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1.3 Brasil: perspectiva histórica

1.3.2 Serviço público federal

Em suas origens, as aposentadorias no setor público eram concebidas como benefícios não contributivos, de modo que o financiamento recaia inteiramente sobre o Erário. Como inexistia previsão de pagamentos aos herdeiros, os montepios e, posteriormente, os institutos

concedida ao Ministério do Bem-Estar Social, denominação antiga do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (Lei no 8.742/1993).

de pensões, surgiram do desejo de conceder proteção aos dependentes após o falecimento dos servidores (PINHEIRO, 1999).

Certas categorias obtiveram cobertura para seus dependentes a partir do final do século XVIII. Especificamente, sabe-se que o “Plano de Beneficência dos Órfãos e Viúvas dos Oficiais da Marinha” foi instituído ainda no Brasil Colônia (1795), enquanto o “Meio-soldo (Montepio) do Exército” data do princípio do Império (1827). Depois das forças armadas, vieram as primeiras iniciativas no âmbito do serviço público civil da União. O “Montepio Geral da Economia (Mongeral)” foi criado em 1835, sendo destinado a todos os empregados do governo. Na época da Proclamação da República, entre 1890 e 1892, surgiram planos para os funcionários do Ministério da Fazenda, empregados civis do Ministério da Guerra e operários efetivos do Arsenal da Marinha da Capital Federal (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 1985).13

Nas primeiras décadas do século XX, outros grupos de servidores adquiriram cobertura para seus familiares por meio de novos montepios. Em 1938, foi criado o Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores do Estado (IPASE), reunindo a filiação das entidades menores (Decreto-Lei no 288). O IPASE pagava pensões e pecúlio mediante

uma contribuição que inicialmente variava de 4% a 7% da remuneração (a alíquota única de 5% vigorou de 1944 em diante), pois as aposentadorias e a assistência médica eram financiadas pelo Tesouro, que repassava os recursos para aquele órgão. Embora o IPASE tenha sido extinto em 1977 – depois de ter sobrevivido à unificação dos demais institutos no INPS em 1966 –, quando foi criado o SINPAS, a contribuição para as aposentadorias só foi instituída de maneira permanente em 1993 (SILVA, 2003).14

Nogueira (2012) observa que a primeira referência constitucional à aposentadoria dos servidores foi feita em 1891 e que, desde então, todas as demais elencaram um rol de benefícios mais ou menos semelhante, mas sem menção clara à fonte de custeio. Enquanto a Constituição de 1891 previa apenas a aposentadoria por invalidez, a de 1934 passou a prever uma aposentadoria compulsória por idade e a de 1937 acrescentou a possibilidade de aposentadoria compulsória por motivação política a juízo exclusivo do governo, situação desconsiderada nos textos posteriores. Por sua vez, a Constituição de 1946 e a de 1967, assim como a EC no 1 de 1969, previram a aposentadoria voluntária por tempo de serviço.

Na Constituição de 1988, foi mantida a aposentadoria por invalidez, a voluntária e a compulsória por idade. Finalmente, a EC no 20/1998 substituiu o tempo de serviço pelo

13 No mesmo período, os funcionários de atividades relacionadas diretamente à prestação de serviços

públicos foram contemplados com o direito à aposentadoria, tais como os empregados dos Correios (1888), das Estradas de Ferro (1888), da Imprensa Nacional (1889), Casa da Moeda (1911) e Capatazias da Alfândega do Rio de Janeiro (1912) (SOUSA, 2002).

14 A contribuição dos servidores para financiar suas aposentadorias havia sido aprovada no Congresso

em 1991 (Lei no 8.162). Porém, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que tal cobrança era

inconstitucional. Assim, foi necessário passar uma Emenda Constitucional (EC no 3/1993) para

tempo de contribuição e introduziu uma idade mínima para a aposentadoria programada. Para Pinheiro (1999), a administração pública brasileira do início do século XX era baseada em um modelo semelhante ao adotado nas fases colonial e imperial desse país, nas quais os cargos públicos eram considerados doações. Na década de 1930, ocorreu a primeira reforma administrativa da República, visando a reorganização e profissionalização do serviço público (administração burocrática no lugar da patrimonial), com a introdução dos concursos públicos.

De fato, o primeiro estatuto dos funcionários públicos civis da União é de 1939 (Decreto-Lei no 1.713). SegundoNogueira (2012), a mudança de paradigma na administra-

ção pública teve efeitos limitados devido à existência de outras formas de contratação mais flexíveis. Por exemplo, o Decreto-Lei no 280/1938 permitiu a contratação do pessoal para

obras e dos chamados extranumerários (contratados, mensalistas, diaristas e tarefeiros). Por sua vez, o segundo estatuto foi aprovado em 1952 (Lei no 1.711). Porém, a Lei no 3.780/1960 estabeleceu que somente as atividades permanentes seriam realizadas pelos estatutários. Os serviços transitórios ou eventuais seriam executados por empregados públicos cujas relações de trabalho seriam regidas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT – Decreto-Lei no 5.452/1943). Essa dicotomia foi reforçada durante o regime militar.

Pode-se citar, como exemplos, a segunda reforma administrativa do país (Decreto-Lei no

200/1967) e as normas sobre os regimes de trabalho permitidos (Lei no 6.185/1974). Con-

sequentemente, na época da redemocratização (1985), grande parte da força de trabalho da União era “celetista” (regida pela CLT).

Na década de 1990, esse quadro foi modificado (figura1.4). Seguindo a Constituição de 1988, todos os entes federativos tiveram que estabelecer um regime jurídico único (RJU) de trabalho nas suas administrações públicas.15 No âmbito da União, o novo estatuto

recepcionou todos os antigos estatutários e celetistas (Lei no 8.112/1990). De acordo

comSilva (2003), o mesmo foi feito por diversos outros entes federativos, que adotaram o estatuto federal como referência. Ademais, a Constituição garantiu estabilidade aos empregados de todas as esferas que, apesar de não terem ingressado por meio de concursos públicos, estavam em exercício há cinco anos ou mais.16

15 A EC no19/1998 havia eliminado a exigência de RJU. Ocorre que o plenário do STF, provocado por

uma medida cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade no ano 2000, enxergou vício formal na tramitação dessa Emenda, suspendendo a eficácia da nova redação em 2008 (efeitos não retroativos), data do acórdão.

16 Se um ente federativo possui um RPPS, devem ser vinculados a ele, além dos novos servidores

admitidos por concursos, tanto os empregados recepcionados pelo RJU como aqueles que ganharam estabilidade. Por muitos anos, houve controvérsia em torno da vinculação para fins de previdência dos empregados declarados estáveis pela Constituição, mas ela foi sanada pelo Parecer noGM 030/2002,

Figura 1.4 – Fração de vínculos estatutários na administração pública (governos federal, estaduais e municipais) – 1985 a 2015a 40 50 60 70 80 90 100 % 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015

Fonte: Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), Ministério do Trabalho.

aA Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada

pelo IBGE, apresenta uma tendência parecida nos anos 1990, mas os níveis são muito diferentes. As duas fontes possuem problemas de declaração.