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TÉCNICA DE ANÁLISE DOS DADOS

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CAPÍTULO 3 DELINEAMENTO METODOLÓGICO DO ESTUDO

3.6 TÉCNICA DE ANÁLISE DOS DADOS

Na utilização da Análise do Discurso (AD) como estratégia de pesquisa no campo social, múltiplas são as abordagens possíveis. As características do material trabalhado e os objetivos pretendidos são os elementos norteadores. Quando se busca construir interpretações, a Análise do Discurso parte da premissa de que “um sentido oculto deve ser captado, o qual, sem uma técnica apropriada, permanece inacessível” (MAINGUENEAU, 1989, p.11). Buscar o significado oculto não implica a crença em um único sentido, em uma única verdade. O foco de interesse é a construção de procedimentos capazes de transportar o olhar-leitor à compreensão menos óbvias, mais profundas através da desconstrução do literal, do imediato.

A análise do discurso prioriza a relação estabelecida entre a linguagem e o contexto histórico e social, condição adequada para sua produção. Tal condição inclui tanto quem fala quanto quem ouve, e também todo o contexto histórico-social e ideológico da comunicação. Isto equivale a afirmar que a base da construção do sentido de um texto ou discurso é a cultura na qual ele foi produzido.

Neste estudo, os dados foram obtidos com a aplicação das entrevistas e foram tratados por meio da Análise Gráfica do Discurso, de Sílvia Lane (1985), que visa apreender os aspectos subjetivos do indivíduo. Sua proposta é "[...] procurar graficamente os núcleos de pensamento, através das palavra que se repetem (ou dos sinônimos), mas seguindo a continuidade do discurso, utilizando a sequência dos números para cada ‘unidade de significação’ sujeito ou predicado (LANE, 1985, p. 8).

A análise do discurso pode ser aprofundada ao procurar as relações entre o discurso e as características do sujeito: seu grupo social, suas atividades, sua história pessoal.

Uma análise do discurso é uma leitura cuidadosa, que caminha entre o texto e o contexto, para examinar o conteúdo, organizações e funções do discurso. Em uma análise final, a análise do discurso é uma interpretação, fundamentada em uma argumentação detalhada e uma atenção cuidadosa ao material que está sendo estudado.

Segundo Lane (1985), as verbalizações apresentam-se como representações que o indivíduo constrói para orientar-se em suas ações com seu meio social. O discurso é considerado fato e contém a marca do sujeito e de sua atividade. As representações são os dados empíricos nas quais se baseia para atingir o conhecimento concreto da consciência dos indivíduos.

A Análise Gráfica do Discurso de Lane (1985) apresenta os seguintes pressupostos: a) não-fragmentação do discurso, pois qualquer critério utilizado para tanto já contém uma interpretação externa; b) a visão da linguagem deve ser construtiva (criadora) e construída e, em conseqüência, as relações entre os significantes devem ser mantidos constantes; c) o discurso, como uma forma de ação, produto da interação entre pensamento e linguagem, processa-se em espiral, havendo, assim, retornos e avanços, semelhanças e diferenciações; d) deve haver uma convicção na organização retórica do discurso, pois esse movimento em espiral caracteriza significações centrais e periféricas.

Na análise gráfica do discurso, mantém-se as setas e os números que indicam a relação e a seqüência do discurso, de modo que se possa ler a entrevista como realizada. Em vez de tratar o discurso como um caminho para outra realidade, os analistas de discurso estão interessados no conteúdo e na organização dos textos.

Para Lane (1985), ao mesmo tempo que os gráficos vão se formando e núcleos se destacando, os núcleos de pensamento são detectados, o que lembra Vigotski em sua análise sobre pensamento e linguagem. Segundo essa abordagem, há interpenetração e mútua dependência entre os dois, porém eles se processam em direções opostas: o pensamento vai do geral ao particular, e a linguagem, do particular ao geral. Assim, a linearidade do discurso constitui-se das particularidades que se processam relativas a um geral pensado e, dessa forma, os núcleos que os gráficos detectam são o pensado em torno do qual o discurso se articula.

A técnica de análise do discurso torna a análise simples, pois, mediante a descrição dos núcleos encontrados e das unidades significativas a eles relacionadas, há a representação que o indivíduo elaborou, com suas contradições, suas rupturas, o que permite detectar elementos ideológicos que permeiam suas representações e, assim, constatar a sua consciência se processando.

Segundo Macêdo (1999), o procedimento para a análise gráfica do discurso obedece à seguinte seqüência: a) transcrição do discurso da forma mais fiel possível; b) análise, identificação e enumeração das unidades de significação; c) ligação por setas, seguindo a direção da seriação das frases nos textos discursivos; e d) busca das palavras-chave ou dos núcleos de pensamento que retornam ao núcleo induzido, que é a pergunta.

A título de ilustração, será apresentado um pequeno fragmento do discurso de entrevistadas e seu respectivo gráfico, com o objetivo de clarificar os passos que foram seguidos na elaboração deste, uma vez que, no capítulo dos resultados, serão apresentados os gráficos finais e não a sua construção. Para isso, apresenta-se trecho da fala referente ao início da profissão como prostituta.

“Foi difícil. [...]fazer o primeiro programa foi difícil [...]”

“[...]uma amiga da minha irmã que tava vindo para cá, daí ela me chamou pra vir conhecer, prá vir morar, conhecer, aí eu peguei e vim, . [...]”

“Muito ruim até me acostumar, . [...]”

“No início, quando tinha 18 anos foi muito difícil, mas agora , já virei puta véia. [...]”

“Foi ruim né porque não tinha costume . [...],”

“[...]foi muito difícil, tinha nojo, medo, mas tinha que ganhar dinheiro, aí a gente se sujeita.”

“[...] Foi difícil, ficar com qualquer um não é fácil. Tem homens de todo tipo. Mas, o

dinheiro fala mais alto, a necessidade, faltava emprego ”

“Eu tinha muita vergonha, ficar com quem a gente não gosta é muito ruim [...], depois fica tudo normal, a gente fica que nem mercadoria.”

“Uma amiga me chamou.”

“Eu não sabia o que era a prostituição, foi muito difícil, faltava coragem [...],”

O início se deu por uma discussão com minha tia, resolvi sair e fui para a boate. Fiquei sem lugar para morar, eu morava com ela.

Observa-se que as palavras que se repetem são sublinhadas, objetivando-se visualizar a identificação dos núcleos de pensamento. Percebe-se que surgem dois núcleos de pensamento: faltava e difícil

Dessa sequência, surgiu o gráfico que se segue (Gráfico 1). Esta ilustração refere-se a um esquema gráfico de parte de um discurso.

Gráfico 1 - Exemplo de gráfico elaborado a partir dos núcleos de pensamento identificados na transcrição das entrevistas. Acima, o esquema inicial; abaixo, o gráfico final.

A seguir, no capítulo IV, o discurso das prostitutas será apresentado, discutido e analisado considerando-se as seguintes categorias associadas à psicodinâmica do trabalho:

Difícil

Tinha

Faltava

Nojo

Medo

Vergonha

Coragem

Emprego

Dinheiro

Lugar para morar

Início profissão de prostituta Início profissão de prostituta Início profissão de prostituta

Faltava

Faltava DifícilDifícil

Ruim Tinha nojo, medo, vergonha Lugar para morar Coragem Amiga Emprego Dinheiro fala mais alto Convite 1 2 2 2 2 2 2 2 2 1 1 1 1 1 1

gestão da organização que envolve a organização do trabalho, as relações de trabalho e as condições de trabalho; vivências de prazer e vivências de sofrimento no trabalho e estratégias defensivas. Neste capítulo poderá ser observado que algumas perguntas não foram contempladas com seus respectivos gráficos para análise. Isto ocorreu pelo fato de algumas respostas serem curtas e lacônicas inviabilizando a construção gráfica, uma vez não ser possível detectar o núcleo de pensamento.

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