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Teatro de bonecos na EA: a participação da comunidade

FIGURA Nº 2 DISTRIBUIÇÃO DOS REPRESENTANTES PELOS SETORES

4.3 Teatro de bonecos na EA: a participação da comunidade

Percebi que estavam procurando por minha contribuição, quando uma das professoras sugeriu: "Seria bom trazer alguém de fora para também trabalhar com o

grupo, todo mundo unido e reunido discutindo." E perguntou se eu não podia ajudá-

las/os. Fiquei pensando e, depois da oficina de teatro de bonecos, que ministrei com todos os professores da zona rural, decidi que iria contribuir com aquele assentamento, fazendo um acompanhamento mais sistemático, repassando os conteúdos e a oficina para a professora que estava com um bebê e não pôde comparecer ao nosso encontro, e para o professor que não pertencia ao quadro de educandores/professores da rede municipal, mas que gostaria de poder conhecer mais sobre a EA e a própria comunidade.

Então, fui percebendo pequenas mudanças na cultura local, com as visitas, almoço e pude conhecer de perto as experiências com o adubo produzido com minhoca, sendo contadas por um dos trabalhadores que assumiu o projeto junto com um professor da UFCG do Campus da Patos, e outros companheiros. Ele foi um dos nossos guias nas visitas às outras áreas de assentamento.

Realizamos, também, para os/as alunos/as, seus familiares e outros interessados/as da escola, no Assentamento Patativa, uma oficina de Teatro de Bonecos. Esse trabalho teve resultados positivos, pois, através da apresentação do teatro de bonecos para a comemoração do dias das mães na escola, as crianças questionaram os problemas ambientais do assentamento, havendo momentos fortes de apresentação e diálogos entre os personagens criados pelas próprias crianças e pessoas da comunidade sobre o uso da água, do lixo e de condições gerais do ambiente.

Transcrevo agora os ensaios para as apresentações do teatro de bonecos. São cenas apresentadas por alunas/os na faixa etária entre 09 e 14 anos, que fizeram o seu próprio boneco com os materiais reciclados recolhidos nas proximidades do assentamento e na escola .

O tema para a cena era poluição das águas. Tudo acontecia entre duas donas de casa, que se encontravam no açude, e uma reclamava da outra porque estava poluindo as águas do açude:

Maria: O que você está fazendo Joana? Joana: Lavando roupa aqui.

Maria: E por que você está lavando aqui? Joana: Por que eu sempre lavo.

Maria: Você faz mal usar essa água, eu já falei pra você. Sabia que a gente bebe desta água?

Joana: Sabia não.

Maria: E por que você faz isso? `As vezes a gente polui a água, mas a gente não sabe as conseqüências que a gente vai sofrer, então por isso não poluam mais a água, Tá bom? Tá, tchau... [A platéia bateu palmas].

Um destaque importante para esse trabalho foi que esses alunos, crianças do assentamento, demonstraram nessa oficina e nas apresentações um nível alto de conhecimento sobre atitudes a serem tomadas para manter a EA no local, surpreendendo- me porque, para as cenas, foi somente indicado por elas quais eram os problemas ambientais; e o resto elas criavam, e nos discursos, alguma lição foi passada.

Joana: Muita gente consome as coisas dentro de casa com preguiça de levar lá fora. Então por isso minha gente eu digo, não deixe juntar lixo na casa, não deixe cair lixo nas encostas dos rios, nas barracas, nos açudes, que a gente dele tira água de beber.

José: É verdade.

Joana: José você sabia que muita gente joga veneno nas plantas. José: Não.

Joana: José isso queima as plantas, não dá preservação natural das plantas. E muitas plantas são o nosso alimento, como: feijão, milho, arroz e até batata. Tudo isso a gente preserva, mas tem gente que não preserva e então o que fazer ? José: Deve cuidar. Vamos cantar nossa música.

10 - Figura do arquivo pessoal - participaram da oficina a mãe, à esquerda, filha, no centro, avó, à direita e o texto cr do abaixo é da filha. .

odos cantam a música FLORIÔ:

ILHO NA PALHA CORAÇÃO CHEIO DE AMOR. (BIS)

pegar/ ra poder fazer o seu roçado e o Brasil se alimentar

o amor .Obrigado Gente. (Palmas da platéia)

ia

T

ARROZ DEU CACHO E O FEIJÃO FLORIÔ. M

Povo sem terra faz a guerra por justiça/ Visto que não tem preguiça esse povo de Cabo de foice também cabo de enxada/ P

Com sacrifício debaixo da lona preta/ Inimigo fez careta mas o povo atravessou/ Rompendo as cercas que cercam a filosofia/ De ter paz e harmonia para quem planta ..

No final de cada cena, havia um pequeno debate entre a platéia e todo o grupo sobre o problema apresentado pela cena. No caso acima foi discutido o veneno na plantação e buscadas saídas para a situação melhorar. A letra da música serve de reflexão para a EA.

José: Vai tomar banho hoje no açude ?

Pedro: Não, o açude não, porque não pode tomar banho, pra não poluir a água, é de nós beber..

José: Poluir ! Aonde, lá no açude?

Pedro: Sim. Agora não pode tomar banho só pode quando começar a chover José: É mesmo, né?

Pedro: Vamos embora. José: Bora, Tchau.

Sobre a participação dos alunos, percebo que eles são curiosos e participam

11 - Figura do arquivo pessoal - alunos que criaram e apresentaram a cena acima

ativamente desse processo. Eles chegam em casa, fazem os comentários sobre o tema, mas é preciso ter a família como uma forte aliada do trabalho. Realizamos o trabalho em conjunto,

12- Figura do arquivo pessoal- Oficina de Teatro de bonecos no Assentamento e ensaio com todo o grupo de alunos as professoras e merendeira.

e as mães e pais participaram e discutiam, anos cada apresentação. A professora e uma aluna apresentaram também esta outra cena:

Ângela: Bom dia.(a professora construiu este personagem ) Meu nome é Angela, tudo bom?

Platéia: Tudo bom.

Carla: E aí gente, aí tá tudo em cima? Platéia: Tá.

Ângela: Olhe, a minha vizinha ali pegou uma carroça de lixo e foi jogar ao lado da minha casa, isso tá certo ?

Platéia: Tá não.

Ângela: Eu vou chamar minha colega pra perguntar essa história. Carla: Olhar?

Platéia: Olha.

Angela: Olhe, foi essa aí que jogou o lixo lá detrás da minha casa, isso tá certo gente?

Platéia: Não.

Ângela: O que vai acontecer agora ?

Platéia: É uma vaia que nós vamos dar agora nela. ( vaiando o personagem) Ângela: Olhe, vocês não joguem lixo lá mais não, porque ontem à noite eu quase não dormia com tanta muriçoca, mosquito da dengue por conta da água que fica acumulada, viu?

Platéia: Viu.

Ângela: Olhe, da próxima vez, Carla, você pega o lixo, escolhe o que pode tirar e usar reaproveitando, como as garrafinhas para fazer bonecos, e o resto queima, fica combinado assim, não é gente, vai ficar tudo limpo agora.

Platéia: Isso, valeu. ( palmas)

A professora comentou que, com o teatro de bonecos, as mensagens são passadas de forma criativa sem cansaço, podendo ajudar na reflexão dos problemas, dando um exemplo de que, depois de uma apresentação desse tipo, replaneja melhor fazendo no assentamento coleta com os alunos e as mães. Nove meses depois, já em 2006 outras apresentações aconteceram discutindo o tema Caatinga.

A professora explicou como são as aulas de campo, ministradas fora de sala, em que os alunos vão colher o lixo nos arredores de casa e dentro do assentamento. Sobre a participação dos alunos nas aulas, a professora afirma:

13- Figura do arquivo pessoal - cartaz colado na parede da escola, no Assentamento Patativa do Assaré eles perguntam muito, perguntam muito mesmo. Eles gostam desse trabalho, eles acham bom as aulas para sair indo a campo, saindo da escola, mas tem que explicar antes as mães que antes não entendia quando a aula era fora da sala de aula.

Quanto aos recursos didáticos usados nas aulas, boa parte é recolhido no próprio assentamento, como caixas de fósforos para fazer dominó de palavras, palitos, folhas. A professora afirma:

É mais material descartável; às vezes a gente leva para a escola, pede aos alunos para trazerem de casa, com cartaz e colagem às vezes. E através da fala também.

As diferenças que ela percebe no assentamento, depois que trabalhou com a EA, são visíveis porque quase não se encontram materiais jogados em boa parte das áreas. Vejamos a fala da professora, a seguir:

às vezes, através dos alunos, a gente percebe eles, já começam a separar o lixo a queimar, a guardar e não jogar no chão os papeis. E quando a gente trabalha o que se deve fazer, já mudou o comportamento.

Por fim, pedi que ela me perguntasse algo que gostaria de saber, e ela quis mais informações sobre EA e gostaria de adquirir mais material didático para trabalhar com seus alunos.

14 - Figura do arquivo pessoal - Assentamento Padre Acácio, área em frente à escola

Do mesmo modo acontece aqui no assentamento Padre Acácio, existe uma escola do Município vizinho, com duas salas de aula, uma pequena cantina e um banheiro, em que falta construir uma área para recreação assim como aumentar e melhorar os recursos didáticos para as professoras trabalharem. Funciona só pela manhã, com uma sala de pré- escola com alfabetização, e a outra sala, com ensino fundamental de 1ª a 4.ª série (multisseriado); à noite, uma sala de educação de jovens e adultos e uma sala de pós- alfabetização. No geral as escolas estão necessitando de melhoras para seu funcionamento.

Em entrevista a professora "Alfazema", perguntei se ela trabalhava a EA na escola. Na sua fala, ela revelou:

A gente trabalha um pouco, porque sabemos que faz parte da vida da criança da zona rural. Ontem, na hora da apresentação, uma criança bem pequenininha desenhou uma árvore e disse que acha bonita, falou que a gente tinha que preservar a natureza para não desmatar. Eu achei bem interessante o que ela falou. A gente tem que orientar as crianças dessa maneira, para preservar a natureza, temos que evitar o desmatamento.

No depoimento acima, o exemplo que a professora da- sobre a apresentação das crianças através do desenho demonstra algo que achou interessante e diz que tem que orientar dessa maneira, dando a entender que as crianças já estão à frente do discurso da escola, enquanto a professora concorda com elas.

Os temas trabalhados, segundo as professoras, são os mesmos em quase todas áreas. Isso ficou confirmado nas visitas:

lixo, desmatamento, que a gente não deve desmatar, e nem cortar árvores jogando dentro de riacho, dos açudes até porque fica ruim para encher os açudes, quando os córregos estão cheio de garanchos, é serviço para correr água.

Sobre a participação dos alunos em sua aula, ela afirmou que a aula de campo. (fora da sala de aula) é mais participativa e interessante. "São interessados, uns se

interessa mais, outros menos, uns já estão acostumados".