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CAPÍTULO 4: O REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO

4.2 O Percurso Metodológico

4.2.3 Sobre a coleta de dados, seu andamento no campo e os aspectos éticos

A coleta dos dados deu-se por meio de entrevistas abertas e em profundidade (BLANCHET; GOTMAN, 1992; BERTAUX, 2001). Tal técnica foi utilizada por se tratar de um dos recursos mais apropriados para a obtenção de material textual, a qual possibilita respostas explicativas dos participantes e contribui para a compreensão detalhada das crenças, atitudes, valores e motivações em relação aos modos de agir das pessoas em seus contextos específicos (BLANCHET; GOTMAN, 1992; BERTAUX, 2001; GASKELL, 2002). Este tipo de entrevista constitui-se um método fundamental em estudos sobre representações, por meio da

qual é possível obter dados básicos para o desvelamento dos pontos de vista dos sujeitos sobre os objetos em questão.

Os usuários foram contatados por profissionais dos serviços para a participação nas entrevistas, que foram agendadas e realizadas em salas reservadas para respeitar a privacidade e o sigilo das falas. As entrevistas foram realizadas somente após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, elaborado de acordo com as regras estabelecidas pela Resolução 196, de 10 de outubro de 1996 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Este termo se encontra no apêndice A.

As entrevistas foram organizadas em duas partes. A primeira parte constou de dados objetivos dos entrevistados, como idade, nível de instrução, renda, situação conjugal, dentre outros, os quais foram anotados na folha do roteiro e gravados. A segunda parte da entrevista consistiu na entrevista aberta com as questões pertinentes ao tema, obrigatoriamente gravadas em gravador eletrônico. Tomou-se o cuidado de encontrar um ponto de partida e formas de relance que levassem os sujeitos a se manifestarem sem provocar constrangimentos que pudessem bloquear ou limitar o discurso, tendo em vista a peculiaridade do tema tratado. O roteiro da entrevista se encontra no apêndice B.

Faz-se necessário ressaltar que o roteiro foi construído para atender a vários objetivos do eixo qualitativo do Projeto PESSOAS, contendo, assim, questões que não foram enfocadas neste estudo, mas o foram em outros estudos do grupo de pesquisa (FREITAS et al. 2008; GOMES, 2010).

Cabe pontuar que a elaboração de um roteiro para a entrevista se deu apenas como um guia para nortear o contato entre o entrevistador e o entrevistado. As entrevistas não seguiram uma estrutura rígida de questionamentos, havendo a preocupação do roteiro não se transformar em um limite à expressão do entrevistado. Além disso, a elaboração do roteiro buscou contemplar a diversidade de situações que poderiam se apresentar, considerando que cada pessoa tem uma história única com motivações próprias. Assim, as questões foram colocadas livremente.

Não houve definição do número de participantes a priori. O critério para suspensão da coleta de novas entrevistas foi o de saturação dos dados, que considera a exaustão dos significados em torno dos temas tratados, pela análise preliminar de cada entrevista concomitantemente à coleta. Todas as entrevistas

foram ouvidas pelos pesquisadores que as realizaram, sendo em seguida transcritas em WORD® e EXCEL® para constituírem o banco de dados a ser analisado pelo

grupo de pesquisa. Depois de digitadas, as entrevistas foram re-conferidas pelos respectivos entrevistadores. Em seguida, foram importadas para o programa de análise NVIVO7®. Os registros eletrônicos foram guardados à chave, com acesso

restrito aos pesquisadores.

Foi dada a opção para que cada entrevistado criasse seu próprio pseudônimo. Todavia, alguns participantes escolheram pseudônimos que permitiam sua identificação. Dessa forma, os sujeitos serão citados pela numeração atribuída à sua entrevista. No apêndice C encontra-se a listagem com a numeração de todas as entrevistas, onde consta também a idade, diagnóstico clínico e o tipo de serviço onde o entrevistado estava sendo acompanhado.

O tempo de duração das entrevistas e o número de encontros não foram definidos a priori, tendo ficado a cargo do pesquisador e dos entrevistados decidirem o momento de terminar, conforme o andamento das mesmas. Elas tiveram duração média de cinqüenta minutos.

Dentre todos os convidados a participar do estudo, somente um se negou ao ver que a entrevista seria gravada, mesmo tendo sido informado anteriormente disto. Em todos os demais casos, as entrevistas ocorreram sem interrupções ou desistências dos participantes.

Inicialmente foram realizadas sete entrevistas para se avaliar a pertinência do roteiro proposto. Após a realização de alguns ajustes, efetuou-se a coleta de dados que veio a compor o corpus das entrevistas. Foram feitas 40 entrevistas, 30 em Minas Gerais e 10 no Rio de Janeiro. Por dificuldades técnicas, uma entrevista se perdeu, realizando-se a análise final sobre 39 entrevistas.

Houve participantes que ficaram inquietos durante a realização das entrevistas o que, contudo, não prejudicou a realização das mesmas.

Algumas entrevistas exigiram maior esforço do entrevistador pelo fato do entrevistado responder apenas ao que era perguntado, com poucas palavras, o que requereu uma conversação que provocasse a expressão do entrevistado. Em alguns casos foi necessário ao pesquisador insistir com questões de relance, que retomassem assuntos abordados, buscando maiores esclarecimentos ou confirmações do que foi dito.

De forma geral, os entrevistados manifestaram ter se sentido à vontade e

respondido às questões com tranquilidade, como expresso por uma participante: “Eu

fiquei morrendo de vergonha, mas eu respondi tudinho” (E31, 29 anos). Foram

narrados, inclusive, partes de histórias de vida consideradas segredos pelo sujeito, com afirmação do estabelecimento de confiança com o entrevistador. Dois entrevistados do sexo masculino manifestaram não querer falar sobre algum ponto específico da temática abordada, o que foi respeitado. Em apenas um caso a entrevista foi pouco produtiva em decorrência de déficit cognitivo do entrevistado.

Ao final das entrevistas, os participantes foram indagados sobre o que acharam da participação no estudo. Eles expressaram satisfação na participação, como se observa nas falas a seguir: “Foi a primeira vez que tive uma conversa assim, e achei bom” (E19, 37 anos); “Dialogar é andar pra frente” (E34, 57 anos); “Quando é uma coisa que eu sei que é importante, eu gosto de falar, para que ajude, para que a coisa caminhe” (E5, 44 anos); “[...] É bom participar de um negócio desses” (E35, 64 anos). Houve entrevistados que manifestaram contentamento pelo

fato da entrevista ter propiciado um momento de „reflexão‟ sobre suas vidas, sobre o que um deles afirmou: “Gostei disto” (E5, 44 anos).

No entanto, acredita-se que fatos possam ter sido omitidos ou terem sido colocados de forma não fidedigna no sentido de se autopreservar, uma vez que segundo Muraro (1996) e Petitat (1998), existem convenções entre o que pode ser dito ou não, no sentido de se manter as aparências e preservar a „normalidade‟. Tais omissões, silêncios e segredos fazem parte das interações sociais, ainda mais em se tratando de sexualidade.

O projeto foi aprovado em todas as instâncias exigidas, incluindo os centros participantes, o Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerias (COEP/UFMG) e a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), apresentados nos anexos 1 e 2.

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