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combate à utopia comunista no centro-oeste brasileiro

SEUS IMPACTOS NA EDUCAÇÃO

Como já afirmamos anteriormente o autoritarismo foi a tônica utilizada pelo Estado brasileiro, fruto do pacto da elite dominante de origem latifundiária ou burguesa, para conduzir a modernização do país, bem como seus regimes políticos, com vistas a alijar do processo diversos segmentos sociais.

Demerval Saviani aponta que o contexto da década de 1960 configurou-se como um período controverso, de grandes expectativas, tanto no campo da esquerda, que considerava essa situação como pré-revolucionária, quanto pela direita, que acreditava ser esse o momento definitivo da expansão econômica brasileira. Ainda segundo ele, o slogan de “50 anos em 5” de Juscelino teve grande repercussão entre a sociedade brasileira. As frações de classe travavam uma luta por interesses políticos, econômicos e sociais naquele momento histórico, que era expressa na prática institucional representada por seus intelectuais e suas visões de mundo, compondo assim um campo de produção ideológica em franca disputa.

Saviani chama atenção também para a formulação ideológica que orientava o governo de Juscelino no período, a saber: o nacionalismo do ISEB, criado um pouco antes de sua eleição, e a doutrina da interdependência, elaborada pelos ideólogos da ESG, considerados a intelligentsia militar mais sólida daquele período.

Enquanto o ISEB, de um lado, elaborava a ideologia do nacionalismo desenvolvimentista e a ESG, de outro, formulava a doutrina da interdependência, a industrialização avançava, impulsionada pelo governo Kubitschek, que conseguia assegurar relativa calmaria política, dando curso às franquias democráticas, graças a um equilíbrio que repousava na seguinte contradição: ao mesmo tempo em que estimulava a ideologia política nacionalista, dava sequência ao projeto de industrialização do país, por meio de uma progressiva desnacionalização da economia. Essas duas tendências eram incompatíveis entre si, mas no curso do processo o objetivo comum agregava grupos com interesses distintos, divergentes e até mesmo antagônicos. Nessas condições, a contradição permanecia em segundo plano, em estado latente, tipificando-se na medida em que a industrialização progredia, até emergir como contradição principal quando se esgotou o modelo de substituição de importações (SAVIANI, 2008, p. 292).

Como se observa, a situação política e econômica era extremamente contraditória, uma vez que a ideologia da política nacionalista era solapada por uma desnacionalização da economia via uma forte introdução do capital estrangeiro para o financiamento das obras de infraestrutura no Brasil. Embora a situação se mostrasse bastante contraditória, ao que parece o nacionalismo foi, pelo menos por um certo tempo, capaz de unir em torno de si classes e interesses divergentes.

A reflexão de Saviani nos parece bastante importante, pois destaca, no campo ideológico de orientação de Juscelino, além do ISEB, já discutido por nós anteriormente neste capítulo, a Escola Superior de Guerra (ESG) como um órgão fundamental no contexto do nacional-desenvolvimento e, sobretudo, na ditadura militar. Hélio Jaguaribe, em uma entrevista concedida em 2008, nos esclarece sobre a importância do ISEB, bem como sobre quais motivos o levaram a sair desse órgão, em função de divergências com alguns intelectuais que pretendiam utilizar o centro de estudos como espaço de militância política.

Essa discussão foi muito grande no ISEB e terminou, em dezembro de 1958, numa noite dramática, que começou às nove horas da noite e se encerrou às cinco da madrugada seguinte. Nela terminei vencendo na discussão, por um voto. Mas aí entraram as férias. Roland Corbisier, que

tinha sido derrotado, deu um pequeno golpe de estado e, aproveitando-se da ignorância de Juscelino Kubitschek a respeito da estrutura do Instituto, converteu o ISEB, que era um órgão parlamentar, num órgão burocrático. Ou seja, o diretor passou a ser designação do Ministro da Educação e não, como era antes, por eleição de um Conselho. Então, resolvi sair do ISEB, porque esse ISEB burocratizado não me interessava mais. Na verdade, o final do ISEB, a meu ver, não foi feliz, porque foi arrastado por uma visão primária do marxismo barato, do comunismo de tipo muito fácil, e se tornou um órgão de “agit prop” e não um Centro de pensamento. Álvaro Pinto, que era um homem de pensamento, que foi o último diretor do ISEB, foi arrastado, por deficiências de sua personalidade e outros problemas complexos de ordem psicológica, a fazer do ISEB uma coisa sem importância. Na verdade, no final, o ISEB era um eco do PC, não tinha mais nenhuma vida própria. Mas eu estava afastado dele desde 1959, de modo que não participei desse ISEB final (Entrevista a Hiro Barros Kumasaka e Luitgarde O. C. Barros. Rio de Janeiro, 9 de março de 1988. p. 12).

Além do ISEB, na formulação ideológica de propostas para a situação brasileira durante o nacional-desenvolvimentismo outro órgão importante foi a ESG. Segundo o historiador Luiz Felipe Mundin (2007), o Estado buscou na ESG e em outros órgãos, como o Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, seus principais projetos administrativos e sua fundamentação e legitimação como aparelho regulador da vida social. Algumas das grandes motivações para a criação da ESG foram a guerra fria e o anticomunismo provenientes do contexto do pós-Segunda Guerra Mundial.

Mundim (2007), em sua dissertação intitulada Juarez Távora e Golbery do Couto e

Silva: Escola Superior de Guerra e a organização do Estado brasileiro (1930-1960),

destaca que desde a criação da ESG houve uma evolução conceitual e um desenvolvimento muito fecundo da doutrina ideológica militar para formulação do poder a ser adotado pelo Estado. O autor aponta a década de 1940 como o momento em que ocorre um fenômeno na produção ideológica no Brasil, que passa a se afirmar por meio de práticas institucionais. Órgãos como o ESG, o ISEB e o Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais (IJNPS), além de instituições partidárias e/ou universitárias, como o PCB e a USP, forneceram aos intelectuais brasileiros os meios práticos para fundamentar seus projetos teóricos. Afirma ainda que Juarez Távora e Golbery do Couto e Silva tiveram um papel preponderante nesse processo a partir de seus ingressos simultâneos na ESG, instituição responsável pela formulação da “Doutrina de Segurança Nacional” (DSN).

Juarez Távora e Golbery frequentaram a ESG, ambos no mesmo período, quando também sistematizaram e escreveram os seus textos e as suas conferências, depois publicados como livros – Juarez, de 1951 a 1952 como aluno, e de 1952 a 1954, como comandante; e Golbery, de março de 1952 a novembro de 1955, como membro do corpo permanente da Escola (MUNDIM, 2007, p. 24).

Mundim afirma que Golbery, fortemente ligado à verdadeira elite brasileira, extrapolou sua simples condição de intelectual militar, demonstrando grande capacidade em auxiliar na estruturação do Estado autoritário brasileiro, na intenção de salvá-lo do que considerava uma total desordem social.

O caso de Golbery é emblemático. Só se fala em Golbery remetendo-se diretamente à ESG e, por conseguinte, ao Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipes) e ao Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad). A observação da particularidade do lugar em que Golbery produziu o seu projeto teórico para o Brasil torna possível fornecer os elementos necessários para apontar, na relação instituição-intelectual, a composição de um sistema simbólico que se pretendia hegemônico, na medida em que levava adiante a autoconsciência de uma missão de salvação nacional. Esse aspecto é mais claro em Golbery, que em sua atividade intelectual pela ESG, em seus textos e palestras, precisa melhor a tarefa da verdadeira elite brasileira, formada tanto por militares quanto por civis, tecnoburocratas e especialistas da organização da produção no País, como a única capaz de salvar a nação da desordem social e do atraso econômico, características de um momento de anomia que o Brasil vivia em sua história, podendo assim livrar a nação da “ameaça do comunismo” (MUNDIM, 2007, p. 25).

Assim como Saviani, Mundim também concorda com a tese da dualidade intelectual contraditória que marcou o Brasil na década de 1950, que encontrava o nacional- desenvolvimentismo no ISEB e a forma nacional-conservadora e autoritária na ESG, veiculada, sobretudo, no pensamento de Juarez Távora e Golbery do Couto e Silva. Os embates entre os intelectuais desses dois grupos eram constantes – se, por um lado, os isebianos eram considerados infiltrados pela ESG, estes eram considerados ingênuos e dicionarizados por aqueles, como destacou Hélio Jaguaribe em uma de suas entrevistas, na qual deixava claro que as relações entre os dois grupos não eram muito complicadas na década de 1950, mas se conturbaram na de 1960. Afirmava ele:

Eram relações não muito estreitas. Eu fui convidado, naquela época, umas duas vezes, para fazer conferências na Escola Superior de Guerra. Naquela ocasião, quando fui, não tive muito boa impressão da forma pela

qual os militares estavam tratando as coisas, porque eles tinham uma perspectiva muito ingênua, dicionarizada: A, para a-água, a-ar etc... Compilavam dados sob a forma de tópicos de uma enciclopédia, sem uma estrutura conceitual organizadora, a não ser a concepção pouco civilista do poder nacional. No nível puramente intelectual, a Escola Superior de Guerra era então uma coleção de verbetes. Agora, ao nível da visão do poder nacional, ela tinha uma certa filosofia, que considero inclusive ingênua (Entrevista a Hiro Barros Kumasaka e Luitgarde O. C. Barros. Rio de Janeiro, 9 de março de 1988, p. 16).

Para Mundim (2007), a ESG buscou, a partir da integração civil-militar comprometida com o pensamento nacional conservador e autoritário, construir, para além de uma representação instrumental da fração burguesa associada ao capital estrangeiro, as condições de desenvolvimento capitalista dominado por ideólogos, especialistas e técnicos de todas as áreas da produção. Segundo ele, foi por esse motivo que na década de 1960 a referida escola aumentou a participação civil em suas fileiras, tanto na qualidade de estudantes quanto por meio de civis palestrantes que eram convidados para suas atividades, a exemplo de Roberto Campos, Octávio Gouveia de Bulhões, Eugênio Gudin e Lucas Lopes (MUNDIM, 2007).

Luiz Felipe Mundim informa ainda que a DSN foi formulada no interior da ESG em função de sua ligação com a FEB (Força Expedicionária Brasileira), com influência e contribuição direta dos EUA em sua implantação, por meio de missão militar americana vinda da National War College. Golbery esclarecia essa preocupação com a segurança na obra Geopolítica do Brasil, conforme destaca:

A ESG partiria, assim, do princípio da guerra total como “fenômeno” dado, e da orientação realista nas relações internacionais como premissa para a tomada de posição na Guerra Fria. Quem melhor justificou essa visão, e deu unidade ideológica para esse pensamento, foi Golbery. Tal visão, introdutória ao seu mais conhecido livro, Geopolítica do Brasil, teria a origem justificada no elemento primordial que impulsionaria o homem diante do mundo e, portanto, impulsionaria o próprio Estado, que seria a necessidade e a busca pela segurança (MUNDIM, 2007, p. 56).

A partir do estudo do pensamento de Golbery, Mundim demonstra que as estratégias não deveriam mais se limitar ao âmbito militar, mas projetar-se aos mais elevados planos, caracterizando-se como política de segurança nacional. Deveria ser constituída uma “estratégia geral”, que estaria na cúpula da segurança nacional, de competência e

coordenação do governo. Segundo o historiador, por meio da ESG formar-se-iam, então, os elementos ideológicos que legitimariam a interferência das forças armadas na vida política do país. Ou seja: as forças armadas “melhor” representadas, os militares da ESG, que, em conjunto com os civis “competentes”, definiam a nova elite esclarecida, pronta para se opor à elite dominante, marcada pelo “populismo” dos governantes amparados pela ala perigosamente “esquerdista” e de um “ingênuo nacionalismo” (MUNDIM, 2007, p. 60). Tal estratégia desses órgãos controladores deveria se estender sobre todos os aspectos da sociedade brasileira e, dessa forma, a educação não escaparia de tal controle e vigilância, principalmente no período da ditadura militar.

Nesse movimento de relacionar a parte (educação) e o todo (a conjuntura brasileira), Saviani afirma que o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), a primeira organização empresarial especificamente voltada para a ação política, foi desses importantes órgãos responsáveis pelo apoio a um pensamento autoritário no país. Segundo Saviani: “Sua finalidade explícita era combater o comunismo e aquilo que seus membros chamavam de ‘estilo populista de Juscelino’” (SAVIANI, 2008, p. 294).

O IBAD, juntamente com a ESG e o IPES (Instituto de Estudos Políticos e Sociais), criado em 1961 por um grupo de empresários e que teve como presidente Golbery do Couto e Silva em 1962, foram os principais responsáveis por uma ideologia que visava combater os interesses populares e instaurar um pensamento autoritário, tendo um papel de destaque no golpe civil-militar de 31 de março de 1964.

Saviani chama a atenção para o fato de que a justificativa de que o golpe foi dado com objetivo de salvar a conjuntura econômica do país não consegue anular o fato de que o mesmo trouxe uma mudança radical na vida política brasileira por mais de 21 anos, que guarda consequências traumáticas ainda nos dias de hoje. A educação foi um dos alvos desse processo. Segundo ele, após a consumação do golpe, o IPES organizou um seminário em dezembro de 1964 com o objetivo de pensar uma reforma educacional cujo propósito era adequar a educação aos interesses do capital. Sobre esse processo, afirma ele:

A orientação geral traduzida nos objetivos indicados e a referência a aspectos específicos, como a profissionalização do nível médio, a integração dos cursos superiores de formação tecnológica com as empresas e a precedência do Ministério do Planejamento sobre o da

Educação na planificação educacional, são elementos que integrarão as reformas de ensino do governo militar (SAVIANI, 2008, p. 295).

Saviani afirma que, em face das atividades realizadas pelos estudantes universitários em maio de 1968, o IPES realiza um novo seminário, no qual deixa mais claro seu objetivo de adequar a educação ao novo regime, sendo decisiva a participação de Roberto Campos, ministro do planejamento do governo Castelo Branco entre 1964 e 1967, que tinha como função aprovar os nomes dos palestrantes convidados. A conferência-síntese do evento girava em torno do conceito de capital humano, que deveria ser orientador do processo educacional a partir daquele momento. Saviani destaca seus principais elementos:

Este sentido geral se traduz pela ênfase nos elementos dispostos pela “teoria do capital humano”; na educação como formação de recursos humanos para o desenvolvimento econômico dentro dos parâmetros da ordem capitalista; na função de sondagem de aptidões e iniciação para o trabalho atribuída ao primeiro grau de ensino; no papel do ensino médio de formar, mediante habilitações profissionais, a mão de obra técnica requerida pelo mercado de trabalho; na diversificação do ensino superior, introduzindo-se cursos de curta duração, voltados para o atendimento da demanda de profissionais qualificados; no destaque conferido à utilização dos meios de comunicação de massa e novas tecnologias como recursos pedagógicos; na valorização do planejamento como caminho para racionalização dos investimentos e aumento de sua produtividade; na proposta de criação de um amplo programa de alfabetização centrado nas ações das comunidades locais. Eis aí a concepção pedagógica articulada pelo IPES, que veio a ser incorporada nas reformas educativas instituídas pela lei da reforma universitária, pela lei relativa ao ensino de 1º e 2º graus e pela criação do MOBRAL (SAVIANI, 2008, p. 296-297).

Como é possível perceber, a partir desse momento, sobretudo com a parceria dos EUA através dos acordos MEC-USAID, buscou-se implantar uma educação produtivista e reduzir os custos de financiamento para tal área. Um dos pontos centrais desse processo é a Reforma Universitária (Lei n. 5.540, de 28 de novembro de 1968). Segundo Saviani:

Completando esse processo, foi aprovada, em 11 de agosto de 1971, a Lei n. 5.692/71, que unificou o antigo primário com o antigo ginásio, criando o curso de 1º grau de 8 anos e instituiu a profissionalização universal e compulsória no ensino de 2º grau, visando atender à formação de mão-de- obra qualificada para o mercado de trabalho (SAVIANI, 2008, p. 298).

Avaliando o legado educacional da ditadura civil-militar, Saviani destaca que, em que se pese a tese de que o ensino de modo geral tenha crescido durante o período, ela deve ser contraditada com o fato de que o lobby no Conselho Federal de Educação favoreceu principalmente o crescimento das instituições privadas de educação no país.

Apesar da adequação aos interesses militares e ao capital, Saviani indica que a educação é um campo de contradições.

Alexandre Lira chama a atenção para o fato de que as instituições escolares, fossem de ensino fundamental, médio ou superiores, sofreram fortes represálias, inclusive com a criação de legislação especifica que garantiu institucionalmente esse processo. Foi o caso da Lei n. 4464/1964, instituída por Suplicy de Lacerda, que dizia o seguinte:

Fica vedado aos órgãos de representação estudantil qualquer manifestação ou propaganda de caráter político partidário, bem como indicar, ou promover ou apoiar a ausência coletiva dos trabalhos escolares, isto é, manifestações contra o governo. Determinou também que diretores de faculdades, de escola e reitores incorrerão em falta grave se, por atos, omissão ou tolerância, permitirem o não cumprimento da lei (LIRA, 2010, p. 64).

A vigilância era constante no interior das escolas e das universidades no período; as denúncias poderiam vir de qualquer lugar, a qualquer momento. Alunos denunciavam professores, professores denunciavam alunos e diretores e vice-versa; ninguém escapava das práticas de delação de agentes infiltrados ou simplesmente favoráveis à ditadura. O clima era de constante tensão e já não se sabia em quem confiar – muitos alunos e professores foram expulsos e/ou mesmo presos e torturados.

A principal motivação para que os estudantes brasileiros organizassem uma resistência ao regime era a tentativa de acabar com a Reforma Universitária e cessar os acordos MEC-USAID, além de questionar a Lei n. 4464 (Lei Suplicy de Lacerda), que significou um duro golpe à autonomia universitária na tentativa de transformar as universidades em meras fundações particulares e de buscar extinguir os diretórios centrais de estudantes (DCEs) e a própria UNE, substituindo-os pelo Diretório Nacional de Estudantes (DNE), órgão que ficaria sob a tutela do Ministério da Educação, possibilitando assim maior controle de suas ações.

José Luis Sanfelice, em sua análise sobre o movimento estudantil, indica que o este não cedeu, mesmo com os processos repressivos:

O movimento estudantil continuava nas ruas mais do que nunca, naquele ano de 1968. No mês de março ocorreu a morte do estudante Edson Luís Lima Souto, quando a polícia reprimia uma manifestação no Calabouço (Paz e Terra, abril de 1968: 282-7). Seguiram-se várias manifestações, em diversos pontos do país, que culminaram, em 1º de abril, no maior movimento de protesto contra o regime já conseguido até aquela época. Era o quarto aniversário do movimento de 64 e, na cidade do Rio de Janeiro, o choque de manifestantes com a Polícia Militar, auxiliada pelo DOPS, resultou em mais dois mortos: o estudante Jorge Aprígio de Paula e o escriturário Davi de Souza Neiva. Sessenta populares e 39 policiais ficaram feridos, 321 pessoas presas e a cidade praticamente ocupada por tropas federais. Em Goiânia, com um tiro de fuzil na cabeça, morreu o estudante Ivo Vieira (SANFELICE, 1986, p. 145).

Sanfelice afirma que, aos poucos, a repressão foi minando a resistência do movimento. A situação se agravou ainda mais com os acontecimentos repressivos do ano de 1968 e com o fracasso do Congresso de Ibiúna, no qual todos os participantes foram presos. O fato foi noticiado pelo jornal Folha de São Paulo em 13 de outubro de 1968.

13 – Congresso da UNE – todos presos: Cerca de mil estudantes que

participavam do XXX Congresso da UNE, iniciado clandestinamente num sitio, em Ibiúna, no Sul do Estado, foram presos ontem de manhã por soldados da Força Pública e policiais do DOPS. Estes chegaram sem serem pressentidos e não encontraram resistência. Toda a liderança do movimento universitário foi presa: José Dirceu, presidente da UEE, Luís Travassos, presidente da UNE, Vladimir Palmeira, presidente da União Metropolitana de Estudantes, e Antonio Guilherme Ribeiro Ribas, presidente da União Paulista de Estudantes Secundários, entre outros. Eles foram levados diretamente ao DOPS. Os demais estão recolhidos ao presidio Tiradentes. Desde segunda-feira os habitantes de Ibiuna notaram a presença de jovens desconhecidos, que iam à cidade comprar pão, carne, escovas e pasta de dentes, despertando suspeitas ao adquirir mais de NCr$ 200 de pão de uma só vez. Essas informações foram transmitidas ao DOPS e à Força Pública, que desde quinta-feira já conheciam segundo afirmaram —o local exato do Congresso. A denúncia de um caboclo, que

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