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SOLIDÃO EM ESCALA DE DÓ

No documento 8° Antologia REPERTÓRIO FINAL (páginas 85-101)

Renata Dias

E a solidão dos que mesmo acompanhados se sentem sós.

E a turba da multidão delirante que não se deixa acompanhar dos solitários. Um ser só será sempre e tão somente só.

Só ele estará entre seus semelhantes; Só ele estará entre seus pares;

Só ele estará entre seus parentes, entre os amigos... E muito mais só entre desconhecidos.

Só ele trilhará seu caminho...

E quando parar para descansar, ainda assim estará só. E nessa rima triste de só com dó

Não tenha pena desse ser solitário que anda só; Talvez só você também esteja, e no momento... Não há ninguém com dó!

Bom dia do Escravo

Jordane Câmara

A voz arredia que invade a tranquila fala do poeta, em manhãs de primavera, onde o som dos pássaros, a brisa do mar, até mesmo o minuano cortando o rosto não passam de lembranças. Perturbado ainda com os primeiros raios de sol, aquele sussurro lhe deseja bom dia, como a ordem do sinhô para o escravo, nunca será um bom dia, não para o indigente que não é dono de sua própria liberdade. Mesmo liberto dos grunhidos o escravo não tem nada a fazer, a não ser procurar sua família, quando negado seu desejo seu dia não é bom.

No teatro aristocrático os negros ganham um papel, triste como sua história. O libambo aprisiona seus dias... não existe Helenas, Afrodite, nem Dionísio. Não existe espaço para felicidade. Uma vida inteira do desejo, da busca interminável, do sonho não realizado, da conexão interrompida, esse é o bom dia do escravo poeta. Não ganhou papel e lápis para descrever seus próprios sonhos, agora da mão do historiador suas anciãs revelam-se. Ele também sonhava, também queria um bom dia, não sabemos de suas individualidades, mas quando reunidos celebravam sem pudor, sem patrão, sorridentes e capazes. Suas vidas incógnitas ganham as academias, suas individualidades serão expostas, mesmo que não seja num bom dia.

Greve Geral

João Jacinto

Greve Geral?!

Vão, mas é, trabalhar!...

Como é possível, quando há quem ainda não esteja suficientemente rico,

à custa da vossa labutação

e tenha já, para roubar, muito mais tempo? Greve Geral?!

O que ganham com isso? Nada!

Mas há quem precise do vosso esforço, para que lhe cresça os lucros

e nada vos sobre! Greve Geral?!

Vão, mas é, trabalhar,

que o senhor engenheiro vos agradecerá com mais umas quantas promessas de nãos!... E viva,

in feliz democracia! Viva!

Na Lona Preta

Ingrid Oliveira

ao MST

Este céu não tem estrelas Não tem nuvens

Não tem sol

Erguido por mãos vermelhas Mãos que lutam

Este céu tem cor escura Tem cheiro de terra Tem grito de força Este céu é lona preta.

Catedral Noturna

Tiago Kroich

Quem é você? Luz enganosa! De quem é esse rosto? De quem são esses cabelos negros?

E esses olhos cansados, estranhos Cheios de sonhos quebrados De quem são essas lágrimas? Quem é você que me persegue? Por que vejo você no meu reflexo?

Quem é, o que quer? Por que me olha?

***

Que palavras sussurras calado? Não vês que não há mais nada? Que só este espelho te escuta Essa tua voz que ninguém ouve

Esse grito que ninguém sente Essa alma perdida no esforço

Esse pêndulo, esse ciclo De silêncio e de sufoco Você que me olha e que pergunta

Eu sou a sombra e o reflexo Sou os desejos e ilusões Sou um caráter perdido A sede do que foi e do que sempre será

Não sou luz nem escuridão Sou só o semblante sem razão

O fantasma de uma noite

Em que o sol não significa nada Já você, carne fadada que me pergunta

Agora as palavras caem no espelho Você tem sua resposta? Quem é você que me renega A própria história da sua vida Eu que sou o seu percurso

Eu que sou o seu destino Seu passado e seu futuro A treva que lhe espera Poder unânime da vida Você, dos cabelos negros

Dos olhos cansados Das lágrimas sem brilho Que me molham o rosto

E você, quem é? *** Eu sou...

...a chama dos meus sonhos Sou a dança que resiste Sou a força determinante A última gota da esperança

Se porém não sou tudo Tampouco sou eu nada

Izabel Garcia Percepções

Renata Dias

Note o ar petulante;

O andar como fosse sobre ovos;

O aperto de mão tal como dedilhar os botões nojentos de um elevador público. Tudo revela ares de superioridade, mas não passa de afetação!

Quais são os valores em que acreditam essas pessoas? Nem sabem quem eu sou...

Não sabem o que trago nos bolsos...

Não sabem se quer o quanto o ser humano pode se degradar... Por dinheiro

Por drogas Por cachaça Por poder

Por mulher ou por jogo.

Existem os que se degradam até por açúcar, e some-se a isso o poder global que o açúcar enquanto combustível irá desempenhar.

Pobreza lhes parece doença contagiosa e para fugir do contágio, foge-se primeiramente de seus estereótipos. E não haverá lugar entre eles para os negros, os nordestinos, os mutilados e para aqueles que as dores da vida deixaram rugas no rosto. E por que vindo de onde eu vim por vezes compactuo e até contribuo com essas manifestações racistas e preconceituosas? ...quando finjo que não sinto.

...quando finjo que não sei, e até quando finjo que nem é comigo.

Acredito ser uma forma de desejar ser invisível, passar sem ser percebido...

Já que não sou negro, não sou nordestino, não sou mutilado e jovem demais para que as desgraças que vivi deixem marcas no meu rosto.

Demonstração que está fazendo falta

Samanta Rosa Maia

Saltam em salto as pôças – as póças as môças – as móças nas docas, dondocas nem tiram os sapatos

Golden goose

Gabriel Felipe Jacomel

fígado fidalgo algo diz que deu errado

na receita do foie gras o ganso pateta tomou uma mais

e roubou o canto do cisne

Vazio

Ingrid Oliveira

Hoje, tudo o que consigo ver é gente invisível. Seus olhos carregam algo que ainda não tem nome porque atroz demais pra ser falado. e passam por elas riem com seus silêncios de vergonha. seguem não se importam. só consigo indagar,

e sem respostas cato meus devaneios.

são corpos ocos travestidos de carne e osso. ainda é tarde, pra gente criar dignidade? Lara Montechio

Das profundezas do inferno para um pacto jovial

Blimer Lilith aproveita cada segundo da eternidade dos bons homens para distorcer a visão do mal e contrabalancear a necessidade que temos de mentir. Afinal de contas, se Deus não tivesse inventado o pecado, não precisaríamos cometê-lo.

Eu senti as carícias de Lilith enquanto descansava em um sono profundo, no intervalo entre um sonho e outro. Foi como se eu estivesse morrido e esperando pelo julgamento das pessoas de bem em algum telejornal sensacionalista.

Mesmo assim, não considero um engano. Em muitos momentos, eu visitei o inferno com a finalidade de observar os anjos que caíram em tentação com essa minha visão de águia.

Luisandra Junges

Sinto nojo do vazio que me corrói

Do buraco no estômago que me consome até o cerne A sujeira das compridas avenidas me dá vida

Um misto de amor & ódio De estar aqui e em lugar nenhum

Enquanto minhas veias estouram corpo adentro Sinto tesão pelo sujo

Quero a boca das prostitutas de vermelho tinto Tingindo de vinho a minha roupa pálida

Quero as ruas esquálidas à minha disposição Quero que brote do âmago dos transeuntes Suas ridículas peculiaridades

Quero gritos & roupas amassadas Sussurros ao pé do ouvido

Lambidas Ruídos Grunhidos

Quero ratos & baratas de esgoto

Perambulando petulantes pelas avenidas Quero o lado podre da vida

Quero o SER humano Nu

Cru

Apenas Sendo.

Depois de Aldebarã

Carmen L. Fossari Chove n.ilha aos cântaros

chove em minh.alma tantas dores

do povo sem casa nas intempéries da vida E

na máscara que esculpia de tua face Na leitura que ofertastes de” parecenças”. A chuva diluiu os traços

d.admiração, d.afetos, desfaço n.água

tão de sal, e tanto menos a última sombra tua que permanecestes. O céu d.aguas sabe o sabor amargo do que vimos.

As casas humildes desmancham seus tetos, abrigos enquanto sob a proteção pequeno burguesa ouço as forças d, águas e

eu mesma oceano.

Sob o manto da aparente proteção ver o que sob as máscaras te desnudas de omissão, volteios e mentiras. A pior pobreza

tu a vestes, na dissimulada forma de viveres.

Todo teu ser, que desconheço Deposito à memória da terra

Que as águas de Maio, levam e lavam O caminho que retorno em navegar-me

Flôr Kepah – Visão da cidade (escultura em madeira triangular).

Juniores Rodrigues Vida está escrito em toda coisa para a maioria mover-se basta martelo e cinzel pedra que grita dor e aprisionamento no mesmo horizonte.

Passo em falso

Flôr Kepah

Estou em busca de paz, Sou da paz.

Antagônico isto! Humano, diga-se.

Retrato da ousadia De quem se permite ser, Simplesmente,

Aqui, ali.

À margem de outros

Ou dos que esperam mais de mim – E como esperam!

Izabel Garcia

Não me rendo

Mas respeito os “vencedores” Idiotice não fazê-lo,

Só não os sinto com medo.

Senti-lo por quê?

O medo não vem de outros O medo vem de mim

Do que eu posso ou não fazer Com o que eu tenho

Ou com o que está longe de mim ...

E olha que eu faço mesmo! Sem me arrepender muito.

Melhor um passo em falso

Não poderemos morrer

João Jacinto

Como pode o mal (ou o bem) de alguns prejudicar muitos,

e haver tanto fanatismo e solidariedade

por quem tão orgulhosamente corrói

e tanto desprezo tem por quem sem defesas sofre e tristemente se perde?

Onde mora o homem de gênero; capaz, de fazer nascer o futuro

e do amor que justifique sua grandeza? Entre tanta pobreza

haverá quem, certamente, esteja bem acordado e pleno de sabedoria, pronto para marchar e a emergir do silêncio... Não poderemos morrer de inércia,

esvaídos de memórias. Não poderemos morrer.

No documento 8° Antologia REPERTÓRIO FINAL (páginas 85-101)

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