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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.4 SPLICING ALTERNATIVO

O splicing é o processo através do qual são removidos os íntrons e unidos os éxons de um RNA mensageiro precursor (ou pré-mRNA), dando origem a um mRNA maduro. Em cada evento de splicing ocorre a remoção de um íntron, através de reações sequenciais de transesterificação (BLACK, 2003). Estas reações são mediadas pelo spliceossomo, um conjunto de moléculas de snRNA (small nuclear RNA), cada uma complexada à várias proteínas, formando snRNPs (small nuclear ribonucleoproteins). Cada componente do spliceossomo é recrutado de forma ordenada, e deixa o complexo à medida que o processo ocorre, dando lugar a outros elementos responsáveis pela etapa seguinte. Por fim, dois éxons são ligados, liberando o íntron em uma estrutura com forma de laço, através da transesterificação de sua extremidade 5’ com uma a posição 2’ de uma adenina presente na região chamada de ponto de ramificação (RUSKIN et al., 1984).

O splicing alternativo ocorre quando há seleção dos éxons que irão compor o mRNA maduro de um determinado gene, através da indução ou repressão do reconhecimento dos limites de um éxon. Desta forma, um único gene pode dar origem à diversos transcritos distintos, que podem codificar proteínas com funções diferentes ou, até mesmo, opostas (DAVID e MANLEY, 2010; TROMBETTA-LIMA et al., 2013).

Estima-se que cerca de 95% dos genes compostos por dois ou mais éxons sofram splicing alternativo (PAN et al., 2008), o que explica a divergência entre as complexidades do genoma e do proteoma humanos (LANDER et al., 2001).

A seleção dos éxons pode ocorrer de acordo com reconhecimento de sequências regulatórias no pré-mRNA por fatores reguladores de splicing que ao interagir com estas sequências, favorecem ou reprimem o reconhecimento de limites éxon/íntron pelo spliceossomo. Como resultado, um determinado evento de splicing pode gerar transcritos alternativos através da utilização de diferentes junções (WANG e BURGE, 2008). As formas como o splicing alternativo gera diferentes transcritos são representadas na FIGURA 7.

FIGURA 7 – FORMAS DE SPLICING ALTERNATIVO FONTE: Adaptado de Wang e Burge (2008)

NOTA: Representações esquemáticas das formas como pode ocorrer o splicing alternativo. Os éxons são representados como retângulos, e as junções possíveis representadas por linhas tracejadas.

O conjunto de éxons expressos em um determinado momento – o exoma – é modulado de forma dinâmica, adaptando o transcriptoma ao contexto em que a célula se encontra. Além disto, o splicing pode ser tecido-específico, como é o caso do éxon 2 da tropomiosina-α (TPM1), presente em 95% dos transcritos deste gene na musculatura esquelética, e em 2% dos transcritos na musculatura cardíaca (WANG et al., 2008). Duas famílias de reguladores estão, predominantemente, envolvidas na definição da junção a ser utilizada em um evento de splicing alternativo: a das proteínas SR (ricas em serina e arginina) e as ribonucleoproteínas heteronucleares (hnRNP) (BRAUNSCHWEIG et al., 2013). As proteínas SR ligam-se a regiões regulatórias dos éxons conhecidas como indutores exônicos de splicing (exonic splicing enhancers – ESE), e estão envolvidas no favorecimento da inclusão do éxon, por promover o reconhecimento de sítios de splicing. Este efeito é antagonizado pela ligação de hnRNPs aos silenciadores exônicos de splicing (exonic splicing silencers – ESS), associados à inibição do reconhecimento de sítios de splicing e, portanto, impedindo sua inclusão no transcrito maduro. O balanço entre a ativação de proteínas SR ou de hnRNPs direcionam um éxon à inclusão ou a exclusão, e representa uma

importante forma de regulação do splicing alternativo. Além dos sítios regulatórios exônicos, ESE e ESS, também existem os sítios intrônicos correspondentes: ISE (intronic splicing enhancer) e ISS (intronic splicing silencer) aos quais se ligam outros moduladores do splicing alternativo (WANG e BURGE, 2008). Esta regulação é esquematizada na FIGURA 8.

FIGURA 8 – REGULAÇÃO DO SPLICING ALTERNATIVO FONTE: Adaptado de Wang e Burge (2008)

NOTA: Representação esquemática dos elementos regulatórios presentes no pré-mRNA e de seus ligantes. As setas verdes representam o favorecimento da ligação snRNPs U1 e U2 aos de sítios de splicing (3’ ss e 5’ ss) pelos ligantes de elementos indutores de splicing (ESE e ISE). As barras vermelhas indicam efeito inibitório sobre as shRNPs pelos ligantes de elementos silenciadores (ESS e ISS).

A perturbação da regulação adequada do splicing alternativo é associada à diversas patologias, incluindo o câncer (COOPER et al., 2009). Curiosamente, vários genes envolvidos em processos como a fuga da apoptose, a angiogênese e a proliferação celular, importantes para a biologia tumoral, podem dar origem tanto à transcritos pró quanto à antitumorais (TROMBETTA-LIMA et al., 2013). Tumores ativam programas de splicing alternativo que favorecem vários aspectos importantes para o seu desenvolvimento (GERMANN et al., 2012). Como exemplo, podemos citar o splicing do pré-mRNA de BCLX. A seleção dos limites do éxon 2 pode utilizar um sítio de splicing 5’ alternativo, produzindo Bcl-XL, uma proteína anti-apoptóticas, em detrimento de Bcl-Xs, com função anti-apoptóticas (BOISE et al., 1993). Em outro exemplo, o splicing alternativo de VEGF (vascular endotelial growth factor), importante no estímulo da angiogênese, pode gerar várias isoformas. Destas, duas são originadas pela utilização de um sítio de splicing 3’ alternativo no éxon 8 gerando isoformas com papéis divergentes: a forma antiangiogênica, VEGF165, e a pró-angiogênica VEGF165b (BATES et al., 2002).

Grande parte da reprogramação do splicing alternativo que ocorre em tumores é creditada à função de proteínas SR. Proteínas desta família podem responder à sinalização de diversos oncogenes, como PI3K (BLAUSTEIN et al., 2005), Ras (WEG-REMERS et al., 2001) e Myc (DAS et al., 2012). Estes sinais induzem modificações pós-traducionais, como metilação, acetilação e fosforilação, que por sua vez regulam o particionamento destas proteínas entre o citoplasma e o núcleo, e modulam sua atividade. Várias quinases podem promover a fosforilação de proteínas da família SR in vitro, como Akt, PKA e PKC (ZHOU e FU, 2013). In vivo, porém, os principais mediadores da fosforilação destas proteínas são as SRPKs (SR-specific protein kinases), que distribuem-se entre núcleo e citoplasma e também podem ser ativadas por vias de sinalização oncogênicas (GERMANN et al., 2012). O alvo mais bem descrito de SRPKs em tumores é SRSF1. Esta proteína é um proto-oncogene (KARNI et al., 2007) e sua superexpressão foi suficiente para transformar células epiteliais de mama, regulando a apoptose e a proliferação (ANCZUKOW et al., 2012), demonstrando seu papel de induzir isoformas de splicing alternativo pró-tumorais.