• Nenhum resultado encontrado

O esporte, da forma como é tratado no interior do sistema educacional, com suas características atuais, está sendo severamente questionado. Isso é evidente nos questionamentos às políticas públicas compensatórias, focais, casuísticas, des- contínuas e com o caráter centralizador e ideológico dos últimos anos, tanto no Governo de Fernando Henrique Cardoso quanto no Governo de Luís Inácio Lula da Silva e pelas práticas dos professores nas escolas, sem condições objetivas de trabalho, sem acesso aos conhecimentos científicos, sem financiamento, com pés- simos salários, sem grande capacidade organizativa reivindicatória desenvolvida e com precaríssima formação inicial e continuada para fazer face à complexidade do que significa educar em tempos de barbárie. O Manifesto por uma Educação

Física Inclusiva assinado pelo Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCE)

em outubro de 2000 e a Carta de Sergipe, sendo esta última assinada por mais de 1.500 (um mil e quinhentos) profissionais da área e por autoridades universitárias e parlamentares, encaminhada ao CBCE e a Fóruns internacionais da área, deixam isso evidente.

O esporte educacional é questionado porque não contribui para debelar a re- voltante e desumana desigualdade social (TAFFAREL, 2009) e não está sintonizado com os anseios por uma sociedade justa. Kunz (1994) resume as críticas ao esporte, na forma que este tradicionalmente se desenvolve na sociedade e na escola, nos seguintes enunciados:

O esporte como é conhecido na sua prática hegemônica, nas competições esportivas e nos meios de comunicação (televisão), não apresenta elementos de formação geral – nem mesmo para a saúde física, mais preconizado para essa prática - para se constituir uma realidade educacional.

O esporte ensinado nas escolas enquanto cópia irrefletida do esporte de competição ou de rendimento só pode fomentar vivências de sucesso para uma minoria e o fracasso ou vivência de insucesso para a grande maioria.

Esse fomento de vivências de insucesso ou fracasso para crianças e jovens em um contex- to escolar é, no mínimo, uma irresponsabilidade pedagógica por parte de um profissional formado para ser professor.

O esporte de rendimento segue os princípios básicos da “sobrepujança” e das “compara- ções objetivas”, os quais permanecem inalterados, mesmo para os esportes praticados na escola onde, por falta de condições ideais, o rendimento não se constitui no objetivo maior da aula. Esse é um dos motivos que contribuem para que o ensino dos esportes também venha a influenciar a crescente “perda de liberdade” e “perda de sensibilidade” do ser humano, pelo “racionalismo” técnico-instrumental das sociedades industriais modernas e seguidoras destas. (C.f. KUNZ, 1994, p.118-119).

1.

2.

3.

É preciso tratar cientificamente do esporte na escola, conforme demonstra Assis de Oliveira (1999) em sua dissertação de mestrado, e iniciar outras aborda- gens do esporte escolar, conforme já vivenciaram os professores Marcos Avellar do Nascimento e Victor Andrade de Melo (1997) e também Escobar (1997) em sua tese de doutorado. Para Escobar (1995), um trato diferenciado e crítico do esporte não deve afastar os alunos do esporte criticado, mas dirigir esse contato através de uma “transformação” que garanta a preservação do significado, a vivência de su- cesso nas atividades e a alteração de sentidos através da reflexão pedagógica. Tudo isso dentro de um programa que dê conta do percurso do aluno no processo de apreensão do conhecimento, ou seja, de um currículo para a Educação Física.

Um bom começo de uma metodologia da Educação Física crítico-superado- ra seria: afirmar o esporte e outras formas da cultura corporal, no currículo escolar, como conhecimento inalienável de todo individuo, independentemente de condi- ções físicas, de raça, de cor, de sexo, de idade ou de condição social; selecionar o conhecimento considerando as modalidades que encerrem um maior potencial de universalidade e compreensão dos elementos gerais da realidade atual, empregan- do os critérios de atual e de útil na perspectiva das classes sociais; resgatar práti- cas que possam, de um lado, contribuir efetivamente para o desenvolvimento da consciência crítica e, do outro, constituir formas efetivas de resistência; privilegiar a unidade metodológica como possibilidade de compreensão da cultura corporal numa perspectiva interdisciplinar; compreender o professor como um trabalhador orgânico da educação e do ensino: organizador, divulgador, incentivador, pesquisa- dor – engajado na dinâmica sócio-cultural da comunidade escolar – que se utiliza, como mais experiente, da atividade prática, “o trabalho social”, como única me- diação entre o homem e o conhecimento, para promover a autoconsciência dos seus alunos; relacionar as possibilidades da prática esportiva às possibilidades reais dadas pelas ações nas áreas da saúde, da cultura, do bem-estar social, da habita- ção, do planejamento urbano, entre outras; buscar os instrumentos de avaliação no próprio objetivo de construção das práticas corporais.

Esse debate nos indica que a avaliação dos objetivos manifestos ou não dos jogos escolares nos permitirão indicar onde avançar, no que avançar e como avan- çar para superar o atual estágio de desvalorização da Educação Física na escola.

Conclusões

Reconhecemos como indicações imediatas que as instâncias SUDESB e SEC necessitam de sintonia em torno do caráter pedagógico que devem ter os jo- gos escolares em um Estado onde predomina o território da caatinga, o semi-árido. Estado entrecortado por gravíssimas situações sócio-econômicas e educacionais, o que pode ser constatado nos indicadores educacionais. Considerando, portanto, os objetivos educacionais de formação de crianças e jovens, indicamos que os Jogos

sejam completamente redimensionados e que isso seja uma tarefa de todos, pro- fessores, estudantes, gestores, comunidade e movimentos sociais de luta da classe trabalhadora pela educação e esporte como direito de todos e dever do Estado.

É necessário destinar um tempo para uma profunda avaliação da Educação Física na RPE-BA e o esporte escolar nesse contexto, por parte dos que fazem o tra- balho pedagógico na escola e por parte dos gestores administradores. Que os jogos aconteçam sim, mas como síntese festiva de um processo educativo exitoso, que amplie a atitude crítica dos estudantes e suas aptidões e habilidades omnilaterais. Ocorram, sim, com base em um consistente processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos da cultura corporal nas escolas, entre os quais o esporte, em es- paços apropriados, com base em objetivos e avaliações rigorosas, com base em condições objetivas para sua realização, com segurança para a integridade física, psicológica, ética e moral das crianças e jovens, com a formação e a capacitação continuada dos professores de Educação Física no plano científico, político, ético, moral, estético e pedagógico, para além do técnico e o envolvimento responsável da comunidade e dos movimentos sociais de luta da classe trabalhadora. Que normas e regras sejam avaliadas e redimensionadas, desde as regras e normas de conduta de professores, técnicos e estudantes, de conhecimentos necessários em relação ao conteúdo esporte, de atitudes de gestores, até as regras do esporte em si.

A escola deve recuperar seu caráter educacional na perspectiva da emancipa- ção humana, o que implica em enfrentar o problema dos jogos escolares em outro patamar político, científico, técnico, pedagógico, em outro patamar de princípios educacionais, de estrutura de gestão e administração e de financiamento. Sem essa firme e definitiva articulação, corre-se o risco de manter no sistema educacio- nal baiano uma prática esportiva altamente alienadora e alienante, completamente desarticulada do projeto político pedagógico da escola, o que compromete a for- mação de crianças e jovens.

Portanto, essa sistematização, que se faz imprescindível, em termos de prin- cípios, em termos de conhecimentos – científicos, pedagógicos e técnicos – em termos de atitude política, em termos de condições objetivas, físicas, materiais, es- truturais, de gestão, administração e finanças, devem ser construídas por todos os envolvidos nos Jogos Escolares da Bahia – desde a escola até a SUDESB. Essas medidas não podem ser tomadas em gabinetes e simplesmente serem cumpridas pela boa vontade de alguns, em condições completamente adversas, pessoas que muitas vezes têm boa vontade, o que é louvável, mas que estão completamente despreparadas para lidar com o fenômeno da cultura corporal esportiva na perspec- tiva da formação humana omnilateral.

Urge inserir a Educação Física na escola, na perspectiva de um projeto de educação e escolarização que efetivamente se preocupe em elevar o padrão cultural esportivo da população da Bahia. Esta é a lição que podemos aprender dos Jogos Escolares da Bahia 2007.

TEXTO 8

EMANCIPAÇÃO HUMANA, TRABALHO