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Sistemas de cren¸cas especializados: o exemplo de agentes com

1.2 Atitudes Epistˆ emicas

1.2.3 Sistemas de cren¸cas especializados: o exemplo de agentes com

A ideia de agentes com recursos limitados foi explorada por Renata Wassermann [99] em sua tese de doutorado. Em tal trabalho, a autora considera agentes com limites de mem´oria e habilidade l´ogica – ou seja, agentes n˜ao idealizados. O sistema proposto por Wassermann segue Harman – de fato, o referido sistema pode ser entendido como uma formaliza¸c˜ao das ideias apresentadas por Harman [45], juntamente com a teoria de agentes m´ınimos proposta por Cherniak [10].

A teoria apresentada por Cherniak define agentes m´ınimos como aqueles que pos- suem as habilidades m´ınimas exigidas para que estes possam ser chamados de racionais. O ponto paradigm´atico, afirma o autor, ´e que todo agente fact´ıvel deve ser necessaria- mente finito, com limites em sua habilidade cognitiva – limita¸c˜oes de tempo, mem´oria ou mesmo em suas habilidades dedutivas. Sua hip´otese central ´e que a defini¸c˜ao de ra- cionalidade universalmente assumida na filosofia ´e t˜ao idealizada que esta n˜ao se aplica a agentes humanos. Ele define, pois, uma hierarquia em cujo topo perfiguram os agentes ideais, com estados epistˆemicos fechados por consequˆencia l´ogica e, na borda inferior, os agentes incapazes de perfazer qualquer inferˆencia l´ogica – que n˜ao podem, pois, ser chamados de racionais.

De acordo com o autor, qualquer agente racional (mesmo os intermedi´arios na hie- rarquia) devem satisfazer o que ele chama de condi¸c˜oes m´ınimas de racionalidade geral,

a partir da qual ele deriva a condi¸c˜ao m´ınima de inferˆencia – exigˆencia de que, dado um conjunto de cren¸cas, os agentes devem perfazer algumas, por´em n˜ao necessaria- mente todas, as inferˆencias aparentemente apropriadas. Desta forma, comportamentos aparentemente n˜ao-racionais podem ser justificados pelas limita¸c˜oes do agente.

Outro importante ponto ´e a distin¸c˜ao entre cren¸cas ativas, ou levadas em conside- ra¸c˜ao, e inativas. Uma simples inferˆencia pode se tornar mais dif´ıcil caso nem todas as premissas estejam ativas. N˜ao pretendemos expor toda a teoria deste autor, apenas frisar que esta ataca a ideia usualmente aceita de que qualquer agente deva raciocinar de acordo a uma l´ogica correta e completa, bem como expor os elementos utilizados no sistema desenvolvido por Wassermann [99]. Por exemplo, n˜ao se deve esperar de um agente que este cheque todos os fatos que poderiam contradizer uma asser¸c˜ao, mas ao menos algumas das possibilidades relevantes devem ser consideradas – o processo de se eliminar contra-exemplos ´e t˜ao limitada quanto os recursos dispon´ıveis.

Um das principais contribui¸c˜oes da referida tese ´e justamente formalizar as ideias presentes nos autores citados – Cherniak e Harman. Grosso modo, em tal teoria, os agentes s˜ao considerados como entidades, naturais ou artificiais, com limita¸c˜oes de mem´oria e habilidades l´ogicas. Algumas cren¸cas do agente s˜ao consideradas explicita- mente representadas – o n´umero de cren¸cas expl´ıcitas ´e finito, por´em grande o suficiente a ponto de n˜ao haver limites pr´aticos.

Cada agente possui uma opera¸c˜ao de inferˆencia a ele associada, que fornece todas as inferˆencia poss´ıveis em cada passo do processo de revis˜ao. Ademais, o conjunto de cren¸cas impl´ıcitas ´e dado pelo fecho das cren¸cas expl´ıcitas, e todo o racioc´ınio ocorre em uma pequena parte do estado epistˆemico do agente representado pelas cren¸cas ativas (as cren¸cas s˜ao ativadas, por exemplo, quando recentemente adquiridas, quando relevantes ao racioc´ınio considerado ou mesmo quando recentemente inferidas). Em tal conjunto h´a ainda conjecturas (ou hip´oteses), as quais o agente ainda n˜ao aceitou totalmente,

por´em as quais o mesmo considera fazˆe-lo. Vejamos o diagrama (retirado de [99]).

Figura 1.1: Agentes com recursos limitados – Estrutura das cren¸cas

As cren¸cas expl´ıcitas (ativas e inativas) organizam-se como uma rede na qual as conex˜oes (links) denotam algum tipo de relevˆancia. As cren¸cas s˜ao ent˜ao organizadas em compartimentos, e cren¸cas no mesmo compartimento tendem a ser ativadas juntas. Grosso modo, ao receber uma nova informa¸c˜ao o agente a incorpora provisoriamente em seu conjunto de cren¸cas ativas e, ent˜ao, aquela ´e posta em quest˜ao pelo agente – que decidir´a se a incorporar´a ou n˜ao em seu conjunto de cren¸cas expl´ıcitas. Desta forma, ´e poss´ıvel definir diversas opera¸c˜oes sobre o estado epistˆemico, nas quais as cren¸cas:

• expl´ıcitas tornam-se ativas;

• ativas s˜ao rejeitadas;

• s˜ao provisoriamente assumidas como ativas;

• passam de ativas para expl´ıcitas;

• s˜ao inferidas a partir de cren¸cas ativas;

Obviamente, tais opera¸c˜oes b´asicas podem ser combinadas para permitir todas as poss´ıveis mudan¸cas que se espera de um estado epistˆemico.

Importante observar, neste momento, que a abordagem adotada no sistema de agen- tes com recursos limitados relaciona-se de maneira interessante com o sistema por n´os desenvolvido nesta tese – destacamos, por exemplo, o fato de que ´e poss´ıvel ao agente possuir cren¸cas contradit´orias (em determinado momento do processo de revis˜ao) sem que isso seja considerado n˜ao-racional. Discorreremos mais sobre esta rela¸c˜ao nos mo- mentos oportunos.

Pretendemos salientar que certamente modelos com estados epistˆemicos mais com- plexos, de Revis˜ao de Cren¸cas especializada, tais como o sugerido por Wassermann, aproximam-se mais dos diferentes fenˆomenos espec´ıficos a serem formalizados. Fri- samos, pois, que n˜ao desconsideramos estas abordagens ao sugerir um sistema mais simples, baseado em estados epistˆemicos menos complexos – muito pelo contr´ario: rei- teramos que a principal vantagem de modelos mais simples ´e justamente utiliz´a-los como ponto de partida, heur´ıstico e formal (material), para a constru¸c˜ao de distintos outros sistemas mais complexos13, bem como relacion´a-los de maneira mais direta a distintos conceitos l´ogicos (filos´oficos e formais), tal como citamos na Introdu¸c˜ao.