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Tabus – das questões familiares e religiosas ao preconceito

No documento 2016Patricia Barazetti (páginas 77-79)

7 AS ESSÊNCIAS FENOMENOLÓGICAS

7.2 A sexualidade

7.2.1 Tabus – das questões familiares e religiosas ao preconceito

Nesta dimensão foi possível observar o quanto impregnados de tabus ainda se encontram os docentes quando o assunto tratado está relacionado à sexualidade. Entretanto, precisamos compreender primeiramente o que é um tabu.

Tabu é um termo polinésio que significa “que é proibido”. O conceito permite compreender as condutas ou ações que são proibidas ou censuradas por um grupo humano devido a questões culturais, sociais ou religiosas.

Desde crianças recebemos, primeiramente de nossas famílias e posteriormente da sociedade, conceitos morais que definem nossas habilidades em relacionar este ou aquele conceito, mobilizadores de comportamentos.

Apesar de vivermos em um momento em que existe a compreensão de um verdadeiro “afrouxamento” nos conceitos morais ligados à sexualidade, apresentam-se em prática outras verdades. Somos impregnados de conceitos morais e éticos, alguns tão essenciais ao bom convívio social, outros por vezes ligados a jogos de poder e outros determinismos.

A história da sexualidade vem marcada por momentos específicos, porém a concepção religiosa propõe um olhar particular a tais questões, as quais, às vezes, imobilizam os sujeitos a tratarem o assunto como algo pulsante na vida humana.

A sexualidade em relação à concepção religiosa é contaminada de tabus e mitos que afetam diretamente a maneira de compreender a sexualidade, e o primeiro deles refere-se ao “pecado“ de Adão e Eva, a partir do qual tudo o que diz respeito ao relacionamento sexual está ligado a um sentimento “de vergonha” e culpa. Também na leitura da religiosidade podemos perceber anjos assexuados, “puros”, sendo o diabo representado como imagem da sexualidade refletida em promiscuidade. Dessa forma, posicionam-se as vertentes religiosas em relação à sexualidade enquanto ato impuro, impregnado de pecado, sendo desfavorável à relação sexual pelo prazer.

Podemos observar professores em sala de aula carregados de tabus em relação à própria sexualidade, com dificuldades particulares em pensar e partilhar sua própria vivência, impedidos de comunicar-se com a sexualidade que aflora dentro do ambiente escolar. Nesse sentido, assim entende Louro (2000, p. 21):

Na escola, pela afirmação ou pelo silenciamento, nos espaços reconhecidos e públicos ou nos cantos escondidos e privados, é exercida uma pedagogia da sexualidade, legitimando determinadas identidades e práticas sexuais, reprimindo e marginalizando outras. Muitas outras instâncias sociais, como a mídia, a igreja, a justiça etc, também praticam tal pedagogia, seja coincidindo na legitimação e denegação de sujeitos, seja produzindo discursos distantes e contraditórios.

Ficam evidentes na fala das docentes participantes sentimentos difusos de vergonha, medo e pudor, ao tratar sobre as questões de sua própria sexualidade, sendo que a maioria delas aponta para uma educação sexual truncada, em que o silêncio ocupava os espaços familiares e sociais, enquanto o assunto era sexo e sexualidade, e as descobertas eram feitas de maneira solitária, como podemos observar na fala da professora B.: “Me sinto um pouco mais à vontade de falar sobre sexualidade com meus filhos, pois a educação que recebi foi cheia de tabus.” É o que também se observa na fala da educadora E., ao manifestar-se a respeito da importância de falar sobre o assunto com os docentes: “A escola estava precisando muito falar sobre sexualidade para abrir a mente das pessoas.”

As descobertas do corpo, como o ciclo menstrual, aconteciam como surpresa e somente quando ocorriam, era reconhecida através de poucas informações que vinha na maior parte das vezes da mãe.

Outro fator ligado aos tabus sexuais que mobiliza diretamente os educadores se refere às questões de identidade de gênero, fator latente em todos os discursos docentes quando o assunto é sexualidade. Tratar das questões de gênero e da homoafetividade ainda é difícil para os educadores, de um modo geral, e questões relacionadas a essa situação dentro da escola assombram o imaginário dos professores. Quando o assunto vem acompanhado de outras mazelas, isso ganha uma proporção maior ainda.

Esteve presente na fala das educadoras uma situação específica em que alunas da escola pesquisada cometeram suicídio pela questão da homoafetividade e dos preconceitos sofridos. Segundo a educadora D., “Houve três alunas da escola que se suicidaram em virtude da homossexualidade.”

Fica evidente o quanto o assunto sexualidade ocupa espaços que vão além das questões puramente sexuais e adentra espaços de pulsões de vida e morte.

As questões de gênero são desde muito cedo determinadas pelo entorno social, conforme aponta Schiavo (2004, p. 87):

Nossa sociedade estabelece uma série de normas e regras que diferenciam de forma clara o que se espera de um menino e de uma menina. Assim, definem-se os papéis de gênero, ou seja, os papéis masculinos e os papéis femininos, as formas de ser homem ou mulher. O papel de gênero é determinado, portanto, por aquilo que se

denomina tipificação sexual e é estabelecido pelas prescrições ditadas pelas instituições sociais, tais como a família, a escola, a igreja, a comunidade, onde tais padrões serão exigidos como forma adequada de sentir e se comportar para ser aceito como homem ou mulher.

No entanto, precisamos perceber que as questões de gênero vão além das exigências sociais, pois cada sujeito é único e manifesta sua sexualidade de maneira ímpar, assim esperar que cada um responda conforme as exigências sociais pode tornar-se o reflexo da própria violência.

É de fato complicado compreender o que leva o sujeito a comportar-se na contramão de seu gênero, porém, antes disso, necessitamos compreender que as crianças, meninos e meninas, possuem uma série de predisposições. Sendo assim, mesmo que o meio social trabalhe moldando seus comportamentos e exigindo deles normatizações, outros fatores influenciam suas tendências comportamentais. Dessa forma, essa cobrança inflexível pode resultar em sentimentos de inadequação, angústia e até depressão, os quais acabarão sendo internalizados como sentimentos de inferioridade, insegurança, gravemente comprometedores na sua constituição psíquica.

É necessário, então, que os educadores possam compreender o real valor de despir-se de seus próprios tabus, alcançar o conhecimento e preencher os espaços da sala de aula também com conteúdos de educação sexual. Assim, propiciarão às crianças uma compreensão do eu e do outro e de todas as nuances que envolvem o sujeito e sua sexualidade, deixando de lado os mitos que historicamente vem sendo reproduzidos.

No documento 2016Patricia Barazetti (páginas 77-79)