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Situações investigativas como cenário de aprendizagem da matemática

4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS

4.3 CONSTITUIÇÃO E DISCUSSÃO DAS CATEGORIAS DE ANÁLISE

4.3.3 Situações investigativas como cenário de aprendizagem da matemática

A última categoria a ser discutida – situações investigativas como cenário de

aprendizagem da matemática – é composta por somente uma unidade temática, investigação matemática como via de aprendizagem da matemática (UT5). Embora seja

categorias anteriormente discutidas em função de sua particularidade, a proposta de investigação, identificada nesse estudo como a tendência Pedagogia de Projetos.

Conforme visto no Capítulo 3 dessa dissertação, essa tendência, proposta inicialmente no século XIX, nomeada de outra forma e com algumas características diferentes devidas ao contexto da época, evidencia a importância da participação ativa do aluno na construção de seu conhecimento, também destaca a importância do processo que se ocorre para se desenvolve o conhecimento, pois, conforme afirma Prado (2005), o aluno aprende no processo de produzir.

A Pedagogia de Projetos, conforme já abordado, assemelha-se em alguns aspectos com a Modelagem Matemática, que também tem como característica a investigação, no entanto, pelo procedimento sugerido na coleção didática, todas as situações investigativas encontradas apontavam para uma certa liberdade de organização para realização da atividade, não tendo exclusivamente o modelo matemático como objetivo final, mas a discussão entorno de um tema de importância social.

Na coleção, em alguns casos, a proposta proporciona a constituição de dados para

atividades de investigação matemática (UR28). Um exemplo pode ser identificado no livro do

6º ano, em que há a orientação para pesquisa com viés estatístico sobre os pontos positivos e negativos do bairro em que se localiza a escola, buscando trazer a realidade do aluno para dentro da sala de aula.

Nota-se, como característica em destaque na coleção, a presença de investigações dentro do bloco de conteúdos “Tratamento da Informação”. O que caracteriza a proposta dos autores em abordar a investigação em atividades envolvendo estatística, a construção de gráficos e tabelas, conforme propõe a atividade retratada pela fotografia a seguir.

Fotografia 13 – Levantamento de pontos positivos e negativos no bairro da escola

Fonte: Livro do 6º ano, p.113. Fotografada pela autora.

Verifica-se na situação ilustrada pela fotografia 13 que, embora a proposta de investigação tenha partido do livro didático, exige bastante comprometimento dos alunos, pois os convida a discutir e refletir para criar as alternativas do questionário a ser utilizado, começando a construção do conhecimento nesse pequeno processo. Após a elaboração de tabela e gráfico, existe a proposta de debate e a produção de relatório com observações e conclusões, o que representa uma atividade bastante elaborada e cheia de possibilidades para instigar a participação do aluno no processo de aprendizagem, mostrando que a matemática não está isolada do contexto social e que como afirma Hernández (2000), a articulação de conhecimentos é fundamental. Esse tipo de atividade pode ser considerada uma primeira

inserção da pesquisa na trajetória escolar do aluno.

Outra característica marcante das UR que compõem essa categoria é a discussão envolvendo a questão do lixo, produção e reciclagem. Essas UR abordam a apresentação de

dados numéricos envolvendo produção de lixo em grandes centros (UR84) e registro da

quantidade de lixo produzido, cálculo e comparação de percentuais e reflexão sobre reciclagem (UR85). A fotografia a seguir evidencia essa preocupação.

Fotografia 14 – Proposta de investigação envolvendo a questão do lixo

Fonte: Livro do 7º ano, p. 134. Fotografada pela autora.

Verifica-se nas situações sintetizadas na UR84 e UR85 que a apresentação do assunto é

produzida, principalmente, para fornecer dados para realização de cálculos. Porém, embora não de maneira tão ampla como na unidade de registro descrita anteriormente (UR28), as

situações investigativas descritas nessas duas UR promovem a discussão e reflexão em torno de um tema que é muito importante para o meio ambiente, necessitando, no entanto, de complementação e construção de reflexões que, por não estarem indicadas no livro didático, ficam a cargo do professor.

No caso das atividades relacionadas à questão do lixo, a investigação proposta pelo

livro didático necessita de uma atenção especial do professor para que de fato possa ser mais aprofundada e permita o envolvimento ativo do aluno, incluindo à produção de dados para realização de cálculos e ao tratamento da informação, a transformação da informação em

conhecimento próprio, como pontuam Hernández e Ventura (1998).

Reforçando o caráter social das situações investigativas presentes na coleção, existe a proposta de uma investigação matemática envolvendo coleta, organização, representação e

análise de dados e discussão sobre orçamento familiar (UR87), no livro do 7º ano e uma

investigação matemática envolvendo coleta, organização, representação, análise e discussão de dados (UR150) com o objetivo de analisar as condições de vida do povo brasileiro, no livro

do 9º ano. A fotografia a seguir ilustra a situação envolvendo o orçamento familiar.

Fotografia 15 – Investigação sobre orçamento familiar

Fonte: Livro do 7º ano, p. 142. Fotografada pela autora.

A situação investigativa exposta apresenta vários elementos que possibilitam ao aluno aprender no processo de produzir, conforme Prado (2005) considera importante, descobrindo,

levantando dúvidas, buscando novas compreensões e reconstruindo o conhecimento.

Nesse sentido, Malheiros (2007) afirma que a condução do processo de investigação pode variar e esse processo é tão importante quanto o resultado final da atividade. No entanto, não há como deixar de falar do papel do professor frente às atividades investigativas. Nessas situações, de acordo com Prado (2005), o professor deixa de ser a peça central do processo, para realizar as mediações necessárias para que o aluno possa aprender e tornar significativa sua aprendizagem. Com relação ao papel do professor, Ponte e Quaresma (2012) pontuam que cabe ao professor estimular a interação construtiva entre os alunos trabalhando mais como orientador das aprendizagens do que como única fonte do saber.

O último destaque realizado nessa categoria de análise vai para a única situação encontrada, com base no referencial teórico abordado, que indica a tendência Resolução de Problemas. Nessa situação está proposta a sistematização das etapas da solução de um

problema (UR14), exigindo um esforço do aluno em imaginar estratégias de resolução,

registrar as estratégias de modo que outras pessoas possam entendê-la, conferir as estratégias e os resultados e por fim apresentar a resposta do problema, processo que aproxima-se do roteiro para resolução de problemas elaborado por Pólya em 1944, descrito no Capítulo 3 dessa dissertação.

Os demais problemas propostos pelos livros didáticos que fazem parte da coleção Praticando Matemática constituem o que Charnay (1996 apud Flemming, Luz e Mello, 2005) afirma ser utilizado como critério de aprendizagem, em que se parte do simples para o complexo, visualizando um conjunto de partes simples. Também poderiam ser classificados como resolução de problemas como prática que é destacado por Stanic e Kilpatrick (1989), em que os problemas têm função de prática necessária para reforçar capacidades e conceitos ensinados.

Do mesmo modo, ao considerar a definição de problema apresentada por Onuchic (1999), os demais problemas apresentados na coleção não podem ser compreendidos dentro da tendência Resolução de Problemas, pois o aluno estará apenas aplicando uma fórmula ou uma determinada técnica operatória que dificilmente utilizará para resolver outros problemas, sem que construa um campo de conceitos que tomam sentido num campo de problemas.

Propostos dessa forma, os problemas não cumprem a função de orientação da aprendizagem, dão conta somente da aplicação da aprendizagem o que diverge das concepções de Resolução de problemas de Onuchic (1999) e, também, da proposta dos PCN que apontam a Resolução de problemas como o ponto de partida da atividade matemática.

de operações, vão de encontro à proposta da Educação Matemática Crítica, tendência não identificada na coleção didática, mas que permeia as discussões no que se refere a essa disciplina.

Para o principal protagonista da Educação Matemática Crítica, Ole Skovsmose, o que tem predominado é a domesticação dos alunos, por meio da matemática, sem que se ofereçam condições para que o aluno analise de forma crítica os contextos. Skovsmose afirma que a matemática deveria promover não apenas a resolução de um modelo, mas também a ampliação do repertório do aluno para que pudesse questionar porque, quando, como e para que utilizá-lo.

Retomando a essência do objetivo da dissertação, identificar quais e analisar como as tendências no Ensino da Matemática são abordadas, nesta coleção didática pode-se dizer que compuseram essa categoria de análise as tendências, Pedagogia de Projetos e Resolução de Problemas. Para complementar o desenvolvimento da análise foram trazidas para discussão as tendências: Modelagem Matemática e Educação Matemática Crítica. Ambas tendências foram trazidas para o cenário da discussão por constituírem elementos importantes para o Ensino da Matemática e por apresentarem algumas características (relacionadas à investigação) que às aproximam das tendências encontradas nos livros didáticos da coleção.

No que diz respeito a como são abordadas as tendências, nessa categoria, são trazidas como atividades à serem desenvolvidas (no Desenvolvimento, seção Exercícios e Seção

Livre), promovendo, na maioria das situações, a participação ativa do aluno no processo de

construção do conhecimento, possibilitando visualizar que a matemática oferece elementos que facilitam a análise de outros contextos, inclusive o social e o econômico.

Cabe destacar que, a partir da revisão de literatura em que se baseia essa dissertação, foram identificadas na coleção poucas situações investigativas que pudessem ser consideradas como Pedagogia de Projetos. As situações investigativas propostas pelos livros didáticos da coleção analisada, ainda assim, demandavam de muita atenção e organização do professor, pois, embora abordando temas de pesquisa de forte relevância para a sociedade, ofereciam poucos elementos para a discussão e problematização em torno desses assuntos, também não apresentavam indicações de leituras complementares ou outras referências.

Desse modo, percebe-se novamente a importância da participação do professor no processo de construção de conhecimento pelo aluno. O professor, que nesse tipo de atividade, descritas nessa unidade temática, deixa de exercer um papel central, tem, no entanto, uma tarefa bastante complicada de se realizar, promover a autonomia dos alunos, frente à produção e descoberta, ao mesmo tempo em que deve acompanhar o processo e sistematizar os

resultados obtidos.

Nesse cenário desafiador, destaca-se a necessidade de formação docente voltada às exigências de uma sociedade que se desenvolve a passos largos e requer uma postura ativa do cidadão, em contraposição ao contexto educacional, principalmente das escolas públicas que se desenvolvem lentamente, produzindo lacunas entre a matemática da vida real e a matemática escolar, fazendo com que o aluno, muitas vezes, não identifique a função social da matemática.