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Sujeitos titulares e sujeitos destinatários do DIREITO FUNDAMENTAL ao TRABALHO

SESSÃO 3. DIREITO AO TRABALHO COMO DIREITO FUNDAMENTAL

3.2 Sujeitos titulares e sujeitos destinatários do DIREITO FUNDAMENTAL ao TRABALHO

de perto a classificação elaborada pela doutrina constitucional, proceder-se-á à análise do direito fundamental enquanto direito de defesa, impondo um dever de omissão por parte do Estado, bem como enquanto direito prestacional em sentido amplo (incluindo os direitos de proteção, organização e procedimento) e em sentido estrito (direito a prestações materiais).

No entanto, antes de entrarmos nesta temática das distintas dimensões que se pode extrair do Direito Fundamental ao Trabalho, cabe uma reflexão relativamente a quem são os seus titulares e sujeitos destinatários.

3.2 Sujeitos titulares e sujeitos destinatários do DIREITO FUNDAMENTAL ao TRABALHO

Jorge Miranda64 defende que não é suficiente que um direito fundamental seja lesado para que a pessoa possa reclamar, fazendo-se valer dos mecanismos providenciados pelo ordenamento jurídico. É necessário que a pessoa em questão seja titular do

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Luc Ferry/ Alan Renaut, Philosophie Politique, Vol. 3. P 9, citado por J J Gomes Canotilho, Estudos sobre Direitos Fundamentais, p 23.

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Jorge Miranda, Manual Direito Constitucional, tomo IV – Direitos Fundamentais, Coimbra Editora, 3ª Edição, 2000, p 114.

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direito. Neste caso impõe-se a pergunta: Quem são os titulares do direito ao trabalho enquanto direito fundamental como um todo?

À primeira vista, somos tentados a responder a resposta óbvia “os trabalhadores”, no entanto é defensável que o verdadeiro titular do direito fundamental ao trabalho é a pessoa humana, o indivíduo. A nossa Constituição não delimita a titularidade dos direitos. Desta forma, entende-se que há uma ampliação da titularidade desse direito, abarcando todos aqueles que mesmo que ainda não possuam o estatuto de trabalhador, o possam ser potencialmente. Assim, o titular do direito fundamental ao trabalho (artigo 58º da CRP) é a pessoa humana, esteja ela desempregada ou trabalhando por conta própria ou subordinadamente, já o titular do direito do trabalho (artigo 59º da CRP) é o trabalhador subordinado.

Ainda, se considerarmos que o trabalho é um direito reconhecido como direito humano pela Declaração dos Direitos Humanos65, impõe-se que o perímetro da titularidade seja restrito ao homem individual e não a um grupo de pessoas.

Defende-se, pois, a ideia de que o direito fundamental ao trabalho terá como titular o indivíduo que puder exercer livremente o direito de trabalhar, ou seja, aquele que usar esse direito frente a possíveis restrições do Estado.

Podemos então excluir da titularidade do direito fundamental ao trabalho o menor de 16 anos, pois tal indivíduo não é titular desse direito, pois o mesmo não tem direito de resistência frente à limitação etária66 colocada pelo Estado.

Já os direitos sociais enunciados no artigo 59º da CRP são direitos dos trabalhadores, isto é, qualquer pessoa que presta serviço a outrem com regularidade, subordinação, pessoalidade e mediante remuneração. Em alguns casos a Constituição amplia,

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Artigo 23º

Artigo 23°

1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego.

2. Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual.

3. Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social.

4. Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses.

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Artigo 55º, nº2 do Código do Trabalho – A idade mínima de admissão para prestar trabalho é de 16 anos.

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restringe ou modifica a titularidade dos direitos sociais, por exemplo, quando trata especificamente no artigo 59º de direitos dos trabalhadores que tenham dependentes, dos desempregados, dos aposentados, dos trabalhadores-pais, dos emigrantes e os estudantes.

Assim sendo, pelo exposto, podemos afirmar que o titular do direito fundamental ao trabalho é o indivíduo, a pessoa humana, maior de 16 anos que preencher os requisitos técnicos para o exercício do ofício livremente escolhido, desde que essa atividade seja lícita.

Já no que diz respeito ao destinatário do direito fundamental ao trabalho enquanto direito de defesa, cabe repetir o questionamento de Canaris67 relativamente de se saber se é apenas o Estado ou também os particulares.

Sobre a eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas, sinalizamos quatro grandes correntes.68

A chamada doutrina da state action, adotada no sistema jurídico norte-americano, segundo a qual os direitos fundamentais somente impõem restrições aos poderes públicos, não se aplicando às aplicações entre particulares. Esta teoria é amenizada pela chamada public funtion theory, que admite a incidência dos direitos fundamentais nas relações que envolvem particulares que agem no exercício das atividades próprias do Estado.

A teoria da eficácia indireta ou mediata dos direitos fundamentais nas relações privadas, que diz que a Constituição possui valores próprios, que influenciam os princípios e regras de direito privado, o que configura a incidência daqueles somente de forma reflexa. Nessa perspetiva, os princípios constitucionais auxiliam na interpretação das cláusulas e dos conceitos indeterminados, uma vez observados os princípios próprios do direito privado.

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Claus – Wilhelm Canaris, Direitos Fundamentais e Direitos Privados, tradução de Ingo Wolfgang Sarlet e Paulo Mota Pinto, Coimbra, Almedina, 2006, reimpressão da edição de Julho de 2003, p 73.

68

Bruno Furtado Silveira, “ A eficácia dos direitos fundamentais”, artigo publicado no Caderno Virtual, nº 21, V. 1, Jan-Jun 2010, Brasil.

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Outra corrente doutrinária defende que a obrigação de serem respeitados os direitos fundamentais nas relações entre os indivíduos emana diretamente da Constituição. Assim, as normas de direitos fundamentais presentes na Constituição impõem condutas tanto em relação aos poderes públicos, quanto aos particulares, sem a necessidade da intermediação do legislador ordinário.

A corrente doutrinária dos deveres de proteção, que vimos acompanhando, sustenta que, apesar dos direitos fundamentais se aplicarem diretamente somente em relação ao Estado, este, ao fazer emanar normas e na realização da prestação jurisdicional deve adotar, não apenas uma postura negativa, no sentido de não violar esses direitos, como também de protegê-los de ameaças decorrentes dos particulares.

No âmbito da doutrina portuguesa, o debate desta problemática levou à formação de três correntes principais.

Uma que entende que a eficácia dos direitos fundamentais no âmbito dos vínculos particulares deve ser idêntica à que têm perante os entes públicos, uma vez que o art. 18º da Constituição estabelece a imediata vinculação quer de entes públicos quer de entes privados a esta categoria de direitos, como é o caso de Gomes Canotilho.

Outra que admite a eficácia direta ou imediata dos direitos fundamentais apenas naqueles vínculos privados em que uma das partes detenha uma posição de poder ou de autoridade e com base num argumento de identidade de razão com os vínculos públicos (Jorge Miranda69, Vieira de Andrade70, José João Abrantes71).

Por último, uma terceira corrente, com uma posição mais restritiva, considerando que a eficácia dos direitos fundamentais não é direta mas carece necessariamente da mediação de princípios gerais, como os princípios da boa-fé e do abuso do direito, não só pela natureza privada dos entes jurídicos em questão e interesses em jogo, mas

69 Jorge Miranda, Manual Direito Constitucional, Vol IV, já citado, pp 286 e ss. 70

Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 2ª Edição, Coimbra, 2001, pp 237 e ss.

71 José João Abrantes, Contrato de trabalho e direitos fundamentais, Memórias II Congresso Direito

Trabalho, Coimbra, 1999, pp. 105-114; Contrato de Trabalho e Direitos Fundamentais, p 227: “No domínio das relações entre pessoas desiguais, como são, por exemplo, as relações laborais, há um consenso generalizado de que, face ao referido nº 1 do art. 18º, os direitos fundamentais têm aí aplicação direta”.

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também pelos riscos de utilização disfuncional que uma posição aberta pode envolver (Menezes Cordeiro72).

No que concerne à dimensão do direito ao trabalho enquanto direito de defesa, que consiste em direitos de liberdade do indivíduo e que especificamente no caso do direito fundamental são traduzidos na liberdade de escolha da atividade profissional, tem-se como destinatário por excelência o Estado, no sentido em que este não pode limitar o exercício da referida liberdade, havendo o que se define como limitação material da liberdade de conformação do Estado.

Dificuldade maior se vislumbra na aceitação dos particulares como destinatários do direito fundamental ao trabalho. Aos particulares, pessoas físicas ou jurídicas, é admissível estipular regras que impliquem restrições à liberdade do exercício profissional de outrem?

Canaris explica a possibilidade de extensão do alcance de destinatário dos direitos fundamentais aos particulares através da teoria da eficácia externa imediata e a eficácia externa mediata. Eficácia imediata traduz-se que os próprios sujeitos do Direito Privado e não somente o Estado são destinatários dos direitos fundamentais, tanto dos direitos fundamentais, enquanto direitos subjetivos, como dos direitos fundamentais, na condição de normas objetivas.

Com base neste entendimento, podemos chegar à conclusão que todos os direitos conduzem a proibições de intervenções no âmbito das relações jus privativas e a direitos de defesa em face de outros sujeitos de direitos jus privativos, sendo supérflua qualquer implementação do próprio sistema jurídico privado. Ao contrário, nesta perspetiva, para cada direito fundamental estatui-se uma proibição que, em princípio, veda a sua restrição por meio de um contrato e um direito subjetivo cuja lesão obriga, em princípio, a indemnização pelos danos causados.

Para o autor referido em supra, tal tese não pode ser defensável, pois, se assim o fosse, poderia tornar inócuo tanto o direito contratual como a responsabilidade extracontratual. No entanto, o mesmo autor aduz que a Constituição alemã

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estabeleceu a aplicação imediata de um direito fundamental nas relações entre particulares73.

Conclui o jurista alemão afirmando que somente o Estado é destinatário dos direitos fundamentais, ainda que esses produzam efeitos nas relações jus privativas, embora apenas mediatamente, ou seja, os direitos fundamentais devem ser considerados na concretização das cláusulas gerais jus civilistas. Ressalvando que os direitos fundamentais servem, tanto para a defesa de intervenções por parte do Estado nos bens jurídicos dos seus cidadãos, quanto para obrigar o Estado à proteção dos seus cidadãos, caracterizando-se, pois, como “mandamentos de tutela ou deveres de proteção”.

Esta teoria obriga o Estado a atuar positivamente, ainda que seja para proteger um cidadão contra o outro também nas relações entre si, pois, se assim não proceder, correrá o risco de ser co-responsabilizado, na medida em que não tenha cumprido este dever específico de tutela.

Steinmetz74 explica esta teoria da eficácia mediata ou indireta como aquela que sustenta que as normas de direitos fundamentais produzem eficácia nas relações entre particulares por meio de outras normas e parâmetros dogmáticos existentes e derivados do próprio direito privado, condicionando, em primeiro plano, a mediação concretizadora do legislador de direito privado, através do desenvolvimento dos direitos fundamentais por meio da criação de regulações normativas que especifiquem o seu conteúdo, condições de exercício e alcance, e dos Tribunais em segundo plano, mediante a interpretação e aplicação dessas regulações normativas. Jorge Miranda complementa que a conciliação entre direitos fundamentais e direito privado, por meio de produção indireta de efeitos do primeiro no segundo, pressupõe a ligação de uma conceção de direitos fundamentais como um sistema de valores com a existência de portas de entrada desses valores no próprio direito privado, que seriam cláusulas gerais.

73

Artigo 9, parte III, alínea 2 da LF, em que é expressamente afirmada a nulidade de acordos para a restrição da liberdade de aliança entre empregados e empregadores, assim como a ilegalidade de medidas que visam tais acordos.

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Steinmetz, citado pelo professor da Universidade de S. Paulo Virgílio Afonso da Silva, na obra A

Constituição dos Direitos, os direitos fundamentais nas relações entre particulares, 1ª Edição, 2ª

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Este modelo de efeitos indiretos na vinculação entre os particulares é o modelo consensualmente mais aceite entre os diversos ordenamentos jurídicos, em que o problema da aplicabilidade dos direitos fundamentais às relações entre particulares é estudado. No entanto, Steinmetz75 faz a crítica no sentido de que nem sempre as cláusulas gerais poderão oferecer proteção suficiente aos direitos fundamentais na vinculação entre os particulares.

No que diz respeito à teoria imediata ou de efeitos diretos, a mesma propõe a aplicação direta de normas de direitos fundamentais nas relações entre particulares. A eficácia não está condicionada à mediação concretizadora dos poderes públicos. Não dependem de regulamentações legislativas específicas nem de interpretação e aplicação judiciais. Na teoria imediata não é necessário nenhuma ação intermediária para que os direitos fundamentais sejam também aplicáveis nas relações privadas. As normas de direitos fundamentais conferem ao particular uma posição jurídica oponível, não só ao Estado, mas também as demais particulares. No entanto, para Steinmetz a eficácia imediata possui diferentes graduações. Num plano mais forte, a eficácia é geral, plena e indiferenciada nas relações entre particulares. Num plano mais fraco, os direitos fundamentais vinculam os particulares, mas com consideração pelas diferenças económicas e sociais entre eles. Num plano intermédio, a eficácia entre particulares não será ilimitada, incondicionada e indiferenciada, carecendo da aplicação do princípio da proporcionalidade para a sua determinação.

Hoje é aceite pela doutrina dominante que as normas de direito fundamental influenciam as relações entre particulares, tendo, neste sentido, efeito horizontal. Mas como se dá esta influência e em que grau existe a vinculação?

Alexy76 propõe a teoria integradora, defendendo que as teorias supra descritas, juntamente com a teoria da imputação defendida por Steinmetz77, não se excluem, mas sim se complementam. Na teoria proposta há um modelo de três níveis, o dos

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Obra já citada, p 54.

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Obra, 2008, pág. 515

77 Steinmetz defende que todas as lesões a um direito fundamental entre particulares devem ser

imputadas ao Estado, uma vez que a lesão é o resultado de uma permissão estatal ou da sua não proibição. Assim, o problema da vinculação dos particulares a direitos fundamentais desloca-se para o plano das relações entre o indivíduo e o Estado, plano em que opera a eficácia imediata, direitos de defesa perante o Estado.

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deveres do Estado, o dos direitos perante o Estado e o das relações jurídicas entre os particulares. Cada um deles deve ser visto perante o caso concreto, tendo como referência a questão da funcionalidade, sendo que nenhum deles terá prevalência frente aos demais, e os três conduzem a um mesmo resultado, ou seja, a eficácia imediata de direitos fundamentais nas relações entre particulares.

Resta sabermos então, se os direitos fundamentais sociais vinculam os particulares. Tendo em conta que os direitos fundamentais sociais são direitos a algo (prestações materiais de bens ou serviços), do destinatário exige-se uma ação. Por isso, para grande parte da doutrina, não podemos defender a vinculação dos particulares neste caso.

Os particulares não estão obrigados frente ao direito fundamental social ao trabalho a criar efetivamente postos de trabalho, não é um dever jurídico-constitucional dos mesmos propor, planear ou executar políticas sociais e económicas promotoras dos direitos fundamentais a prestações, embora delas possam participar.

Na nossa opinião, a forma como os direitos sociais foram concebidos no nosso ordenamento jurídico, não nos é possível negar de forma generalizada a eficácia jurídica a esses direitos nas relações entre particulares. Os particulares aqui são destinatários imediatos dessas normas, sendo que estas atuam com eficácia imediata. Ora, pondo o exemplo de uma decisão proferida pelo Tribunal de Trabalho Alemão, em 5 de Maio de 1957, que considerou nula uma cláusula contratual que previa a extinção da relação laboral das enfermeiras que trabalhavam num determinado hospital privado, caso eles contraíssem matrimónio. Esta cláusula foi considerada nula por violação os artigos 1.1., 2.1. e 6.1. da Lei Fundamental Alemã.

Neste caso, os direitos fundamentais não atuam apenas como princípios de conduta para a atividade legislativa ou como regras hermenêuticas dirigidas ao Tribunal. Mais do que isso, são verdadeiras normas de comportamento aptas a incidirem no núcleo das relações entre particulares.

Independentemente de existir ou não lei proibitiva ou permissiva da restrição e de o ajuste de vontades ter sido realizado com base na autonomia privada, o caráter normativo da CRP exige a consideração imediata dos direitos fundamentais por ela

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consagrados. Neste caso, a vinculação conduziria à materialização de uma posição jurídica subjetiva de um particular frente a outro, quando ocorresse a violação por um dos particulares de um comando jus fundamental estabelecido pela Lei Fundamental. Assim, partindo-se da premissa que estamos perante um direito fundamental como um todo, somos levados a considerar que a identificação do seu destinatário estará vinculada à existência (ou não) de uma relação jurídica base, que sirva de ponto de apoio para a concretização de uma das suas inúmeras formas de expressão.

Esta relação jurídica trata-se de uma relação em que os destinatários poderão ser tanto o Estado como o particular ou, onde ambos (destinatários) poderão ser demandados judicialmente pelo titular do direito ao trabalho, sempre que incumprirem o objeto (ou parte dele) que for imediatamente dirigido. São essas as hipóteses tuteladas nos artigos 58º e 59º da Constituição, em que claramente os particulares e o Estado figuram como destinatários dessas normas.

No entanto, se estivermos perante uma relação em potência, em que a pessoa humana não adquiriu ainda o status de “trabalhador”, aí sim, estamos perante uma relação dual, no sentido em que ao titular do direito ao trabalho não lhe será atribuído um direito subjetivo e, consequentemente, um direito de demandar judicialmente; o destinatário jurídico (do objeto implícito ao direito ao trabalho) será exclusivamente o Estado, que terá o dever de proteger o cidadão, contra qualquer medida do próprio Estado ou de particulares que venham a obstaculizar a fruição desse direito.

Neste último caso, estamos perante a dimensão objetiva do direito ao trabalho (vista pelo ângulo dos deveres não relacionais), o que nos conduz à seguinte conclusão: apesar de não haver um vínculo concreto entre o titular do direito ao trabalho (neste caso, o trabalhador em potência) e um inexistente beneficiário (jurídico e/ou fáctico) da sua atividade, ao poder público não será permitido despir-se do papel de zelador máximo deste direito fundamental.78

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“(…) A garantia da segurança no emprego não se esgota na proibição de despedimentos

injustificados, intervindo, não apenas quando está em causa a cessação do contrato de trabalho ou do vínculo à função pública, mas também quando se coloca o problema da subsistência ou insubsistência da relação laboral efetiva (Acórdãos nºs 285/92 e 39/97 TC) – em conjugação com a consagração do direito dos trabalhadores à ‘organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal (…)’ – art.º 59º/1/b – pois, para que o trabalhador se possa realizar, é preciso que ele possa trabalhar ou, o mesmo é dizer,

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Podemos deduzir que, o direito fundamental ao trabalho tem como destinatário principal o Estado, porém não podemos ficar só por ele, porque se assim fosse, tal elemento retiraria o conteúdo jurídico fundamental dos direitos dos trabalhadores quando os destinatários fossem pessoas físicas ou jurídicas na condição de empregadores.

Sendo assim, concluímos que no tocante a prestações positivas o destinatário é apenas o Estado, porque não podemos incumbir ao particular o dever de promover o direito ao trabalho, através da elaboração de políticas de emprego e criação de postos de trabalho. Já no que diz respeito ao dever de abstenção, de respeito às liberdades do titular, os particulares têm o dever de não intromissão e respeito, dever esse que os vincula, como regra geral mediatamente e, excecionalmente, de forma imediata (como nas hipóteses do artigo 59º CRP) também como destinatários. O Estado, ao impedir essa violação por parte dos particulares, está a cumprir o ser dever de não permitir a intervenção nas liberdades fundamentais.

É nosso entendimento ainda, que podem ser diretamente invocados no vínculo laboral, todos os direitos fundamentais dos trabalhadores que relevam do princípio geral de proteção, quer incidam na regulamentação coletiva das relações de trabalho, quer incidam nas relações individuais do contrato de trabalho.

Podem ainda ser diretamente invocados na execução do contrato, todos os direitos