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Suscetibilidade Eletromagnética (em Seres Vivos)

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA O conteúdo deste capítulo foi cuidadosamente definido para que fosse possível ao

2.1 FUNDAMENTOS DE ELETROMAGNETISMO

2.3.4 Suscetibilidade Eletromagnética (em Seres Vivos)

Foi visto anteriormente que o receptor da energia eletromagnética também pode ser constituído de estruturas vivas, como animais ou seres humanos. Para estes casos, é possível interpretar o tecido vivo como um complexo sistema de cargas elétricas que são definidas intrinsecamente pela natureza bioquímica das suas estruturas moleculares e íons. Os gradientes de concentração iônica impostos, por exemplo, por uma membrana celular são suficientes para estabelecer uma sensível diferença de potencial (tensão elétrica) entre as duas faces da membrana celular. Baseado nesta evidência elétrica, que está relacionada a todo tecido vivo, torna-se justificada a preocupação com relação a possíveis efeitos biológicos decorrentes da interação do ser vivo com a energia oriunda do ambiente em que ele habita. Um simples estímulo elétrico (causado, por exemplo, pela ação de campos eletromagnéticos) é capaz de desencadear uma série de fenômenos bioquímicos complexos, como por exemplo, ocorrência de potenciais de ação da célula. Em uma situação mais severa, a absorção da energia eletromagnética pode acarretar em uma modificação da homeostase3 do organismo e estabelecer uma situação de risco biológico.

É importante esclarecer que a interação da energia eletromagnética do ambiente com seres vivos, e a conseguinte observação de efeitos biológicos devido a um determinado estímulo, não resultam necessariamente em um perigo biológico. Um efeito biológico se torna um risco biológico apenas quando ele causa danos à saúde de um indivíduo ou de sua descendência [N7].

Assim, a suscetibilidade de um ser vivo está relacionada com a evidência de riscos biológicos observados, frente à sua exposição a campos e perturbações eletromagnéticas. Dentre os fatores que caracterizam esta suscetibilidade destacam-se:

a) Tipo de radiação eletromagnética (ionizante ou não-ionizante); b) Tempo de exposição;

c) Densidade de potência; d) Taxa de absorção específica; e) Correntes induzidas;

f) Correntes de contato.

3 Conjunto de atributos físicos e químicos que permanecem parcialmente constantes (temperatura,

concentração de substâncias, pressão, etc.) e são compatíveis com a vida e o bom funcionamento do organismo vivo.

a) Tipo de radiação eletromagnética: A natureza da radiação eletromagnética que é

recebida por um tecido vivo é um importante fator na suscetibilidade do organismo. A rigor, a definição quanto ao tipo de radiação está intimamente ligada com a freqüência das emissões radiadas pela fonte eletromagnética. Ao recapitular o espectro eletromagnético ilustrado anteriormente na Figura 2-1, pode-se observar que quanto maior a freqüência de uma onda eletromagnética, menor o seu comprimento de onda e maior será a energia contida em um quantum a ela associado.

A partir de uma determinada freqüência na faixa de radiações ultravioleta, da ordem de 2,5 PHz (Peta ≡ 1015) [P11], as ondas eletromagnéticas passam a ter comprimentos de onda tão pequenos que podem ser comparados aos comprimentos das cadeias protéicas e outras estruturas moleculares presentes na matéria. Além disso, o conteúdo de energia associada a estas freqüências é tamanho, que a onda eletromagnética é capaz de quebrar as estruturas bioquímicas existentes no tecido vivo, arrancando elétrons das moléculas e liberando-os sob a forma de íons (elétrons livres). O fenômeno pelo qual os elétrons são arrancados dos átomos e moléculas é chamado de ionização e, por esta razão, as ondas eletromagnéticas que possuem esta propriedade são conhecidas como radiações

ionizantes (RI). São exemplos de radiações ionizantes os raios-X e raios gama. Este tipo

de radiação é prejudicial aos tecidos vivos, pois a quebra das estruturas químicas e as mudanças moleculares ocorridas neste processo trazem danos aos tecidos e podem inclusive acarretar em mudanças genéticas (quando o rompimento ocorre nas cadeias de DNA). Como as modificações das estruturas moleculares no tecido vivo são irreversíveis, o efeito da exposição à radiações ionizantes é dito acumulativo, pois os efeitos danosos são acumulados a medida que existe maior exposição e, consequentemente, uma maior modificação molecular. O estudo das radiações ionizantes, assim como das suas implicações, foge ao escopo deste trabalho, visto que o interesse aqui é voltado aos efeitos relacionados a ondas de freqüências mais baixas, principalmente ondas de rádio-freqüência (RF).

Em emissões de freqüências relativamente baixas, como a luz visível, o infravermelho e as ondas de RF, a energia associada às suas ondas eletromagnéticas não é grande o suficiente para causar a ionização dos átomos e moléculas em estruturas vivas e, por esta razão, estas ondas são conhecidas como radiações não-ionizantes (RNI). O conjunto de efeitos biológicos provocado pela RNI é objeto freqüente de estudo para diversos grupos de pesquisa ao redor do mundo. Existe uma grande polêmica sobre

correlação entre a exposição à radiação não-ionizante e a possibilidade de risco biológico, como por exemplo, a ligação entre exposição à radiação RF e o câncer ou com o surgimento de tumores, entretanto, até hoje os resultados têm se mostrado inconclusivos [P45]. Até o momento, os únicos fenômenos consistentes conhecidos com relação a este tipo de emissão estão relacionados apenas a efeitos térmicos e indução corporal de correntes [P11]. Por esta razão, estes dois aspectos são considerados os principais fatores de risco para exposição de organismos vivos.

b) Tempo de Exposição: Um dos fatores fundamentais com relação à

suscetibilidade de estruturas vivas é o tempo que o corpo permanece exposto à radiação eletromagnética. Visto que os efeitos comprovados de radiações não-ionizantes são efetivamente ligados à produção de calor, somado à incapacidade do organismo vivo de dissipar calor excessivo sob certas condições, então, quanto maior o tempo de exposição do organismo, maior serão os efeitos biológicos nele observados. A partir de então, a extensão do aquecimento corporal que, no limite, poderá resultar em um perigo biológico, está intimamente ligada ao tempo de exposição à radiação eletromagnética.

c) Densidade de Potência: Conforme visto anteriormente, uma forma de representar

a intensidade de uma onda eletromagnética plana pode ser em termos de densidade superficial de potência (relacionando-a com o vetor de Poynting). Ela foi definida como sendo a potência por unidade de área (W/m2). Assim, é natural esperar que quanto maior a intensidade dos campos eletromagnéticos em uma onda, maior serão os seus poderes de ação e conseqüentemente seus efeitos sob o tecido vivo.

d) Taxa de absorção específica: A taxa de absorção específica (SAR – do inglês

Specific Absorption Rate) é uma das principais medidas dosimétricas adotadas para a

quantificação da energia eletromagnética absorvida por um meio biológico [P11]. Esta grandeza correlaciona a quantidade de energia eletromagnética radiada que é absorvida por unidade de massa em um determinado volume do corpo do organismo. A SAR é expressa em W/kg, e pode ser relacionada ao campo elétrico por meio da equação 2-30 [N20]:

ρ

σ 2

E

SAR= (TAXA DE ABSORÇÃO ESPECÍFICA) 2-30

Onde σ é a condutividade do tecido dado em S/m, ρ é a densidade de massa do tecido em kg/m3, e |E| é o módulo do campo elétrico (valor rms) expresso em V/m. A SAR também pode ser relacionada ao aumento de temperatura em um determinado ponto do tecido vivo (efeitos térmicos no organismo) de acordo com a expressão 2-31 [N20]:

t T c SAR Δ Δ = 2-31

Onde “c” é a capacidade específica de calor do tecido envolvido, expresso em J/kg°C, ΔT é a variação de temperatura em °C, e Δt é a duração do tempo de exposição em

segundos.

Os valores de SAR podem ser definidos em termos de SAR média, utilizada para o

corpo inteiro, que expressa a relação entre a potência total absorvida pelo corpo e a sua massa (W/kg), ou ainda em termos de SAR local, utilizada para verificação da influência de

fontes radiantes em regiões próximas a determinadas partes do corpo, como por exemplo, a radiação de um telefone celular para a cabeça humana [P11]. A SAR local é definida como

o valor médio da SAR por grama de tecido (W/kg/g).

e) Correntes induzidas: A interação dos campos eletromagnéticos presentes no

meio ambiente com os seres vivos pode resultar na indução de correntes elétricas circulantes no interior do organismo. A distribuição das correntes induzidas no corpo é dependente da freqüência da radiação, das condições de exposição, do tamanho, da forma e das propriedades elétricas do corpo, além do seu posicionamento em relação ao campo eletromagnético atuante [N7].

Para efeitos de suscetibilidade do organismo vivo duas perturbações podem ser decorrentes de correntes induzidas: o efeito de eletro-estimulação e o efeito térmico. Para freqüências mais baixas (até 100 kHz), a eletro-estimulação provocada pela circulação destas correntes pode causar reações adversas no sistema nervoso [P11], principalmente em razão da estimulação de nervos periféricos e/ou músculos [N7]. Para freqüências a partir de 10 MHz, a densidade de corrente induzida passa a ser um fator preponderante, pois os efeitos de sobre-aquecimento local dos tecidos tornam-se predominantes em relação à eletro-estimulação [P11].

f) Correntes de contato: As correntes de contato são efeitos indiretos da ação de

campos eletromagnéticos sobre uma pessoa ou um objeto. Devido à exposição a um campo eletromagnético, um corpo qualquer (ser vivo ou objeto) pode ser carregado eletricamente e manter o seu potencial eletrostático elevado. Quando este corpo carregado se aproxima ou entra em contato com outro corpo que se encontra em um potencial elétrico diferente ocorre a transferência de cargas elétricas entre eles, sob a forma de uma descarga eletrostática (ESD - do inglês Electrostatic Discharge). Este fluxo de cargas elétricas,

em severidade, desde a percepção até a dor [P11]. Os efeitos mais comuns estimulados por estas correntes são relacionados à sensação de choque elétrico e até queimaduras [N5].