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LISTA DE FIGURAS

1.1. Sistemas magnéticos multicomponentes

No início da década de 80 do século passado, alguns trabalhos de pesquisas em semicondutores mostraram que partículas multicomponentes e/ou compósitos apresentavam melhora na eficiência do material quando comparadas às correspondentes partículas únicas e, em alguns casos, diferentes propriedades surgiam dessa nova estruturação10,11,12. Já na década de 90, pesquisadores sintetizaram semicondutores organizados em multicamadas concêntricas com o objetivo de melhorar suas propriedades. Tais materiais receberam a terminologia caroço@casca (do inglês, core@shell)12,13,14,15. Devido à demanda da tecnologia moderna, existe um aumento gradual no número de trabalhos envolvendo estruturas multicomponentes e, simultaneamente a este crescimento, o avanço nas técnicas de caracterização tem auxiliado na investigação e no desenvolvimento de diferentes estruturas caroço@casca. Uma grande vantagem das estruturas caroço@casca é que sua síntese pode ser planejada de acordo com a aplicação que se busca para o material final. A estrutura, o tamanho e a composição dessas partículas podem ser direcionados hierarquicamente durante o procedimento de síntese resultando em sistemas que podem apresentar propriedades magnéticas, ópticas, catalíticas ou biológicas16 e, sobretudo, uma combinação de duas ou mais propriedades. Devido a sua versatilidade, as nanoestruturas caroço@casca representam uma classe de materiais de fronteira entre a química e as diferentes áreas em que encontram aplicações, com destaque para aquelas em biomedicina, farmácia, catálise, fotoluminescência, dentre outras17. A

literatura descreve também outra importante aplicação das estruturas caroço@casca como precursores na síntese de partículas ocas, a partir da remoção do caroço por dissolução ou calcinação18,19,20,21.

Na grande maioria dos sistemas multicomponentes baseados em nanoestruturas do tipo caroço@casca, o caroço apresenta uma propriedade relevante (semicondutora, metálica, magnética) enquanto que a casca pode servir para estabilizar o caroço, criar compatibilidade entre o caroço e o meio em que a partícula será empregada, por exemplo, biocompatibilidade em sistemas biológicos, ou ainda modificar a carga superficial, funcionalidade ou reatividade da nanoestrutura22. A construção desses

sistemas pode acontecer em uma única etapa ou, mais comumente, a partir da modificação da superfície das partículas do caroço previamente sintetizado. A modificação da superfície do caroço para formação da casca pode acontecer através de reações químicas, adsorção de moléculas ou pequenas partículas ou ainda por processos de auto-organização (self-assembly) e ligações cruzadas (crosslinking) de macromoléculas23.

Nanopartículas (NP) de magnetita (Fe3O4) e maguemita (γ-Fe2O3) têm sido

largamente utilizadas como caroço na construção de sistemas magnéticos multicomponentes do tipo caroço@casca. A combinação entre um caroço e uma casca, sendo um deles magnético, confere multifuncionalidade à partícula obtida. Enquanto sistemas monofuncionais provêm uma simples função – um quantum dot pode exibir alta fluorescência, mas não pode ser removido de uma matriz por ação de um campo magnético – sistemas multifuncionais são capazes de reunir diferentes propriedades em uma única partícula, surgindo deste comportamento novas potencialidades de aplicação na área biomédica como carregadores de fármacos, agentes de contraste em imagens por ressonância magnética nuclear, hipertermia, biosseparação e biodetecção22,23,24.

Para os sistemas caroço@casca magnéticos, o recobrimento das partículas magnéticas é uma estratégia adotada para proteger a sua superfície de reações de oxidação e biodegradação e impedir a agregação das partículas, preservando assim suas propriedades magnéticas. Dependendo da aplicação que se busca para o sistema, o recobrimento pode ser constituído por moléculas orgânicas, como polímeros e biomoléculas, ou por camadas inorgânicas de sílica, metais, óxidos ou sulfetos metálicos22.

Nanopartículas magnéticas (NPM) recobertas com uma casca metálica podem ser encontradas no trabalho de Wang et al.25 que relata a síntese do sistema Fe3O4@Au. A multifuncionalidade da nanoestrutura é conferida pela casca de ouro

associada ao caroço magnético. A cobertura de Au confere estabilidade às NP do caroço contra oxidação em condições biológicas além de atuar como uma superfície atrativa para posterior funcionalização com biomoléculas. Tais características associadas às propriedades plasmônicas do Au em nanoescala torna o sistema Fe3O4@Au extremamente interessante para aplicações magnéticas, ópticas e

biomédicas. As NP do caroço e a casca de Au metálico foram obtidos a partir da decomposição térmica do acetilacetonato de ferro(III) e do acetato de ouro(III), respectivamente, na presença de ácido oleico e oleilamina. A decomposição ocorre sob refluxo tendo como solvente um poliol que atua também como agente redutor. Uma imagem de microscopia eletrônica de transmissão (TEM) e a ilustração esquemática da NP Fe3O4@Au é mostrada na Figura 1.

Figura 1. Representação esquemática das NPM de Fe3O4@Au [Adaptado da referência

25].

No trabalho desenvolvido por Peng et al.26, a síntese sonoquímica foi utilizada

para a formação da casca no sistema Fe3O4@ZrO2, desenvolvido para aplicação como

biossensor na absorção de mioglobina. As NP de Fe3O4 foram inicialmente obtidas pelo

método da coprecipitação. Os dados de TEM, apresentados na Figura 2(a), revelam que as NP de Fe3O4 foram obtidas na forma esférica com diâmetro entre 6-10 nm. Após

o recobrimento com ZrO2, Figura 2(b), a morfologia é mantida e observa-se um

aumento de tamanho para 40-50 nm. A espessura da casca de ZrO2 determinada foi de

∼ 19 nm. As Figuras 2(c) e 2(d) mostram o comportamento das NPM na ausência e na presença de um campo magnético externo, respectivamente.

Fe3O4

Au

Figura 2. (a) e (b) Micrografias TEM das amostras Fe3O4 e Fe3O4@ZrO2,

respectivamente, sintetizadas por Peng et al.26; (c) e (d) Comportamento da amostra Fe3O4@ZrO2 na ausência e na presença de campo magnético, respectivamente.

[Retirado da referência 26]

Wang et al.27, descreveram a síntese de um sistema caroço@casca para detecção, adsorção e remoção de íons mercúrio de soluções aquosas. O caroço é constituído por NP de Fe3O4 de 10 nm e, após a deposição da sílica, as partículas

atingem diâmetro entre 50 e 60 nm. As partículas foram funcionalizadas com rodamina B para atuar como uma sonda seletiva e sensível de íons Hg(II) (limite de detecção de 10 ppb). A propriedade magnética do caroço facilita a remoção das partículas após adsorção do Hg(II) por aplicação de um campo magnético externo. Desta forma, as microesferas combinam as funções dos três componentes: molécula orgânica, casca mesoporosa e caroço magnético. A síntese do caroço foi realizada através do processo poliol e a formação da casca de sílica porosa ocorreu através da hidrólise-condensação do tetraetilortossilicato (TEOS). As micrografias de microscopia eletrônica de varredura (SEM) das amostras do caroço e do sistema multicamadas são apresentadas na Figura 3.

Figura 3.Micrografias SEM das amostras: (a) Fe3O4; (b) Fe3O4@SiO2, sintetizadas por

Wang et al.27 (c) e (d) Micrografias de TEM da amostra Fe

3O4@SiO2. [Retirado da

referência 27]

Um trabalho que ilustra claramente o processo de síntese de partículas multicomponentes hierarquicamente organizadas foi desenvolvido por Grumezescu et

al.28. Os autores descrevem a síntese de microesferas magnéticas ocas de sílica.

Inicialmente as NPM de Fe3O4 foram obtidas a partir do método da coprecipitação na

presença de microesferas de dextrano comercial (Fluka, diâmetro de partícula de ~50

µm). O sistema dextrano@Fe3O4 foi recoberto com uma casca de sílica que foi obtida a

partir do silicato de sódio. Após o tratamento térmico da amostra para remoção do caroço de dextrano, foram obtidas esferas magnéticas ocas de sílica conforme procedimento ilustrado na Figura 4(a). As Figuras 4(b-d) apresentam as micrografias de SEM das partículas de dextrano, dextrano@Fe3O4 e Fe3O4@SiO2, respectivamente. As

propriedades de carregador de fármacos do material foram exploradas a partir da investigação da atividade antimicrobiana de diferentes antibióticos utilizados no carregamento das partículas.

Figura 4. (a) Ilustração da metodologia de síntese das microesferas magnéticas ocas de sílica. Micrografias SEM das amostras: (a) Dextrano; (b) Dextrano/Fe3O4; (c)

Fe3O4@SiO2. [Adaptado da referência 28]

Os diferentes sistemas citados acima apresentam multifuncionalidade decorrente do comportamento magnético do caroço de magnetita utilizado na construção das estruturas caroço@casca. As nano e microesferas de magnetita, assim como de maguemita, apresentam propriedades superparamagnéticas que justificam os inúmeros trabalhos descritos na literatura envolvendo sua síntese, caracterização e utilização na construção de sistemas multicomponentes para diferentes aplicações. Essa propriedade magnética será apresentada para a magnetita uma vez que foi este o caroço proposto para a obtenção dos sistemas multicomponentes desenvolvidos nesta Tese.

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