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SUMÁRIO

1) Material completo do BBT-Br (Teste de Fotos de Profissões), versão Masculina (Jacquemin, 2000) e Feminina (Jacquemin et al., 2006), incluindo os protocolos dos casos

6.1. Sobre os Dados Normativos:

Um dos requisitos mais importantes para adequado uso e interpretação dos resultados de instrumentos de avaliação psicológica refere-se a suas pesquisas de normatização para o contexto sócio-cultural onde será utilizado. Segundo Urbina (2007), as normas referem-se ao desempenho no teste psicológico de um ou mais grupos de referência, sendo, geralmente, apresentadas na forma de tabelas com estatísticas descritivas, resumindo resultados de caracterização de respostas de determinado grupo ou grupos de indivíduos. Essas referências normativas são, então, utilizadas para a interpretação do instrumento de avaliação psicológica, possibilitando a comparação dos resultados obtidos em uma aplicação específica com os padrões do respectivo grupo de referência.

A amostra normativa deve, portanto, refletir da melhor maneira possível as características da população para a qual o teste psicólogo é utilizado. Urbina (2007) ao dar o exemplo de um teste para avaliar habilidades de leitura afirma que “a constituição

demográfica da população nacional em variáveis como gênero, etnia, linguagem, status socioeconômico, residência urbana ou rural, distribuição geográfica e matrícula em escolas públicas ou privadas deve estar refletida na amostra normativa para este teste” (Urbina,

2007, p. 89). Neste sentido, diversos autores (Draime & Jacquemin, 1989; Villemor-Amaral & Pasqualini-Casado, 2006; Urbina, 2007; Fensterseifer & Werlang, 2008) ressaltam a

importância de atualizações nas pesquisas de normatização dos instrumentos avaliativos usados no Brasil, visando o aprimoramento e maior abrangência dos referenciais normativos. Considerando a imensa extensão territorial brasileira, idealmente os estudos de normatização deveriam ser realizados com a maior amostra possível, permitindo representar a diversidade de reações humanas frente àquelas atividades focalizadas no instrumento em questão.

Neste contexto, o presente trabalho procurou, por meio da utilização do Banco de Dados do Centro de Pesquisas em Psicodiagnóstico do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto – USP, agregar os resultados coletados nas pesquisas de Jacquemin (2000), Jacquemin et al. (2006), Noce (2008) e Okino (2009), elaborando, assim, uma nova amostra normativa de conveniência, mais abrangente e completa, para as duas versões (feminina e masculina) do BBT-Br. Na avaliação dos resultados, há de se considerar o espaço de tempo decorrido nos processos de coleta dos dados, uma vez que abarcou quase dez anos, desde Jacquemin (2000) até Okino (2009). No entanto, a composição do banco de dados com tamanho atual demanda tempo e recursos que tornariam pouco viável sua completa realização em menor período de tempo com equipes reduzidas de pesquisadores, como é o caso da maioria dos trabalhos de investigação científica desenvolvidos no Brasil.

Dadas as dificuldades financeiras e de psicólogos treinados para a realização de mais aplicações, a utilização do presente Banco de Dados permitiu o acúmulo de grande número de protocolos do BBT-Br e a elaboração dos novos referenciais normativos, com tabelas referentes ao sexo, origem e série escolar de estudantes. Especificamente em relação à série escolar, as novas normas aqui apresentadas buscam abranger os três anos do Ensino Médio brasileiro, uma vez que as normas atuais (Jacquemin, 2000; Jacquemin et al, 2006) apresentam tabelas descritivas apenas de alunos de 1ª e 2ª séries. Considerando a realização dos vestibulares e exigências sócio-culturais para a realização da escolha profissional após o término da 3ª série, espera-se que os referenciais atuais possam ser úteis para identificação dos interesses profissionais desses adolescentes em processo de escolha.

Cabe ainda destacar que, com base no presente banco de dados, foi possível comparar os índices de produtividade no BBT-Br de adolescentes em função da forma de aplicação (coletiva ou individual) desse instrumento projetivo, comparando-se os dados de Okino (2009) e de Noce (2008). Foram identificadas semelhanças estatísticas no número de escolhas positivas obtidos pela aplicação coletiva de Okino (2009) e a aplicação individual de Noce (2008). Essa semelhança serviu como justificativa para a inclusão dos dados encontrados neste último trabalho no presente Banco de Dados, apesar de ter utilizado a aplicação

individual do BBT-Br, já que os indicadores de inclinação vocacional e o estudo das associações da técnica referem-se prioritariamente aos dados obtidos pelas escolhas positivas. Pode-se pensar que, considerando a abrangência da amostra estudada, os resultados descritos neste trabalho podem ser considerados como os mais completos e atualizados referenciais normativos das duas versões do BBT-Br.

Para a sistematização das normas, foram realizadas análises quanto ao número de escolhas positivas, negativas e neutras dos participantes das duas amostras, feminina e masculina. Cabe aqui ressaltar novamente que as formas feminina e masculina do BBT-Br são compostas por estímulos (fotos) diferentes, embora retratem os mesmos radicais de inclinação motivacional de Achtnich (1991). Considerando esta diferenciação entre as versões, é preciso lembrar que as análises estatísticas referentes à comparação entre sexos, de fato, retratam evidências advindas de instrumentos diferentes, embora teoricamente equivalentes. Esta questão ainda precisará ser aprofundada em futuros trabalhos, ultrapassando as possibilidades atuais.

As participantes da amostra feminina selecionaram, em média, aproximadamente 34 fotos positivas, compondo as seguintes estruturas de inclinação motivacional: S OZ W G V M K(primária) e w z s m g o k v (secundária). No caso da estrutura de motivação primária, os radicais S, O, Z e W foram os principais, revelando o interesse em atividades com maior senso social, tanto de ajuda quanto de dinamismo, atividades de relação interpessoal, comunicação ou tarefas relacionadas à nutrição, atividades que exigem senso estético e o mostrar a si ou a seu trabalho, além de atividades relacionadas à maternagem. Em relação às escolhas negativas, as estudantes do sexo feminino apresentaram média de 42 fotos e estruturas negativas (rejeições) de inclinação motivacional assim distribuídas: K M V W G O Z S (primária) e v o k m s g z w (secundária). Essa rejeição primária aos radicais K, M, V sugere reduzido interesse por atividades que envolvam força física, imposição, trabalho com o concreto, com asseio, uso de materiais rústicos, atividades com alto investimento racional.

Já os participantes da amostra masculina selecionaram, em média, 27 fotos positivas, resultando nas seguintes estruturas positivas de inclinação motivacional: G S V O K Z M W (primária) e z s k g v o w m (secundária). Os radicais principais, G, S, V e O revelam que os adolescentes do sexo masculino tenderam a apresentar maior interesse em atividades criativas, com uso da imaginação, atividades de envolvimento social, de dinamismo ou ajuda, atividades de rigor lógico e objetividade, além de comunicação, de alimentação. Em contrapartida, o grupo masculino apresentou média de 48 escolhas negativas, resultando nas estruturas de rejeição motivacional: W M K Z O S G V (primária) e m w o g v s k z

(secundária). Os radicais de inclinação com maior rejeição foram W, M, K e Z, indicando reduzido interesse por atividades mais afetuosas, de cuidado, de asseio e limpeza, além de atividades permeadas por componentes de agressividade, com uso de força física e aquelas que exigem maior apuro estético, apreciação do belo.

Observou-se, desta maneira, especificidades nas estruturas de interesse e de rejeição motivacional em função do sexo, a partir das duas versões do BBT-Br. Enquanto o grupo feminino sinalizou maior interesse por atividades que exigem maior afeto, cuidado e emotividade, o grupo masculino preferiu atividades mais racionais, com maior uso da lógica. Esses achados são coerentes com as interpretações clínicas elaboradas pela vasta experiência enquanto orientador profissional de Achtnich (1991), e ressaltam a importância da existência de versões diferentes do BBT-Br específicas para cada sexo, possibilitando captação dos interesses profissionais dos adolescentes.

Cabe destacar que esta diferenciação de interesses em função do gênero é encontrada também em outros instrumentos de avaliação psicológica dos interesses no contexto brasileiro. Observando-se o manual do SDS – Questionário de Busca Auto-Dirigida (Primi et

al., 2010), pode-se observar especificidades nos tipos de interesses principais encontrados

para homens e mulheres. Enquanto na amostra feminina de normatização deste instrumento foi constatada maior preferência pelo tipo Social, na amostra masculina essa preferência por um tipo específico dentre os propostos por Holland não foi tão clara, com maior distribuição entre os seis tipos do RIASEC na amostra. Outro instrumento para avaliação de interesses profissionais, o AIP – Avaliação dos Interesses Profissionais (Levenfus & Bandeira, 2009) apresentou, em sua amostra normativa, diferenças entre padrões de escolhas de homens e mulheres. De modo geral, as mulheres apresentaram maior interesse pelo Campo Comportamental/Educacional, relacionado ao comportamento humano, enquanto os homens apresentaram maiores médias no Campo Físico/Matemático, relacionado ao interesse por Física e Matemática, e no Campo Cálculo/Finanças, relacionado aos interesses estatísticos e financeiros. Pode-se depreender, portanto, que, os interesses e as inclinações motivacionais ressentiriam influência da variável gênero, expectativa compartilhada em vários contextos sócio-culturais, inclusive no Brasil, como evidenciaram os estudos acima referidos sobre as normas diferenciadas dos instrumentos de avaliação psicológica.

Ainda sobre os dados normativos aqui elaborados para o BBT-Br cabe sua análise comparativa frente aos achados do recente estudo de Shimada (2011). Neste trabalho, entre outras análises, a pesquisadora compara os índices de produtividade e média de escolha dos radicais de inclinação motivacional de Achtnich (1991) no BBT-Br de grupo clínico de

adolescentes da terceira série do ensino médio (usuários de serviço de orientação profissional, n = 118) em relação aos dados de Okino (2009), oriundos de adolescentes da mesma escolaridade, representando um grupo não-clínico mais atual de mesma escolaridade. Shimada (2011) demonstrou que as estruturas de inclinação motivacional do grupo clínico foram bastante semelhantes às encontradas nos adolescentes de Okino (2009), com exceção do rapazes oriundos de escolas particulares que apresentaram reduzido número de escolhas positivas. Identificou, portanto, evidências de estabilidade no padrão de escolhas positivas, negativas e indiferentes das fotos do BBT-Br, ainda que a partir de grupos diferenciados de adolescentes.

Outro dado interessante do estudo de Shimada (2011) foi a observação de menor média de escolhas positivas por parte da maioria da amostra clínica, tanto dos estudantes de 1ª e 2ª séries do ensino médio, quanto no estudo complementar com estudantes de 3ª série, em comparação com as amostras normativas (Jacquemin, 2000; Jacquemin et al., 2006 e Okino, 2009). Essa menor média de escolhas positivas parece corroborar uma tendência dos achados de Noce (2008), apontando que jovens com menor maturidade, ou prontidão, para a realização da escolha ocupacional/profissional tendem a vivenciar dificuldades de escolha diante dos próprios estímulos propostos pelo BBT-Br. Assim também pareceriam estar os adolescentes que procuraram atendimento clínico no Serviço de Orientação Profissional (população clínica) estudado por Shimada (2011) que também apresentaram, no BBT-Br, reduzido número de escolhas positivas, restringindo suas opções profissionais. No mesmo sentido, o trabalho de Junqueira (2010), utilizando-se de instrumento específico para a avaliação da maturidade para escolha profissional, a Escala de Maturidade para Escolha Profissional (EMEP), identificou menor maturidade para escolha profissional em relação ao grupo normativo da EMEP (Neiva, 1999), em uma amostra clínica de 748 jovens que procuraram, no período de 2001 até 2006, o mesmo serviço de Orientação Profissional estudado por Shimada (2011).

Esses achados parecem corroborar a utilidade do BBT-Br como instrumento técnico auxiliar em processos de Orientação Vocacional/Profissional. Dessa forma, dados provenientes de avaliações psicológicas por meio do BBT-Br poderiam ser levados em consideração para a possível elaboração e implementação de serviços de atendimento a adolescentes em processos de escolha de carreira.