2.3 CONFIANÇA 2.3.4 Principais Correntes Teóricas da Confiança 2.3.4.3 Sistema Social Luhmann (1979), para explicar sua teoria, propõe um ideal imaginário, sugerindo um mundo em um estado natural, desestruturado e complexo para os indivíduos. Nesse mundo, toda ação ou reação é tida como impossível de ser gerenciada por dois ou mais atores na formação de um relacionamento interativo. Tais atores são testados através da proposição de problemas que precisam resolver. Como os outros atores com quem eles poderiam se relacionar possuem um comportamento duvidoso, leva-se em consideração um número ilimitado de ações e reações, não sendo possível a seleção das possibilidades desejadas. Em resumo, o mundo se apresenta complexo para os atores sociais para permitir a existência de coordenação de expectativa e de relacionamento. Para Cunha (2004), no mundo real, as expectativas sociais e ações podem ser coordenadas e planejadas no sistema social, através de meios que permitem reduzir a complexidade e limitar o alvo das observações que os atores sociais fazem sobre o comportamento dos outros. De uma forma regular, os atores sociais selecionam um curso particular de ação e ignoram outras possíveis ações, baseados em certos princípios ou códigos. O sistema social surge então da relação, através da possível existência de instrumentos sociais que permitem orientar ações e expectativas dos atores sociais, resultando em soluções aceitáveis (CUNHA, 2004). Para Bachmann et al (2001), no mundo real, os atores lidam com problemas para coordenar seus interesses. Luhmann (1979) acredita que o mundo social real necessita ter mecanismos que auxiliem a reduzir incertezas e complexidade e permitam a elaboração de expectativas sobre o comportamento de outros atores sociais. Esses instrumentos são essenciais para a construção do sistema social diferenciado. Para o autor, sem os mecanismos de coordenação, o mundo social não existiria. A confiança é vista como o principal exemplo desses mecanismos de coordenação, pois, ao permitir considerações sobre o comportamento de outros atores, reduz incertezas sobre a relação de confiança. Para Luhmann (1979), a confiança é, entre outras coisas, resultante da familiaridade, sendo que, nos últimos anos, essas condições de familiaridade vêm sofrendo alterações significativas, e, nas últimas décadas vêm passando por transformações. Ainda segundo este autor, como não se pode viver sem um mundo familiar, as sociedades tendem a usar símbolos e mitos para reintroduzir o familiar dentro do não-familiar. Mesmo que a confiança seja fundamental na realidade social, todavia ela pode apresentar problemas, como o envolvimento entre os atores ou o risco do contrato. Luhmann (1979) relata que um ator social ao confiar em outro ator, poderá limitar-se às informações disponíveis apenas sobre o comportamento do outro, à partir da possibilidade de uma confiança incerta e menos complexa simultaneamente à produção de riscos na relação. Luhmann (1979) sugere que a existência de normas legais é uma solução para redução de riscos de confiança, provendo de boas razões o indivíduo que depende da confiança que busca, antes de decidir investir em um relacionamento baseado em confiança. Além das regulações legais, existem outros elementos da estruturação institucional do sistema sócio-econômico que precisam ser considerados no processo de construção da confiança. Uma vez que esses outros elementos institucionais, sejam normas, regras, regulamentos ou qualquer forma de normatização fiquem claros, seu objetivo enquanto instrumento de regulação será o de reduzir os riscos da confiança para os agentes da relação. Na teoria da estruturação social, confiança é definida como uma ferramenta para a redução da complexidade de interação entre os atores sociais, ao adotar expectativas sobre o comportamento futuro de outros pela seleção de possibilidades, podendo estas serem baseadas em processos históricos, em características compartilhadas ou em mecanismos institucionais (LUHMANN, 1979). Confiança processual histórica – está ligada ao passado ou a trocas realizadas anteriormente, sendo responsável pela construção da confiança através do acúmulo gradativo de conhecimentos diretos ou indiretos sobre o outro (CUNHA, 2004). Esse tipo de confiança é desenvolvido deliberadamente pelas empresas, pois se parte da presunção de um grau de estabilidade e da existência de uma baixa troca de firmas ou organizações de mercado (LUHMANN, 1979). Confiança baseada em características compartilhadas – surge da semelhança e concordância social entre confiante e confiado por pertencerem ao mesmo grupo social ou à mesma comunidade, e compartilharem status ético, base familiar, religião, enfim, características que permitam a construção de um mundo em comum (CUNHA, 2004), sendo esse tipo de confiança baseada na prerrogativa de valores, e não sendo criada de forma decidida (LUHMANN, 1979). Confiança baseada em mecanismos institucionais – não pode ser apenas gerada através das relações familiares pessoais. Os atores organizacionais criam uma forma impessoal de confiança, mesmo não tendo características pessoais em comum ou histórico que garanta relações futuras. A confiança é criada baseada em uma estrutura social formal, sendo reduzidos os seus riscos em decorrência de meios legais (CUNHA, 2004), podendo ser produzida de forma proposital, já que os mecanismos legais precisam ser socialmente legitimados para surtirem seus efeitos legais (LUHMANN, 1979). Segundo Luhmann (1979), as bases da teoria do sistema social tratam a confiança de uma forma mais abrangente, indo além das consequências geradas pelo risco calculado. Essa teoria leva em conta, ainda que parcialmente, as considerações da teoria institucional. Ainda segundo Luhmann (1979), a confiança surge da relação social, sendo também fruto de ação racional, sendo vista, portanto, como a soma dos dois aspectos, racional e social. Sob a ótica social, a confiança implica a aceitação de elementos como normas e expectativas, sendo que a sociologia explica a confiança a partir de interações passadas, como por exemplo relações prévias entre organizações (ZAHERR; HARRIS, 2006). Partindo dessa abordagem, a confiança é baseada na boa vontade (goodwill) do próximo, sendo entendida como uma expectativa positiva em relação à atitude do outro, e que este, por sua vez não irá tirar proveito de forma unilateral da relação formada (UZZI, 1997). As teorias apresentadas até o momento serviram de apoio às análises da pesquisa empírica. No entanto, adotou-se como base referencial a teoria social focada na confiança baseada em características, uma vez que o objeto do estudo procurou entender as relações de confiança entre as culturas árabe e chinesa. No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CENTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTRATÉGIA E ORGANIZAÇÕES DISSERTAÇÃO DE MESTRADO (páginas 45-48)