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CAPÍTULO 1- ENQUADRAMENTO TEÓRICO

1.2. Supervisão em Educação

1.2.1. Supervisão reflexiva e supervisão clínica

A abordagem reflexiva da supervisão, de acordo com Schon (1983, 1987), citado por Alarcão e Tavares (2003), preconiza uma construção contextualizada do conhecimento profissional através da “reflexão na e sobre a ação”, assumindo particular relevância na formação de professores, promovendo uma consciência da imprevisibilidade dos contextos da sua ação a qual deve ser inteligente e flexível, contextualizada e reativa. O foco na formação de professores de cariz reflexiva está relacionado com uma orientação da prática pedagógica assente no pressuposto de que os profissionais constroem e reconstroem o seu conhecimento através de uma prática contextualizada, através de um diálogo constante com as situações e as personagens que nelas atuam e “na mobilização criativa de saberes de referência” (Alarcão, 2002, p.219) que constituem um “know-how inteligente e socialmente relevante” (Alarcão & Tavares, 2013, p.15).

A docência de hoje é uma profissão que tem de ser exercida em equipa, através da construção de um conhecimento coletivo em interação contextualizada com objetivos comuns, assumindo aqui particular importância a existência de um contexto de mudança e um pensamento e compreensão coletivos, essenciais para mudança a operar na escola, sendo para isso necessário promover um pensamento coletivo dos seus atores ao nível do que deve ser, do que é e do como funciona. É desta forma que Alarcão (2002, p.220) nos introduz o seu conceito de escola reflexiva "enquanto organização que continuadamente se pensa a si própria, na sua missão social e na sua estrutura e se confronta com o desenrolar da sua atividade num processo heurístico simultaneamente avaliativo e formativo". Nesta escola aprendente e qualificante, que expande continuamente a sua capacidade de criar futuro, reconhece-se, à escola e aos indivíduos, a capacidade de evoluir através das suas aprendizagens, configurando uma aprendizagem coletiva e individual, sendo esta última focada num contexto coletivo e cooperativamente realizada. Neste contexto, a supervisão visa "a dinamização e o acompanhamento do desenvolvimento qualitativo da organização escola e dos que nela realizam o seu trabalho de estudar, ensinar ou apoiar a função educativa através de aprendizagens individuais e coletivas incluindo a dos novos agentes" (p. 231), configurando assim uma missão dinâmica e contínua de apoio ao desenvolvimento individual de todos os seus atores e do coletivo-escola.

Uma leitura sobre “supervisão reflexiva”, como aliás já referimos, está intimamente relacionada com a formação inicial de docentes sendo o supervisor um profissional dotado de mais conhecimentos, competências e experiência, configurando desta forma uma relação hierárquica, na qual assume o papel de agente de desenvolvimento de pessoas, de profissionais e de organizações, sendo-lhe atribuída a competência de facilitar, liderar ou

dinamizar comunidades de aprendentes no interior da escola. Mais, o supervisor na sua ação de acompanhamento, em contexto, do futuro profissional tem o dever de promover o “confronto com problemas reais que careçam de ser descodificados e resolvidos e proporcionar situações de levantamento de hipóteses, experimentação e verificação”. (Alarcão & Tavares, 2003, p.36)

A supervisão clínica

A supervisão clínica é, segundo Alarcão e Tavares (2003), um modelo que tem como objetivo principal a melhoria da prática de ensino dos professores na sala de aula conferindo ao supervisor as tarefas de ajudar o professor a analisar e a repensar o seu próprio ensino sendo este, o professor, um agente dinâmico num processo que se quer colaborativo entre os dois (supervisor e professor) e entre este (o professor) e os colegas, numa ação continuada constituída por planificação e avaliação conjuntas para além da observação e da análise. Desta forma, e de acordo com Vieira e Moreira (2011), o modelo é desenvolvido por (Cogan, 1973) e Goldhamer, Andersen e Kajewwsky (1980) e apresentado em Portugal por Alarcão (1982) em reação a práticas de cariz inspetivo. Algumas das principais caraterísticas do modelo de supervisão clínica apontadas por Goldhamer et al.(1980, citado por Vieira & Moreira, 2011) são: a) é uma tecnologia para melhorar a instrução que implica uma intervenção deliberada no processo instrucional; b) é orientada por finalidades e combina necessidades individuais e coletivas de desenvolvimento profissional; c) supõe uma relação de trabalho entre supervisores e professores que requer confiança mútua, traduzida em compreensão, apoio e comprometimento nos processo de desenvolvimento profissional; d) é sistemática, embora requeira uma flexibilização e atualização constante da sua metodologia; e) cria uma tensão produtiva no sentido de ultrapassar o desfasamento entre o real e o ideal; f) pressupõe que o supervisor saiba mais que o professor acerca da instrução e da aprendizagem e requer formação do supervisor.

Ideologicamente a supervisão clínica é aquela que "pressupõe a defesa de valores como a colegialidade, a confiança mútua, a auto-suficiência, a liberdade a autonomia, e o espírito crítico no ensino e na supervisão para todos os envolvidos no processo", sendo fundamental que a ação seja promovida por iniciativa dos professores pois devem ser estes a solicitar o apoio do supervisor para a análise conjunta de situações problemáticas, devendo o supervisor, enquanto colega e elemento de apoio e recurso, disponibilizar-se para o ajudar a ultrapassar as dificuldades profissionais detetadas.

O modelo de supervisão clínica está estruturado, de acordo com as propostas iniciais formuladas por Goldhamer, citado por Alarcão e Tavares (2003) em cinco fases: 1) o encontro pré observação; 2) observação; 3) análise dos dados e planificação da estratégia da discussão; 4) encontro pós-observação; 5) análise do ciclo de supervisão. Na primeira fase do ciclo supervisivo, o supervisor e o professor planificam conjuntamente a estratégia de observação (o quê, o quando e o como observar) num clima de confiança e sem tensões. O apoio do supervisor na identificação do problema e na definição de soluções depende do grau de

autonomia do professor para identificar, decidir e resolver problemas. Na segunda fase, a observação, o supervisor observa e analisa as estratégias e os procedimentos que o professor utiliza na sala de aula para resolver os problemas que foram previamente identificados e recolhe informação pertinente. Na fase da análise de dados e planificação da estratégia da discussão, o supervisor e o professor separadamente analisam a informação recolhida durante a aula e procedem a uma sistematização que possibilite a análise e interpretação conjunta da informação na fase do encontro após a observação. O professor deverá ter um papel ativo na análise dos dados porque só através da apropriação do significado dos dados se sentirá comprometido com o ensino que ministrou e que deseja ministrar.

Smyth (1984) citado por Alarcão e Tavares (2003) dá-nos uma perspetiva da supervisão clínica assente numa relação de colaboração entre colegas, os quais procuram a interação do processo ensino-aprendizagem como objeto de reflexão e questionamento crítico e fonte de hipóteses, soluções e mudanças a operar de modo a contribuir para uma prática de ensino mais eficaz, mais pessoal e autêntica. Uma das caraterísticas da supervisão clínica situa-se ao nível da noção de formação contínua que se contrapõe a uma noção de hierarquia que existe num processo de avaliação e mesmo entre supervisor e formando. Em supervisão clínica tende-se a esbater as fronteiras entre supervisor e supervisionado, inclusive em termos da maior experiência do supervisor, bastando o desejo de refletirem sobre as suas práticas de ensino munidas das ferramentas metodológicas que lhes permitam analisar e refletir sobre o que fazem, porque o fazem e com que objetivos e resultados. Com efeito o processo de supervisão contínua pode permitir que a prática sistematizada e eventualmente continuada entre colegas, assente numa experiência, conceptualização, ação, observação, reflexão e avaliação tenda a constituir-se num projeto de investigação dos professores sobre o seu próprio ensino, enquadrando-se num tipo de formação que cumpre os requisitos do processo e desenvolvimento do professor enquanto profissional reflexivo.

Para o êxito do processo descrito é necessário que ele cumpra os seguintes requisitos: a) vontade de participar, livremente expressa; b) certeza de que os colegas não vão exercer avaliação sobre os outros; c) apoios para levar a cabo as tarefas incluindo a ajuda de quem possa esclarecer dúvidas sobre processos de recolha de dados e reflexão sobre os mesmos; d) uma organização de horários compatíveis que permita condições de colaboração e entreajuda.

Perante a abordagem referentes à atual definição e caraterização de supervisão reflexiva e supervisão clínica, acima apresentadas, emergem entre as duas algumas diferenças e semelhanças mas também alguma complementaridade, na medida em que se, por um lado, o cenário reflexivo da supervisão nos remete para um contexto de formação inicial, conferindo ao supervisor um estatuto natural fruto de uma relação professor aluno e de uma ação continuada mas induzida e acompanhada, indutora e promotora da reflexão com vista à aquisição de um conhecimento de experiência feito, por outro lado, o papel de supervisor na supervisão clínica, embora inicialmente conferindo-lhe um certo estatuto, porque parte do princípio que é um docente mais experiente, tende a esbater-se uma vez que

estamos perante uma ação realizada por profissionais, colegas com objetivos e motivações comuns de análise e reflexão sobre as suas práticas com vista à sua melhoria. Chegando aqui importa perceber qual é, ou deve ser, o papel do supervisor numa atualidade educativa fortemente marcada pela constante mudança, sobretudo institucional, de paradigmas educativos.

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