• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 5 Modelagem da informação de edificações existentes

5 MODELAGEM DA INFORMAÇÃO DE EDIFICAÇÕES EXISTENTES

5.2 BIM EM EDIFICAÇÕES EXISTENTES

5.2.1 Sobre os conceitos de as-built, as-is e HBIM

Através dos estudos de caso descritos na literatura nacional e internacional, pode-se afirmar que o processo de aquisição das informações para criação de modelos BIM é baseado, em sua maioria, em cadastros por medição direta ou desenhos já existentes (complementados por fotografias - sem tratamento).

Apesar de vários autores citarem as potencialidades do modelo BIM para as fases de uso e manutenção de edificações existentes, poucos são aqueles que já utilizaram ou testaram de forma consistente, o modelo para auxiliar no gerenciamento dessas etapas do ciclo de vida da construção. Isto acontece, muitas vezes, devido à falta de correspondência tanto em nível de detalhe (quantidade de informações suficientes), como de precisão, entre o modelo BIM gerado e a situação real (existente) da edificação.

Com relação a esse aspecto, é importante diferenciar os casos onde:

(1) se dispõe de informações (sejam desenhos, modelos geométricos ou modelos as- designed BIM102) - relativas às fases de projeto e construção, e

(2) as situações em que não existem dados disponíveis, geralmente em edificações mais antigas.

No primeiro caso, é comum haver revisão nos desenhos ou modelos de projeto, através da comparação desses com a situação encontrada na edificação, permitindo a atualização das informações alteradas durante a construção. Em casos onde é requerida maior precisão, pode-se realizar o levantamento cadastral para conferência das informações. Nessas situações, estão sendo produzidos desenhos ou modelos as-built. Apesar do termo "as-built" ser utilizado de forma ampla, incluindo diversas fases da edificação após a construção, ele é mais adequado quando se refere à documentação da edificação durante a obra e/ou logo após sua conclusão.

102

O termo "as-designed BIM" vem sendo utilizado atualmente referindo-se ao modelo, produzido na fase de projeto, para dar suporte à construção. No entanto, é um modelo que não foi atualizado, para refletir as alterações ocorridas durante a obra ou após a mesma.

No segundo caso, é mais comum a utilização de as-is. O termo "as-is" passou a ser usado mais frequentemente com o desenvolvimento das tecnologias de captura de "nuvens de pontos", dada a grande densidade de informações que podem ser coletadas, permitindo registrar com precisão a forma real dos objetos, com suas irregularidades e imperfeições decorrentes do processo construtivo e, principalmente, das deformações e dos desgastes naturais sofridos pela edificação ao longo dos anos. Assim, o termo "modelo as-is" está sendo utilizado, atualmente, para designar o estado atual da edificação, principalmente em situações em que é realizado o levantamento completo, preciso e detalhado com sistemas de varredura, visando dar suporte a projetos de intervenção (restauração, renovação, conservação). É comum também encontrar na literatura o termo "as-found", com o mesmo significado de "as-is" (GROETELAARS; AMORIM, 2012b).

Ainda, considerando esses conceitos, pode-se observar em artigos publicados nos últimos anos, mais precisamente a partir de 2011, o uso do termo "as-is BIM" (e não mais "as-built BIM"), referindo-se a edificações existentes que foram levantadas pela varredura a laser e representadas através de modelos BIM (ANIL; AKINCI; HUBER et al., 2011; ANIL et al., 2011). Quando se trata de modelos BIM para a documentação de edificações históricas, o termo mais utilizado atualmente é o "Historic Building Information Modelling" - HBIM, introduzido por Murphy, McGovern e Pavia (2007), para descrever um método de modelagem paramétrica de componentes históricos a partir de "nuvens de pontos". Outro exemplo de trabalhos pioneiros nessa área é o artigo de Pauwels (2008), quando utiliza o termo "Architectural Information Modeling" - AIM, se referindo aos modelos de informação de edificações existentes, principalmente as históricas, para diferenciar dos modelos BIM gerados na fase de projeto/construção de novas edificações.

A expressão "modelos BIM de edificações existentes" foi adotada nesta tese, pois representa uma situação mais ampla, que não está necessariamente (ou somente) associada à técnica de varredura a laser, nem a documentação de edificações de interesse histórico-cultural. 5.2.2 Aplicações do BIM em edificações existentes

Apesar do uso do BIM ser mais comum nas etapas de desenvolvimento de projeto e construção de novas edificações, essa tecnologia apresenta grandes potencialidades para

documentação, gerenciamento, manipulação, análise e visualização das informações relativas às edificações existentes, durante a fase de operação das mesmas (uso e manutenção), incluindo possíveis reformas, restaurações, requalificações e/ou demolições. Dentre as aplicações do BIM para edificações existentes, destacam-se algumas:

 verificação e consulta de informações durante a fase de operação e manutenção da edificação, permitindo a conferência dos dados, como prazo de validade dos componentes construtivos de uso essencial ou de segurança (para substituição e manutenção preventiva);

 realização de estudos, simulações, análises de interferências entre instalações existentes e previstas no projeto, favorecendo o desenvolvimento de projetos de intervenção mais consistentes e sustentáveis;

 possibilidade de integração do modelo com sensores e sistemas de monitoramento em tempo real (EASTMAN et al., 2011, p. 25);

 documentação de edificações históricas, permitindo uma série de operações, como classificação e listagem dos objetos e materiais, geração automática dos desenhos e documentação das diferentes fases construtivas da edificação (DORE; MURPHY, 2014);

 possibilidade de associar diferentes dados aos elementos construtivos, como fotos, desenhos e dados históricos, facilitando o acesso às informações.

Observa-se que há poucos estudos publicados sobre a utilização da tecnologia BIM para a documentação de edificações existentes. No entanto, pode-se citar dois artigos que apresentam experiências iniciais sobre as potencialidades da tecnologia BIM para a representação de edificações históricas:

 Edificação arruinada na Ilha da Fumaça - Brasil: base para o desenvolvimento de projeto de restauro;

 Sinagoga Kluckygasse – Áustria: para fins de documentação arquitetônica e preservação da memória.

a) Edificação arruinada na Ilha da Fumaça - Brasil

O uso de modelo BIM para representação de uma edificação arruinada localizada na Ilha da Fumaça, no estado do Espírito Santo (Brasil), é descrito em trabalho acadêmico realizado na Universidade Federal do Espírito Santo (ALVES; OLIVEIRA, 2010). O modelo foi usado não somente para a representação do estado de conservação atual da edificação(Figura 93a e b) - através do cadastro por medição direta, mas como ferramenta para estudo e representação do projeto de restauro (Figura 93c).

Figura 93 - (a) Foto do estado atual da edificação; (b) modelo BIM da situação existente; (c) perspectiva do projeto de restauro

(a) (b) (c)

Fonte: Alves e Oliveira (2010).

Os autores citam algumas vantagens em se trabalhar com a modelagem BIM em projetos de intervenção. Com o modelo BIM concluído é possível ter acesso a informações precisas sobre cada elemento construído, como materiais, dimensões, volume, acabamentos, sendo uma fonte rica de informações para o desenvolvimento do projeto de restauro. É possível ainda, identificar os elementos existentes, os que foram ou serão demolidos, os que serão construídos, ou ter as informações sobrepostas para fazer estudos, comparações e simulações.

b) Sinagoga Kluckygasse – Áustria

Um exemplo de aplicação de ferramenta BIM para representaçãode uma sinagoga destruída há mais de 60 anos, pode ser encontrado no artigo de Martens e Peter (2002). Os autores apresentam a metodologia utilizada no ArchiCAD para a reconstituição digital da Synagogue Kluckygasse, a partir de desenhos, fotos e dados históricos (Figura 94).

Devido à falta de dados mais precisos da edificação, principalmente relativos ao espaço interior, os autores afirmam que muitas informações foram deduzidas a partir de evidências históricas relativas a edificações construídas em épocas semelhantes.

Figura 94 - Sinagoga Kluckygasse: (a) foto antiga; (b) desenho da fachada principal; (c) objetos paramétricos (paredes, teto, telhado, etc.); (d) modelo BIM gerado

(a) (b) (c) (d)

Fonte: Martens e Peter (2002).

O processo de modelagem foi realizado a partir das seguintes etapas:

 levantamento de dados e informações existentes: desenhos, fotos, descrições, dados históricos;

 comparação dos desenhos com as fotografias existentes, para verificação das diferenças entre o projeto (desenhos) e a execução (fotos);

estruturação dos layers de acordo com as diferentes partes da edificação: paredes (internas ou externas), telhado, piso, forro, detalhes do forro, elementos de fachada, janelas, portas, balaustres, detalhes da fachada, detalhes interiores, vitrais, colunas, escadas, madeiramento do telhado, vigas, etc.;

 definição de níveis (planos horizontais de referência) - os elementos construtivos devem estar associados aos pavimentos correspondentes, podendo-se criar níveis intermediários se existir um grande número de ornamentos. Segundo Martens e Peter (2002), a divisão em níveis auxilia também na modelagem, principalmente quando existem várias pessoas trabalhando na mesma edificação, tornando-se referência para a correta junção das diferentes partes;

 utilização de diferentes cores, associadas aos diversos tipos de materiais, para a posterior associação das texturas correspondentes;

 criação de famílias para objetos repetitivos, armazenados em diretórios específicos para permitir alteração de partes individuais.

Martens e Peter (2002) apontam para a necessidade de definições de padrões e metodologias para a organização dos dados. Além disso, destacam que a função do modelo

BIM e a maneira com que as informações serão utilizadas têm grande influência na determinação dos processos de modelagem.

Vale ressaltar que o modelo BIM gerado dessa sinagoga serve para fins de interesse histórico, como reflexão historiográfica de como a edificação poderia ter sido. Não pode ser usado para fins de restauro, pois muitos dados foram modelados a partir de hipóteses e com base em documentos não fidedignos103, o que não atende as recomendações do Art. 9° da Carta de Veneza: "o restauro cessa quando começa a hipótese".