• Nenhum resultado encontrado

Revisão da Literatura: Situando a pesquisa

3. Sobre Informática na Aprendizagem do Cálculo

Ao contrário dos estudos envolvendo a escrita, a quantidade de pesquisas envolvendo a informática na aprendizagem do Cálculo é substancialmente maior. No entanto, elas têm obedecido a orientações próprias em boa parte de suas

características, tais como referencial teórico, objetivos, metodologia, perfil da população pesquisada, conteúdos específicos abordados e tipo de tecnologia informática utilizada.

Ainda assim, se restringirmos os resultados de pesquisas aos contextos nacionais, constataremos, novamente, grandes lacunas a serem exploradas. Isto, no entanto, deve ser encarado com naturalidade: a utilização sistemática de sistemas de computação algébrica nas aulas de Cálculo é fenômeno recente mesmo em países ricos, tendo ganhado impulso apenas a partir da década de 90, com o início da popularização da plataforma Windows para as mais variadas aplicações em Educação e em outros setores da sociedade em geral.

Uma abordagem típica nessas pesquisas tem sido a utilização de um determinado software na exploração de determinados conteúdos. Entretanto, os trabalhos que elegem especificamente os CAS comerciais mais importantes (dentre estes o MAPLE, o MATHEMATICA e o DERIVE) como uma das tecnologias a serem investigadas, são bem mais restritos. A razão para isso é óbvia: as licenças ainda são relativamente caras para a aquisição individual. Assim sendo, o pesquisador depende de que a instituição onde ele fará o trabalho de campo disponibilize os sistemas. Embora pareça paradoxal, há um número crescente de novos livros-textos de Cálculo concebidos de maneira a integrar a informática a seu conteúdo justamente por meio desses sistemas comerciais, particularmente do MAPLE e do MATHEMATICA. A boa notícia é que seus preços têm caído e as instituições de ensino têm cada vez mais se sensibilizado para a necessidade de integrarem essas novas tecnologias a seus projetos pedagógicos.

Considerando que os três sistemas acima são os que majoritariamente têm ocupado os espaços educacionais da matemática universitária, a presente revisão da literatura, destacará apenas as pesquisas em informática na aprendizagem do Cálculo que os utilizaram.

Em pesquisas com objetivos comparativos, isto é, estudos com o propósito de comparar os resultados da utilização ou não de determinados CAS temos, no contexto brasileiro, Saraiva (2000), sob o quadro teórico da transposição didática de Balacheff, investigando o conceito de limite, ainda que sob o aspecto metodológico, sua abordagem permitisse tanto o uso de computadores quanto o de calculadoras eletrônicas. No contexto da pesquisa realizada no exterior, Kendall (2001) analisou o impacto do uso do MAPLE no estudo de derivadas e Roddick

(2001) apresentou um estudo investigando a produção entre um grupo de estudantes de Cálculo trabalhando sob a forma tradicional e um outro grupo trabalhando em ambientes munidos de um SCA. Em todos os casos acima, a abordagem foi comparativa.

No desenho metodológico e nos objetivos não comparativos, similares ao da presente pesquisa, destaca-se o estudo de Villarreal (1999), tratando, em sua tese de doutorado, das concepções de alunos de Biologia sobre o conceito de derivada, emergente das interações entre pesquisador, estudantes e o sistema de computação algébrica Derive. Em seu estudo, Villarreal explora profundamente o tema visualização de gráficos a partir deste sistema computacional, numa abordagem que, articulada com a oralidade, produz resultados que contribuem no sentido de oferecer descrições do pensamento matemático, das dificuldades dos estudantes e, também das possibilidades do trabalho coletivo onde se interagem humanos e computador. Deve-se, no entanto, destacar algumas diferenças fundamentais do trabalho da autora em relação ao presente estudo. Primeiramente, sob o ponto de vista contextual, os participantes eram alunos do primeiro ano do curso de Biologia. A disciplina Introdução ao Cálculo, na qual os alunos estavam matriculados, é tratada de maneira inovadora e, justamente por isso, atípica com uma abordagem centrada na modelagem como estratégia pedagógica e tem seu foco orientado para aplicações escolhidas pelos próprios estudantes. Em consonância com este contexto, as funções utilizadas nos experimentos da pesquisa foram similares àquelas usualmente utilizadas nos processos de modelagem emergentes naquele cenário. Assim sendo, a já tradicional importância das funções elementares, em particular das polinomiais e exponenciais, são ali potencializadas, pois são justamente elas as principais funções modeladoras nas aplicações usuais abordadas naquele curso de Biologia.

No caso de um curso tradicional de Cálculo para a Matemática, a situação é bastante diferente: em geral, as aplicações são sacrificadas em favor da teoria. A questão da propriedade ou não de um tal sacrifício não me cabe aqui discutir, mas é inegável que a demanda teórica matemática subseqüente exigida do(a)s aluno(a)s será substancialmente maior do que a de outras áreas. Neste sentido, o presente estudo procurou tratar os conceitos investigados de maneira mais generalizada mais próxima, portanto, das demandas matemáticas a que os alunos serão

submetidos sem privilegiar, por exemplo, o trabalho com classes específicas de funções. Um outro diferencial a ser observado entre este estudo e o de Villarreal está na metodologia. Embora similares, duas diferenças são fundamentais: o privilégio à escrita dos estudantes e a restrita interação oral do pesquisador com estes. A primeira, obviamente, deve-se à proposta da pesquisa de “ouvir” os estudantes escrevendo sob conceitos do Cálculo. A segunda que, longe de caracterizar uma assepsia incompatível com o paradigma de pesquisa adotado, visou “simular” a dificuldade de comunicação, no sentido do aluno para o professor, facilmente constatada nas turmas tradicionais da disciplina.

A discussão acima pode ser aplicada em sua quase totalidade também à pesquisa de Araújo (2002), apresentada em sua tese de doutorado. Assim, em ambos os casos, os alunos eram de cursos Biologia, no primeiro, e Engenharia Química neste último distintos da Matemática. Como o ensino de Cálculo tem as aplicações práticas da área como um dos principais objetivos, este contexto moldou, como era de se esperar, ambas as pesquisas. Uma característica importante no trabalho de Araújo é que ela investigou o pensamento matemático de alunos modelando uma situação real escolhida por eles, o que os levou a gerar uma função contínua por partes (de funções quadráticas), diferente, portanto, daquelas analisadas por Villarreal. Este fato, auxiliado pela motivação natural dos estudantes por estarem trabalhando com uma aplicação “real”, permitiu, entre outros resultados importantes, que o conceito de continuidade da função fosse explorado de maneira contextualizada e significativa. Em termos comparativos com o presente estudo, ambas as pesquisas, por estarem focadas nas aplicações, não se detiveram no aprofundamento teórico do conceito de função que poderiam estar subjacentes às demais compreensões sobre os conceitos de limite, continuidade e derivabilidade dos estudantes. Naturalmente, em ambos os casos, a decisão de não se aprofundar na exploração teórica do conceito de função foi totalmente compatível com os objetivos das referidas pesquisas e da posição da qual também sou signatário que o Ensino de Cálculo deve assumir nesses cursos.

Ao priorizar e explorar as potencialidades das tecnologias ─ oralidade, escrita e informática ─ na investigação de compreensões de alunos de Matemática

sobre os conceitos de função, limite, continuidade e derivada, a pesquisa em pauta busca compreensões sobre uma região de inquérito atual, sob uma abordagem que se localiza, portanto, numa posição de originalidade a partir do levantamento efetuado.

CAPITULO IV