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2 TRAJETÓRIA DA PESQUISA: ORIENTAÇÃO E ANCORADOURO

2.3 O processo de produção e análise dos dados

2.3.3 Técnica de análise dos dados: Análise de Conteúdo sob o amparo da

“Eu atravesso as coisas — e no meio da travessia não vejo! — só estava era entretido na idéia dos lugares de saída e de chegada. Assaz o senhor sabe: a gente quer passar um rio a nado, e passa; mas vai dar na outra banda é num ponto mais embaixo, bem diverso do que em primeiro se pensou (...) o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia...” (JOÃO GUIMARÃES ROSA, 1986: 26-52)

Considerando o objetivo central deste trabalho de pesquisa, é válido afirmar a premência da constituição de uma análise crítica a partir do discurso das pedagogas como interlocutoras no processo de estudo, ao descreverem sobre o trabalho que realizam em uma instituição pública de Educação Profissional. Assim, é relevante considerar a premissa de que as finalidades desta Instituição estão estreitamente relacionadas ao mundo do trabalho e à profissionalização das pessoas. É contemplado desta maneira o terreno da ação política e social.

Este reconhecimento é fundamental para pensar na técnica que possibilitará o processo de análise e interpretação dos dados da pesquisa, primando sempre pela coerência teórica e metodológica. É concebível que uma técnica, seja de produção ou análise dos dados em uma pesquisa, só é fortalecida e legitimamente científica se está sustentada em um determinado referencial teórico. No entanto, entende-se que a análise e interpretação ocorrem ao longo de todo o processo e não existem fronteiras, não existem momentos distintos, isolados para “produção de informações, dados” e para o início do processo de análise e interpretação.

É válido salientar que este estudo se apropria tecnicamente do método da Análise de conteúdo – A.C., fundamentada nas interlocuções teóricas dos(as) autores(as): Triviños, (2012), Franco (2005), Bardin (2011) e Guerra (2012). É interessante considerar, como já foi mencionado anteriormente, que o Grupo de Estudos e Pesquisas Kairós vem utilizando tais técnicas nas pesquisas desenvolvidas até o momento, primando pela sua articulação aos princípios teóricos e metodológicos dialéticos, que orientam conhecer, compreender uma determinada realidade, nos movimentos das contradições, historicidade e mediações com uma totalidade social, atentando para a produção da práxis. Assim, a A.C. é empregada como uma técnica para

analisar os dados em seus contínuos movimentos, considerando “A compreensão dos fenômenos vai se modificando no decorrer do processo de pesquisa e é paulatinamente aprofundada durante o trabalho de análise.” (SZYMANSKI, ALMEIDA E PRANDINI, p. 72, 2004)

Esta técnica de análise dos dados dispõe de um conjunto de formas de interpretação, a partir de instrumentos de análise das comunicações. É utilizada tanto em pesquisas com a abordagem quantitativa quanto qualitativa e tem uma longa história no campo das ciências. Teve origem de vertentes teóricas positivistas, no século XII, sendo fortalecida por volta da década de 1920, com a Primeira Guerra Mundial, quando surgem novos planos metodológicos e epistemológicos. É válido salientar que os primeiros materiais analisados são essencialmente jornalísticos. Bardin (2011) caracteriza a A.C. como instrumento para compreender o sentido, o significado e significação do conteúdo de uma mensagem, considerando que esta “procura conhecer aquilo que está por de traz das palavras sobre as quais se debruça [...] é uma busca de outras realidades por meio das mensagens.” (BARDIN, 2011, p. 50)

Considerando que os escritos desta autora representam com maior propriedade tal técnica, este estudo apropriou-se deles para pensar a produção das análises dos dados da pesquisa. Portanto, este processo é orientado pelas etapas de: pré-análise, exploração do material e, por fim, tratamento dos

resultados, a inferência e a interpretação. Em interlocução com Franco (2005),

é oportuno afirmar que estas etapas compõem um plano de pesquisa o qual pode viabilizar uma integração necessária entre teoria, produção, análise e interpretação dos dados da pesquisa.

Recorrendo à outra autora que escreveu sobre a A.C. (FRANCO, 2005), confirma-se a prerrogativa de que existem relações atreladas à emissão de mensagens, pois “a expressão verbal, seus enunciados e suas mensagens passam a ser vistos como indicadores indispensáveis para a compreensão dos problemas ligados às práticas educativas e as seus componentes psicosociais.” (FRANCO, p. 08, 2005) Portanto, a escolha da A.C., no seu processo de realização, deve ser coerente com a perspectiva dialética, a qual se tem como orientação no processo de compreensão da realidade de pesquisa. Uma vez que as mensagens emitidas pelos sujeitos produzidas na oralidade ou escrita, as que estão presentes em gestos, silêncios, imagens ou documentos,

expressam significados e sentidos, os quais não estão e não são isolados de um contexto mais amplo.

Considerando o processo de elaboração desde trabalho de pesquisa, em uma compreensão dialética da construção de um conhecimento, é possível dizer que a primeira etapa da análise, que é a pré-análise, conforme a exploração da literatura acima referenciada possibilitou a formulação do problema e dos objetivos deste estudo. Esta fase gerou a própria organização da pesquisa, uma vez que esta parte é constituída pela “escolha dos documentos a serem submetidos a análise, a formulação das hipóteses e dos objetivos e a elaboração de indicadores que fundamentem a interpretação final.” (BARDIN, p. 125, 2011). A partir de todo processo de exploração do material obtido na produção dos dados da pesquisa, constituindo uma pré- análise, considerando o material documental, as entrevistas e também os registros do grupo de interlocução, aconteceram as etapas de codificação,

categorização e inferência.

Bardin (p. 134, 2011) indica que “Tratar o material é codificá-lo”, assim, entende-se que a etapa de Codificação como o processo de transformação dos dados primários, possibilitando o conhecimento das características do texto, a representação ou a forma como se expressa o conteúdo, verificando as atitudes do interlocutor (verbal ou comportamental), predisposição, estabilidade, intensidade e organização do discurso. A codificação pode ser organizada, conforme referencial da autora, por recorte (escolha das unidades de registro e de contexto), enumeração (escolha das regras de contagem), classificação e a agregação (escolha das categorias).

Nesse sentido, durante o processo das entrevistas e transcrição das mesmas, foi o tempo em que foi possível revisitar, rememorar os momentos de conversas com as interlocutoras, identificando os trechos das falas mais relevantes com vinculações às questões da pesquisa. Foi possível observar a existência de uma relação entre o tipo de formação no curso de pedagogia (considerando ano e habilitação), as experiências vividas como pedagoga, com a maneira de descrever sobre o próprio trabalho e suas relações. Nesse sentido, procurou-se realizar um movimento de aproximar estas percepções ao

processo de constituição da historicidade do trabalho de pedagoga, a qual ora se manifesta individual, ora coletivamente.

Ao analisar a enunciação19, é importante destacar aspectos

presentes na maneira como as interlocutoras produziram seus discursos, alguns assemelhando-se em alguns pontos, outros sendo conduzidos de maneiras diferentes. Dentre tais aspectos, é observada a utilização de variações designativas (a gente, tu...), temporalidade das entrevistas, excesso de informações logo na resposta da primeira questão. Algumas pedagogas não limitaram suas respostas apenas ao que tinha sido perguntado. De maneira ansiosa, relacionaram à primeira questão a uma série de fatos e acontecimentos de suas vidas em uma ordem cronológica, descrevendo experiências sobre a carreira profissional, especialmente aquelas com mais anos de trabalho antes do ingresso no IF. Assim, foram repetitivas em algumas questões previstas no roteiro da entrevista, porém atribuíram mais detalhes em seus relatos. Tal processo resultou em entrevistas mais longas, com durações de 50 até 70 minutos.

Seguindo a apresentação do processo de análise das entrevistas transcritas, aconteceu a categorização dos discursos, movimento pelo qual se pode identificar aspectos mais amplos das interlocuções, possibilitando uma observação horizontal das falas das pedagogas. Esta etapa constituiu na confecção gradativa de quadros/tabelas referente às questões presentes no roteiro das entrevistas, individualmente. Estes instrumentos serviram para sistematização das categorias de estudo, em que trechos das falas foram selecionados de acordo com as seguintes temáticas: Trabalho de Pedagogo, Historicidade, Instituto Federal Farroupilha, Curso de Pedagogia e Pedagogia. Este processo visa a descobrir os ‘núcleos de sentido’ que compõem a comunicação e cuja presença ou frequência de aparição pode significar alguma coisa para o objetivo analítico escolhido (GOMES, 2012). Vale salientar que, paralelo a este procedimento, aconteceu um movimento de reflexão, mediada por articulação teórica a partir do referencial teórico produzido para a etapa de construção do projeto de pesquisa.

19 Inserida para a análise de entrevistas abertas, sendo concebida como processo da comunicação e não como um dado estatístico. A- condições de produção da palavra (fala, discurso) B- Análise das estruturas gramaticais; C – Análise da lógica de organização do discurso; D – Análise das figuras de retórica (figuras de linguagem).

A partir destes movimentos, foram sendo estabelecidos critérios de análise para produzir as interpretações, no sentido de conhecer os dados construídos em sua horizontalidade e verticalidade, viabilizando o reconhecimento de pontos, questões que entrecruzam entre os discursos. Para tanto, os dados obtidos nas entrevistas foram observados em suas semelhanças e diferenças, reconhecendo no que se contradiziam, no que se apresentava como paradoxal entre um e outro e no que convergiam. A partir deste processo, os dados foram novamente agrupados em arquivos computacionais, separadamente por categoria. Esse procedimento que possibilitou uma leitura dos dados sob uma perspectiva mais verticalizada, analisando a evolução de cada categoria pelo discurso das pedagogas.

Logo, iniciou-se então o registro do processo intelectual da produção das inferências do estudo, conteúdo do próximo capítulo desta dissertação, em que as categorias de estudo são apresentadas a partir de suas intersecções e relações. É atribuído sentido teórico e crítico na produção da pesquisa, sendo esta concebida como a imbricação, a articulação entre teoria e prática, a partir de uma realidade concreta na construção de ferramentas para uma ação pedagógica consciente.