• Nenhum resultado encontrado

Condutores e isolantes

4.4 Sobre a “linha pendular” e a “linha branca”

4.4.1 A litha petdular

Um ponto que vale a pena observar ao ler as traduções dos ar- tigos de Gray são as possíveis definições do objeto chamado por ele de “linha pendular” (pendulous thread, nos originais em inglês). Dependendo da situação em que é utilizada, a linha pendular assu- me propriedades diferentes, podendo ser feita de linha isolante ou condutora, o que implica comportamentos bastante distintos. Em algumas situações, o texto de Gray não menciona o material de que a linha pendular é feita. Portanto, inferimos se ela é condutora ou isolante a partir do contexto em que é empregada. Vamos ver dois exemplos que ilustram essa questão.

A linha pendular parece ter sido mencionada por Gray pela pri- meira vez à página 228 do artigo de 173113 como uma pendulous thread.

Nesse caso, provavelmente referia-se a uma penugem condutora de- pendurada na ponta inferior de uma linha de seda isolante. O expe- rimento trata de uma linha pendular que é atraída e repelida por um prato eletrizado. Gray não especificou de que material foi feita essa linha pendular. Contudo, nesse exemplo em particular, afirma que a linha pendular “será atraída e repelida [pelo prato] muitas vezes se- guidas com um movimento muito rápido” (Gray, 1731-2c, p.228). Para que ocorra esse movimento repetido de atração e repulsão, o que nos parece mais provável é que essa linha pendular seja similar ao instrumento elétrico que ele descreveu em 1720 (Gray, 1720-1, p.107),14 o qual atualmente denominamos pêndulo elétrico. Trata-se

de uma vareta de madeira com uma fina linha de seda isolante presa a sua ponta. Na extremidade inferior da linha de seda era presa uma penugem. Gray segurava a vareta, na posição horizontal, com a mão. A linha de seda ficava na vertical, com a penugem na extremidade in-

13 Neste livro, à página 172.

STEPHEN GRAY E A DESCOBERTA DOS CONDUTORES E ISOLANTES 91 ferior. Embora a vareta de madeira se comporte como um condutor, isso não é relevante nesse caso.

Os aspectos cruciais são que a linha de seda comporta-se como um isolante, enquanto a penugem comporta-se como um condutor. Pode ser obtida uma sequência de atrações e repulsões com um pên- dulo elétrico ao colocá-lo entre um corpo eletrizado e um condutor aterrado (Assis, 2010, p.88-9).15 No caso específico desse experi-

mento de Gray, a penugem de seu pêndulo elétrico seria mantida na mesma altura do prato eletrizado pela linha de seda. A penugem ficaria entre o prato eletrizado e um corpo aterrado, que vamos su- por que seja um dedo de uma das mãos de Gray. Ao aproximar o pêndulo do prato eletrizado, a penugem é atraída pelo prato, toca nele, adquire uma carga de mesmo sinal que o prato, passa a ser re- pelida por ele, toca no dedo de Gray que está do outro lado da penu- gem, sendo então descarregada nesse aterramento. Ela, então, volta a ser atraída pelo prato eletrizado, e todo o procedimento se repete. Esse movimento vibratório de atração e repulsão continuará até que o prato tenha sido descarregado, quando então deixará de atrair a penugem. Utilizaremos, em nossos textos, a nomenclatura pêndulo elétrico para o instrumento que Gray reporta oscilar entre um corpo eletrizado e outro neutro, o qual ele denomina linha pendular.

No entanto, Gray também chama de linha pendular outro ins- trumento, que descrevemos em seguida. Em nossos textos, a no- menclatura linha pendular será utilizada apenas para o instrumento descrito a seguir. Contudo, o leitor deve ficar atento, porque nas traduções dos textos de Gray, a expressão linha pendular pode signi- ficar qualquer um dos dois instrumentos, dependendo do contexto. No texto de Gray de 1731 (p.403), a linha pendular provavel- mente era um condutor elétrico. O experimento trata de uma linha utilizada para verificar se uma bola de cortiça está eletrizada, ou seja, ela é utilizada como um detector de eletrização. Nesse caso, a linha deve ser um condutor elétrico – feita de algodão ou de li- nho, por exemplo – para poder ser visivelmente atraída pelo objeto eletrizado. Caso a linha fosse feita de seda, um material isolante, a

atração que ela sofreria pela bola de cortiça eletrizada seria muito pequena, não sendo tão perceptível quanto no caso anterior (Assis, 2010, p.90-2).

Alguns experimentos propostos por Assis (Ibid., p.90-2) permi- tem verificar que alguns materiais são bem atraídos por um corpo eletrizado, enquanto outros ou não são atraídos, ou então a atração sofrida por eles é bem menor do que aquela sofrida pelos primeiros materiais (Ibid, p.24-4). Supondo vários materiais de mesmo peso e formato, mas feitos de substâncias diferentes, o que se observa é que a atração sofrida pelos materiais condutores é bem maior do que aquela sofrida pelos materiais isolantes (Ibid., p.22-4, 90-2, 149, 198-201).

A partir desses experimentos, o leitor pode fazer uma compara- ção entre um corpo ser ou não ser atraído por um objeto eletrizado e o fato desse corpo ser ou não ser condutor. Ou seja, os materiais que são visivelmente atraídos são condutores ou isolantes? Ou os materiais que quase não são atraídos são condutores ou isolantes?

É possível estabelecer alguma relação? Sugerimos ao leitor que faça a leitura da Seção “Quais corpos descarregam um eletroscó- pio por contato?” (Ibid., p.147-152),16 pois nela há uma discussão

bastante interessante e completa sobre os materiais condutores e isolantes.

4.4.2 A litha bratca

O mesmo aplica-se ao objeto chamado por Gray de “linha bran- ca” (white thread, nos originais em inglês). Dependendo da situação em que é utilizada, a linha branca assume propriedades diferentes. Pode ser feita de linha isolante ou condutora, o que implica com- portamentos bastante distintos. Em algumas situações, o texto não menciona o material de que a linha branca é feita. Portanto, infe- rimos se ela é condutora ou isolante a partir do contexto em que é empregada. Vamos ver dois exemplos que ilustram essa questão.

STEPHEN GRAY E A DESCOBERTA DOS CONDUTORES E ISOLANTES 93 No texto de Gray (1731-2b, p.289),17 a linha branca prova-

velmente era um condutor elétrico. Aqui a linha é utilizada para verificar se objetos estão eletrizados, ou seja, é utilizada como um detector de eletrização. Nesse caso, a linha branca tem a mesma função da linha pendular já citada, apenas recebe um nome dife- rente. Portanto, deve ser um condutor elétrico, por exemplo, fei- ta de algodão ou de linho, para que seja visivelmente atraída pelo objeto eletrizado. Caso a linha branca fosse feita de um material isolante, como a seda, seria muito menos atraída por um objeto ele- trizado do que uma linha condutora de mesma densidade (isto é, de mesmo peso e de mesmo comprimento que a linha condutora) (Assis, 2010, p.90-2). Já no texto de Gray (1731-2d, p.397),18 existe

a possibilidade de interpretá-la como um material condutor e como um material isolante. Não vamos fazer aqui uma descrição sobre as duas possibilidades, pois a faremos em detalhes mais adiante.19

O importante, neste momento, é que o leitor fique ciente de que a expressão linha branca, tal como a expressão linha pendular, não tem significado único nos artigos de Gray. Portanto, é preciso ficar atento às situações e aos comentários para entender os diferentes significados que essas expressões assumem.

4.5 Diferenças entre os vidros da época de Gray