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3 ENVELHECIMENTO ATIVO: UMA CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS PARA A EFETIVAÇÃO DO DIREITO DA PESSOA IDOSA

3.4 O SERVICO SOCIAL E A “GARANTIA” DO DIREITO DA PESSOA IDOSA

Para Paulo Netto (2001), o surgimento do Serviço Social, enquanto profissão, deu-se a partir de uma perspectiva conservadora apresentada em dois momentos principais: o surgimento da profissão como prática na divisão sociotécnica do trabalho, por meio de resposta conservadora às expressões da questão social,30 com o intuito de manter a ordem estabelecida para reprodução do capital. O segundo momento levantado pelo autor é a de que a profissão surgiu subalterna às Ciências Sociais, como profissão técnico-operativa, pragmática, avessa às formulações teóricas e à produção de conhecimento, sustentada teoricamente nas produções das Ciências Sociais.

A respeito da trajetória do Serviço Social no Brasil, é somente nos anos 1980/1990 que a profissão apresenta novos direcionamentos. Novos códigos de ética são elaborados e pautados pela primeira vez a partir do compromisso com a classe trabalhadora, com a intenção de romper com os traços tradicionais e conservadores que perpassavam a profissão nesse período. Especificamente, no ano de 1993 viu-se a necessidade de revisar alguns aspectos contidos no Código de Ética profissional de 1986. Dessa forma, o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) no uso de suas atribuições, por meio da resolução de n° 273, institui o Código de Ética profissional do(a) assistente social e outras providências em 13 de março de 1993.

De acordo com o Código de Ética profissional (1993, p. 24), “[...] tem-se a necessidade de criação de novos valores éticos, fundamentados na definição mais abrangente, de compromisso com os usuários, com base na liberdade, democracia, cidadania, justiça e igualdade social [...]”. Dessa maneira, ao assistente social cabem ações pautadas nesse código de ética, por meio de princípios que norteiam sua prática profissional nas variadas expressões da “Questão Social”. O envelhecimento é incorporado como uma expressão da questão social quando toma uma proporção considerável, passando a exigir que o Estado garanta ações sociais de sobrevivência sem as quais alguns indivíduos, dadas suas particularidades, seriam incapazes de manter (PAULINO, 2006). Coloca-se que o processo de envelhecimento é uma demanda crescente e irreversível e, enquanto fenômeno social, está presente como uma das

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De acordo com Iamamoto (2000, p. 27), a “Questão Social” é apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade.

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atribuições profissionais no XI princípio do código e ética, assim, o “[...] Exercício do Serviço Social sem ser descriminado(a), nem descriminar, por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, orientação sexual, identidade de gênero, idade e condição física [...]” (CONSELHO FEDERAL, 1993, p. 24).

Pereira (2005) aponta que alguns aspectos têm induzido tanto as universidades quanto os cursos de ensino superior, incluindo o Serviço Social, para voltar suas atenções para a problemática do envelhecimento. Considerando que a viabilização do direito do idoso é uma atribuição profissional, por meio de atividades interventivas, trabalhando de forma direta com as políticas e direitos sociais, o Serviço Social é umas das profissões que portam instrumentos teórico-metodológicos que capacitam e subsidiam para intervenção nas mais variadas expressões da “Questão Social”.

O Serviço Social, para Pereira (2005, p. 3), “[...] não pode se abster do exame crítico do significado e implicações contextuais deste fenômeno, visto que ele não se dá de forma isolada [...]”. No cenário de desigualdades, o processo de envelhecimento torna-se algo complexo, visto que cada indivíduo sofre os impasses de forma diferente, especialmente os que vivem em condições de vulnerabilidade social. A partir disso, os profissionais devem sempre, por intermédio da dimensão investigativa, procurar atualizar seu arsenal teórico- metodológico para produção de conhecimento, contribuindo também para possíveis modificações nas políticas sociais existentes.

As implicações do neoliberalismo e da crise estrutural do capital refletem ameaças constantes frente às políticas sociais, o que tem afetado atualmente todos os países do mundo. Os governos, por meio do Estado, alegam não apresentar recursos econômicos para aumentar os investimentos no combate aos problemas sociais em crescimento, o envelhecimento e a questão do desemprego (PEREIRA, 2005). O fato é que não só a problemática do envelhecimento, mas todos os segmentos e movimentos sociais que reivindicam seus direitos estão sendo afetados pelos cortes e reformas que as políticas sociais contemporâneas enfrentam nos dias de hoje. A “diminuição” do compromisso dos governos para a viabilização dos direitos sociais dos brasileiros apresentam reduções consideráveis e os “ataques” podem ser visualizados por meio de “reformas”, principalmente, nas políticas de proteção social específicas ao idoso.

De modo geral, podemos notar que a condição do idoso, nessa forma de sociedade, se comparado aos outros segmentos, estão tendenciados a condições menos favoráveis, exigindo, assim, maiores atenções. Silveira e Mocelin (2017), por exemplo, demonstram que as

condições em que se encontram os idosos estão diretamente influenciadas pela sociedade capitalista na qual estão inseridos, pois a reprodução social do envelhecimento é também a reprodução social do sistema capitalista.

Não só o Serviço Social, em seus espaços sócios-ocupacionais e acadêmicos, mas todas as profissões comprometidas com o envelhecimento devem direcionar maiores ações para os assuntos gerontológicos. Conforme Pereira (2005), ainda é inexistente no curso de Serviço Social diretrizes e políticas de formação para o atendimento ao idoso, como também a inclusão da matéria dentro das Diretrizes Curriculares obrigatórias, ambas de acordo com a portaria de n° 56 da Secretaria de Ensino Superior (SESU).

Faz-se necessário inserir constantemente a questão do envelhecimento na pauta de ensino, pesquisa e extensão, incorporando disciplinas alternativas e abordando também sobre o processo de transição demográfica, os aspectos demográficos bem como suas consequências, que são bastante influentes na consolidação das políticas sociais. Sendo assim, não devem estar inexistentes para o curso de Serviço Social (PEREIRA, 2005).

Por essa razão, a autora chama atenção: como o Serviço Social é uma profissão interventiva, suas pesquisas devem ter como meta não apenas o conhecimento da realidade, mas também o uso desse conhecimento para contribuir com mudanças socialmente necessárias dessa ou nessa realidade. Assim, “[...] a pesquisa sobre o fenômeno do envelhecimento a ser realizada pelo Serviço Social não constituirá um fim em si mesmo, mas um meio capaz de subsidiar ações ou políticas planejadas e intencionais [...]” (PEREIRA, 2005, p. 12).

Certamente, os desafios para atuação profissional dentro de um contexto de crise são imensos, e verifica-se que, essas transformações incidem similarmente sobre as profissões. Para Paulo Netto (2012, p.416), “as transformações societárias” – desencadeadas mediante o contexto atual de crise estrutural – refletem de forma direta em algumas áreas profissionais, em especial na atuação (e formação) do Serviço Social, visto que as lógicas conservadoras que movem essas transformações tendem a ser impulsionadas a partir do aumento dos ganhos capitalistas, evidenciando, cada vez mais, um adiantamento da formação31.

São muitos os desdobramentos ocasionados pela crise e implicam maiores desafios para os assistentes sociais, de modo que, dentro de um contexto de crise estrutural, seus

31 Aqui colocada por meio da expansão de instituições de ensino superior à distância, bem como do reordenamento das grades curriculares no interior das academias.

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efeitos afetam diretamente o “mundo do trabalho”32, especialmente para o Serviço Social que ultrapassa alterações significativas. De acordo com Paulo Netto (2012),

[...] a segmentação do mercado de trabalho põe a diferenciação nas condições de trabalho nas instituições estatais e nas da „iniciativa privada‟, mesmo que se considere que tal diferenciação seja esbatida na medida em que a lógica destas últimas possa a vir ser incorporada por várias daquelas. Mas a segmentação coloca especialmente, desafios instrumental-operativos diversos. Se na maioria das instituições estatais, o que essencialmente rebate no capitalismo tardio em busca de „flexibilidade‟ é a restrição de coberturas, nas da „iniciativa privada‟, o que se altera mais rapidamente são as atribuições e papéis profissionais (PAULO NETTO, 1996, p. 122).

Daí explica-se o crescimento da inserção dos profissionais de Serviço Social em instituições privadas e organizações não governamentais (que estão dentro do chamado terceiro setor). Passam a atribuir aos assistentes sociais práticas meramente assistencialistas, trazendo de volta o debate para uma compreensão da prática profissional a partir da concepção de meros executores de políticas sociais. É possível também notar alterações significativas do mercado de trabalho profissional, por meio do envolvimento de uma perspectiva neoconservadora que progressivamente exige, por parte dos profissionais, respostas imediatistas, limitando-se apenas a uma competência teórico-metodológica33 (técnico-operativa), atendendo apenas – direta ou indiretamente – as demandas e projetos institucionais. É importante salientarmos que a lógica do mercado capitalista e o avanço dos ideais neoliberais, paulatinamente, se fazem presentes em todos os segmentos da sociedade que buscam e reivindicam seus direitos.

32 Expressão utilizada por Antunes (1995). 33

Em relação às competências teórico-metodológicas, compreende-se, segundo Iamamoto (2004), a partir do que se apresenta como desafio nos dias atuais à atuação profissional, três dimensões que deve embasar a atuação profissional: a competência teórico-metodológica, que diz respeito à necessidade de o profissional estar aptamente se qualificando, uma vez que a realidade torna-se altamente dinâmica; a dimensão ético-política, na qual o profissional deve portar uma direção crítica com clareza de sua prática; técnico-operativa: o profissional deve criar um conjunto de instrumentais que o permitam atuar mediante a realidade tanto dos usuários quanto da instituição.