3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
3.1.2. Sistemas de classificação de movimentos de massa
As classificações dos movimentos de massa envolvem uma grande variedade de materiais, processos e fatores condicionantes, resultando em diversas propostas de sistemas de classificação nacional e internacional. A maioria dos sistemas de classificação desenvolvidos
ao longo dos anos foi baseada nas condições geológicas e climáticas regional, tendo aplicabilidade basicamente de caráter local.
Na literatura científica nacional e internacional constam inúmeras propostas para classificação dos movimentos de massa a partir da combinação de diferentes critérios atribuídos à este processo tais como as características associadas ao movimento (velocidade de deformação e tipo do movimento), a natureza do material (teor de umidade, textura, estrutura; geometria e quantidade de massa mobilizada), a geometria do talude e às condições ambientais (climatologia e hidrologia). De um modo geral, o desenvolvimento de sistemas de classificação de movimentos de massa tem grande importância no meio geológico-geotécnico pois permite associar e relacionar os diferentes tipos de movimento com um conjunto de características e seus fatores condicionantes.
Guidicini e Nieble (1976) citam as propostas de sistema de classificação de movimentos de massa elaboradas por Baltzer, Heim, Penck e Molitor que datam do final do século XIX. Estes mesmos autores também mencionam trabalhos do século XX, destacando alguns realizados por Terzaghi, Sharpe, Varnes, Skempton e Hutchinson.
Sharpe (1938) propôs um sistema de classificação em que considera como parâmetros a velocidade do movimento, o tipo do material (solo ou rocha) e a quantidade de água ou gelo atuante nesse processo (GUIDICINI; NIEBLE, 1976), como apresenta a Figura 3.1. O trabalho de Sharpe (1938) foi amplamente difundido e precursor para inúmeros sistemas de classificação, apresentando como principal vantagem a sua simplicidade e o seu caráter genérico na identificação dos tipos de movimentos.
Figura 3.1 – Classificação dos movimentos de massa segundo Sharpe (1938). Fonte: Guidicini e Nieble (1976).
Baseado no trabalho de Sharpe (1938), Varnes (1978) elaborou um sistema de classificação bem simples para os movimentos de massa no qual utiliza apenas dois critérios para essa classificação: tipo de movimento e tipo de material mobilizado. A classificação proposta por Varnes (1978) é considerada como a classificação oficial da Associação Internacional de Geologia de Engenharia (International Association for Engineering Geology – IAEG), tornando-se modelo para muitos pesquisadores e a mais utilizada internacionalmente.
Tabela 3.4 – Classificação dos movimentos de massa segundo Varnes (1978).
Tipo de movimento
Tipo de material
Rocha Solo
Fino Grosseiro
Quedas De rocha De detritos De terra Tombamentos De rocha De detritos De terra Escorregamento rotacional Abatimento de rocha Abatimento de detritos Abatimento de terra Escorregamento
translacional
Poucas unidades De blocos rochosos De blocos de detrito De blocos de terra Muitas unidades De rocha De detritos De terra Expansões laterais De rocha De detritos De terra Corridas/escoamentos De rocha De detritos De terra Complexo combinação de dois ou mais tipos de
movimentos
Fonte: Traduzido e adaptado de Varnes (1978).
Hutchinson (1988) propôs um sistema de classificação de movimentos de massa fundamentada na morfologia da massa em movimento e em aspectos relacionados ao tipo de material, ao mecanismo de ruptura, à velocidade do movimento, às condições de pressão neutra e às características do solo. A proposta de classificação apresentada por Hutchinson (1988) foi baseada na classificação de Varnes (1978), abrangendo todos os tipos de movimentos de solo e rocha, sendo considerada uma das classificações mais complexas e completas até o momento. A classificação de Hutchinson (1988) divide o movimento de massa em alívio de tensões, rastejo, rompimento de taludes de montanha, escorregamentos, fluxo de detritos, tombamentos, quedas e movimentos complexos de talude.
Também existem algumas propostas de classificações nacionais de movimentos de massa sugeridas por pesquisadores brasileiros a partir da década de 1950 (AUGUSTO FILHO, 1992; BARATA, 1969; COSTA NUNES, 1966; CUNHA; FARAH; CERRI, 1991;
FREIRE, 1965; GUIDICINI; NIEBLE, 1976; VARGAS; PICHLER, 1957). Dentre as inúmeras propostas nacionais, destacam-se as sugeridas por Augusto Filho (1992), Freire (1965) e Guidicini e Nieble (1976).
Freire (1965) desenvolveu um sistema de classificação pioneiro no Brasil baseado no trabalho de Sharpe (1938), em que divide os movimentos de massa em escoamentos (rastejo e corridas), escorregamentos (rotacionais e translacionais) e subsidências e desabamentos. A proposta de Freire (1965) foi fundamentada nos dados físicos dos locais, na superfície de escorregamento e materiais envolvidos, nos dados mecânicos associados ao desenvolvimento dos movimentos e no tempo de duração dos fluxos e suas causas.
Guidicini e Nieble (1976) adaptaram a proposta de Freire (1965), acrescentando mais um grupo aos tipos de movimentos de massa, estando distribuídos da seguinte maneira: escoamentos (rastejo e corridas), escorregamentos (rotacionais, translacionais, quedas de blocos e quedas de detritos), subsidências (subsidências, recalques e desabamentos) e formas de transição movimentos complexos.
Augusto Filho (1992) propôs um sistema de classificação bastante simplificada, na qual os movimentos de massa encontram-se divididos em rastejo (ou fluência), escorregamentos, quedas e corridas (ou fluxos), como indicam a Tabela 3.5. Nesta proposta, Augusto Filho (1992) busca revisar e adaptar a classificação de Varnes (1978) de acordo com os processos de escorregamentos observados no Brasil.
Tabela 3.5 – Classificação dos movimentos de massa segundo Augusto Filho (1992).
Processos Características do movimento, material e geometria
Rastejo ou fluência
Vários planos de deslocamento (interno)
Velocidades muito baixas (cm/ano) a baixas e decrescentes com a profundidade
Movimentos constantes, sazonais ou intermitentes Solo, depósito, rocha alterada/fraturada
Geometria indefinida
Escorregamento
Poucos planos de deslocamento (externos) Velocidades médias (km/h) a altas (m/s) Pequenos a grandes volumes de material
Geometria e materiais variáveis
Planares: solos pouco espessos, solos e rochas com um plano de fraqueza Circulares: solos espessos homogêneos e rochas muito fraturadas
Em cunha: solos e rochas com dois planos de fraqueza
(conclusão)
Tabela 3.5 – Classificação dos movimentos de massa segundo Augusto Filho (1992).
Processos Características do movimento, material e geometria
Queda
Pequenos a médios volumes
Geometria variável: lascas, placas, blocos, etc Rolamento de matacão
Tombamento
Sem planos de deslocamento
Movimentos tipo queda livre ou em plano inclinado Velocidades muito altas (vários m/s)
Material rochoso
Corrida
Muitas superfícies de deslocamento (internas e externas à massa em movimentação)
Movimento semelhante ao de um líquido viscoso Desenvolvimento ao longo das drenagens
Velocidades médias a altas
Mobilização de solo, rocha, detritos e água Grandes volumes de material
Extenso raio de alcance, mesmo em áreas planas
Fonte: Augusto Filho (1992).