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Capítulo 2 – Burguesia, desenvolvimento e comunicação

2.2 Comunicação de massa: um novo negócio

2.2.3 Televisão

A vez da entrada do Grupo Edson Queiroz no ramo da televisão acontece na virada da década de 1960 para a de 1970. Os anos 60 que foram abertos com a inauguração da primeira emissora de TV no Ceará, integrante dos Diários e Emissoras Associados, se encerravam com a chegada do segundo canal, a TV Verdes Mares. Em um ano, esta já estaria em primeiro lugar, posição de onde nunca mais saiu. Nesse período, consolidava-se a integração do mercado de bens culturais brasileiro.

Em 1962, ano em que Edson Queiroz iniciava suas atividades no ramo dos empreendimentos em comunicação, o empresário Moysés Pimentel ganhou a concessão do

canal 10 de televisão em Fortaleza. A TV Ceará, canal 2, já funcionava havia cerca de dois anos. Pimentel, proprietário da Rádio Dragão do Mar e deputado federal pelo Partido Social Trabalhista (PST), o qual fundou, deu início às obras de seu novo empreendimento, no cruzamento das avenidas Antônio Sales e Estados Unidos (atual avenida Virgílio Távora). O empresário realizou desfile de equipamentos da nova emissora pela cidade e publicava nos jornais convocatórias de reunião da nova TV.

Ficam os Srs. Acionistas da TV Dragão do Mar S/A convidados a se reunirem em assembléia geral extraordinária, às 9h, do dia 3 de maio de 1965, na sede social, Av. do Imperador, 696, nesta cidade, a fim de deliberarem:

a) homologação do aumento de capital autorizado pela assembléia geral de 17 de março de 1965;

b) outros assuntos de interesse da empresa. Fortaleza, 23 de abril de 1965

Vinculado ao ideário nacionalista, apoiador de João Goulart, teve seu mandato cassado depois do golpe de 1964. No bojo da perseguição política aos opositores do golpe, o prefeito de Fortaleza, general Murilo Borges (1963/1966), denunciou ao Conselho Nacional de Telelecomunicações (Contel), em junho de 1965, o caráter subversivo da emissora. “Uma emissora de televisão nas mãos dos comunistas seria mais perigoso que metralhadoras” (CARVALHO, 2006, p. II). Em julho do mesmo ano, um mês depois da denúncia, Edson Queiroz entraria com um processo no Contel solicitando concessão para explorar uma faixa do espectro televisivo, o que seria aprovado por Costa e Silva no dia 23 de maio de 1969. No dia 30 de julho estaria firmado o contrato.

A afirmação de Capparelli (1982, p. 165) enquadra de forma muito justa a dança das cadeiras operada no Ceará no cenário político brasileiro:

Em vez do sistema de concessões favorecer o pluralismo ideológico, serviu para reforçar o monopólio das emissões dentro de um bloco ideológico politicamente identificado com a doutrina da Segurança Nacional. Por outro lado, a filtragem dos detentores de concessões favorece uma censura indireta, operada pela raiz e, eventualmente, há facilidades para a difusão da ideologia dos grupos dominantes no aparelho do Estado.

Ao contrário de visões vulgares que concebam a dominação política efetuada por frações da elite sobre os meios de comunicação de uma forma instrumental-panfletária, vemos aqui a “sutileza” com a qual se pretende operar a reprodução ideológica. Selecionando dentro da própria classe burguesia perfis de gestão convergentes com o projeto político no poder, tornou-se garantida a perpetuação dessa difusão ideológica (e com a “sutileza” que corresponde à natureza das ideologias), mesmo depois de retirado o grupo do poder. Com um

único ato de abuso explícito da força, a retirada das concessões do já cassado político Moysés Pimentel26, ao melhor estilo maquiavélico, realizou-se a “filtragem” ideológica no Ceará.

A velocidade de construção da emissora foi em ritmo acelerado. Os equipamentos importados em pouco tempo entraram em funcionamento. Em menos de três meses começariam as emissões experimentais e, no dia 31 de janeiro de 1970, encerrado o sexto mês, tinha início o funcionamento regular da TV Verdes Mares. Com uma potência de 1 Kw, seu sinal podia ser captado em todo o Ceará e no oeste do Rio Grande do Norte e Paraíba. Cerca de 86 pessoas foram contratadas pela nova empresa.

Durante todo o mês de janeiro daquele ano o Grupo Edson Queiroz investiu em publicidade, alimentando na população a expectativa sobre a nova emissora. Os jornais O Povo e Tribuna do Ceará trouxeram instruções de como sintonizar as emissões dos teipes (nesse caso, filmes de longa-metragem), em caráter experimental do canal 10. Alguns anúncios diziam “Pena que nossa televisão não seja a cores...”, “as ruas de Fortaleza vão ficar mais desertas à noite” e “TV Brasília-canal 10-Fortaleza-CE”.

O número de aparelhos de TV vendidos só crescia. Em 1970, esse número quase atinge a marca de 5 milhões de televisores novos no Brasil (CAPARELLI, 1982, p. 88). No dia 21 de janeiro, Tribuna do Ceará anunciava a seleção de sete garotas-propaganda que se somariam às quatro que trabalhavam no canal 10. Realizada pela atriz Floriza Rossi, as escolhidas eram todas estudantes do “curso secundário” e já possuíam emprego de vendedora, secretária ou recepcionista.

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No dia 9 de abril de 1964, foi anunciado em plenária do congresso nacional que estariam, pelo prazo de dez anos, suspensos os direitos políticos e cassado o mandato de Moysés Santiago Pimentel (PTB-CE) (http://www.camara.gov.br/internet/infdoc/publicacoes/html/pdf/construcao4.pdf).

A diretoria da então Rádio Televisão Fortaleza S/A contava em 1971 com Edson Queiroz na presidência, José de Paula Barbosa como diretor-gerente, José de Arimatéia dos Santos como diretor-secretário, Astrolábio Queiroz Filho como diretor-comercial. Na fundação da empresa, em junho de 1965, o número de acionistas chegou a dezoito.

No dia 8 de janeiro, a coluna “Ondas e Canais”, do jornal O Povo, seção voltada para assuntos relacionados às mídias eletrônicas, traria uma entrevista com Astrolábio Queiroz Filho. Ao ser questionado, disse que entre as novidades do canal estaria o oferecimento gratuito de 50 minutos, de segunda a sexta, de programação educativa ao governo brasileiro, sendo a primeira emissora comercial a fazer isso. Na mesma entrevista aproveitou para pressionar o governo estadual pela concessão de utilização da infra-estrutura de repetidoras já existente, para contribuir de alguma forma para a implementação da nova emissora, o que ainda não haveria ocorrido. Esse fato demonstra a disposição da TV ao alinhamento político acima mencionado por Capparelli, a espera de “favores” do Estado, ao mesmo tempo em que apresenta um conflito entre interesses políticos e econômicos na relação da emissora com este.

Ainda na coluna “Ondas e Canais” trata-se como bem-vinda a chegada da nova TV, alegando que o canal 2 vinha repetindo muito os teipes e apresentava grande quantidade de anúncios. As expectativas geraram uma certa decepção na própria coluna, quando foi anunciada a programação da TV Verdes Mares, na qual encontravam-se programas já transmitidos pela TV Ceará, como o “Moacir Franco Show” e “Família Trapo”, produzidos no Sudeste. Enquanto isso, as lojas da Ceará Gás Butano vendiam televisores Philco, fomentando a ampliação do número de receptores e, conseqüentemente, da audiência. Preocupado com a concorrência, antes mesmo do dia 31 de janeiro de 1970, o canal 2 estendia sua programação, que passou a ter início mais cedo.

A programação anunciada pela TV Verdes Mares para a primeira semana baseava-se em filmes, desenhos animados e séries estrangeiras, produção do sudeste do país, telejornais, comentários esportivos e políticos. Em 1974 torna-se “afiliada” da Rede Globo.