura 3-3 – a) Cascatinha, situada no córrego Cascata na área do parque do Caraça, com suas águas de coloração escura b) devido à presença de compostos húmicos.

a)

No entorno do Caraça, fora dos limites da RPPN, o ponto 1 também foi de relativa importância ao aliar alta concentração de compostos húmicos (até 20 mg/L de COD, segundo Silva, 2010) com a presença de elementos metálicos como o ferro, que foi evidenciado pela presença de concreção laterítica, que pode ser visualizada na Figura 3-5.

Figura 3-5 – a) Coloração escura da água em um ponto ao sul da serra do Caraça (ponto 1), provavelmente devido ao Fe e a compostos húmicos. b) Presença de concreção laterítica.

Nesse ponto ainda foi possível observar claras variações na vegetação e no nível da água ao longo das três campanhas de coleta. Inclusive não se pôde amostrar água no mês de agosto/2011, pois o brejo estava seco, o que é mostrada na Figura 3-6.

Figura 3-6 – a) Nível d’água e vegetação (ponto 1) em outubro/2010, b) março/2011 e c) agosto/2011.

a) b)

As áreas dos pontos 1, 2, 5, 6, 7 e 8 estão inseridas na região dos limites da Serra do Caraça que, como já foi exposto, sofre com os efeitos na mineração e da monocultura de eucaliptos. Na Figura 3-7 é possível observar claramente o contraste entre a serra, uma região minerada e o ponto 1 de coleta.

Figura 3-7 – Ponto de coleta em contraste com uma área minerada e a Serra do Caraça.

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