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Ao se falar em agricultura familiar, geralmente encontramos estudos relacionando esta ao desenvolvimento sustentável ou que destaque sua contribuição no contexto construtivo da agricultura, seja nos moldes convencionais, agroecológicos, orgânicos, ou em outras áreas. A importância pela compreensão desse tipo de agricultura remonta ao clássico da literatura agrária, já perceptível em sua pesquisa:

Não conseguiremos progredir no pensamento econômico unicamente com as categorias capitalistas, pois uma área muito vasta da vida econômica (a maior parte da esfera de produção agrária) baseia-se, não em uma forma capitalista, mas numa forma inteiramente diferente, de unidade econômica familiar não assalariada. Esta unidade tem motivações muito específicas para a atividade econômica, bem como uma concepção bastante específica de lucratividade (CHAYANOV, 1981, p.133-134).

Outro clássico contemporâneo, analisando o processo evolutivo pelo qual passava a agricultura campesina, escreveu:

O velho campesinato não está apenas se “diferenciando”; ele está sendo totalmente dissolvido, está deixando de existir, deslocado por tipos de população rural totalmente novo, por tipos que constituem a base da sociedade na qual dominam a economia mercantil e a produção capitalista. Estes tipos são a burguesia rural (pequena burguesia, principalmente) e o proletariado rural, a classe dos produtores de mercadorias na agricultura e a classe dos trabalhadores agrícolas assalariados (LÊNIN, 1985, p.177).

Nessa perspectiva é possível verificar que já havia certo rompimento, em parte, do velho campesinato dos moldes tradicionais de trabalho e da condução do meio agrário para uma nova tendência de desenvolvimento influenciada pelo capitalismo.

Entretanto, autores contemporâneos consideraram haver divergências entre o entendimento do campesinato descrito pelos clássicos da literatura agrária e o conceito atual da agricultura familiar (ABRAMOVAY, 1998). O conceito sobre “camponês” para Abramovay (1998), não é discutido pelos teóricos da época, que tinham como foco os desdobramentos do capitalismo e socialismo a qual se propunha; no marxismo o “camponês não pode ser senão uma categoria social construída” ou o resultado de uma construção social (histórica), e não derivado de um modelo de sistema político-econômico (capitalismo ou socialismo).

Ao discorrer sobre a sustentabilidade na agricultura familiar, faz-se também imperioso conhecer o conceito de agricultura familiar:

”[...] a família, ao mesmo tempo em que é proprietária dos meios de produção, assume o trabalho no estabelecimento produtivo” (WANDERLEY, 1997, p. 10).

[...] a partir de três características centrais: a) a gestão da unidade produtiva e os investimentos nela realizados são feitos por indivíduos que mantém entre si laços de sangue ou casamento; b) a maior parte do trabalho é igualmente fornecida pelos membros da família; c) a propriedade dos meios de produção (embora nem sempre da terra) pertence à família e é em seu interior que se realiza sua transmissão em caso de falecimento ou aposentadoria dos responsáveis pela unidade produtiva (INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA, 1996, p. 8).

Apesar da existência de tais conceitos arrolados na literatura e na legislação ao longo dos anos, pesquisadores da área da agricultura familiar ainda não chegaram a uma definição do tema, muito embora seja possível delimitar as características essenciais da agricultura familiar (SHIKI; SILVA; ORTEGA, 1997, p. 229-233).

Prosseguindo, é importante considerar que a agricultura moderna posiciona o agricultor familiar dentro de um novo contexto econômico e social, aquele em que o agricultor possui uma alta capacidade de resistência e de adaptação aos desafios modernos, o que seria impensável ao agricultor campesino de “Marx”. Tal colocação

tem respaldo em Lamarche (1993) que compreende a origem do agricultor familiar como portador de certos fundamentos (a centralidade da família, pelas formas de produzir e pelo modo de vida), mas que estão inseridos nas condições modernas de produção, bem como envolvidos nas ações em sociedade e no desenvolvimento do mercado moderno, o qual recebe constante influência.

No Brasil é sabido que a Agricultura Familiar sempre foi muito carente de informações que possibilitassem demonstrar aspectos fundamentais e característicos desse importantíssimo braço produtivo do agronegócio brasileiro. Nesse sentido, um estudo contemporâneo realizado por Del Grossi e Marques (2010) ocupou-se em detalhar os principais pontos que constroem o arcabouço teórico e normativo da agricultura familiar, servindo-se oportunamente do Censo Agropecuário de 2006 para tal fim. A obra apresenta resultados mais recentes da literatura agrária com a caracterização dos estabelecimentos agropecuários de acordo com a classificação de agricultura familiar, segundo a Lei n. 11.326 (BRASIL, 2006).

Tabela 1: Caracterização dos estabelecimentos agropecuários, de acordo com a classificação de agricultura familiar, segundo a Lei n. 11.326 (BRASIL, 2006).

Fonte: Elaborado por Del Grossi e Marques (2010, p. 152).

Em síntese, o emprego da “sustentabilidade” apresentou maior receptividade por parte da agricultura familiar em grande parte devido ao processo de afirmação dessa categoria durante os ciclos de acumulação capitalista, a uma maior facilidade de transição de tipos de sistemas (convencional para o agroambiental) e às vantagens características da empresa familiar para a sustentabilidade da agricultura (VEIGA, 1996).

Tavares (2009, p. 57-63) confirma a importância da agricultura familiar no Brasil, enfatizando as características diversificadas que esta possui e sua representatividade e importância na organização da produção brasileira, bem como mundial.

O pequeno produtor da cadeia agropecuária ou agricultor familiar tem papel fundamental no Brasil, chegando a ser referência para outros países. Conforme dados do Censo de 2006 do Governo Federal, a agricultura familiar é responsável por boa parte da produção brasileira, representando cerca de 25% dos alimentos consumidos no país (HOFFMANN, 2014).

Respectivamente ao café, 80% da produção provêm da agricultura familiar e, ainda, segundo dados do MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO (2017), a cadeia emprega em torno de 8 milhões de pessoas, consolidando a posição do café como uma importante fonte de renda. Com evidência, essas informações mostram o quanto a atividade agropecuária do pequeno e médio produtor são estratégicas e importantes para o abastecimento da população1.