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Quando as pessoas ouvem falar de um homicídio e discutem a morosidade da Justiça, elas vêem o trabalho da Polícia e o trabalho da Justiça como um todo, talvez diferenciando um

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pouco que na Justiça “as coisas são mais demoradas”. Nosso estudo possibilitou identificar o tempo em dias da Fase de Polícia e da Fase de Justiça, ambos componentes do Ciclo de Justiça Criminal.

A Tabela 12 apresenta o tempo em dias da Fase de Polícia, considerando desde a data do registro do homicídio do Boletim de Ocorrência até a data do Relatório do Inquérito feito pelo Delegado de Polícia, que quando encerrado apressa-se em protocolá-lo na Justiça. A Fase de Justiça considera desde a data do Recebimento da Denúncia pela Justiça até a data do Julgamento. Na maioria das vezes a data do Relatório do Inquérito coincide com a data do Recebimento da Denúncia, o que demonstra uma rapidez em começar um Processo Penal. Mas há casos em que o Recebimento da Denúncia requer um tempo maior para sua apreciação, o que pode gerar uma diferença de alguns dias em certos casos, se for considerado o tempo total (BO até Data do Julgamento) como foi apresentado na Tabela 02.

Na Tabela 12 a coluna da esquerda “Nr. Processo” identifica o número do Processo Penal para os 20 réus processados e a ordenação desta tabela está pela ordem crescente do percentual atribuído à Fase de Polícia em relação ao tempo total.

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Tabela 12

Tempo em dias da Fase de Polícia e da Fase de Justiça

Nr. Processo Fase de Polícia % Fase de Justica %

6 0 0,0 583 100,0 9 0 0,0 2036 100,0 10 0 0,0 377 100,0 11 0 0,0 503 100,0 12 0 0,0 390 100,0 3 3 0,5 628 99,5 4 6 2,0 297 98,0 1 7 1,0 707 99,0 16 9 1,5 587 98,5 17 9 1,4 657 98,6 17 9 1,4 657 98,6 17 9 1,4 657 98,6 17 9 1,4 657 98,6 5 16 0,7 2362 99,3 14 28 5,3 505 94,7 15 61 4,1 1438 95,9 8 103 27,2 276 72,8 7 105 19,4 435 80,6 2 105 16,1 547 83,9 13 311 34,6 589 65,4

Fonte: Banco de Dados de Processos Penais de Homicídios do Levis

Quando de nosso trabalho de leitura e análise individual de cada Processo Penal, ainda com o senso “das pessoas que não conhecem bem o trabalho da Polícia e o trabalho da Justiça”, não tínhamos percebido a grande diferença do tempo em dias alocado para a Fase de Polícia (FP) e para a Fase de Justiça (FJ). Na Tabela 12 chama atenção que 5 réus tiveram seus Inquéritos Policiais resolvidos no mesmo dia do Boletim de Ocorrência, que ocorre quando da prisão em flagrante e que mesmo com esta “rapidez” a Fase de Justiça para estes 5 réus requereu de 390 a 2036 dias. Percebemos que o tempo da Fase de Justiça é expressivamente mais longo que a Fase de Polícia, sendo que o trabalho da Justiça é baseado no Inquérito Policial que a Polícia Civil produziu, o que entendemos que deveria ser “uma peça completa”. Mas Coelho (1986, p. 77) identifica falhas no Inquérito Policial e que a Promotoria espera que “as deficiências dos inquéritos sejam sanadas” na Fase de Justiça, o

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que entendemos que seja um protelador do tempo da Fase de Justiça. Para 14 réus a Fase de Polícia foi resolvida em até 2% do tempo total (FP + FJ). Os demais 6 Inquéritos Policiais foram resolvidos de 4,1% até 34,6% do tempo total. A Tabela 12 mostra que no mínimo 65% do tempo total foi gasto pela Fase de Justiça, mas na maioria dos casos ela é maior que 95% do tempo total.

Tabela 13

Percentuais médios do tempo da Fase de Polícia e da Fase de Justiça

Total de Réus % Fase de Polícia % Fase de Justiça

20 6 94

Fonte: Banco de Dados de Processos Penais de Homicídios do Levis

Numa análise geral, conforme a Tabela 13, para os 20 réus processados a Fase de Polícia teve um percentual médio do tempo total de 6%, enquanto a Fase de Justiça usou 94% do tempo total.

Nos chama atenção esta diferença entre os percentuais da Fase de Polícia e da Fase de Justiça, no sentido de que “tanto a Polícia quanto a Justiça” cumprem os prazos legais, e portanto, a própria lei “admite” esta diferença e estes tempos. Por outro lado, conforme a os casos que estudamos, foi num tempo médio de 6% do tempo total, que a Polícia Civil produziu o Inquérito Policial, o qual serviu de base para o trabalho da Justiça que ocupou 94% do tempo total do Processo Penal.

Capítulo 4

Padrões dos Homicídios Analisados: Alguns Perfis

Os trabalhos estatísticos sobre homicídio sempre privilegiaram as informações sobre a vítima de homicídio, em detrimento do autor do crime. O homicídio é o tipo de crime melhor registrado e disponibilizado em bases de dados, assim como já identificado por Zimring e Hawkins (1997) que destacam que além de registrados e relatados, os homicídios intencionais, que são considerados os crimes mais violentos e que geram uma séria sensação de perda, são anotados com melhor qualidade de informação, a exemplo do sistema de saúde e da polícia.

Investigar Processos Penais no Fórum de Justiça é um locus privilegiado, pois num mesmo conjunto de documentos, ou seja, nos autos do Processo Penal, além de obter informações sobre o processamento dos documentos, considerando seu trâmite protocolar, podemos também analisar as categorias do crime de homicídio, podemos procurar caracterizar perfis sociais e eventuais relações entre vítima e acusado. Lembramos que o indiciado no Inquérito Policial, sendo aceita a denúncia, passa a figurar como réu no Processo Penal.

Em um Processo Penal estão coligidos documentos originados em diversas instâncias que registram o homicídio, como o atestado de óbito do IML e os laudos técnicos da Delegacia Técnica de Polícia da Capital (DPTC); o Boletim de Ocorrência, os interrogatórios das testemunhas e dos suspeitos, as provas testemunhais e de confissão de culpa, as provas materiais, e os atestados de antecedentes criminais, contidos no Inquérito da Polícia Civil na Fase de Polícia; as oitivas de testemunhas e do réu, as argumentações da defesa e da Promotoria dentro do princípio do contraditório, os despachos do Juiz, as observações protocolares dos funcionários do Cartório da Vara Criminal, o desenvolver da Sessão do Tribunal do Júri, a sentença, os recursos ao TJ e outros pleitos das partes, recortes de jornais

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com reportagens sobre o crime, documentos estes produzidos ou anexados ao Processo Penal na Fase de Justiça. Desta maneira pudemos caracterizar vítima e réu quanto a sexo, idade, cor (pertença étnica), estado civil, profissão, naturalidade, local de residência, escolaridade, “situação econômica”, tipo de relacionamento entre réu e vítima, tipo do motivo do crime. É importante destacar que os envolvidos são primeiramente qualificados pela Polícia e, portanto, as categorias foram obtidas dos documentos gerados pela Fase de Polícia. Quando da ausência destas informações no Inquérito Policial, elas foram buscadas nos demais documentos do Processo Penal. A qualidade das informações do BO já foi observada pelo Delegado Thomé “Na prática policial civil podem ser observadas duas grandes situações embaraçosas quanto ao boletim de ocorrência: a ausência de indicações seguras quanto à qualificação e localização das pessoas envolvidas e o descuido na narrativa do fato” (THOMÉ, 1997, p. 33).

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