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4. O TERRITÓRIO FRENTE ÀS EXIGÊNCIAS DO MERCADO

4.1 TECNIFICAÇÃO, FLUIDEZ E DIVISÃO TERRITORIAL DO TRABALHO

Buscamos, inicialmente, compreender o processo de instalação do Complexo Portuário de Suape no município do Ipojuca, ou seja, como a técnica se impõe no território no período técnico-científico-informacional. A forma pela qual os gestores públicos optaram para ser instalada em Suape são os Hub Port. Estes são “[…] megaportos voltados para a concentração e a redistribuição dos fluxos do comércio internacional para portos marítimos ou hinterlândias terrestres. Os portos de tipo hubs [Port] funcionam como instrumentos a serviço de multinacionais marítimas.” (MONIÉ, VIDAL, 2006. p. 894). O Hub port consiste em um porto concentrador de cargas e de linhas de navegação, para tal, busca o aumento nos tamanhos dos navios, concentrar rotas e reduzir o número de escalas marítimas. Em uma estratégia planejada pelos armadores internacionais, Suape passou a ser visto como o porto que poderia realizar, na Costa Atlântica da América do Sul, as operações de ‘transhipment’, ou seja, a transferência de cargas de navios de grande porte (full- containers de 4ª geração) para as instalações portuárias e reembarcando-as em navios de menor porte.

Estes megaportos têm uma função exclusiva de trânsito de mercadorias, neste caso os grandes portas contêineres são descarregados e os contêineres são redistribuídos sobre navios menores em direção a outros portos que não teriam a capacidade infraestrutural de atendê-los. Os ‘hubs’ estão a serviço das transportadoras marítimas. Comportam pouco pessoal, mas extremamente qualificado.” (RIAL, 2008, p. 110). Desta forma, o porto de Suape faz parte da necessidade de fluidez do mercado onde normas e técnicas se comungam para responder a demanda deste sistema. Logo, as variáveis técnicas e normativas são diretamente responsável pela reconfiguração do território do município de Ipojuca. Neste sentido, estamos falando de sistemas técnicos (Complexo Industrial Portuário de Suape) e de ações normativas carregadas de intencionalidades políticas que vão dialeticamente transformando o espaço geográfico ou, segundo Milton Santos, o ‘território usado’, pois este é a associação entre objetos e ações.

Este entendimento de ‘território usado’ “[…] tanto engloba a materialidade do mundo quanto as organizações, ações e sistemas de vida que necessitam desta materialidade para se reproduzir. Neste sentido, podemos falar que o espaço geográfico é sempre uma forma, uma extensão, mas que possui conteúdos técnicos,

normativos, econômicos, sociais, etc.” (CONTEL, 2006. p. 3). Através dessas transformações técnicas e normativas a parcela do território de Ipojuca onde está localizado Suape vai cumprindo um papel preponderante na divisão territorial do trabalho.

“Hoje, graças às possibilidades técnicas do período, o trabalho pode ser repartido entre muitos lugares, de acordo com a sua produtividade para certos produtos. Isso leva a refuncionalizar áreas portadoras de densidades pretéritas e a ocupar áreas até então rarefeitas. Em todos os casos, modifica-se o valor de cada pedaço do território e aumenta a cooperação.” (SANTOS & SILVEIRA, 2001, p.141).

Ademais “A divisão territorial do trabalho, ao mesmo tempo em que promove uma dispersão geográfica das atividades produtivas, favorece as forças da concentração.” (ARROYO, 2012. p. 24). Portanto, para que a parcela do território de Ipojuca, onde se localiza Suape, adquirisse este valor geoeconômico para o grande capital, como afirma Arroyo (2012), este complexo de atividades industriais portuárias procura, de forma intensa, aumentar o nível de produtividade dos terminais e ampliar a capacidade de carga do sistema, sempre, com o objetivo de figurasse como um polo portuário dinâmico e competitivo em escala global. Nesse sentido:

As condições de fluidez e porosidade assim criadas acabam reforçando a tendência a um uso cada vez mais corporativo do território e, portanto, uma lógica reticular se impõe sobre a lógica dos lugares” (ARROYO, 2003. p.441).

Em outras palavras, todo este aparato técnico-científico-informacional em conjunto com as normas, tanto as governamentais como as estabelecidas pelas empresas, tem como objetivo principal colocar Suape (fixo)8 em função do fluxo dos

8 Fixos são vistos aqui, à luz do pensamento do professor Milton Santos, correspondendo as

materialidades técnicas (representados pelos viadutos, estradas, portos, usinas hidrelétricas, empresas de telecomunicações, etc.), fixos e fluxos, respondendo às imposições do capitalismo, acabando por redefinir os espaços e as relações existentes neles; assim vão se implementando no território brasileiro, envoltos em um jogo de contradições, formas de acumulação cada vez mais segregadas, desiguais e combinadas. (SANTOS, M. Técnica, espaço, tempo. 1998)

produtos comerciais, no mercado capitalista como integrante de uma tecnificação do território voltada para gerar a fluidez territorial demandada pelo mercado.

A parcela do território de Ipojuca onde está localizado Suape constitui peça chave para a reprodução do sistema econômico, enquanto outras parcelas, as que estão localizadas fora do complexo portuário são utilizadas de diversas formas, umas seguem a lógica do mercado, ou seja, servem aos usos mercantil e especulativo impostos pelas corporações imobiliárias e pelos tredding turísticos e, as demais parcelas encontram-se fora da lógica comercial dominante, portanto, submetida aos jogos de interesses dos agentes corporativos e governamentais.

O território, dessa forma, transforma-se em uma arena de disputa entre os agentes locais e os agentes externos. Portanto, “A história da implantação do Complexo Industrial Portuário de Suape é, necessariamente, uma história territorial, já que a expansão desse agente social, com sua própria conduta territorial, entra em choque com as territorialidades dos antigos moradores que ali residiam.”(CASTELLAN et al, 2013 p.239). Tais choques, entre os antigos moradores de Ipojuca, com tudo o que representa Suape, reconfiguram o território reorganizando seu espaço, transformando o uso e a ocupação do solo em mero recurso a ser explorado, carregando, assim, forças de fragmentação e desagregação de base territorial. Assim sendo, colocam-se em embate duas forças em ordens dialeticamente opostas: A ordem global e a ordem local. Pois, “A ordem global busca impor, a todos os lugares, uma única racionalidade. E os lugares respondem ao mundo segundo os diversos modos de sua própria racionalidade. A ordem global serve-se de uma população espaça de objetos regidos por essa lei única que os constitui em sistema.” (SANTOS, 2006a. p. 45).

A ordem global, da qual faz parte Suape, se dá pelo contínuo processo de fluidez que acontece territorialmente. Pois, “A introdução de modernas técnicas de gestão dos fluxos pelos operadores dos terminais e os ganhos de velocidade nas operações de manuseio, armazenagem e distribuição e de pontualidade na entrega dos contêineres, geram avanços nítidos em termos de fluidez gerencial.” (MONIÉ, 2014. p. 111). Desta feita, a organização do território de Ipojuca vai se revelando espacialmente a partir dos elementos fixos que garantem a realização dos fluxos,

seguindo a lógica comercial, na qual o espaço é visto apenas como mais um produto de mercado.